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Estado de Minas BBC

Queda sem precedentes em doa��es de sangue deixa bancos em alerta no Brasil

Na Funda��o Pr�-Sangue, em SP, estoques de v�rios tipos est�o em n�vel emergencial; sistema de sa�de dos EUA vive uma de suas maiores crises em uma d�cada


31/01/2022 20:36 - atualizado 31/01/2022 20:36

Pessoa doando sangue
Funda��o Pr�-Sangue, em S�o Paulo, diz que estoque de alguns tipos de sangue est� no n�vel emergencial (foto: Getty Images)
Em feriados prolongados ou de meses de f�rias, como janeiro, � comum que os estoques fiquem mais baixos no banco de sangue da Funda��o Pr�-Sangue, que abastece mais de cem hospitais da regi�o metropolitana de S�o Paulo com suprimentos essenciais para salvar a vida de v�timas de acidentes, pacientes em tratamento ou com complica��es de sa�de.

 

Mas a m�dica Helena Sabino nunca viu uma escassez t�o longa quanto a vivida atualmente.

 

"Se � uma crise sem precedentes? Acho que sim. Porque j� tivemos crises piores (de falta de sangue), mas pontuais, de curta dura��o", diz a m�dica � BBC News Brasil. "Neste ano est� bem mais dif�cil para bancos p�blicos e privados de sangue. Todo mundo est� restringindo o que se usa em transfus�es."

No dia em que conversou com a reportagem, em 31 de janeiro, todos os tipos negativos de sangue estavam em n�vel emergencial - o n�vel mais cr�tico - na Funda��o Pr�-Sangue.

 

A meta do �rg�o (ligado ao governo paulista) � coletar mensalmente em torno de 9,5 mil bolsas de sangue, mas o m�s de janeiro se encerrou com uma coleta em torno de 8 mil bolsas.

 

E se a situa��o � delicada na Funda��o Pr�-Sangue (que � refer�ncia no pa�s e tem seis postos para atendimento a doadores), o problema tende a ser ainda mais agudo em bancos de sangue menores.

 

"Alguns hospitais que tinham seus pr�prios bancos de sangue t�m nos procurado" por estarem sem estoque, agrega Sabino.

 

A m�dica ressalta que, at� o momento, nenhum paciente deixou de ser atendido por causa da escassez atual na Grande S�o Paulo.

 

"Mas se voc� (hospital) me pede fornecimento, n�s temos que fornecer com restri��o. Se tenho 50% de estoque, vou atender com 50% do que me pedem e da� avaliar as demandas caso a caso, a pedido dos hospitais. Temos de orientar os m�dicos a n�o usarem quando o paciente puder esperar. � mais trabalhoso e tudo fica mais vulner�vel."

Doa��es ca�ram na pandemia

Logo no in�cio, em 2020, a pandemia de covid-19 fez ca�rem muito as doa��es de sangue, em um momento em que as pessoas tinham mais medo de sair de casa e evitavam ao m�ximo buscar unidades de sa�de.

 

"Mas, apesar dessa queda dr�stica, o consumo de sangue estava mais restrito, porque n�o havia tantos acidentes de tr�nsito e o paciente de covid-19 n�o usava tanto sangue, s� quando tinha complica��es mais s�rias", detalha Sabino.

 

Agora, por�m, com a volta da circula��o das pessoas, dos acidentes de tr�nsito e das cirurgias (muitas das quais estavam represadas), o consumo voltou a crescer - mas as doa��es continuam em um patamar aqu�m do ideal.

 

Com o agravante do avan�o da variante �micron, que fez o Brasil bater sucessivos recordes de novas infec��es di�rias pelo coronav�rus e dificultou as doa��es de sangue - pessoas com diagn�stico ou suspeita de covid-19 t�m de se isolar e esperar dez dias ap�s sua recupera��o completa para doar sangue, segundo norma do Minist�rio da Sa�de (veja mais detalhes sobre como doar ao fim da reportagem).


Mulher idosa doando sangue
Pandemia fez cair a doa��o de sangue em diversos pa�ses, inclusive no Brasil (foto: Getty Images)

Ou seja, a demanda por sangue voltou a crescer no pa�s, mas a oferta n�o tem conseguido acompanhar esse crescimento.

'Crise nacional' de falta de sangue nos EUA

A queda de doa��es de sangue por conta da pandemia tem sido observada em v�rios pa�ses.

 

No Reino Unido, em outubro de 2021, o centro de sangue e transplantes do sistema de sa�de p�blico brit�nico (NHS) acendeu alerta depois de o suprimento ter ca�do para n�veis "cr�ticos". Na Esc�cia, por exemplo, o n�mero de doadores era o mais baixo em todo este in�cio de s�culo, segundo dados de dezembro.

 

Mas � nos Estados Unidos que o problema se converteu em uma crise nacional - e uma das mais graves da hist�ria recente, resultando em remarca��o for�ada de cirurgias, fechamento tempor�rio de centros m�dicos para novos pacientes e adiamento de tratamentos vitais.

 

A situa��o � t�o complicada que, na segunda semana de janeiro, a Cruz Vermelha americana, que fornece 40% dos hemoderivados utilizados pelos centros m�dicos do pa�s, declarou pela primeira vez na hist�ria uma "crise nacional" por falta de sangue.

 

Em comunicado com os Centros de Sangue dos Estados Unidos e a Associa��o para o Avan�o do Sangue e Bioterapias, a organiza��o humanit�ria declarou que alguns hospitais s� tinham fornecimento de certos tipos de sangue por menos de um dia, o que constitui "um n�vel perigosamente baixo".

 

"Se o suprimento n�o se estabilizar em breve, o sangue que salva vidas pode n�o estar dispon�vel para alguns pacientes quando eles precisarem", alertou a Cruz Vermelha.

 

De acordo com dados oficiais, desde mar�o do ano passado houve uma queda geral de 10% nas doa��es de sangue em todo os Estados Unidos, enquanto uma diminui��o de 62% foi relatada nas campanhas de doa��o em escolas e universidades.

 

Como explica a m�dica Emily Coberly, especialista em hematologia da Cruz Vermelha americana, desde o ano passado os hospitais t�m recebido menos sangue e, atualmente, at� um quarto da demanda hospitalar n�o pode ser atendida.

 

"Chegamos a um ponto em que os m�dicos precisam decidir todos os dias quais pacientes recebem uma transfus�o e quais n�o n�o v�o receber. E isso � de partir o cora��o", diz.


sangre
EUA vivem uma grave crise no sistema de sa�de por conta da escassez de sangue (foto: Getty Images)

"As cirurgias est�o sendo canceladas �s vezes no �ltimo minuto. H� pessoas que t�m c�ncer que precisam de uma transfus�o e est�o sendo mandadas para casa sem receb�-la. H� centros de trauma que est�o chegando ao ponto de esgotar suas reservas de emerg�ncia para casos como um paciente que chega gravemente ferido, com sangramento ap�s um acidente, ou algu�m com hemorragia p�s-parto", diz Coberly.

 

Esse foi o caso do Harbor-UCLA Medical Center, na Calif�rnia, que, no m�s de janeiro, chegou a precisar deixar de internar pacientes por mais de duas horas por falta de sangue, algo que, segundo autoridades locais, nunca tinha acontecido em 30 anos de exist�ncia do hospital.

'Uma tempestade perfeita'

Segundo Coberly, v�rias circunst�ncias coincidiram para o agravamento do problema, criando "uma tempestade perfeita".

 

"O m�s de janeiro (inverno no hemisf�rio Norte) costuma ser uma das �pocas mais dif�ceis do ano para se coletarem hemoderivados suficientes para atender �s necessidades dos pacientes. Al�m disso, doen�as sazonais, como a gripe, deixam os doadores temporariamente incapazes de doar sangue", diz ele.

 

"Desde mar�o de 2020, como resultado da covid-19 e do lockdown, vimos um decl�nio na participa��o de doadores. E tamb�m enfrentamos desafios como o cancelamentos de doa��es de sangue e limita��es de funcion�rios para execut�-las", diz a m�dica Jennifer Andrews, diretora do banco de sangue do Vanderbilt University Medical Center, � BBC News Mundo, servi�o em espanhol da BBC.

 

J� Ellen Klapper, diretora de Medicina Transfusional e Servi�os de Doa��o de Sangue do Hospital Cedars-Sinai, na Calif�rnia, acrescenta que o aumento nas infec��es pela variante �micron complicou ainda mais o cen�rio.

 

"Este �ltimo aumento de casos e a natureza generalizada das infec��es atuais realmente viraram tudo de cabe�a para baixo. E isso porque os doadores n�o est�o apenas doentes, mas podem estar em casa cuidando de familiares que est�o doentes, isolados ou em quarentena", explica.

 

Coberly ressalta que j� ocorreram outras crises por dificuldades em responder � demanda por sangue, mas as circunst�ncias fazem do momento atual um dos mais cr�ticos.

 

"� verdade que de vez em quando sentimos falta de sangue, mas temos estrat�gias para minimizar o impacto nos pacientes durante o per�odo em que a oferta � limitada ou curta, com o m�nimo de interrup��o (no fornecimento)", explica.

 

"A diferen�a agora � que a escassez � mais grave e prolongada. Foram meses sem conseguir atender a demanda hospitalar, o que levou a esta circunst�ncia realmente grave. Estamos limitando a quantidade de sangue que vai para os hospitais."


glóbulos vermelhos
Com a crise, hospitais precisam escolher qual paciente vai receber sangue (foto: Getty Images)

Andrews ressalta que a falta de sangue, juntamente com infec��es por covid entre os funcion�rios, levou seu hospital, o principal centro de trauma da regi�o de Nashville, a ser for�ado a cancelar cirurgias.

 

"A situa��o aqui � terr�vel: temos que tomar decis�es individuais sobre os pacientes n�o apenas todos os dias, mas v�rias vezes ao dia", conta.

 

Ao contr�rio de outros tratamentos em que � poss�vel mudar a estrat�gia ou o medicamento, "n�o h� alternativa ao sangue".

 

"Sou hematologista pedi�trica e, �s vezes, quando um de meus pacientes precisa de uma transfus�o de gl�bulos vermelhos, mas n�o tenho o suficiente para dar a ele, os parentes me perguntam: 'Voc� pode prescrever algo diferente?'", explica.

 

"N�o h� mais nada que eu possa prescrever, infelizmente. Ent�o eles s� precisam esperar at� que tenhamos sangue suficiente", acrescenta.

Controv�rsia

Nos EUA, o fato de que, embora as doa��es sejam volunt�rias e n�o remuneradas, distribuidores e processadores como a Cruz Vermelha vendam o sangue para hospitais � um tema frequente de discuss�o em f�runs e redes sociais.

 

Os EUA t�m uma poderosa ind�stria de plasma sangu�neo: os americanos fornecem dois ter�os do plasma usado em todo o mundo, em um mercado avaliado em US$ 24 bilh�es (R$ 131 bilh�es).

 

"A Cruz Vermelha � uma organiza��o sem fins lucrativos e n�o lucramos com a coleta de sangue de doadores volunt�rios", diz Coberly.

 

"Os hospitais nos pagam por unidades de sangue, com as quais cobrimos o sal�rio dos trabalhadores associados �s doa��es, o custo da an�lise e processamento do sangue e todo o trabalho envolvido na coleta dessas unidades", afirma.

 

Outro ponto � que as autoridades federais n�o permitem a doa��o de sangue de homens gays que tenham relacionamentos com outros homens e uma vida sexual ativa (no Brasil, o Supremo Tribunal Federal derrubou em 2020 a restri��o que proibia homossexuais de doar sangue).

 

A proibi��o nos EUA, que ainda vigora quase 40 anos ap�s o in�cio da epidemia de HIV, foi revisada no ano passado e reduziu a "quarentena" sem atividade sexual que � exigida para a doa��o de sangue. Antes, era um ano e, agora, s�o tr�s meses. Por�m, os motivos para a altera��o n�o foram muito bem explicados pela comunidade cient�fica.

 

"Certamente h� evid�ncias e raz�es cient�ficas para mudar essas regras. Pessoalmente, n�o acho que essas regulamenta��es tenham acompanhado a ci�ncia", diz Kappler.

Apelo � sociedade

Doação de sangue no Hemocentro de Brasília
Pessoas que tiveram covid-19 t�m de esperar dez dias ap�s fim de sintomas para doar sangue (foto: Rodrigo Nunes/Minist�rio da Sa�de)

Os especialistas consultados pela BBC News Mundo acreditam que a crise nos EUA pode durar semanas ou at� meses, e que pode ter um impacto grande no sistema de sa�de americano, j� enfraquecido pelo aumento de interna��es por casos de covid.

 

Klapper lembra que doar sangue � um gesto an�nimo que salva vidas.

"Vemos isso nos hospitais todos os dias. Com um gesto como esse, outra pessoa pode ser trazida de volta � vida. Damos a vida, salvamos o outro quando lhe damos um pouco do nosso sangue", diz.

 

De volta ao Brasil, outros bancos de sangue, como o Hemocentro de Bras�lia, tamb�m registraram queda de 23% nas doa��es na primeira semana de janeiro - atribu�da ao aumento nos casos de covid-19 e de influenza.

 

No ano passado, o Minist�rio da Sa�de calculou que, ao longo de 2020, primeiro ano da pandemia, as doa��es de sangue ca�ram 10% em todo o Brasil. Mas o remanejamento de bolsas de sangue entre os diversos Estados impediu que houvesse escassez, segundo a pasta.

 

Em nota em 28 de janeiro deste ano, o minist�rio afirmou que, entre janeiro e setembro de 2021 houve uma ligeira alta (de 4%) nas doa��es em rela��o ao mesmo per�odo de 2020. Mas advertiu que per�odos de f�rias, como in�cios de ano, s�o de alerta, j� que as doa��es ficam mais escassas, mas acidentes e complica��es de sa�de "n�o param de acontecer".

 

Uma �nica doa��o � capaz de salvar at� quatro vidas, informa a pasta.

"Hoje cerca de 1% a 2% da popula��o brasileira � doadora de sangue. Se dobr�ssemos isso para 4%, ficar�amos em situa��o muito mais confort�vel", diz Helena Sabino, da Funda��o Pr�-Sangue.

Como doar sangue

Para ser doador de sangue no Brasil, � preciso ter entre 16 e 69 anos e pesar a partir de 50 kg e estar em boas condi��es de sa�de (veja mais pr�-requisitos e restri��es aqui).

 

Vacinados contra a covid-19 podem doar - basta aguardar dois dias depois da dose mais recente da CoronaVac ou sete dias dos demais imunizantes.

 

Quem tem diagn�stico ou suspeita de infec��o pelo coronav�rus e apresente sintomas, mesmo que leves, s� deve doar depois de estar plenamente recuperado por dez dias.

 

Assintom�ticos que tenham testado positivo para a covid-19 tamb�m t�m de esperar dez dias. Quem teve contato com pessoas que testaram positivo devem esperar sete dias, contados a partir do �ltimo dia desse contato.

 

Em S�o Paulo, a Funda��o Pr�-Sangue tem seis postos para atender doadores (apenas sob agendamento online) na capital paulista e regi�o metropolitana. � poss�vel doar tamb�m em hospitais p�blicos e privados de todo o pa�s que tenham bancos de sangue pr�prios.

 

Com reportagem de Paula Adamo Idoeta, da BBC News Brasil, e Lioman Lima, da BBC News Mundo

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