
A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi�a (STJ), decidiu, por unanimidade, confirmar decis�o que garantiu a Maria Luiza da Silva, a primeira transexual das For�as Armadas, o direito de se aposentar no cargo de subtenente, �ltimo posto da carreira militar no quadro de pra�as.
O colegiado negou recurso da Uni�o para reformar decis�o do relator, ministro Herman Benjamin, que, em junho de 2020, considerou leg�timo que a militar posta na reserva ap�s ter realizado cirurgia de mudan�a de sexo recebesse a aposentadoria integral no posto de subtenente, 'pois lhe foi tirado o direito de progredir na carreira devido a um ato administrativo ilegal, nulo, baseado em irrefut�vel discrimina��o'.
"N�o h� d�vida, assim, de que a agravante (Maria Luiza) foi prejudicada em sua vida profissional por causa da transexualidade", ponderou, o relator na ocasi�o.
Os ministros tamb�m mantiveram decis�o que concedeu � ex-militar o direito de permanecer no im�vel funcional da FAB at� que seja implantada a aposentadoria integral como subtenente, com determina��o de reembolso de uma multa por ocupa��o irregular que foi imposta a Maria Luiza pela Aeron�utica.
No recurso � Segunda Turma, a Uni�o questionava o ac�rd�o do Tribunal Regional Federal da 1ª Regi�o que reconheceu o direito de Maria Luiza �s eventuais promo��es por tempo de servi�o no per�odo em que esteve ilegalmente afastada. A Aeron�utica alegava que o reconhecimento de tais promo��es n�o haviam sido solicitadas no ju�zo de origem.
No entanto, Herman Benjamin considerou que o ac�rd�o daquela corte seguiu o entendimento do Superior Tribunal de Justi�a de que, ap�s a anula��o do processo administrativo, estariam asseguradas � Maria Luiza as promo��es, o soldo integral, bem como o direito � moradia, consequ�ncia natural decorrente da anula��o do processo administrativo.
Na decis�o monocr�tica proferida em junho do ano passado, o ministro destacou ainda que a determina��o de reimplanta��o da aposentadoria integral n�o se refere ao posto de cabo, 'a que a ex-militar ocupava antes de ser injustamente afastada', tendo direito a se aposentar como subtenente, com 35 anos de servi�o. O relator tamb�m indicou que Maria Luiza esperou por anos que fosse reimplantada sua aposentadoria, mesma aquela referente ao posto de cabo e nesse ponto citou document�rio produzido sobre a vida da ex-militar.
"O presente caso est� tratado inclusive no document�rio (longa-metragem) "Maria Luiza", no qual � relatado todo o drama vivido pela agravada - que se tornou a primeira transexual das For�as Armadas do Brasil - e desnudada a postura absolutamente discriminat�ria que enfrentou. A pel�cula corre o mundo fazendo sucesso de cr�tica", ponderou o ministro na ocasi�o.
Destacando a 'flagrante necessidade de se concluir a demanda de Maria Luiza, que j� dura 14 anos', e lembrando que foi tirada da ex-militar a oportunidade de progredir em sua carreira, o ministro pontuou que a Uni�o tem o 'dever jur�dico de implementar todas as promo��es por antiguidade eventualmente cab�veis' entre a publica��o do ato de reforma e a data em que a parte agravada completou 54 anos.
Apesar da decis�o favor�vel � ex-militar, a luta de Maria Luiza na Justi�a, que j� dura 15 anos, vai ter mais um cap�tulo. Mesmo com o 'forte argumento' de que o posto que cabe � militar - de subtenente - j� foi definido em inst�ncias inferiores, os ministros entenderam que a quest�o deve ser analisada no ju�zo competente para cumprir a decis�o, considerando a insist�ncia da Uni�o em defender que n�o � poss�vel chegar a tal cargo sem participa��o em processo seletivo aberto a civis e militares (e n�o por meio de promo��o).
Segundo o STJ, tal ju�zo 'ter� melhores condi��es' de avaliar que posto poderia ser alcan�ado por Maria Luiza se ela ainda estivesse na ativa, o de Terceiro-Sargento ou de Suboficial. Os ministros ressaltaram, no entanto, que era certo que tal posto n�o � o de cabo engajado, como a ex-militar foi 'impropriamente' aposentada.
"� inconceb�vel dizer, como faz a Uni�o, que a agravada tem direito � aposentadoria integral apenas no posto de cabo engajado (como foi aposentada). Prestigiar tal interpreta��o dos julgados da origem acentua, ainda mais, a indesculp�vel discrimina��o e os enormes preju�zos pessoais e funcionais sofridos pela recorrida nos �ltimos 20 anos em que vem tentando - agora com algum �xito - anular a ilegalidade contra si praticada pelas For�as Armadas do Brasil", afirmou o relator.
At� a decis�o do ju�zo competente, a ex-militar deve permanecer aposentada no posto de suboficial, determinou o STJ. Al�m disso, a corte vedou qualquer desconto ou cobran�a de multa pelo per�odo de ocupa��o do im�vel funcional.
Entenda o caso
Maria Luiza foi reformada ap�s se submeter a cirurgia de mudan�a de sexo, tendo a Aeron�utica a considerado incapaz para o servi�o militar com base na lei 6880/80, que estabelece como hip�tese de incapacidade definitiva para os integrantes das For�as Armadas: 'acidente ou doen�a, mol�stia ou enfermidade sem rela��o de causa e efeito com o servi�o militar'.
Ao analisar apela��o da ex-militar, o Tribunal Regional Federal da 1ª Regi�o entendeu que Maria Luiza n�o poderia 'ser prejudicada em seu direito �s promo��es que eventualmente teria direito', tendo em vista que o ato que a conduziu � reserva foi declarado como nulo.
A corte destacou ainda que a orienta��o sexual n�o pode ser considerada incapacidade definitiva, nem acidente ou enfermidade, 'sob pena de ofender o direito constitucional � Sa�de, o princ�pio da n�o discrimina��o e a pr�pria a dignidade humana, num dos seus desdobramentos mais sens�veis: o respeito � capacidade dos transexuais de autodeterminarem a sexualidade'.
A Aeron�utica acabou reimplantando a aposentadoria de Maria Luiza, mas como cabo e alegou que as promo��es n�o dependeriam exclusivamente do crit�rio de antiguidade.