
O primeiro milh�o de infectados no Brasil foi alcan�ado em junho do ano passado, quando cientistas de v�rias partes do mundo se debru�avam em estudos para chegar a um imunizante que freasse o avan�o do v�rus. As informa��es sobre a import�ncia do uso de m�scaras, distanciamento social e medidas de higiene, como lavar as m�os ou usar �lcool em gel, j� tinham sido amplamente divulgadas, mas o Pa�s entrou em uma escalada de casos, que se refletiram em um n�mero alto de mortes.
"Seria tudo diferente. Mas a gente vem, desde o come�o, seguindo uma s�rie de desobedi�ncias a medidas de restri��o e isso acaba nos levando para o que estamos vivendo hoje. Quanto mais a gente v� pessoas falando que t�m o direito a circular e n�o usar m�scara, temos, em termos de biologia, a forma��o de novas muta��es e, com essas variantes, a gente vai acabar sendo pego por algo que n�o tinha sido programado. No ano passado, quando come�ou a fazer quarentena at� se chegar a uma vacina, era pela possibilidade de atender casos que viessem a surgir, achatar a curva e manter estabilidade gen�tica no v�rus para que ele n�o tivesse mudan�as bruscas demais. As pessoas cansaram da pandemia, mas ela n�o se cansou da gente", avalia Benilton de S� Carvalho, professor do Departamento de Estat�stica e coordenador da frente de epidemiologia da for�a-tarefa Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) contra a covid-19.
Carvalho diz que tentar estimar como a propaga��o da doen�a vai caminhar no Brasil n�o � tarefa imposs�vel, mas desafiadora, tendo em vista a quantidade de vari�veis que precisariam ser levadas em considera��o. "Estamos falando daquela fase de crescimento exponencial. O que acaba acontecendo com esse comportamento num�rico � que, se hoje teve um caso, amanh� tem dois, depois, quatro. Nessa velocidade, chega a um ponto que acelera demais", afirma.
"No nosso caso, � mais complicado (estimar) pela dificuldade de acesso � informa��o, seja de vigil�ncia, como os dias de sintomas, seja pelas informa��es de testagem e vacina��o, todas as vari�veis s�o importantes para mensurar" diz S� Carvalho. "A briga pelo aux�lio emergencial � outra quest�o. A aus�ncia vai fazer com que as pessoas circulem mais, trazendo novas variantes."
No Brasil, j� h� registro de circula��o da variante brit�nica e, no Amazonas, tamb�m surgiu outra variante, a P1, que j� foi detectada em outros Estados, como Rio, Cear� e Santa Catarina. S�o Paulo j� detectou casos das duas cepas.
Vacina��o
Outro ponto preocupante � a imuniza��o da popula��o, que tem sido feita com lentid�o por causa da escassez de doses. At� esta quarta-feira, 17, 5,4 milh�es de pessoas tinham sido imunizadas, segundo balan�o do Minist�rio da Sa�de.
"Por causa da baixa velocidade da vacina��o, a gente n�o deve ver esses efeitos t�o cedo ou t�o r�pido quanto Israel. Temos cerca de 3% das pessoas vacinadas no Brasil. N�o estou positivo de que teremos efeito depois de julho e vai ser complicado porque, at� o segundo semestre, vamos passar pelo inverno e n�mero de casos respirat�rios, n�o s� covid, aumentam em maio ou junho por padr�o."
Em Israel, mais de 40% dos 9 milh�es de habitantes j� receberam a vacina contra a covid-19. Quase dois meses ap�s o in�cio da campanha de imuniza��o, os resultados j� est�o aparecendo e o Pa�s j� contabiliza queda no n�mero de pacientes em estado grave (38%), das mortes entre a popula��o com mais de 60 anos (40%), de idosos hospitalizados (58%) e interna��es em geral (44%) em rela��o a janeiro.
Nos Estados Unidos, que tamb�m teve uma explos�o de casos, o n�mero de novos casos apresentou queda de 39% nas duas �ltimas semanas, puxada pela vacina��o em massa.
"A vacina��o est� lenta porque a demanda por vacinas est� extremamente alta e n�o temos doses suficientes. A gente recebeu oferta de 70 milh�es de doses da Pfizer, que foi deixada passar. Teve um erro brutal em log�stica e de colocar o investimento em algo que a ci�ncia fala que n�o tem efici�ncia", diz Carvalho, referindo-se ao "tratamento precoce", indicado inclusive pelo presidente Jair Bolsonaro, feito com medicamentos que estudos j� comprovaram que n�o s�o eficazes contra o v�rus.
Isolamento com estrat�gias � eficaz mesmo com novas variantes
Quando a pandemia teve in�cio, o distanciamento social logo foi apontado como uma estrat�gia para conter a dissemina��o do v�rus. O Brasil n�o experimentou o lockdown, mas assistiu ao movimentos de abertura e fechamento de estabelecimentos nos pa�ses europeus. O "fique em casa" foi adotado por uns e criticado por outros ao longo do ano passado. No entanto, o isolamento social � uma ferramenta importante para evitar a propaga��o do v�rus, inclusive as novas variantes. S� que precisa ser pensado de forma estrat�gica, de acordo com Airton Deppman, pesquisador e professor do Instituto de F�sica da Universidade de S�o Paulo (USP).
Ele conduziu um estudo no ano passado que apontou o modelo de propaga��o do v�rus. Em vez de usar o padr�o SIR, mais usado para descrever a evolu��o de uma pandemia no tempo e que considera pessoas suscet�veis, infectadas e removidas (por morte ou vacina��o), foi utilizado um modelo chamado fractal, que avaliou a dissemina��o por meio de grupos.
"Esse modelo come�ou com uma an�lise dos dados da epidemia em mar�o e abril do ano passado, coletando dados em diferentes regi�es do mundo, como China, Europa, Estados Unidos e no Estado de S�o Paulo. Vimos que a melhor forma de analisar n�o era atrav�s do SIR, que � o mais antigo e tradicional. No SIR, se tem um infectado, ele tem a probabilidade de infectar qualquer um, mas sabemos que uma pessoa em S�o Paulo tem uma probabilidade m�nima de contaminar outra que est� em Manaus. � dif�cil us�-lo para explicar a epidemia em uma popula��o grande. Nosso modelo considera que um indiv�duo vai infectar um grupo pequeno e esses indiv�duos v�o contaminar outros grupos que t�m contato com outros grupos de pessoas."
A partir desses resultados, segundo ele, � poss�vel desenhar modelos mais eficazes para conter o v�rus. "O processo de contamina��o depende do n�mero de contatos e isso � mais importante do que diminuir a efici�ncia do v�rus, mesmo para as novas variantes. Esse modelo oferece oportunidades para avaliar estrat�gias mais inteligentes de isolamento social, porque, se for imposto um isolamento muito geral e prolongado, as pessoas n�o conseguem seguir, como a gente viu no carnaval e no fim do ano do ano passado. O que a gente aprendeu � que a popula��o, de modo geral, n�o consegue isolamento rigoroso e que a contamina��o �, em grande parte, regional."
Com o monitoramento das bolhas, testagem e isolamento em pontos que realmente precisam, al�m da vacina��o, a tend�ncia � de que as infec��es caiam.
"Minha impress�o � de que a popula��o vai se adequando com base nas informa��es que o governo transmite. Com um modelo matem�tico, � poss�vel desenhar formas de restri��o de mobilidade que sejam mais eficientes para evitar o espalhamento do v�rus e sem prejudicar um n�mero muito grande de pessoas, observando onde precisa de distanciamento mais rigoroso, como a bolha se alastra e em que regi�o precisa fazer mais testes para ver se o isolamento est� sendo efetivo", sugere Deppman.
'Pensei que meu organismo ia reagir mais r�pido', diz professora que foi internada
A professora de educa��o infantil Amanda Vello do Paraizo, de 41 anos, espera sair do hospital nesta sexta-feira, 19. H� 15 dias, ela apresentou os primeiros sintomas da covid-19 e, desde o dia 12, est� internada. Ela teve febre, cansa�o, prostra��o, enjoo e v�mitos. Depois do diagn�stico, ficou em casa, mas precisou de atendimento tr�s dias depois. "Estava sentindo muito cansa�o e tossindo muito. Fiz novos exames e minha oxigena��o estava baixa. Fiz tomografia e raio X, que mostrou que 50% do pulm�o estava afetado. N�o fui entubada, mas estava com medo."
Sua maior preocupa��o era porque tamb�m tem diabete, o que fazia dela uma paciente com mais riscos de ter complica��es. Ao longo da pandemia, tomou os cuidados para evitar a infec��o, como usar m�scara, higienizar as m�os e evitar aglomera��es. "Sempre fui muito cuidadosa por causa da diabete. Sa�a com toda precau��o, mas tive uma consulta m�dica com a endocrinologista e fui com a minha filha na cabeleireira. E mercado, que j� ia sempre."
Amanda conta que a doen�a n�o � leve. "Eu me senti muito fraca. Pensei que meu organismo ia reagir mais r�pido. Tive muito calafrio da febre, foi muito mal-estar." Na fam�lia, s� ela foi infectada. "Meu marido fez o teste e deu negativo duas vezes. Meus pais, minha tia, que tenho bastante contato, n�o tiveram. Nem a minha filha de 9 anos. Est� sendo dif�cil ficar sem v�-la. A gente conversa por v�deo, mas espero encontr�-la logo."
