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Estado de Minas EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO

M�e procura filha que ela doou 30 anos atr�s, logo ap�s o parto

Divina Bueno est� em busca da filha que doou ap�s o parto, h� 30 anos, no munic�pio goiano de Luzi�nia. Uma hist�ria triste, mas cercada de cren�a na possibilidade de reencontr�-la. Na lembran�a, ela guarda apenas o choro do beb�


05/08/2020 10:12 - atualizado 05/08/2020 10:21

(foto: Minervino Júnior/CB/D.A Press)
(foto: Minervino J�nior/CB/D.A Press)

Um reencontro com algu�m pressup�e a exist�ncia de uma separa��o pr�via, de uma conviv�ncia que existiu, mas Divina Bueno, de 49 anos, busca por algu�m de quem ela conhece apenas o som do choro da hora do parto. N�o tem ideia dos tra�os do rosto da filha, nem da altura, ou do tom de sua voz, mas com uma ponta de esperan�a procura nos tra�os de jovens mulheres, ind�cios do beb� que entregou ainda na maternidade, em Luzi�nia (GO), h� 30 anos.

Sentada � mesa, a dona de casa tem os bra�os grudados ao corpo e come�a a contar sua hist�ria em um tom de voz baixo e t�mido. As l�grimas est�o grudadas em seus olhos, elas n�o desaparecem, mas tamb�m n�o escorrem pelas bochechas. Ficam paradas no olhar. Fixas como a dor que ela sente todos os dias desde 28 de junho de 1990, quando doou, por engano, segundo ela, a filha rec�m-nascida a quem daria o nome de Rafaela.

Filha de m�e solteira e cozinheira de frigor�fico, Divina se viu gr�vida pela segunda vez aos 19 anos. Numa casa em que havia pouco para se dividir, n�o aceitaram uma boca a mais para comer. Desesperada para apaziguar a rela��o com a m�e, se sentiu pressionada a dizer que doaria a crian�a quando nascesse. “Eu disse que ia dar o beb�, mas foi da boca para fora e me arrependo todos os dias de ter falado isso”, conta.

Divina tinha uma filha de 3 anos na �poca, mas se separou do pai da primog�nita quando ela tinha 9 meses. Foi ent�o que conheceu o pai da segunda filha. “Namoramos um ano e meio, mas ele bebia muito e, no dia que fui contar (que estava gr�vida), o clima n�o estava bom, e eu fui embora. Terminamos o namoro no mesmo dia, sem ele saber”, relembra.

Divina estava solteira, com uma filha para criar e outro beb� no ventre, quando uma conhecida da fam�lia ficou sabendo que a jovem tinha a inten��o de doar a crian�a. A mulher se aproximou contando que sabia de um casal interessado em adotar um rec�m-nascido. Em algumas conversas na porta da escola onde Divina estudava, convenceu a jovem a ir ao m�dico, pagou consultas e exames e marcou a data do parto, sem avisar a jovem.

Os detalhes daquele dia n�o saem da mente de Divina. N�o havia mais que quatro pessoas envolvidas no procedimento, realizado num hospital, e era perto do meio-dia quando a prepararam para a cirurgia cesariana. “Quando nasceu eu escutei os m�dicos falando que era uma menina e ouvi o choro dela, depois um deles disse: ‘Embrulha ela bem que ela vai viajar’, ent�o eu n�o escutei e nem vi mais nada”, conta, em um relato emocionado da hist�ria. “Ap�s o parto, eu apaguei e acordei perto das 20h naquele dia, perguntei sobre a minha filha, e a enfermeira me disse que ela tinha ido fazia tempo”, diz Divina, que acredita que a menina tenha sido entregue a um casal de Belo Horizonte.

Divina fazia planos para o dia que a filha Rafaela nascesse. Achava que poderia ter tempo de segurar a crian�a e dizer que n�o a doaria. “Mas foi tudo muito r�pido, n�o deu tempo de pensar e reagir, eu nunca doaria ela”, conta, dessa vez em prantos.

Um dia depois, ela estava em casa. Sem a filha e com um enorme sentimento de vazio. Nenhum dia ap�s o nascimento de Rafaela foi f�cil para Divina. Todos os anivers�rios, datas comemorativas e reuni�es de fam�lia s�o permeadas pelo vazio de n�o ter a crian�a que gerou. Neste ano, tomou coragem e pediu � filha mais velha, Grasi Bueno, de 33 anos, para usar a visibilidade que tem no Instagram e postar um v�deo seu, contanto sua hist�ria e desejo de reencontrar sua filha. “� �poca, eu era muito nova, humilde, fiquei com medo, porque o m�dico me falou para eu n�o contar a ningu�m. Se a gente soubesse do destino n�o fazia tanta besteira”, diz.

Uma semana depois, Divina voltou ao hospital em busca de alguma pista sobre a filha, mas n�o encontrou o prontu�rio ou documentos do nascimento recente. Ao Correio, o Hospital Santa Luzia, em Luzi�nia, onde a menina nasceu, informou que os registros m�dicos s�o guardados por at� 20 anos, � imposs�vel achar o prontu�rio de Divina nos arquivos da unidade.

“Nos primeiros anos, eu tinha muita esperan�a. A mulher que a levou tinha me prometido que, quando ela completasse 7 anos, a traria para me conhecer. Eu contei os anos, os dias e os minutos e nunca aconteceu. Atualmente, fica muito mais dif�cil procurar, porque essa mulher morreu h� mais de 10 anos, segundo me informaram, n�o tenho mais como perguntar para quem ela entregou a minha filha”, diz Divina.

Anos depois, uma reviravolta na hist�ria. Divina reencontrou o pai de sua filha em uma sorveteria. “Ficamos separados 13 anos e quando o reencontrei voltamos a namorar e eu contei que havia engravidado e doado nossa filha. Me casei com ele novamente e estamos juntos h� mais de 15 anos, mas ele tamb�m quer encontr�-la, pois essa � a �nica filha biol�gica que ele tem”.

Ado��o � brasileira


Registrar o filho de outra pessoa ou atribuir parto alheio como pr�prio � crime previsto no artigo 242 do C�digo Penal. J� transferir uma crian�a ou adolescente a terceiros, sem autoriza��o judicial, desrespeita o artigo 30 do Estatuto da Crian�a e do Adolescente (ECA). Apesar disso, explica a respons�vel pela se��o de ado��o da Vara da Inf�ncia e da Juventude do DF, Andrea Porto Peixoto, a chamada “ado��o � brasileira” continua acontecendo. Em oito anos de trabalho nessa �rea, ela viu casos como o de Divina  repetirem-se algumas vezes.

“O ECA vem nessa via de garantir o direito da crian�a e do adolescente. A ado��o � uma medida que visa atender a conviv�ncia familiar e comunit�ria dessas crian�as, ent�o uma ado��o mediada pela Justi�a protege todos os envolvidos, mas principalmente a crian�a, que n�o perde aspectos da pr�pria hist�ria, que acabam se perdendo nesses processos ilegais”, explica.

No Brasil, um beb� s� pode ser entregue � ado��o depois que a m�e declara �s autoridades o motivo pelo qual ela n�o pode ficar com a crian�a. Ao contr�rio da “ado��o � brasileira”, essa entrega volunt�ria � um processo legal amparado pela lei e n�o � pass�vel de puni��o. Nesses casos, a mulher passa por acompanhamento na Vara da Inf�ncia e da Juventude para que as autoridades conhe�am seu estado emocional, psicol�gico, financeiro e estrutura familiar. “A m�e que deseja fazer a entrega legal de seu rec�m-nascido n�o deve ser julgada, mas amparada, porque ela est� tomando uma atitude respons�vel e demonstrando interesse em oferecer seguran�a e melhores condi��es de crescimento � crian�a”, comenta Andrea.


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