
Substitua Trump por Benjamin Netanyahu, o l�der israelense que acaba de cair ap�s 12 anos de governo, e a f�rmula se mant�m.
Nesta quarta-feira, um grupo improv�vel formado por pol�ticos israelenses de diferentes vertentes anunciou a confirma��o de uma coaliz�o constru�da para, acima de tudo, interromper a longa gest�o de Nethanyahu, - cuja popularidade foi abalada por uma s�rie de investiga��es de corrup��o, suborno e fraude no pa�s.
Espera-se que a guinada no n�cleo duro do governo israelense, que agora re�ne pol�ticos ultranacionalistas, figuras de centro e at� isl�micos �rabes, tenha forte impacto na complicada geopol�tica do Oriente M�dio.
Mas ela tamb�m tem reflexos do outro lado do mundo - mais precisamente no gabinete do presidente brasileiro, novamente �rf�o de um de seus principais padrinhos pol�ticos internacionais.
Ap�s investir em uma intensa rela��o de elogios e apoio ao ex-premi� de Israel, a quem chegou a tratar como "irm�o", o presidente brasileiro agora se v� "mais isolado do que nunca" no tabuleiro pol�tico internacional, segundo analistas estrangeiros ouvidos pela BBC News Brasil.
"Esse � o problema de ter uma pol�tica externa que n�o � uma pol�tica de Estado, mas uma pol�tica partid�ria e ideol�gica", avalia o professor Christopher Sabatini, pesquisador s�nior para Am�rica Latina da Chatham House, instituto real de pesquisa mais prestigiado do Reino Unido.
"Antes de voc� se dar conta, seus aliados podem sair do cargo e voc� sobra sozinho."
Reviravolta em Israel

A reviravolta na pol�tica dom�stica de Israel � fruto de um surpreendente encontro entre o centrista Yair Lapid, ex-ministro das Finan�as e l�der do partido Yesh Atid ("H� um futuro", em hebraico), e Naftali Bennet, o cabe�a do partido ultranacionalista Yamina (ou "� direita").
O partido de Lapid foi o segundo mais votado nas elei��es israelenses em mar�o deste ano, depois do partido de direita Likud ("Consolida��o"), liderado por Netanyahu.
Em 6 de abril, o presidente israelense Reuven Rivlin deu um prazo de 28 dias para que Netanyahu conseguisse construir uma coaliz�o para formar um novo governo. Como o atual premi� n�o conseguiu atrair partidos suficientes para atingir maioria no parlamento, Rivlin transmitiu a miss�o para o segundo colocado Lapid, que desde ent�o vinha dialogando com diferentes grupos na tentativa de alcan�ar maioria, mesmo que heterog�nea.
As negocia��es sobre a forma��o de um novo governo foram interrompidas em 10 de maio, quando uma nova rodada de hostilidades entre Israel e o Hamas teve in�cio na Faixa de Gaza. No �ltimo dia 30, nove dias ap�s o an�ncio de um cessar-fogo, o direitista Bennet, ex-assessor-s�nior, chefe de gabinete, ministro da Educa��o e da Defesa em governos recentes de Netanyahu, foi � televis�o para anunciar o golpe final no governo do ex-aliado.
"Farei tudo o que for preciso para formar um governo de unidade nacional com meu amigo Yair Lapid", exclamou.O acordo entre os dois pol�ticos, que divergem em diversos temas-chave, entre eles a possibilidade da cria��o de um Estado palestino, prev� que Bennet seja o primeiro-ministro pelos pr�ximos dois anos - quando ser� substitu�do por Lapid, que governar� por mais dois.
A coaliz�o vencedora tamb�m une opostos como Avigdor Lieberman, um pol�mico nacionalista de extrema-direita que certa vez sugeriu que membros "desleais" da minoria �rabe do pa�s deveriam ser decapitados, e o pequeno partido �rabe Ra'am, que busca prote��o oficial a costumes conservadores mu�ulmanos e mais verbas para cidades de maioria �rabe.
Este ser� o primeiro partido liderado por �rabes a participar de um governo de coaliz�o em Israel - o que por si s� requereria uma mudan�a na postura de Bolsonaro em rela��o ao pa�s.
Bolsonaro isolado

Mas o que isso significa para o presidente brasileiro, frequentemente fotografado junto a bandeiras de Israel e cuja plataforma, desde a campanha, era de alinhamento com o ex-premi� Netanyahu?
Para o historiador Federico Finchelstein, chefe do departamento de Hist�ria e do programa de Estudos Latinos Americanos da New School, em Nova York, a intimidade mostrada publicamente entre os dois l�deres, a partir de agora, deve acabar.
"� cedo para saber o que a nova coaliz�o far� em Israel, mas devemos esperar uma rela��o menos amig�vel, e uma rela��o baseada em geopol�tica, em vez de ideologia", aponta.
Para Christopher Sabatini, "construir uma alian�a com o Brasil n�o vai ser uma prioridade do governo de coaliz�o israelense". "Isso era uma pol�tica muito pr�pria e pessoal de Netanyahu", diz.
Na avalia��o de Sabatini, que at� pouco tempo tamb�m dava aulas sobre Am�rica Latina na Universidade de Columbia, "Bolsonaro trocou a diplomacia de Estado profissional do Brasil pela uma vis�o pessoal e limitada".
"Ele acaba sendo ref�m de sua pr�pria falta de toler�ncia e de modera��o: basta se lembrar dos coment�rios dele sobre a esposa do presidente (franc�s Emmanuel) Macron. Um presidente n�o pode fazer isso."
Em agosto de 2019, um seguidor de Bolsonaro fez coment�rios sexistas comparando as duas primeiras-damas. "Agora entende por que Macron persegue Bolsonaro?", escreveu um homem sob uma foto dos dois casais. "N�o humilha, cara", replicou o chefe de Estado brasileiro, criando novo constrangimento internacional.

Finchelstein, especialista em radicalismo e populismo, diz n�o se surpreender com o rev�s enfrentado agora por Bolsonaro ao perder seu aliado pessoal no Oriente M�dio.
"A situa��o mostra a falta de prepara��o da pol�tica internacional de Bolsonaro para uma situa��o de perda de seus pares autorit�rios", avalia. "Esse caracter�stica, que tamb�m aparece na m� condu��o e falta de planejamento sobre a pandemia no Brasil, se baseia na simples torcida pelo que pode acontecer, e n�o a partir de dados concretos e reais."
Para Sabatini, "o Brasil j� est� isolado" e o novo governo israelense aprofunda o problema.
"Bolsonaro j� est� fora de compasso na maior parte da sua pr�pria regi�o e agora os �nicos governos com quem ele pode contar como aliados s�o Turquia, Hungria e Pol�nia - nenhum deles exatamente est�veis - e �ndia. E ele vai ficar mais e mais isolado globalmente", pondera.
Finchelstein concorda e questiona: "Ali�s, qu�o importante � a Hungria para os interesses geopol�ticos brasileiros?".
Embaixada em Tel-Aviv
Durante a campanha presidencial, j� acenando ao ent�o par israelense, Bolsonaro foi alvo de cr�ticas em todo o mundo ao traduzir seu alinhamento ideol�gico com Netanyahu pela promessa de transfer�ncia da embaixada brasileira no pa�s de Tel-Aviv para Jerusal�m, a exemplo do que haviam feito EUA e Guatemala.
A mudan�a representaria uma guinada sem precedentes na postura da diplomacia brasileira, que sempre foi de equil�brio entre o lado israelense e o lado palestino. O reconhecimento da cidade como capital de Israel poderia irritar n�o somente palestinos, pa�ses �rabes e de maioria mu�ulmana, mas tamb�m gerar rea��es da comunidade internacional, cuja posi��o formal � de que o status de Jerusal�m deve ser decidido em negocia��es de paz.
O entendimento � de que o reconhecimento de Jerusal�m Ocidental como capital de Israel s� poder� ocorrer ao mesmo tempo em que Jerusal�m Oriental for reconhecida como capital de um futuro Estado palestino.
� por isso que os pa�ses mant�m suas embaixadas em Tel Aviv, a capital comercial de Israel.

A medida tamb�m teria impacto direto nas rela��es do Brasil com importantes parceiros comerciais: pa�ses �rabes e mu�ulmanos, como o Ir�, respondem por quase 6%¨de todas as exporta��es brasileiras - principalmente carne. Em mar�o de 2019, em visita oficial a Netanyahu, no entanto, Bolsonaro recuou.
"O Brasil decidiu estabelecer um escrit�rio em Jerusal�m para a promo��o do com�rcio, investimento, tecnologia e inova��o", anunciou o Itamaraty, que nunca mais tocou no tema da transfer�ncia da embaixada.O epis�dio ilustra o que especialistas apontam como preju�zos da perspectiva pouco conciliadora que, para analistas, marca tanto Netanyahu, quanto Bolsonaro.
Em entrevista recente ao jornal local Times of Israel, o novo primeiro-ministro Naftali Bennett disse: "Sou mais direitista do que Bibi (Netanyahu), mas n�o uso o �dio ou a polariza��o como uma ferramenta".O professor da New School diz que "governos extremistas e populistas como Netanyahu e Bolsonaro baseiam suas pol�ticas na demoniza��o do outro, em vez de integra��o e di�logo".
"No caso brasileiro, � uma quebra muito grande com administra��es anteriores", diz. ""Estamos vendo no Brasil que pessoas muito distintas, como os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Lula, podem se encontrar e pensar juntas sobre suas diferen�as enquanto pol�ticos democratas."
"J� Bolsonaro est� preso � uma ideologia problem�tica e, quando a realidade muda, seja nos EUA ou em Israel, temos uma nova li��o sobre como pol�ticas movidas pela vontade e por caprichos pessoais s�o t�o prejudiciais."
Mudan�a de postura?
Se o pal�cio do Planalto seguir a cartilha adotada ap�s a derrota de Trump, Bolsonaro deve tentar recalibrar seu discurso a partir de agora.
Ap�s apoiar abertamente a reelei��o de Donald Trump, sugerir fraude nas elei��es dos EUA e ter sido o �ltimo l�der de um pa�s democr�tico a parabenizar Joe Biden pela elei��o, Bolsonaro escalou o ent�o chanceler Ernesto Ara�jo como porta-voz de um di�logo renovado entre os dois pa�ses.

"Tive hoje longa e produtiva conversa com o Secret�rio de Estado Antony Blinken. Agenda 100% positiva. Ficou claro que h� excelente disposi��o e amplas oportunidades para continuarmos construindo uma parceria profunda entre o Brasil e os Estados Unidos", disse ent�o Ara�jo pelo Twitter.
De l� para c�, sob intensa press�o por uma gest�o classificada como err�tica e ideol�gica � frente do Itamaraty, Ernesto Ara�jo perdeu a cadeira e foi substitu�do pelo diplomata Carlos Fran�a, descrito como figura mais moderada.
Sua fun��o seria "filtrar" o discurso ideol�gico que Bolsonaro direciona a apoiadores mais radicais em uma gest�o mais pragm�tica nas rela��es internacionais do pa�s.
A chegada de Fran�a ajudaria o Brasil a construir pontes com o novo governo israelense?
"Como podemos ver com os ministros da Sa�de, nas quest�es mais pol�micas, � Bolsonaro quem decide. Os que tentaram uma abordagem mais cient�fica ou pragm�tica foram demitidos. Na perspectiva democr�tica, a quest�o mais problem�tica da administra��o Bolsonaro � ele pr�prio", avalia Finchelstein.
Para Christopher Sabatini, Bolsonaro agora est� diante de um dif�cil quebra-cabe�as.
"Ele vai precisar fazer sacrif�cios em termos do que sempre considerou como princ�pios b�sicos: por exemplo, o apoio a uma defini��o muito limitada sobre Israel e seus interesses, ou uma nova vis�o sobre um Estado palestino. Ele vai mudar nesses pontos para conseguir se realinhar? Se o fizer, ser� um movimento pragm�tico, mas que vai faz�-lo parecer vol�vel e abrindo m�o do que caracteriza sua imagem e personalidade", pondera.
"E, se n�o o fizer, ent�o ele vai ficar ainda pior como l�der global - o que o Brasil, no passado, aspirava ser", diz.
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