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Estado de Minas VATICANO

Como Francisco nomeia seus cardeais e aproxima a Igreja das periferias

Papa consolida sua marca de descentraliza��o, pluralidade e rejuvenescimento com posses marcadas para 28 de novembro


01/11/2020 16:00 - atualizado 01/11/2020 17:10

Pontificado de Francisco é marcado por ações de descentralização, rejuvenescimento e pluralidade da Igreja(foto: AFP / Tiziana FABI/afp - 28/10/20)
Pontificado de Francisco � marcado por a��es de descentraliza��o, rejuvenescimento e pluralidade da Igreja (foto: AFP / Tiziana FABI/afp - 28/10/20)
Com os 13 novos cardeais anunciados pelo papa em 25/10, que ser�o empossados no consist�rio marcado para 28 de novembro, consolida-se na c�pula da Igreja Cat�lica uma tr�ade que se torna marca deste pontificado de Francisco: descentraliza��o, rejuvenescimento e pluralidade.

Entre os purpurados que assumem, nove s�o eleitores em um eventual conclave - ou seja, t�m menos de 80 anos. As vozes das periferias seguem bem representadas. Torna-se cardeal o bispo Cornelius Sim, o �nico de Brunei, pa�s mu�ulmano onde a evangeliza��o crist� � proibida. Tamb�m recebem o barrete cardinal�cio o arcebispo Antoine Kambanda, sobrevivente do genoc�dio de Ruanda - praticamente toda a fam�lia morreu no massacre de 1994 - e o arcebispo filipino Jos� Advincula.

"Um cardeal viaja v�rias vezes em sua vida a Roma - pelo menos uma vez por ano. Ao nomear o bispo Cornelius Sim cardeal, administrador apost�lico de uma diocese com apenas tr�s padres em Brunei, uma monarquia mu�ulmana, o papa torna essa realidade ‘perif�rica’ da Igreja ainda mais presente no Vaticano", afirmou a vaticanista argentina In�s San Mart�n, diretora do escrit�rio romano da Crux Catholic Media. Para ela, isso proporcionar� ao Vaticano uma "experi�ncia muito diferente" se comparada com a trazida pelos purpurados de um pa�s onde cat�licos s�o maioria.

Cardeais americanos

Altamente simb�licas foram as indica��es de dois arcebispos de grandes dioceses do continente americano. Ex-presidente da confer�ncia episcopal dos Estados Unidos, o arcebispo de Washington, Wilton Gregory, ser� o primeiro negro americano cardeal - em um momento em que os EUA vive onde de protestos raciais.
Wilton Daniel Gregory, arcebispo de Washington, será o primeiro cardeal norte-americano negro da história(foto: STEPHEN JAFFE/AFP - 4/4/19)
Wilton Daniel Gregory, arcebispo de Washington, ser� o primeiro cardeal norte-americano negro da hist�ria (foto: STEPHEN JAFFE/AFP - 4/4/19)

Olhando para um Chile tamb�m tomado por manifesta��es e vandaliza��o de igrejas, Francisco tornar� purpurado o espanhol Celestino A�s Braco, arcebispo de Santiago. Para o vaticanista italiano Andrea Gagliarducci, o nome de Braco "foi uma escolha quase �bvia", j� que a Igreja chilena "passa por forte mudan�a ap�s o esc�ndalo de abusos" e "precisa de um cardeal, um guia".

No caso do norte-americano, Gagliarducci acredita que "n�o � o fato de ele pertencer ao Black Lives Matter que conta, mas sim o desejo do papa de "mudar o perfil dos cardeais americanos". O vaticanista entende que o recado � que a Igreja busca, no episcopado dos Estados Unidos "n�o guerreiros culturais, mas construtores de pontes, mesmo em quest�es candentes como as de vida e g�nero".

Europa perde hegemonia

Este � o primeiro papado em que os europeus n�o comp�em a maioria do col�gio cardinal�cio. Em 1903, no primeiro conclave do s�culo 20, 98,4% dos cardeais eram origin�rios da Europa. No entanto, essa cifra chegou a 42,9% no consist�rio do ano passado e cair� para 42,2% a partir do dia 28, considerando os cardeais eleitores. Quando o argentino Jorge Mario Bergoglio se tornou papa Francisco, em 2013, a Europa detinha 60,9% do col�gio.

"A geopol�tica de Francisco � pautada pelas periferias. Vemos isso nas suas viagens, nas pautas que defende e nas nomea��es, tanto de cardeais quanto de bispos", comentou a vaticanista Mirticeli Medeiros, pesquisadora de Hist�ria do Catolicismo na Pontif�cia Universidade Gregoriana de Roma. "Foi a lugares que jamais tinham sido visitados por um papa ou onde os crist�os s�o minoria, como Mianmar, Bangladesh, Tail�ndia e Emirados �rabes. Escolhe cardeais de pa�ses que nunca sonharam em ter um."
Ações do papa Francisco têm aproximado, segundo especialistas, a Igreja Católica de regiões antes distantes do Vaticano(foto: Vincenzo PINTO/AFp - 25/10/20)
A��es do papa Francisco t�m aproximado, segundo especialistas, a Igreja Cat�lica de regi�es antes distantes do Vaticano (foto: Vincenzo PINTO/AFp - 25/10/20)

"O papa Francisco pensa de forma poli�drica. Ou seja, v�rias facetas para compor o cen�rio multilateral da Igreja e do col�gio de cardeais. Todos precisam ouvir a todos para realizar a sinfonia", afirma o te�logo e fil�sofo Fernando Altemeyer Junior, da Pontif�cia Universidade Cat�lica de S�o Paulo (PUC-SP).

Tornou-se comum no pontificado atual a nomea��o de cardeais j� com mais de 80 anos. � o caso de quatro dos nomes anunciados no �ltimo domingo. Francisco costuma fazer isso como forma de reconhecimento. "Em muitos casos, a trajet�ria pastoral da pessoa, bem como o povo sofrido que ela representa, pesam muito mais do que o curr�culo acad�mico na hora da escolha", diz Mirticeli.

Primeiro afro-americano � nome forte

Entre os novos anunciados por Francisco para compor o cardinalato, as vozes baixas dos corredores do Vaticano j� elegeram o norte-americano Wilton Daniel Gregory, arcebispo de Washington, como o nome mais forte. Aos 72 anos, o primeiro cardeal norte-americano negro da hist�ria sintetiza valores muito caros ao pontificado de Francisco. Ao mesmo tempo, ele est� no centro de movimentos importantes do mundo contempor�neo.

"� uma mensagem muito clara n�o apenas no contexto do Black Lives Matter, mas em um momento em que o pa�s norte-americano est� profundamente dividido pelo racismo, polariza��o e radicaliza��o do discurso p�blico", afirma a vaticanista argentina In�s San Mart�n, diretora do escrit�rio romano da Crux Catholic Media.
Posse dos novos cardeais nomeados pelo papa Francisco está marcada para 28 de novembro(foto: Filippo MONTEFORTE/AFP - 01/11/20)
Posse dos novos cardeais nomeados pelo papa Francisco est� marcada para 28 de novembro (foto: Filippo MONTEFORTE/AFP - 01/11/20)

Nascido em Chicago, filho de pais divorciados, Gregory decidiu se tornar padre aos 11 anos, antes mesmo de ter se convertido ao catolicismo. Foi ordenado em 1973, doutorou-se em Liturgia Sagrada em Roma e tornou-se bispo em 1983. Ao longo de seu episcopado, ficou conhecido pela postura de acolhimento a cat�licos LGBT e pela defesa da import�ncia de uma maior representatividade dos negros na Igreja dos Estados Unidos.

O religioso � enf�tico no discurso antiarmamentista. Em pelo menos duas ocasi�es, criticou publicamente o presidente Donald Trump.

Em meio aos atuais movimentos antirracistas, sua voz se ergue em defesa dos negros norte-americanos. Entre 2001 e 2004, Gregory presidiu a confer�ncia episcopal norte-americana (USCCB, na sigla em ingl�s). Nessa �poca, conduziu uma pol�tica de toler�ncia zero frente a casos de abusos sexuais do clero. Em 2019, quando a Arquidiocese de Washington estava no epicentro de esc�ndalos sexuais, ele foi nomeado pelo papa Francisco para assumir o posto e recuperar a confian�a dos fi�is. A partir da�, j� se ventilava que Gregory estava cotado para receber o barrete cardinal�cio.

"A geopol�tica de Francisco � pautada pelas periferias. Vemos isso nas suas viagens, nas pautas que defende e nas nomea��es, tanto de cardeais quanto de bispos"

Mirticeli Medeiros, pesquisadora de Hist�ria do Catolicismo na Pontif�cia Universidade Gregoriana de Roma


Pesquisadora de Hist�ria do Catolicismo na Pontif�cia Universidade Gregoriana de Roma, a vaticanista Mirticeli Medeiros concorda que Francisco "s� esperava o momento certo para faz�-lo" cardeal. "E o clamor popular, os protestos, o debate em torno do tema talvez o tenham motivado a lan�ar, de uma vez, essa nomea��o", comentou.

"Parece ser uma pessoa moderada. Fala pouco mas, quando fala, fala forte", pontua o vaticanista Filipe Domingues, da Universidade Gregoriana de Roma. "Por ser um negro nos Estados Unidos, onde os negros cat�licos s�o a minoria da minoria, ele traz uma bagagem que n�o estava representada no col�gio cardinal�cio."

Para o te�logo e fil�sofo Fernando Altemeyer Junior, da PUC de S�o Paulo, a nomea��o de Gregory mostra que "a Igreja segue seu caminho sem submeter-se aos imperialismos ou decis�es dos grandes detentores do poder mundial". Os cardeais, acrescenta, "s�o escolhidos sintonizados com o projeto de uma Igreja mission�ria e pr�xima dos povos". "S�o novos horizontes de sentido, um novo modo de ser bispo e ser cardeal."

Sem representantes de Brasil e da Amaz�nia

Havia uma expectativa de que o papa Francisco, atento �s quest�es ambientais e na sequ�ncia do S�nodo dos Bispos sobre a Amaz�nia realizado no ano passado, fizesse cardeal algum bispo amaz�nico. Da lista dos 13 anunciados pelo pont�fice, contudo, n�o consta nenhum novo nome brasileiro ou da regi�o.

Com nove cardeais, o Pa�s segue bem representado no col�gio cardinal�cio. Quatro deles ainda s�o eleitores: o arcebispo de S�o Paulo, d. Odilo Pedro Scherer; o do Rio, d. Orani Jo�o Tempesta; o de Salvador, d. S�rgio da Rocha; e o atual prefeito da Congrega��o para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apost�lica no Vaticano, d. Jo�o Braz de Aviz.

"Por que nenhum brasileiro?", indaga-se o te�logo e fil�sofo Fernando Altemeyer Junior, da PUC-SP, ao ver a lista dos novos indicados por Francisco. "Creio que algum bispo amaz�nico poderia ser nomeado em um pr�ximo consist�rio…"

O papel de representante amaz�nico dentre os purpurados do Vaticano vem sendo cumprido por um amigo pessoal do papa Francisco, o cardeal Cl�udio Hummes, arcebispo em�rito de S�o Paulo e presidente da rec�m-criada Confer�ncia Eclesial da Amaz�nia.

"Olhando para o atual col�gio, o Brasil tem um n�mero adequado de representantes", analisa o vaticanista Filipe Domingues, doutor pela Pontif�cia Universidade Gregoriana de Roma.

As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.


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