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Estado de Minas

Pesquisadores se debru�am sobre zika para confirmar rela��o com microcefalia

Fiocruz inicia primeiro estudo comparativo, com 600 crian�as. Artigo pernambucano publicado na revista 'The Lancet' associa a anomalia causada por zika a les�es oculares


postado em 19/01/2016 12:10 / atualizado em 19/01/2016 12:50

Fundação Altino Ventura pesquisa os impactos da microcefalia na estrutura do olho e já começou a reabilitação dos casos diagnosticados (foto: João Carlos Lacerda/Divulgação FAV)
Funda��o Altino Ventura pesquisa os impactos da microcefalia na estrutura do olho e j� come�ou a reabilita��o dos casos diagnosticados (foto: Jo�o Carlos Lacerda/Divulga��o FAV)
N�o faltam perguntas sobre o zika v�rus e, agora, sobre sua poss�vel, e bem prov�vel, rela��o com o surto de microcefalia que assusta Pernambuco e come�a a se espalhar pelo Brasil. Conhecido h� menos de 70 anos, h� pouqu�ssimos trabalhos na literatura cient�fica sobre o v�rus. Sobre sua rela��o com a microcefalia, ent�o, h� apenas relatos de casos. Mas o n�mero de pesquisas est� crescendo proporcionalmente ao de casos notificados. De repente, todo mundo est� estudando o zika, e n�o poderia ser diferente, tamanho o impacto que ele causou no pa�s.

Chefe do Laborat�rio de Flaviv�rus do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) e primeira a diagnosticar a presen�a do v�rus zika no l�quido amni�tico de duas gr�vidas da Para�ba, Ana Maria Bispo admite que h� um longo caminho para que pesquisadores alcancem conhecimento suficiente sobre os efeitos do v�rus. � preciso explicar, por exemplo, que fatores estariam favorecendo sua invas�o; por que, e como, ele atravessa a placenta e infecta o feto; quais s�o suas c�lulas-alvo no feto e se todas as gestantes em contato com ele t�m beb�s com microcefalia.

A rela��o de doen�as infecciosas e de fatores gen�ticos e ambientais com a microcefalia come�ou a ser investigada, semana passada, pelo Grupo de Pesquisa da Epidemia de Microcefalia. Est�o envolvidos professores, m�dicos e pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco, Universidade Estadual de Pernambuco, Hospital Universit�rio Oswaldo Cruz, e do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira, al�m do Centro de Controle e Preven��o de Doen�as dos Estados Unidos (CDC) e da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres.

PRIORIDADE


Sob coordena��o do Centro de Pesquisa Aggeu Magalh�es/Funda��o Oswaldo Cruz em Pernambuco (Fiocruz-PE), o objetivo � identificar que outros fatores, al�m do zika, estariam relacionados com o aumento de casos da anomalia. Pela metodologia de caso-controle, ser� comparado um grupo de 200 crian�as com microcefalia, nascidas vivas ou n�o, com um grupo de 400 crian�as sem a malforma��o. Segundo o doutor em epidemiologia Ricardo Ximenes, professor das universidades federal e estadual, essa � uma das quatro linhas priorit�rias da pesquisa.

“Comparando os beb�s diagnosticados com aqueles sem a malforma��o, poderemos verificar os fatores associados ao desenvolvimento da microcefalia. H� evid�ncias fortes de que o zika v�rus esteja implicado como fator causal, mas n�o existem estudos que explorem outros fatores que tamb�m poderiam provocar essa condi��o. � o que vamos fazer agora. A amostra pesquisada ser� testada em rela��o a diferentes poss�veis agentes causais. Pode ser que o estudo fortale�a o zika como respons�vel, mas depois de afastar outras causas”, explica.

Segundo Ricardo, o que enfraquece a hip�tese de outras infec��es � o surgimento de casos em um espa�o muito curto de tempo, a dispers�o geogr�fica desses registros e a forte concentra��o em algumas �reas. “V�rios munic�pios pernambucanos t�m casos de microcefalia. Isso n�o � compat�vel ao mecanismo de transmiss�o de doen�as infecciosas cl�ssicas. Esse surto sugere uma doen�a transmitida por mosquito. Mas seria o zika sozinho? Ou o zika em uma m�e que foi previamente contaminada pelo v�rus da dengue? Tudo precisa ser checado.”

METODOLOGIA


Para reunir 600 beb�s, o estudo envolveu oito maternidades, aquelas com os maiores registros de casos no estado. Com o consentimento dos pais, ser� coletado sangue do cord�o umbilical de todas as crian�as envolvidas. Os beb�s com per�metro cef�lico igual ou menor que 32 cent�metros, considerados sob suspeita, de acordo com o protocolo do Minist�rio da Sa�de, ser�o submetidos tamb�m a tomografia. Os demais far�o uma ultrassonografia na transfontanela (moleira) para saber se h� malforma��es no sistema nervoso central.

J� as m�es dos dois grupos ter�o sangue coletado para saber quais anticorpos de doen�as elas t�m e responder�o a um question�rio que resgata, por exemplo, as infec��es que j� tiveram, quais medica��es e vacinas tomaram durante a gesta��o, se h� doen�a gen�tica e outros casos de microcefalia na fam�lia. Todas as amostras de sangue coletadas na pesquisa de caso-controle ser�o testadas para zika, dengue, toxoplasmose, rub�ola, citomegalov�rus e herpes.

Um segundo estudo vai acompanhar gestantes com exantema para ver o desfecho da gravidez. Esse poder� responder, por exemplo, caso o zika seja mesmo o respons�vel, se qualquer gestante infectada, necessariamente, gera um beb� com microcefalia. A rub�ola, por exemplo, s� provoca microcefalia em 27% das m�es infectadas. J� o terceiro estudo acompanh� as crian�as com microcefalia nos seus dois primeiros anos de vida para ver seu desenvolvimento cl�nico e psicomotor em compara��o com o de crian�as saud�veis. O quarto � um estudo ecol�gico, que vai observar a distribui��o dos casos de microcefalia no tempo e no espa�o.

Segundo Celina Turchi Marteli, coordenadora do grupo, a coleta dos dados deve durar de seis a oito meses e uma primeira an�lise deve ser apresentada nos primeiros dois ou tr�s meses do estudo, ou seja, ainda no primeiro semestre. “Esse projeto trar� informa��es muito ricas do ponto de vista cient�fico em rela��o ao uso de drogas e �lcool no per�odo da gesta��o, fatores gen�ticos, exposi��o a pesticidas, inseticidas e qualquer outro elemento que, se n�o estiver contribuindo para a microcefalia, poder� ser exclu�do como fator de interfer�ncia.”

OUTROS PROJETOS

Al�m do cl�nico-epidemiol�gico, que engloba esses quatro projetos, h� outros dois grupos de pesquisas na Fiocruz-PE sobre o tema. Um deles, de virologia, visa compreender o zika v�rus em detalhes. Desde o surgimento dos primeiros casos de microcefalia, pesquisadores testam amostras biol�gicas de diferentes grupos populacionais em rela��o aos v�rus da dengue, chikungunya e zika. Outro grupo se dedica ao vetor, para entender a compet�ncia do Aedes aegypti na transmiss�o tamb�m desse v�rus.

(foto: João Carlos Lacerda/Divulgação FAV)
(foto: Jo�o Carlos Lacerda/Divulga��o FAV)
IMPACTO NA VIS�O


M�dicos pernambucanos envolvidos no diagn�stico e na reabilita��o dos beb�s tamb�m est�o fazendo an�lises de caso e passar�o a acompanhar grupos de pacientes para avaliar os comprometimentos e a evolu��o cl�nica da anomalia cong�nita. “S�o muitas perguntas sem resposta. Por que Pernambuco? O que estaria facilitando um surto maior em alguns estados do Nordeste? Comorbidades influenciam?”, questiona a neuropediatra Vanessa van der Linden, a primeira a perceber o aumento de casos e uma das envolvidas na pesquisa.

A organiza��o dessa rede de especialistas – com 24 m�dicos – j� deu frutos. Um artigo pernambucano sobre os impactos do zika na vis�o foi destaque na brit�nica The Lancet, uma das mais conceituadas publica��es cient�ficas do mundo. Pesquisadores da FAV e da Universidade Federal de S�o Paulo (Unifesp) relatam tr�s casos de beb�s nascidos com microcefalia durante o surto em Pernambuco e que j� apresentam altera��es oftalmol�gicas severas.

Exames identificaram altera��es em 40% dos beb�s. Segundo a oftalmologista Camila Ventura, chefe do Departamento de M�cula da FAV, o olho � uma extens�o do c�rebro e, por isso mesmo, as crian�as com altera��es na estrutura ocular podem desenvolver problemas de vis�o. “Precisamos acompanhar tamb�m os beb�s que n�o tiveram comprometimentos estruturais para ver o que pode surgir com o tempo”, explica Camila, segundo a qual tamb�m na vis�o o impacto da infec��o cong�nita � maior quanto mais cedo o feto for atingido.

A retina, uma das estruturas comprometidas, � a camada mais interna do olho, respons�vel por captar as imagens. “Os exames revelam pigmentos e ou cicatriz nessa �rea, sinal de que a retina sofreu uma agress�o. O nervo �tico, estrutura que leva a informa��o do olho para o c�rebro, tamb�m foi afetado em alguns casos de microcefalia atribu�dos ao zika v�rus”, alerta. As m�es est�o sendo avaliadas, mas at� aqui n�o tiveram nenhuma altera��o.

“Mas o pr�prio v�rus circulante destr�i o tecido da retina? Ou alguma toxina liberada por ele � o agente que lesiona a estrutura ocular? A microcefalia, em si, causa tal comprometimento?.” Essas respostas dependem da an�lise minuciosa do globo ocular afetado. “Estamos aprendendo tudo com essas crian�as. A ci�ncia vai evoluir com elas. N�o temos no��o da dimens�o do surto, nem o quanto v�o enxergar. Quantificar isso s� ser� poss�vel com um acompanhamento de perto e por um longo per�odo de tempo. Estamos de m�os atadas em muitos aspectos”, desabafa Camila.

IN�DITO

Foi no acompanhamento de prematuros em tr�s maternidades do Recife que os oftalmologistas da FAV come�aram a avaliar tamb�m os beb�s com microcefalia e perceberam les�es no fundo do olho muito diferentes do habitual. Em parceria com a Unifesp, a FAV come�ou a investigar que porcentagem dos pacientes tinha o comprometimento oftalmol�gico. Para identificar o m�ximo de crian�as afetadas, promoveu tr�s mutir�es, um deles na semana passada. O objetivo � o entendimento de como o v�rus est� comprometendo a vis�o.

“� um achado muito relevante para a medicina e a sa�de p�blica. Eu me sinto privilegiada por fazer parte disso e na obriga��o de continuar, de tratar essas crian�as de forma adequada e de dar conforto a essas m�es”, afirma Camila. Como pondera o infectologista Dem�trius Montenegro, do Huoc, neste momento, todas as aten��es est�o voltadas para essas crian�as, mas como ser� essa assist�ncia no futuro? “� toda uma gera��o comprometida, uma demanda que os servi�os de sa�de nunca enfrentaram”, prev�.

ESTIMULA��O

� preciso correr para que esses beb�s sejam abordados precocemente. Segundo Camila, o per�odo mais importante do desenvolvimento visual � at� os seis meses de vida. “Se descobrimos antes disso, temos como tratar com estimula��o visual precoce. Depois do primeiro semestre de vida, eles ainda melhoram a vis�o, por�m menos”, explica. As primeiras 55 crian�as avaliada j� come�aram a reabilita��o.

S�rie de reportagens

Durante tr�s dias, a rep�rter Carolina Cotta, enviada especial do Estado de Minas a Recife, acompanhou a ang�stia de m�es e profissionais de sa�de diante do surto de microcefalia em Pernambuco. Na s�rie de reportagens publicadas desde domingo, foram relatados a busca por exames e explica��es em hospitais-refer�ncia, o drama das fam�lias e os bastidores do diagn�stico de uma condi��o neurol�gica que cresceu mais de 10.000% em um ano. At� semana passada, j� s�o 1.236 casos suspeitos s� em Pernambuco. Em todo o pa�s, os casos notificados somam 3.530.


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