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Estado de Minas TORRES G�MEAS

11 de Setembro: '20 anos depois, � prov�vel que EUA e Taleb� se aliem no combate ao terror', diz ex-analista do FBI

Especialista em contraterrorismo dos EUA afirma que cen�rio inimagin�vel em 2001 de alian�a entre grupo extremista e americanos se tornou necess�ria em nome da seguran�a dom�stica do Ocidente.


11/09/2021 07:22 - atualizado 11/09/2021 10:15


Soldados americanos em Herati, no Afeganistão, em 2009; especialista em contra-terrorismo dos EUA afirma que aliança com Talebã se tornou necessária em nome da segurança doméstica do Ocidente
Soldados americanos em Herati, no Afeganist�o, em 2009; especialista em contra-terrorismo dos EUA afirma que alian�a com Taleb� se tornou necess�ria em nome da seguran�a dom�stica do Ocidente (foto: Getty Images)

Vinte anos atr�s, quando duas aeronaves atingiram os pr�dios do World Trade Center, em Nova York, os Estados Unidos juraram "ca�ar" os respons�veis pela morte de quase 3.000 cidad�os em seu pr�prio territ�rio. Naquele momento, os alvos eram o grupo extremista Al Qaeda, comandado por Osama Bin Laden, que operara os avi�es usados no epis�dio e o governo do Taleb�, no Afeganist�o, que dera guarida para os combatentes da Al Qaeda. Era o in�cio da guerra mais longa da hist�ria americana.

Em 2021, depois da retirada ca�tica das tropas americanas do pa�s e da ascens�o mete�rica do mesmo Taleb� de volta ao poder no pa�s do sul asi�tico, a hist�ria parece prestes a produzir mais uma reviravolta: EUA e Taleb� se tornariam aliados no combate a grupos extremistas como a Al Qaeda e o Estado Isl�mico.

Um cen�rio inimagin�vel h� 20 anos, quando o Ex�rcito americano lan�ava sua mais pesada artilharia para abater o governo Taleb�. Para o especialista em contra-terrorismo dos EUA Javed Ali, esse � um desfecho "muito prov�vel". Atualmente professor na Faculdade de Pol�ticas P�blicas da Universidade de Michigan, Ali tem mais de 20 anos de experi�ncia como analista de seguran�a para o governo dos EUA. Nesse per�odo, ele trabalhou na Ag�ncia de Intelig�ncia de Defesa, no Departamento de Seguran�a Dom�stica e no FBI. Passou ainda pelo Conselho de Seguran�a Nacional da Casa Branca, durante a Presid�ncia de Donald Trump.


Javed Ali, um dos conselheiros de defesa nacional no primeiro ano do governo de Donald Trump, em foto na Casa Branca
Javed Ali, um dos conselheiros de defesa nacional no primeiro ano do governo de Donald Trump, em foto na Casa Branca (foto: Arquivo pessoal)

Ali esteve entre os analistas que desaconselharam a guerra do Iraque, por exemplo. Sua posi��o foi vencida pelos interesses pol�ticos da gest�o do ent�o presidente George W. Bush. � BBC News Brasil ele deslinda uma s�rie de erros t�ticos cometidos pelos americanos nos �ltimos 20 anos que levaram ao surgimento do Estado Isl�mico e � dram�tica evacua��o dos EUA de solo afeg�o nas �ltimas semanas.

Para o analista, h� risco de que inimigos de 20 anos atr�s, como a Al Qaeda, se fortale�am novamente. E a seguran�a do territ�rio americano contra tais grupos depender� da vontade e da capacidade do Taleb� de garanti-la.

Mas a maior amea�a de ataques aos EUA hoje, na vis�o de Ali, j� est� dentro do pa�s. Nas palavras dele, os americanos vivem uma "onda de terrorismo dom�stico" intensa, na qual se inserem epis�dios como a tentativa de sequestro da a governadora democrata Gretchen Whitmer, do Michigan, em outubro de 2020, e a j� hist�rica invas�o do Capit�lio por apoiadores de Trump, em 6 de janeiro de 2021.

Leia a seguir os principais trechos da entrevista de Javed Ali � BBC News Brasil, editada por concis�o e clareza.

BBC News Brasil - Vinte anos depois dos ataques de 11 de setembro, qual o balan�o poss�vel � chamada guerra ao terror lan�ada pelos Estados Unidos logo depois do incidente?

Javed Ali - O 11 de Setembro foi um momento t�o profundo na hist�ria que eu diria que suas implica��es v�o muito al�m dos EUA. Os ataques mudaram o curso da hist�ria do planeta, talvez de um modo sem precedentes. E duas d�cadas mais tarde, o pa�s ainda est� lutando para compreender o que deu certo e o que foi errado no per�odo. Porque se olharmos para estes �ltimos 20 anos, objetivamente, pode-se argumentar que existem coisas que est�o no lado positivo dos resultados, mas h� outras coisas que claramente n�o est�o e n�o tenho certeza se era isso o que os l�deres do pa�s esperavam que aconteceria 20 anos depois. Por isso acho que 20 anos ainda s�o pouco. Vamos levar provavelmente mais 20, 40 ou 60 nessa elabora��o.

As guerras no Iraque e no Afeganist�o s�o claros exemplos de eventos que n�o sa�ram da maneira que as lideran�as pol�ticas em Washington e talvez em outros pa�ses do Ocidente, que participaram dessas campanhas militares, planejaram. Em uma perspectiva pol�tica, muitos erros foram cometidos por eles, e outros tantos aconteceram em solo iraquiano e afeg�o, e que tiveram impacto no mundo real e causaram enorme sofrimento humano. Daqui a 20 anos, quando os livros de hist�ria contarem sobre as campanhas militares no Iraque e no Afeganist�o, n�o acho que a hist�ria ser� gentil com as decis�es que foram tomadas.

Um agravante � que dentro do pr�prio governo, enquanto essas decis�es eram tomadas, momentos antes de o serem, j� havia muita gente alertando que elas n�o eram as melhores. Mas muitos desses conselhos foram ignorados ou marginalizados, e posso dizer isso porque vivenciei como analista momentos em que as an�lises eram simplesmente ignoradas pelos formuladores de pol�ticas.

BBC News Brasil - Voc� poderia citar algum exemplo espec�fico em que an�lises tenham sido ignoradas com maus resultados pelos pol�ticos?

Ali - N�o posso entrar em muitos detalhes, mas tive um pequeno papel no per�odo em que os EUA estavam prestes a lan�ar a guerra do Iraque. Na minha perspectiva, e na de meus colegas de equipe, tentamos alertar os congressistas, o Pent�gono e outros pol�ticos que, se segu�ssemos pelo caminho de uma campanha militar contra o Iraque, o melhor resultado ou aquele cen�rio que as pessoas desejavam poderia jamais se concretizar. E acho que nossos instintos estavam corretos. Era muito mais prov�vel que o pior cen�rio ocorresse do que o mais otimista, que justificava a guerra. Mas, novamente, n�o cabia a n�s a tomada de decis�o, �ramos apenas os analistas que traziam subs�dio � tomada de decis�o. E n�o necessariamente os pol�ticos eleitos para isso eram influenciados pelas an�lises ou, no limite, n�o importava quanta an�lise fiz�ssemos, eles seguiriam pelo mesmo caminho que tomaram.

Mas esse � o tipo de tens�o que pode existir nesses sistemas de seguran�a nacional (como o dos EUA) em que voc� elege l�deres ou tem pessoas que s�o politicamente nomeadas tomando decis�es. Mesmo que estejam recebendo conselhos profissionais s�lidos de pessoas que n�o t�m qualquer apetite pol�tico ou vis�o partid�ria, as decis�es delas ser�o pol�ticas e eu sabia disso.


'O 11 de setembro foi um momento tão profundo na história que eu diria que suas implicações vão muito além dos EUA', diz Javed Ali
'O 11 de setembro foi um momento t�o profundo na hist�ria que eu diria que suas implica��es v�o muito al�m dos EUA', diz Javed Ali (foto: Reuters)

BBC News Brasil - E na sua perspectiva, as a��es americanas no Iraque contribu�ram para criar um ambiente para o surgimento do Estado Isl�mico?

Ali - Parte do objetivo que motivou a guerra contra o Iraque era livrar-se de Saddam Hussein e - sem entrar no m�rito se a decis�o foi certa ou errada - isso criou um v�cuo de poder no pa�s e imediatamente na sequ�ncia come�amos a ver o crescimento de uma insurg�ncia multifacetada no Iraque que tentava resistir � campanha ocidental.

Um bra�o dessa insurg�ncia era jihadista, comandada por um indiv�duo chamado Abu Musab al-Zarqawi, que era um veterano do Afeganist�o e tinha conex�es com pessoas da Al Qaeda. No in�cio, ele operava de forma mais independente, mas entre 2004 e 2005 mudou o nome de sua rede para Al Qaeda no Iraque, e desencadeou uma escalada inacredit�vel de carnificinas dentro do pa�s para tentar refor�ar divis�es sect�rias entre sunitas e xiitas e �rabes e curdos e desintegrar o pa�s, o que obviamente faria com que fosse muito dif�cil para os Estados Unidos permanecerem em solo iraquiano.

Esse era o plano sombrio de Zarqawi e ele foi morto pela coaliz�o militar em 2006. Seu grupo tamb�m sofreu uma significativa press�o militar, tanto da coaliz�o quanto de outros grupos do Iraque que mudaram de lado para apoiar os EUA e lutar contra a ent�o Al Qaeda no Iraque. Mas o rescaldo do grupo de Zarqawi, a retirada dos EUA do Iraque no final dos anos 2000 e o estabelecimento de um novo governo iraquiano lan�aram as sementes para o que ent�o se tornou o Estado Isl�mico alguns anos depois, entre 2012 e 2013. Ent�o certamente se pode tra�ar algumas linhas, embora n�o t�o retas, entre a invas�o inicial do Iraque pelos EUA e, uma d�cada depois, o surgimento de algo muito diferente e novo, e ainda mais tem�vel do que a Al Qaeda no Iraque, porque a Al Qaeda no Iraque n�o estava tentando governar um territ�rio, como queria o Estado Isl�mico.

Foi mais uma not�vel reviravolta dos acontecimentos que for�ou os EUA e os aliados a voltarem para o Iraque e, em seguida, entrarem na S�ria para pressionar o Estado Isl�mico, para que eles n�o pudessem realizar mais ataques dentro de ambos os pa�ses, n�o conseguissem governar sob esta forma brutal de lei isl�mica, nem lan�assem ataques contra o Ocidente.

O Estado Isl�mico foi respons�vel por ataques na Europa, e inspira��o para uma s�rie de extremistas nos Estados Unidos. Havia uma c�lula do Estado Isl�mico que foi neutralizada antes das Olimp�adas de 2016, na primeira grande opera��o de contraterrorismo envolvendo jihadistas no Brasil. Ent�o percebe-se o qu�o significativa era a influ�ncia do grupo mesmo entre pessoas que jamais pisariam no Iraque ou na S�ria. E isso come�ou da semente que os EUA plantaram anos antes com a decis�o de invadir o Iraque, quando os pol�ticos em Washington pensaram que nos livrar�amos de Saddam Hussein, ter�amos um novo governo iraquiano no poder que seria aceito pelo povo e o Iraque acabaria se tornando uma democracia ocidental.

Esse objetivo era completamente ilus�rio j� que o Iraque praticamente nunca operou como uma democracia, ou pelo menos uma democracia ocidental, e sua composi��o �tnica e religiosa era diversa, e a maioria das pessoas se filiava mais fortemente com essas divis�es do que com o Estado do Iraque em si.

E os mesmos erros foram cometidos pelos EUA com o Afeganist�o. Os EUA n�o entenderam que o Afeganist�o � um pa�s com composi��o complexa de diferentes religi�es e etnias e os elementos tribais e a forma como essas lealdades funcionam localmente, nos vilarejos, pode mudar muito rapidamente, e que a identidade nacional � quase a �ltima coisa em que essas pessoas est�o pensando. Ent�o, acho que essa � uma daquelas li��es dos �ltimos 20 anos que da pr�xima vez que algu�m no Ocidente decidir pensar em lan�ar algum desses campanha militares no Oriente M�dio ou no sul da �sia, � melhor saber melhor que estamos nos metendo nessa sociedade complexa, ou, como mostram os resultados, n�o vamos atingir os objetivos a que nos propusemos.


Analista de segurança nacional dos EUA, Javed Ali dá palestra na base naval americana em Annapolis, Maryland
Analista de seguran�a nacional dos EUA, Javed Ali d� palestra na base naval americana em Annapolis, Maryland (foto: Arquivo pessoal)

BBC News Brasil - � como se os EUA tivessem ignorado completamente os aspectos humanos da �rea nessa �nsia de construir na��es como se fosse construir uma estrada?

Ali - Sim, e de uma forma que mostra uma ambiguidade entre for�a e fragilidade n�o apenas pol�tica, mas da pr�pria identidade americana, de quem somos, como um pa�s que tem essa no��o de que, de alguma forma, temos mais capacidade de mudar o curso da hist�ria porque somos a pot�ncia militar mais forte do mundo ou a economia mais forte do mundo.

As pessoas parecem gostar dos valores e da cultura americana, e h� um pensamento de que se pudermos exportar isso para outros pa�ses no exterior, ao longo do tempo, eles iriam simplesmente se voltar em nossa dire��o. � claro que h� exemplos em que os EUA foram uma for�a positiva no mundo, mas existem certos pa�ses que meramente por sua hist�ria mostram que eles resistiram � ocupa��o estrangeira v�rias vezes no passado. Ou a composi��o do pa�s � t�o �nica e diferente que mesmo com as melhores inten��es e, com o melhor dos objetivos em mente, o esfor�o jamais teria valido a pena.

O Afeganist�o, provavelmente mais do que qualquer outro pa�s, � esse caso. E isso remonta a mil�nios. Alexandre, o Grande, tentou conquistar o Afeganist�o h� quase 2.000 anos, e esse foi um projeto fracassado. O Imp�rio Brit�nico, no auge de seu poderio, em meados de 1800, tentou duas vezes, sem sucesso, e h� quem argumente que isso pode ter sido o in�cio do fim do Imp�rio Brit�nico no Sul da �sia. Em seguida, 100 anos mais tarde, a Uni�o Sovi�tica, no auge do poder e rivalidade contra os EUA, achou que poderia atingir objetivos semelhantes. E ainda assim eles partiram depois de oito anos, tendo falhado e sofrido muitas perdas econ�micas. Muitos historiadores argumentaram que esse tamb�m foi o come�o do fim da Uni�o Sovi�tica.

Ent�o, o Afeganist�o ao longo do tempo e da hist�ria levou ao fim desses imp�rios globais, e espero que isso n�o signifique o fim da hegemonia global americana, mas depois de alguns trilh�es de d�lares gastos e das terr�veis baixas que as tropas dos EUA sofreram, al�m de obviamente, o impacto para os afeg�os, os historiadores v�o olhar para tr�s a partir da perspectiva dos EUA e dizer que de alguma forma nos perdemos quando seguimos na dire��o da constru��o de uma na��o que nenhum poder estrangeiro foi capaz de fazer antes.

BBC News Brasil - O 11 de Setembro gerou essas guerras sem fim no Iraque e no Afeganist�o e a partida dos americanos do solo afeg�o era popular nos EUA. O modo como a partida aconteceu, no entanto, gerou cr�ticas. Como avalia os �ltimos momentos do pa�s no Afeganist�o, quando os EUA tiveram que negociar com o Talib�, o grupo que tiraram do poder?

Ali - Voltando aos primeiros dias ap�s o 11 de Setembro, nosso foco inicial era apenas perseguir a Al Qaeda, porque a Al Qaeda foi a respons�vel pelos ataques. Pouco depois, ampliamos o foco para o Taleb�, mas n�o apenas. Inclu�mos na sequ�ncia a ideia de constru��o de na��o. � a� que vejo erros estrat�gicos importantes, de uma perspectiva pol�tica. Mas nenhum presidente at� Trump, e agora Biden, decidiu mudar isso.

Podemos ter um debate interessante sobre se a retirada total foi a melhor decis�o, mas a forma como foi realizada pareceu precipitada, desconsiderou as complica��es dessas evacua��es, partimos da base da for�a a�rea de Bagram, onde estava a maioria dos meios a�reos e, literalmente, apenas dois meses depois colocamos quase o dobro do n�mero de tropas no solo de novo e tivemos que mover um n�mero igualmente grande de aeronaves de volta ao pa�s para tirar dezenas de milhares de pessoas do Afeganist�o em um per�odo de tempo realmente curto.

E, como consequ�ncia, isso levou � morte de afeg�os e �quelas imagens terr�veis de pessoas desesperadas agarradas em um avi�o militar, e, pior ainda, ao ataque ao aeroporto de Cabul. O governo Biden n�o previu que ao reunir tantas pessoas relativamente desprotegidas e claramente desesperadas para sair, colocando tropas dos EUA e outras tropas ocidentais de volta em perigo para acelerar a partida de todas essas pessoas, que essa seria a oportunidade ideal para o ISIS-K (bra�o paquistan�s-afeg�o do Estado Isl�mico) e, infelizmente, eles se aproveitaram disso.

Mas agora essa parte foi conclu�da e teremos que ver o que ser� do Afeganist�o sob o Taleb�, que se vende como mais gentil e aberto, mesmo que ainda queiram governar sob a lei isl�mica. � preciso ver se conseguir�o passar essa ideia e ter acesso a financiamento internacional, ou se v�o operar como um Estado p�ria do s�culo s�timo e cometer os mesmos erros de 25 anos atr�s que os levaram a perder o poder.

E depois, no lado do terrorismo, com a evacua��o dos EUA e outras for�as militares ocidentais, veremos o ressurgimento de grupos como a Al Qaeda, que foi duramente castigada por 20 anos e teve sua capacidade de ataques ao Ocidente praticamente anulada. Dado o que restou da Al Qaeda, seus recursos, equipamentos, pessoas e dinheiro, n�o acho que eles tenham abandonado o foco do ataque ao Ocidente, e dado seu hist�rico relacionamento com o Talib�, que lhes deu guarida para lan�ar o ataque de 11 de setembro, o que vai acontecer agora? O Talib� vai fazer vistas grossas ou vai reprimir a Al Qaeda? E quanto ao ISIS-K?

O ISIS-K conduziu dezenas, sen�o centenas, de ataques nos �ltimos cinco anos, desde que entrou em cena. Agora, eles s�o uma amea�a ao Taleb� e � seguran�a do Afeganist�o. Como o Taleb� reagir� ao lutar contra eles agora que os EUA n�o est�o mais l�? E isso levanta outro cen�rio realmente interessante: os EUA entrar�o em uma parceria de contraterrorismo com o Taleb� para combater amea�as como ISIS-K ou a Al Qaeda ou outros grupos que tentem amea�ar o Ocidente? � um cen�rio quase inimagin�vel 20 anos atr�s, quando est�vamos jogando bombas sobre o Taleban e conduzindo opera��es terrestres para arranc�-los do poder.


Soldados armados do Talebã e civis em foto de 2020
Soldados armados do Taleb� e civis em foto de 2020 (foto: Getty Images)

BBC News Brasil - E qu�o prov�vel � essa alian�a entre EUA e Taleb� agora?

Ali - Muito prov�vel, porque j� n�o estamos mais l�, n�o temos a infraestrutura de contraterrorismo que estava dispon�vel para colocar press�o sobre esses grupos por contra pr�pria ou em parceria com o governo afeg�o, que sequer existe mais. Agora, o �nus recai sobre o Taleb� de ser o fiador da seguran�a para o pa�s e, teoricamente, tamb�m para o Ocidente. E esses pa�ses ter�o que entrar em acordo com o Taleb�, n�o porque gostemos politicamente deles, mas apenas porque nossos interesses b�sicos de seguran�a nacional dependem disso.

Ent�o, eu realmente acho que � muito prov�vel que os EUA desenvolvam esse tipo de relacionamento, de parceria, como j� fizemos com outros grupos nos �ltimos anos, quando n�o quer�amos colocar tropas terrestres, como no Iraque, na S�ria, no Norte da �frica. Os EUA devem apoiar os Taleb� direta ou indiretamente, para que eles possam fazer o necess�rio n�o apenas para manter o Afeganist�o seguro, mas tamb�m para manter os EUA seguros.

BBC News Brasil - N�o � uma posi��o muito fr�gil para os EUA depender do Taleb� para garantir a seguran�a de seu pr�prio territ�rio?

Ali - Espero que estes riscos tenham sido pensados %u200B%u200Bpelos l�deres em Washington, em Londres e nos demais pa�ses da Otan (Organiza��o do Tratado do Atl�ntico Norte) que tomaram a decis�o de retirar as tropas e toda a infraestrutura da �rea ao mesmo tempo em que sabiam n�o ter um parceiro vi�vel, como o governo afeg�o, que foi extirpado. Esta � a realidade da situa��o. Tendo trabalhado na Casa Branca antes, eu assumo que essas quest�es foram cuidadosamente estudadas e, novamente, esses riscos foram considerados e que haja um plano de conting�ncia, como uma parceria com o Talib�.

Biden tem dito que manteremos a capacidade de conduzir opera��es de contraterrorismo remotamente, mas n�o h� muitos detalhes sobre o que isso significa. Nas �ltimas semanas, vimos demonstra��es dessa capacidade, com ataques a alvos do ISIS-K ap�s o epis�dio do aeroporto de Cabul (em um dos casos, o ataque a�reo matou civis e investiga��es apontam que n�o havia explosivos no alvo inicial americano). N�o � o mesmo que ter essa presen�a em solo, mas ao menos mostra que temos alguma capacidade de identificar alvos e atacar quando precisarmos, ainda que de modo impreciso. Ent�o o peso de garantia da seguran�a recai realmente muito mais sobre o Taleb�. Agora, se eles querem ou conseguem fazer isso, � uma outra quest�o.

BBC News Brasil - Ao partirem, os americanos deixaram para tr�s uma grande quantidade de armamento militar de ponta. Eles poderiam ter armado grupos, n�o apenas o pr�prio Taleban, mas a Al Qaeda e o ISIS-K, e ajudado assim a gerar novas amea�as ao seu pr�prio territ�rio?

Ali - Isso � algo que vimos no Iraque, quando o Estado Isl�mico avan�ou pelo leste da S�ria e o oeste do Iraque no ver�o de 2014 e capturou enormes quantidades de recursos fornecidos pelos EUA, principalmente armas, nos campos de batalha contra as for�as de seguran�a iraquianas, que naquele momento espec�fico, em sua maioria n�o resistiram e nem lutaram.

O Taleb� fez exatamente a mesma campanha agora sem encontrar praticamente nenhuma resist�ncia. E parece que com isso tomaram uma quantidade significativa de armas e equipamentos americanos. Agora, se o Taleb� vai manter a posse disso pra si ou transferir silenciosamente para outros grupos que apoia, n�o acho que algu�m saiba a resposta. Outra possibilidade � simplesmente que ao usar essas armas contra o ISIS-K e outros grupos, o Taleb� as perca. O modelo do Iraque mostra que "ao vencedor os despojos", ent�o esses grupos provavelmente assumir�o o controle dessas armas. Estamos apenas come�ando a entender a extens�o de como muitos desses recursos est�o agora nas m�os de advers�rios nossos em potencial.

BBC News Brasil - Diferentemente de 20 anos atr�s, h� hoje uma percep��o do governo e da popula��o americana de que as amea�as de ataques dom�sticos s�o muito maiores do que as estrangeiras. O que explica essa mudan�a?

Ali - Nos EUA, passamos por diferentes ondas de terrorismo dom�stico, ent�o essa amea�a tem estado no pa�s h� mais de 100 anos, mas se manifesta de forma diferente ao longo dos diferentes cap�tulos da hist�ria. Acredito que estamos no meio do que eu chamaria de quinta onda de terrorismo dom�stico, que parece diferente, mais intensa. Desde o final dos anos 2000, temos visto mais e mais pessoas aderindo diferentes cren�as no que eu batizei de espa�o amplo da extrema-direita. N�o � um bloco monol�tico, n�o h� um �nico grupo, s�o diferentes vertentes ideol�gicas, sejam elas de supremacia branca, neonazista, anti-governo, teorias da conspira��o.

Mas eu diria que esse grupo de pessoas � hoje muito grande e provavelmente maior do que at� mesmo o contingente de extremistas jihadistas com os quais est�vamos preocupados logo ap�s o 11 de Setembro.

E al�m de ataques de atiradores em grande escala, vimos coisas como uma tentativa de sequestro da governadora de Michigan, pela primeira vez na hist�ria dos EUA. Eram ao menos 13 pessoas envolvidas na conspira��o, que fizeram tudo que voc� veria num plano de terrorismo internacional e, felizmente, todos eles foram presos e est�o sendo julgados. E apenas alguns meses depois, as divis�es pol�ticas em nosso pa�s e as campanhas de desinforma��o sobre os resultados das elei��es levaram a uma insurrei��o no Capit�lio. Algo que n�o v�amos em Washington D.C. havia 200 anos, desde que os brit�nicos tomaram o Congresso, em uma outra era. Eu diria que a amea�a � alta e permanecer� alta por um longo per�odo de tempo, porque normalmente essas ondas tendem a durar entre 20 e 40 anos.

BBC News Brasil - � razo�vel imaginar que alguma dessas amea�as possa resultar em um ataque da escala do que vimos em 11 de setembro de 2001 novamente?

Ali - Acho que n�o, at� porque a invas�o do Capit�lio n�o foi um ataque organizado por uma c�lula, foi um movimento muito mais org�nico. A esmagadora maioria de quase 600 pessoas acusadas de participar do ato se enquadram em uma categoria de a��o individual, enquanto que apenas cerca de 10% ou 20% ali estavam agindo de forma mais coordenada. Ent�o, por um lado, a partir desse terrorismo dom�stico, ver um ataque como o 11 de Setembro � muito remoto, n�o digo imposs�vel, mas de probabilidade muito baixa.

J� os pequenos ataques cometidos por um �nico indiv�duo com uma arma ou um carro-bomba, esses t�m sido muito frequentes nos �ltimos quatro ou cinco anos, e alguns desses ataques podem matar dezenas de pessoas. Acho que � mais realista pensar em uma amea�a de longo prazo de ataques de menor escala. Mas esses s�o os mais dif�ceis de prever, porque indiv�duos isolados ou pequenos grupos s�o mais dif�ceis de entrar no radar das for�as de seguran�a e precisam apenas de uma oportunidade para realizar seu plano.

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