
Naquela d�cada, duas coisas extraordin�rias aconteceram com ela: Schwartz iniciou uma carreira na fotografia que acabaria por lev�-la a se tornar uma das grandes expoentes da fotografia em S�o Paulo. E tamb�m come�ou — no percurso di�rio entre sua casa e a lavanderia — a conhecer e a fazer amizade com dezenas de travestis e transformistas que frequentavam a cena noturna da cidade em plena ditadura militar (1964-85).
Na d�cada seguinte, com diversos trabalhos fotogr�ficos j� realizados, Schwartz come�ou a fazer ensaios com as personagens da cena alternativa de S�o Paulo. Come�ou com nomes como o cantor Ney Matogrosso, as integrantes do grupo Dzi Croquettes e a atriz Elke Maravilha. Mas depois fotografou tamb�m travestis e transformistas an�nimas e menos conhecidas, que trabalhavam em sal�es de cabeleireiro no centro de S�o Paulo e se apresentavam em boates da regi�o.
O universo retratado por Schwartz era um grupo de homens e mulheres que faziam frente ao conservadorismo da �poca, explica Samuel Titan Jr., coordenador executivo do Instituto Moreira Salles (IMS) e um dos curadores da mostra As Metamorfoses, que re�ne at� junho, no IMS de S�o Paulo, as imagens das transformistas feitas pela fot�grafa nos anos 1970.

"Essas mulheres trans est�o muito claramente buscando espa�o de visibilidade e legitima��o", afirma Titan Jr. "Era per�odo mais duro da ditadura militar, quando n�o havia nenhuma possibilidade de reconhecimento jur�dico para mulheres trans ou abertura para falar do preconceito que sofriam. Mas elas souberam aproveitar, com muita intelig�ncia, qualquer brecha que se abria nesses espa�os, na arte e no burlesco."
Legitima��o atrav�s da arte
O termo "mulher trans" para definir algu�m que � do sexo masculino ao nascer e depois se reconhece como sendo do g�nero feminino, nem era usado ou conhecido na �poca, explica o curador da mostra.
As personagens retratadas por Schwartz se definiam como transformistas (artistas homens que usavam roupas femininas e andr�ginas para se apresentar) e travestis (pessoas que se reconheciam como sendo de g�nero diferente do designado ao nascer).
Havia uma gama ampla de figuras que frequentavam essa cena alternativa, explica Titan Jr.
"As figuras mais em evid�ncia eram majoritariamente homens gays que performavam no palco como figuras amb�guas, que encenavam no palco alguma ambiguidade de g�nero", diz o curador. Era o caso de Ney Matogrosso, por exemplo, retratado por Schwartz em 1974.

A principal transsexual em evid�ncia no Brasil na �poca era a cantora Rog�ria, mas ela fazia mais parte da cena carioca — tinha um show chamado Les Girls no Rio de Janeiro.
A maioria das travestis fotografadas por Schwartz eram an�nimas e menos conhecidas, se apresentavam em boates do centro � noite, trabalhavam em sal�es de beleza ou como prostitutas — um destino para muitas em um cen�rio em que os empregos eram ainda mais escassos do que hoje em dia.
"Elas lutavam com unhas e dentes por visibilidade e legitima��o, que na �poca s� era poss�vel na arte. N�o havia uma organiza��o pol�tica conjunta, elas trilhavam caminhos individuais", diz Titan Jr.

"Mas havia muitas redes de ajuda, de camaradagem e tamb�m de rivalidade", diz ele. "O movimento por direitos LGBT foi se constituindo de forma mais robusta mais tarde, por homens gays, no fim dos anos 1970", diz Titan Jr.
Schwartz conseguiu uma grande intimidade com as frequentadoras dessa cena e os retratos eram realizados em um est�dio improvisado em seu apartamento — isso se traduz em um clima de troca e cumplicidade nas fotos. Em uma delas, o gatinho da fot�grafa resolveu aparecer ao lado das artistas.
"Uma das quest�es � porque ela se interessou por esse mundo. Tinha um elemento de contesta��o nessas travestis e transformistas. Elas adquiriram para a Madalena e para muitas pessoas um car�ter simb�lico dentro de um per�odo de persegui��es. Tudo aquilo virava uma encarna��o do conceito de liberdade", diz o curador da mostra no IMS.
A exposi��o no IMS tamb�m faz um paralelo com a cena alternativa em pa�ses da Am�rica Latina, onde os cen�rios tinham suas peculiaridades.

"No Peru, as festas de travestis foram eminentemente proibidas depois em 1975 depois que uma das artistas beijou o presidente na bochecha", conta o curador.
Na Argentina, a reuni�o das fotos foi poss�vel gra�as a arquivos de mem�rias trans — havia muita persegui��o e nenhuma visibilidade, ent�o os retratos que foram salvos muitas vezes eram fotos escondidas, fotos de festas na rua que a fam�lia ia jogar fora.
A mostra As Metamorfoses est� em cartaz no IMS Paulista, em S�o Paulo, at� 13 de junho. Mais informa��es neste link aqui.
J� assistiu aos nossos novos v�deos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!