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Estado de Minas

"N�o acreditem nos que dizem que � s� uma gripe: N�o �!", alerta brasileira na It�lia

Jornalista Juliana Monteiro relata o que mudou depois da quarentena em Roma e chama aten��o dos brasileiros: 'N�o paguem para ver porque o pre�o � a vida dos mais fr�geis entre n�s'


postado em 12/03/2020 12:00 / atualizado em 12/03/2020 16:30

(foto: Vincenzo PINTO / AFP)
(foto: Vincenzo PINTO / AFP)

“Essa � nossa segunda semana de quarentena coletiva em Roma. Primeiro foram as escolas e muita gente passou a trabalhar em casa, deixar as crian�as com os av�s n�o � uma op��o. Fomos orientados a n�o sair e evitar lugares fechados e aglomerados.


At� que essa semana o governo “fechou” a It�lia.

Agora somos autorizados a sair apenas para trabalhar (os que ainda saem para trabalhar), fazer compras ou ir para o hospital. Nada mais. A nata��o e a capoeira das crian�as est�o fechadas, o dentista desmarcou a consulta do meu filho e s�bado n�o vai ter o jogo do campeonato de futebol dele, a companhia a�rea cancelou minha passagem para Madri, tamb�m n�o vai ter o show da Gal, a faculdade avisou que tampouco tem data para a pr�xima prova. As escolas j� trabalham com a possibilidade de seguirem fechadas at� maio.


O pa�s inteiro fechou.

N�s tamb�m nos fechamos nesse novo arranjo dom�stico porque eu ainda tenho que estudar, Gui (companheiro da jornalista) ainda tem que trabalhar e Gael, com oito anos, tem o cronograma da escola para cumprir. A professora tem nos orientado remotamente sobre o conte�do de cada dia e nos vemos professores dos nossos filhos, �s voltas com o neol�tico e os verbos auxiliares. N�o sei o que seria de n�s sem o Google.


Anita, aos cinco anos, se encarrega de dar o toque de fim de mundo colocando a casa abaixo enquanto eu a mando deixar Gael terminar o compiti de italiano.

Passamos o dia de pijama. Vi uma vizinha receber o correio de luvas. Moro no quinto andar. Ningu�m mais pega o mesmo elevador. Sobe um vizinho de cada vez, � o protocolo.

Fui ao mercado na quarta-feira. Na rua, as poucas pessoas usavam luvas cir�rgicas e, na falta de m�scara, len�o ou cachecol cobrindo o nariz. Fila na porta, todos respeitando a orienta��o de manter dist�ncia uns dos outros, a entrada contingenciada, mais gente fora do que dentro do mercado. Cinco de cada vez.


Ningu�m reclama.


Pela primeira vez em seis anos n�o sou a �nica com carrinho l� dentro. Os italianos, em geral, s� compram o que podem carregar, mas agora est�o fazendo dispensa e j� faltam alguns produtos nas prateleiras. Um corredor para cada pessoa. Ningu�m se esbarra, o alto-falante fica repetindo para respeitarmos a dist�ncia m�nima. Na volta para casa, reparo o com�rcio fechado, os poucos caf�s abertos espa�aram as mesas. Mas est�o desertos.

Estamos todos isolados em casa.

Depois do an�ncio da OMS decretando a pandemia, outros pa�ses come�aram a adotar as mesmas medidas para deter o avan�o do v�rus que, por menos letal que seja, contamina tanto que mata muito. Na maioria dos casos, idosos e pessoas com imunidade baixa e doen�as pregressas. Mas n�o s� elas.

A flor no asfalto � a solidariedade. N�o vejo, entre as pessoas de meu conv�vio, p�nico de ficar doente ou medo pelas nossas crian�as que, ao que parece, n�o s�o p�reo para o coronav�rus. Mas estamos todos cuidando de quem n�o tem defesas suficientes para ele. Eu cuido do morador de rua que dorme no frio, embaixo da marquise do meu pr�dio, das senhorinhas que cumprimento no mercado, do senhor da loja de molduras. E, aqui em Roma, essas pessoas viraram a prioridade de todos. Pensamos coletivamente numa onda de cuidado com o outro, esse desconhecido, que eu nunca tinha vivido antes. As crian�as aprenderam a “tossir nos cotovelos” e o fazem at� em casa. Foram ensinadas que s�o estrat�gicas para conter a amea�a.

� triste, mas tamb�m � bonito, sabem?

Como escreveu um amigo italiano, n�o h� sa�da que n�o passe pela reconstru��o paciente de uma resposta coletiva aos desafios. Talvez seja did�tico estarmos vivendo, todos, ao mesmo tempo, essa crise. Fica evidente que o engajamento de cada um de n�s, pessoa a pessoa, � a melhor, se n�o a �nica, defesa diante a pandemia. Ningu�m pode dar-se ao luxo de ser negligente. Acho que ficaremos com um aprendizado importante depois que tudo isso passar.

Tamb�m pela primeira vez testamos uma nova organiza��o do trabalho. Ao mesmo tempo pessoas do mundo todo est�o trabalhando de casa, empresas e reparti��es com carga hor�ria e staff reduzidos. Talvez esteja sendo estabelecido um novo paradigma. Ainda n�o sabemos qual ser� o saldo, a hist�ria nos ensina que evolu��o nem sempre � progresso. Mas eu, que n�o posso evitar a esperan�a, acredito que tiraremos proveito desses dias de isolamento, quando n�o podemos sequer nos abra�ar, tocar e beijar. E, apesar disso, acredito que esse v�rus tamb�m possa desencubar a humanidade em n�s.

Mas faremos esse balan�o depois.

Por hora, lavem as m�os, ensinem as crian�as, cuidem dos idosos e, se puderem, amigos, fiquem em casa. E mandem seus funcion�rios para casa. N�o viajem. � preciso identificar e curar os que contra�ram a doen�a antes que ela se espalhe. O v�rus j� est� a�, no nosso Brasil, n�o o subestimem. Cobrem das autoridades, n�o acreditem em quem diz que � s� uma gripe, - eu j� fui essa pessoa - n�o �! N�o paguem para ver: o pre�o � a vida dos mais fr�geis entre n�s. As teorias conspirat�rias s� distraem at� que os m�dicos comecem a escolher quem, entre os necessitados, ir�o entubar. At� que morra a av� de um amiguinho dos nossos filhos. At� que o colega de trabalho safenado fique entre a vida e a morte numa UTI.


O momento n�o � de p�nico, mas de cuidado e responsabilidade. E uni�o e solidariedade. Estamos todos diante o mesmo desafio, meus caros, � preciso assumir esse compromisso.

H� um m�s a China era longe; h� tr�s semanas, a Lombardia tamb�m era. Quando come�ou a quarentena eu tamb�m me revezava, junto com outras m�es e pais, nos grupos de WhatsApp, entre o desespero de ter que encaixar as crian�as, de repente, nos compromissos dos dias �teis e os memes - como n�s, os italianos tamb�m reagem com bom humor �s adversidades. Hoje, em Roma, j� n�o podemos ignorar que o mundo diminuiu e que hoje somos todos vizinhos.

Desejo que meus conterr�neos n�o deem chance para a doen�a no calor de nossa terra.
Cuidem-se. Uns dos outros. Fiquem firmes. Sairemos melhores dessa.”

Juliana Monteiro, jornalista brasileira, mora no bairro de San Giovanni, de Roma, h� seis anos e compartilhou o relato acima em suas redes sociais.
 


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