Embranqueceram a imagem da padroeira do Brasil

Em visita ao Santu�rio Nacional de Aparecida, na cidade de mesmo nome, em S�o Paulo, o papa Francisco vai receber de presente hoje uma r�plica da imagem de Nossa Senhora da Concei��o, mais conhecida como Aparecida por ter sido encontrada por pescadores no fundo do Rio Para�ba, no in�cio do s�culo 18. Exposta em uma redoma de vidro, a padroeira do Brasil tem cor de barro queimado, enegrecido pelo lodo do leito do rio e pela fuligem das velas dos cerca de 10 milh�es de fi�is que visitam anualmente o santu�rio, na maior peregrina��o do mundo em homenagem a Maria, m�e de Jesus.

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 Longe dali, por�m, a santa tem sido retratada de forma livre, confeccionada por variados artistas em diferentes processos artesanais e industriais, incluindo pe�as importadas da China. Nem sempre as c�pias obedecem ao original. Para indigna��o de parte dos devotos, Nossa Senhora Aparecida ultimamente passou a ser encontrada com tom de pele mais claro em rela��o � imagem original e tra�os finos, quase europeus. “Nossa Senhora Aparecida est� desbotada, quase branca. Achei uma aberra��o, uma falta de respeito com a hist�ria da santa, que sempre foi negra”, protesta a artes� Neusa Santos, de 82 anos, mostrando santinhos com a imagem mais p�lida e manto vermelho, destoando do tradicional azul com detalhes dourados.

Para continuar fabricando seus estandartes de santos, a artes� foi obrigada a reproduzir uma c�pia antiga que deixou guardada em casa, mais fiel ao original. “Em uma das lojas, a atendente chegou a sugerir que eu passasse um l�pis de cor por cima, escurecendo a imagem. Da minha m�o � que n�o vai ser, pois tenho medo de receber um castigo da santa”, diz. A reportagem do Estado de Minas fez um teste, percorrendo cinco lojas da Regi�o Central de BH, nas imedia��es do Mercado Novo. Em tr�s delas, as estampas impressas eram mais claras e a imagem em gesso ou madeira aparentava ser igual � aut�ntica.

“As pessoas ainda s�o muito preconceituosas, sabe? Outro dia, chegou uma senhora ao meu ateli� e disse com todas as letras: preto na minha casa n�o entra, nem santo”, contou o santeiro de Santa Luzia Carlos Perret, de 50 anos, artes�o desde os 15. Filho de pai franc�s e m�e negra, o artista j� recebeu in�meros pedidos para alterar a cor da pele de santos como Aparecida e Santa Efig�nia e do irm�o dela, S�o Elesb�o, de origem africana. Recusou todos eles. “Embora meu pai tenha sido branco, tenho uma m�e que n�o � loura e n�o posso fazer isso. Deixo claro para o cliente que melhor seria ele trocar de devo��o por uma santa branca. Infelizmente algumas pessoas colocam a quest�o est�tica na frente da pr�pria devo��o ao santo”, lamenta.

Virgem morena

“N�o temos controle sobe a livre produ��o das imagens de Nossa Senhora Aparecida, cantada como Virgem Morena, cor que am�lgama as diferentes ra�as que formam o nosso povo. Quanta beleza e originalidade h� nisso!”, ensina dom Darci Jos� Nicioli, bispo auxiliar da Arquidiocese de Aparecida. Ele garante apenas a autenticidade da imagem oferecida ao papa Francisco, entalhada em cedro brasileiro, com p�tina de cera de abelha. “Ser� um bel�ssimo presente, posso garantir", afirma.

Como de outras vezes, o bispo de Aparecida encomendou a pe�a ao escultor Paulo Henrique Ferreira Pinto, o S�dem, natural de Campanha, regi�o do Sul de Minas, terra de tradicionais santeiros. Devoto de Aparecida, S�dem comprou “panos novos” para conhecer o papa Francisco de perto e acompanhar a entrega da imagem feita pelas pr�prias m�os. “Minha imagem � de madeira, amarronzada e com o fundo escurecido, bem pretinho. A santa tem de ser igual ela �, mas algumas pessoas andam querendo modernizar demais as coisas”, critica o santeiro, que recebeu elogios de todo o pa�s ao ter o seu trabalho divulgado na internet. “Mas houve coment�rios maldosos, como o de uma mulher que disse assim: ‘Duvido que essa santa pretinha v� ser venerada no Vaticano’. Nem dei ouvidos”, afirmou.