
Com 20 livros publicados, o autodeclarado mentor promete uma mudan�a de vida. Em seus perfis nas plataformas Linkedin, Instagram, Twitter e em seu pr�prio blog pessoal, no entanto, n�o h� informa��es sobre sua forma��o acad�mica ou certifica��o profissional para aplicar tais m�todos. T�o pouco h� registro de seu nome na plataforma Lattes, sistema de curr�culos virtual do Conselho Nacional de Desenvolvimento Cient�fico e Tecnol�gico (CNPq).
Conhecido pelos m�todos para “subir na vida”, Mar�al decidiu tirar o conceito das redes sociais e lev�-lo para o alto, literalmente. Como parte de seu novo programa de aconselhamento, “O pior ano de sua vida”, o coach conduziu um grupo de 67 pessoas ao Pico dos Marins, localizado a 2.420 metros acima do n�vel do mar, na Serra da Mantiqueira em S�o Paulo.
O caminho para o sucesso, segundo ele, n�o � f�cil e exige “sangue, suor, l�grima e gordura”. Parte do processo seria, portanto, alcan�ar o cume de uma das montanhas mais altas do Brasil. O lema acabou sendo seguido em sua integralidade, j� que metade do grupo precisou ser resgatado pelo Corpo de Bombeiros. A outra metade desistiu durante a subida.
O Corpo de Bombeiros atribuiu o desastre da expedi��o � falta de treinamento de Mar�al, l�der do grupo, para guiar em ambientes como o da Serra da Mantiqueira e o desrespeito �s condi��es clim�ticas - previstas e alertadas pela Defesa Civil para a data. “Falta de responsabilidade”, definiu o porta-voz do Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais (CBMMG), tenente Pedro Aihara.
“H� situa��es que s�o evit�veis. Uma situa��o como aquela � recorrente de falta de planejamento e falta de observa��o de regras de seguran�a”, completou o tenente, em entrevista ao Estado de Minas.
O caso, amplamente comentado e difundido nas redes sociais, sofreu duras cr�ticas de praticantes de montanhismo e guias profissionais de montanha. Durante o ver�o, a ascens�o ao Pico dos Marins � altamente desaconselh�vel, justamente pela varia��o clim�tica e tempestades. “N�o � uma regi�o indicada para iniciantes”, enfatiza Aihara.
"O pior ano da sua vida"
Ao clicar no link dispon�vel no perfil de Mar�al no instagram, uma frase de efeito toma a tela do celular: “Aqui n�o tem nada que o seu corpo quer, mas tudo que sua alma precisa”. Este � um dos lemas do programa de aconselhamento, vendido pelo mentor, por 12 parcelas de R$ 299,70.

No site oficial, na aba de "d�vidas frequentes”, quando questionado se o curso possui certificado do Minist�rio da Educa��o (MEC), ele responde: “Seu certificado ser�o seus resultados assustadores em um curto espa�o de tempo”.
“N�o vai ser f�cil, n�o vai ser confort�vel e nem algo 'animado' de se fazer. Mas eu prefiro que voc� sofra a dor do desconforto por um curto per�odo da vida para n�o sofrer essa dor de arrependimento uma vida toda!”, descreve o mentor.
Com base nestes conceitos, Mar�al levou o grupo a campo para exemplificar, na pr�tica, suas teorias. Toda a expedi��o foi filmada e publicada em seu perfil. Nas imagens se nota a falta de equipamento do grupo. Em um dos v�deos, o mentor questiona um dos integrantes: “O que est� mais pesado, a mochila ou a sua mente?”.
Carlos Moura, guia de montanha h� 10 anos e dono da Mantiex, empresa especialista em trilhas na Serra da Mantiqueira, acredita que a montanha pode ser uma ferramenta de desenvolvimento pessoal, desde que encarada com respeito. “Nem tudo � emocional. Controlar as for�as da natureza, por exemplo, est� fora do nosso alcance”, explica.
“Ele misturou as coisas, excesso de confian�a, ignor�ncia, imper�cia e imprud�ncia. Um pouquinho de cada um”, continua Moura. Experiente em expedi��es ao Pico dos Marins, ele explica: “Onde o grupo estava, a temperatura cai rapidamente, chegando pr�ximas ou abaixo dos 0ºC e, com isso, a visibilidade cai drasticamente. Por sorte, a tempestade que surpreendeu o grupo do Pablo n�o tinha descarga el�trica, sen�o o desfecho poderia ter sido realmente catastr�fico”.
Resgate

Nas redes sociais, Mar�al chegou a definir o resgate do grupo como uma medida de “precau��o”. O tenente do CBMMG, Pedro Aihara, esclarece: “N�o existe acionamento por precau��o. O Corpo de Bombeiros � um servi�o de urg�ncia e emerg�ncia, e s� pode ser acionado nesses casos”.
“A chamada foi muito clara, eles estavam perdidos, sem equipamento, em uma situa��o extremamente complicada de chuva e n�o conseguiam sair sozinhos”, afirma. Segundo a equipe que trabalhou na opera��o, os integrantes do grupo corriam s�rio risco de morrer de hipotermia.
"N�o existe equipamento seguro na situa��o meteorol�gica em que eles se encontravam. Por melhor que fossem suas barracas, n�o os salvaria de uma tempestade el�trica. Eles estiveram em risco sob v�rios aspectos"
Carlos Moura, guia profissional de montanha
Pico dos Marins
Um dos �cones do montanhismo brasileiro, o Pico dos Marins � destino de milhares de turistas e praticantes de esportes de montanha. O local, conhecido pela sua exuber�ncia, entretanto, requer aten��o e cuidado daqueles que desejam chegar ao cume e voltar em seguran�a.

Pela altitude e exposi��o, acampar em seu cume pode ser extremamente perigoso sem um conhecimento t�cnico. “A temperatura pode ser muito baixa, principalmente a sensa��o t�rmica. Os ventos s�o muito fortes pelo tipo de forma��o do pico, ent�o temos corredores de vento. Para entrar em uma situa��o de hipotermia � relativamente f�cil se ele n�o estiver preparado para isto”, explica o tenente.
“Temos temporadas que s�o contra indicadas para a pr�tica de montanhismo”, afirma Aihara. A alta temporada para trilhas na Serra da Mantiqueira � entre os meses de abril e setembro. O tenente recomenda, ainda, que as ascens�es sejam realizadas sempre com um guia profissional “capacitado para selecionar um trajeto que seja compat�vel com a sua condi��o f�sica e condicionamento”.
Outro lado
A reportagem procurou Pablo Mar�al para um posicionamento, mas n�o havia obtido resposta at� a publica��o deste texto.