
Bras�lia - O metr� da cidade j� conta com um vag�o exclusivo para mulheres. Conhecido como Vag�o Rosa, a maioria das usu�rias disse se sentir mais segura contra abuso sexuais (F�bio Rodrigues Pozzebom/Ag�ncia Brasil) O metr� de Bras�lia j� conta com um vag�o exclusivo para mulheres, mas especialistas dizem que a medida n�o impede a viol�nciaF�bio Rodrigues pozzebom/Ag�ncia Brasil
Destinar vag�es e �nibus com assentos exclusivos para mulheres � um tipo de viol�ncia e de segrega��o e n�o impede que epis�dios de abuso sexual continue ocorrendo nos espa�os p�blicos, defendem a soci�loga Mar�lia Moschkovih e a militante e integrante da Marcha Mundial das Mulheres e da Sempreviva Organiza��o Feminista (SOF) Sonia Coelho.
Para Mar�lia, os vag�es exclusivos ou preferenciais para mulheres n�o podem ser vistos como uma necessidade ou urg�ncia social. Segundo ela, a medida � apenas uma dentre as v�rias estrat�gias poss�veis para lidar com o problema do ass�dio em espa�os p�blicos. “Parece-me que, no caso dessa estrat�gia, ela n�o muda absolutamente nada as rela��es de poder em nossa sociedade. Pelo contr�rio, restringe a circula��o das mulheres no espa�o p�blico, o que � um absurdo se as consideramos t�o cidad�s quanto os homens”, disse em entrevista � Ag�ncia Brasil.
Para a soci�loga, os vag�es exclusivos ainda refor�am que as mulheres fora deles, nos vag�es comuns, est�o “pedindo” viol�ncia. “Restringir a circula��o das mulheres no espa�o p�blico sempre ser� uma viol�ncia.”
A exclusividade dos vag�es para mulheres tamb�m esbarraria em outro problema, destacou Mar�lia: o da igualdade perante a lei. “Por princ�pio, as pessoas t�m que ter o direito igual de circular no transporte p�blico. Ao restringir as mulheres em alguns poucos vag�es, cria-se tamb�m a ideia de que apenas ali � um espa�o seguro. N�s queremos que todo espa�o p�blico seja seguro para as mulheres”, defendeu a soci�loga.
Vag�es destinados para mulheres em hor�rios de pico j� existem no Rio de Janeiro. Em S�o Paulo, a ideia foi adotada, sem sucesso, em alguns trens da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) em 1995, mas agora pode virar lei e passar a vigorar em todo o estado. Deputados estaduais paulistas estudam um projeto de lei que pretende obrigar as empresas de transporte p�blico urbano de passageiros a reservar um espa�o exclusivo para mulheres. O projeto ainda precisa ser votado em plen�rio e sancionado pelo governador Geraldo Alckmin.
“Essa � uma pol�tica que segrega as mulheres, n�o protege e n�o enfrenta o machismo que h� no transporte coletivo. N�o acreditamos que essa � uma medida que v� resolver o problema do ass�dio e da viol�ncia sexual nos transportes. Em primeiro lugar, n�o queremos viver em uma sociedade que segrega homens e mulheres, brancos e negros e o que seja. Em segundo lugar, entendemos que essa n�o � a resposta adequada na medida em que n�o enfrentamos a situa��o. Temos que ser respeitadas em todos os espa�os p�blicos”, disse Sonia.
Al�m disso, a militante da Marcha Mundial para as Mulheres acredita que a medida dificilmente funcionaria em S�o Paulo, principalmente por causa da superlota��o. “H� momentos em que h� 58% de mulheres no transporte p�blico. Como � que se vai destinar mais da metade dos vag�es para as mulheres? � uma medida fora da nossa realidade.”
Outra quest�o que precisa ser encarada, disse Mar�lia, � sobre a defini��o de quem � mulher, o que poderia gerar preconceitos. “Homem" e mulher n�o s�o categorias fixas, �bvias, nem naturais. Elas foram constru�das ao longo da hist�ria em nossa cultura e hoje s�o entendidas como conven��es question�veis por diversas linhas da antropologia e de outras ci�ncias sociais. O Brasil � o pa�s em que mais se mata transg�neros no mundo. Nesse contexto, � ainda mais problem�tico usar 'homem' e 'mulher' como crit�rio para acesso a um bem que deve ser p�blico, j� que as pessoas transexuais tem a sua identidade de homens e mulheres frequentemente negadas por nossa sociedade.”
A desigualdade social, defende Sonia, � um dos fatores que explicam o fato das mulheres continuarem a ser v�timas de abusos e de viol�ncia no transporte p�blico. “� um conjunto de elementos. As mulheres ainda vivem uma desigualdade na sociedade e s�o vistas como objeto. Vivemos ainda em uma sociedade que mercantiliza o corpo da mulher.” Ela tamb�m aponta como fatores a lentid�o no Judici�rio e a impunidade.
“Os homens pensam que com eles n�o vai acontecer nada, j� que a impunidade � muito grande. Al�m disso, a sociedade justifica a viol�ncia”, disse ela, citando os n�meros de uma pesquisa do Instituto de Pesquisa Econ�mica Aplicada (Ipea) que apontou que 26% dos entrevistados concordam com a afirma��o de que “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”.
“Mesmo a pesquisa do Ipea tendo errado [a informa��o inicial informava que 65% das pessoas concordavam com a afirma��o], mesmo o n�mero sendo menor, ainda h� uma vis�o na sociedade de que as mulheres s�o seres dispon�veis, um objeto”, criticou ela. Ambas defendem que � preciso buscar alternativas e solu��es para evitar que a mulher continue sendo v�tima de abusos e de viol�ncia, inclusive no transporte p�blico.
Segundo ela, o primeiro ponto � discutir o funcionamento do transporte p�blico, que � insuficiente e superlotado. Depois, discutir sobre a cultura em torno do que homens e mulheres podem e devem fazer em nossa sociedade. “Quer dizer: � toda uma mentalidade que precisa ser trabalhada e, sobretudo, uma rela��o com a sexualidade que precisa ser revista.”
“Quanto ao caso mais espec�fico do ass�dio no transporte p�blico, � urgente ter uma estrutura s�lida de apoio �s v�timas. � preciso criar um ambiente em que as mulheres se sintam � vontade para denunciar, sabendo que n�o ser�o culpabilizadas pela viol�ncia que sofrem. � preciso que os demais passageiros, presenciando uma den�ncia, tamb�m sejam capazes de, dentro do que � legalmente aceit�vel e dos princ�pios de direitos humanos, agirem em apoio � v�tima”, defendeu Mar�lia.
Segundo ela, muitas vezes a estrutura institucional que existe para lidar com essas den�ncias, como delegacias da mulher e funcion�rios do metr�, tamb�m reproduzem viol�ncias contra essas v�timas, tratando-as como culpadas pela agress�o sofrida. “� preciso repensar essas estruturas de apoio se quisermos lidar de maneira eficaz com essa quest�o, para que ela de fato deixe de existir.”
Outra proposta apontada por Sonia � que os �nibus, trens e metr�s tenham c�meras para que seja poss�vel identificar os agressores. Al�m disso, devem ser feitas campanhas educativas e preventivas nesses ambientes. Uma ideia, disse ela, seria utilizar as TVs j� instaladas no transporte p�blico paulistano para orientar as mulheres sobre esse problema. “� preciso ter campanhas sistematicamente. Por que n�o usamos os meios de comunica��o no transporte p�blico para fazer coisas educativas?”, disse Sonia.