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Estado de Minas OMISS�O TR�GICA

Jovem retira vidro do rosto ap�s 7 meses: 'Consegui me ver no espelho'

Kedydja Cibelly teve que conviver com resqu�cios de vidro e asfalto no rosto por mais de 200 dias, ap�s ser v�tima de um acidente envolvendo um �nibus


30/06/2021 14:10 - atualizado 30/06/2021 14:22

Kedydja Cibelly Borges conquistou judicialmente o direito a ter as cirurgias reparadoras de danos(foto: Kedydja Borges)
Kedydja Cibelly Borges conquistou judicialmente o direito a ter as cirurgias reparadoras de danos (foto: Kedydja Borges)

Nove minutos foram suficientes para mudar a vida de Kedydja Cibelly Borges, aos 20 anos. A estudante de engenharia de produ��o da Universidade do Vale do S�o Francisco (Univasf) ficou por quase 10 minutos embaixo do �nibus em que viajava para a cidade em que mora, Salgueiro (PE), ap�s o ve�culo ter capotado e sa�do da estrada, em 16 de novembro de 2020. O rosto de Kedydja foi gravemente afetado: parte da testa dela afundou com o impacto, a sobrancelha foi danificada e a cartilagem do nariz foi completamente comprometida. Somente agora, sete meses depois do acidente, se recuperando de cirurgias reparadoras e tendo removido um caco de vidro com o qual conviveu por sete meses, ela se sente confort�vel em se olhar no espelho novamente, se reconhecer e se gostar.
A piauiense conquistou judicialmente o direito a ter as cirurgias reparadoras de danos, custeadas pela empresa respons�vel pelo trajeto, a Autovia��o Progresso. Ela viajava de Picos, Piau�, onde foi votar nas �ltimas elei��es municipais, para Salgueiro (PE), onde mora com o noivo. O acidente ocorreu minutos antes do ve�culo chegar ao destino. 

Em 10 de junho, ela viajou at� S�o Paulo, onde fez uma rinoplastia para colocar a cartilagem do nariz no lugar certo. “Eu consegui me olhar de novo no espelho. Sabe a sensa��o prazerosa de conseguir o que tanto deseja? � isso. Eu estou vivendo de novo, um novo come�o, que tanto desejei”, comemora.

Pedaço de vidro encontrado por cirurgião no nariz de Kedydja sete meses após o acidente. Ela sentia dificuldade em respirar mas não sabia que o resquício era o motivo (foto: Kedydja Borges)
Peda�o de vidro encontrado por cirurgi�o no nariz de Kedydja sete meses ap�s o acidente. Ela sentia dificuldade em respirar mas n�o sabia que o resqu�cio era o motivo (foto: Kedydja Borges)

Na cirurgia, o especialista encontrou um peda�o de vidro que impedia a piauiense de respirar livremente durante todo este tempo. “Eu n�o imaginava que ainda tinha algo desse tamanho em mim. Em todos esses meses, eu encontrava peda�os pequenos de vidro e de asfalto no meu rosto, mas nada desse tamanho. Quando ele tirou, foi um al�vio”, conta.

Este foi o primeiro de in�meros procedimentos cir�rgicos que ela vai passar por, no m�nimo, tr�s anos, para reparar as marcas profundas no rosto deixadas pelo acidente. De acordo com relat�rio da Pol�cia Rodovi�ria Federal (PRF), o motorista teria dormido na dire��o do ve�culo. Parte da testa de Kedydja afundou com o impacto, a sobrancelha foi danificada e a cartilagem do nariz foi completamente comprometida.

“Eu n�o perdi a consci�ncia e senti todo o desespero e dor do momento. O cinto de seguran�a do �nibus n�o me segurou e fui arremessada para fora, mas com uma parte do corpo para dentro”, lembra. “Quando ele capotou, meu rosto e corpo foram arrastados pelo ch�o at� o ve�culo parar totalmente”, conta.

De cabeça baixa, Kedydja registrou as feridas. As marcas fizeram com que ela desenvolvesse depressão profunda(foto: Kedydja Borges)
De cabe�a baixa, Kedydja registrou as feridas. As marcas fizeram com que ela desenvolvesse depress�o profunda (foto: Kedydja Borges)

Por sete meses, ela diz n�o ter conseguido se olhar no espelho, desenvolveu depress�o profunda e foi diagnosticada com um estado de sa�de mental que “poderia causar risco de vida” a ela mesma. O sofrimento de Kedydja foi acentuado pela falta de apoio da empresa respons�vel pelo �nibus, a Autovia��o Progresso. At� abril deste ano, ela n�o havia recebido nenhum aux�lio da companhia de transporte.

Com a falta de recursos, o atendimento hospitalar vivenciado por ela foi prec�rio desde o come�o. No momento do acidente, Kedydja foi levada a um hospital por uma pessoa que passava pela rodovia e demorou cerca de 16h para fazer exames e ser devidamente atendida.

Rosto da estudante ficou marcado por cicatrizes e falhas. Ela não conseguia sair de casa e nem se ver no espelho (foto: Kedydja Borges)
Rosto da estudante ficou marcado por cicatrizes e falhas. Ela n�o conseguia sair de casa e nem se ver no espelho (foto: Kedydja Borges)

Depois, foi transferida para um hospital no munic�pio de Petrolina (PE), no qual fez a primeira cirurgia. “Os m�dicos tiraram muitos vidros. Tinha peda�os enormes embaixo do meu couro cabeludo. Eu perdi alguns nervos do rosto e ele ficou dormente em algumas partes. Por quest�es de cent�metros, n�o fiquei cega”, revela.

Um m�s depois, no retorno do procedimento, Kedydja ouviu a frase que abriu o per�odo mais dif�cil da vida dela. “Ele (o m�dico) falou que eu tinha que me conformar com o meu rosto porque n�o tinha jeito nenhum para recuper�-lo. Meu ch�o sumiu e eu achava que tinha acabado tudo. Doeu muito ouvir isso de um m�dico”, desabafa.

A estudante n�o podia custear consultas com outros m�dicos e especialistas, assim como a fam�lia: o pai est� desempregado h� tr�s anos e vive em busca de oportunidades de emprego. A situa��o se tornou, ent�o, sem sa�da. A chave mudou apenas quando, em maio deste ano, ela conquistou o direito de fazer as cirurgias necess�rias para reparar os danos. No entanto, as marcas eram mais do que est�ticas.

Rosto da estudante no dia do acidente (foto: Kedydja Borges)
Rosto da estudante no dia do acidente (foto: Kedydja Borges)

A mais longa das esperas

Alegre e cheia de vida, a jovem passou a viver dias desafiadores. O estresse p�s-traum�tico e as feridas fizeram Kedydja se isolar em casa e desenvolver um quadro de depress�o profunda. Ela passou a usar um curativo na testa e no nariz e se sentia incomodada com os olhares de outras pessoas.

“Eu vivia de cabe�a baixa, tinha vergonha de andar na rua. Todo mundo me olhava e eu me sentia mal. Eu n�o conseguia me olhar no espelho e me ver sem curativo, porque eu tinha medo do que eu ia ver”, lembra. Pr�ticas comuns do cotidiano de qualquer pessoa se tornaram um empecilho para ela: Kedydja n�o consegue, at� hoje, estar dentro de um ve�culo sem se sentir angustiada, ansiosa e com medo.

Entre amigos e familiares, ela sempre ouvia que precisava aceitar a nova realidade. “Eu estava desesperada e sem ch�o”, diz. Vaidosa, a piauiense sempre gostou de cuidar de si e da apar�ncia, era comum aprender e testar maquiagens novas e tirar fotos para registr�-las. “Agora eu n�o consigo mais. Eu olhava para meu rosto e lembrava de mim coberta de sangue, no dia do acidente”, conta.

A estudante tamb�m se tornou uma pessoa irritadi�a. De personalidade calma, ela passou a perder o humor com facilidade. “A psiquiatra que me atende disse que pode ser alguma sequela do acidente, alguma parte do meu c�rebro pode ter sido atingida e mudado meu comportamento. Eu ainda n�o fiz exames para ver como ele est�”, revela.

Mesmo com o quadro grave, Kedydja encontrou for�as na fam�lia e no noivo, com quem mora. Al�m disso, a f� se tornou uma importante aliada neste processo. “Eu me apeguei muito a Deus, eu pedia muito a ele. Me lembro das noites que passei chorando, pedindo e conversando com ele. Foram muitas conversas que eu tive com ele, viu?”, lembra.

Foi com o aux�lio das pessoas queridas e da sua cren�a que ela foi atr�s de justi�a. Em mar�o, entrou em contato com um advogado especialista em indeniza��es e respons�vel pela vit�ria de casos como o da influenciadora D�bora Dantas, que perdeu o rosto ap�s o cabelo prender em um motor exposto em um kart. Como primeiro ato, o profissional submeteu Kedydja para avalia��o psicol�gica. 

“O psiquiatra identificou uma depress�o profunda e graves ind�cios de perigos emocionais, riscos inclusive de vida. Ele recomendou, com urg�ncia, um tratamento psiqui�trico”, conta Eduardo Barbosa. O pedido por acompanhamento psiqui�trico foi a primeira vit�ria do caso, conquistada com insist�ncia. Em seguida veio o custeio de viagens a S�o Paulo, para consultas com especialistas e or�amento dos reparos faciais, s� ent�o a disputa com a empresa de transportes teve in�cio.

“Os especialistas afirmaram, em relat�rios, que ser�o, no m�nimo, tr�s anos de tratamento. S�o muitos procedimentos”, diz o representante. Inicialmente o pedido de liminar foi rejeitado em Salgueiro, mas acabou autorizado junto ao desembargador Ant�nio Fernando Martins, da 6ª C�mara C�vel, no Recife (PE).

Omiss�o cobrada judicialmente

Desde o acidente at� o momento, segundo a v�tima, a Autovia��o Progresso n�o fez qualquer contato nem ofereceu aux�lio. “� uma grande falta de empatia. Nunca pensaram em mandar uma mensagem pra mim, me confortar. Eu queria apenas uma palavra, seria muito importante nesse momento e eu nunca tive. Eles nunca falaram diretamente comigo”, conta.

De acordo com o advogado Eduardo Barbosa, caberia � empresa a responsabilidade pelo acidente. “Eles tinham a obriga��o de prestar socorro. Al�m disso, ao longo de quatro meses eles nunca tiveram nem mesmo a curiosidade de saber o estado dela”, declara e completa: “o que lamento no Brasil e ficamos impressionados � que parece que os direitos das v�timas n�o existem. A pessoa � tratada como um bicho e parece ser culpada da situa��o em que se encontra. Gra�as a Deus este pa�s n�o � um faroeste, onde � cada um por si, e h� leis. Deixaram uma mo�a abandonada, uma jovem, que s� teve o azar de comprar um passagem da empresa deles”.

Outro lado

At� a publica��o desta reportagem, o Correio n�o conseguiu resposta a Autovia��o Progresso. No entanto, este espa�o ficar� aberto para a empresa se pronunciar e ser� atualizado t�o logo recebamos um posicionamento oficial.


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