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Estado de Minas DOM E BRUNO

'Enquanto eles matam, levantamos mais vozes', diz filha de Chico Mendes

Filha de ativista assassinado por defender a floresta, Angela Mendes diz que morte do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips fortalecer� movimento pela prote��o da Amaz�nia.


17/06/2022 09:54 - atualizado 17/06/2022 13:23


Indígena segura cartaz com ilustrações de Dom e Bruno
A ambientalista Angela Mendes v� similaridades entre a trajet�ria de seu pai e as do indigenista Bruno Pereira e do jornalista brit�nico Dom Phillips (foto: Reuters)

Filha do seringueiro Chico Mendes, assassinado em 1988 por se contrapor ao avan�o destrutivo de grileiros e fazendeiros na Amaz�nia, a ambientalista Angela Mendes v� similaridades entre a trajet�ria de seu pai e as do indigenista Bruno Pereira e do jornalista brit�nico Dom Phillips, mortos no in�cio do m�s no Amazonas.

"Eles t�m o mesmo prop�sito, a mesma causa coletiva: a luta pela preserva��o do meio ambiente e das popula��es que est�o nesse meio", diz �ngela em entrevista � BBC News Brasil.

"Se voc� considera o cen�rio de extremos ataques a essas popula��es e territ�rios, que t�m como pano de fundo a explora��o mineral, a retirada de madeira, (a cria��o do) gado, no final das contas, a realidade do Chico � a mesma que enfrentavam o Bruno e o Dom", ela afirma.

Bruno Pereira e Dom Phillips foram assassinados quando viajavam pelas proximidades da Terra Ind�gena Vale do Javari, no in�cio do m�s.

Dom, que estava escrevendo um livro sobre como salvar a Amaz�nia, visitava a regi�o para conhecer o trabalho de Bruno junto a uma associa��o ind�gena local, que vinha se contrapondo a garimpeiros, madeireiros, pescadores e ca�adores ilegais.

Segundo a pol�cia, Bruno havia sofrido amea�as por causa do trabalho — assim como tamb�m enfrentava amea�as o seringueiro Chico Mendes antes de ele ser morto em Xapuri, no Acre, em 1988.

Chico Mendes liderava um sindicato que criou a estrat�gia dos chamados "empates", nos quais seringueiros desmontavam acampamentos de pe�es contratados por fazendeiros para derrubar as matas.

Por causa das a��es, foi assassinado com um tiro de espingarda quando se preparava para tomar banho em sua pr�pria casa.


Filha e neta de Chico Mendes posam abraçadas
Ang�lica e �ngela Mendes, neta e filha do seringueiro (foto: Andr� D'Elia)

A filha do seringueiro, que tinha 19 anos quando o pai foi morto, conta que j� imaginava que Dom e Bruno pudessem ter sido assassinados quando soube do desaparecimento da dupla, na �ltima segunda-feira (06/05).

Ela lembra que o Brasil figura entre os primeiros colocados nos rankings de pa�ses onde mais ativistas ambientais s�o mortos.

"A gente sabe que, com o cen�rio que est� posto, de intenso incentivo (a crimes contra ativistas ambientais) e impunidade, o fim n�o poderia ser outro", afirma.

"Dom e Bruno se somam a muitas outras pessoas cuja morte n�o teve tanta divulga��o, mas que tamb�m fazem parte dessa terr�vel lista", diz.

Angela v� semelhan�as entre as quadrilhas que atuam no Vale do Javari, onde Dom e Bruno morreram, e as que est�o presentes na Reserva Extrativista (Resex) Chico Mendes, criada ap�s a a��o de seu pai.

A pol�cia diz suspeitar que um grupo de pescadores ilegais vinculado ao narcotr�fico esteja por tr�s das mortes de Dom e Bruno.

Na reserva Chico Mendes, diz Angela, desmatadores tamb�m "est�o agindo aliados ao narcotr�fico".

"� uma situa��o muito dif�cil para a gente, e quem est� no territ�rio est� sendo dominado, oprimido. Sabemos que pessoas nesses lugares est�o sendo amea�adas", afirma.

Ela tamb�m v� similaridades, ainda que com varia��es, entre a rela��o que o governo federal mant�m com a Amaz�nia hoje e a que mantinha nos tempos de seu pai.

Chico Mendes se tornou um ativista durante a ditadura militar, quando o governo encampava na Amaz�nia os lemas "integrar para n�o entregar" e "uma terra sem homens para homens sem terra", estimulando a ocupa��o da floresta sob o pretexto de garantir a soberania nacional sobre o territ�rio.


Retrato de Chico Mendes sorrindo em parede de uma casa
Retrato de Chico Mendes na casa que ele viveu, em Xapuri (AC) (foto: YASUYOSHI CHIBA/AFP via Getty Images)

No entanto, diz Angela, "ao chegarem aqui, os 'propriet�rios' se deparavam com uma floresta viva, cheia de gente, pessoas que vieram principalmente do Nordeste para o cultivo do l�tex, e come�aram a expulsar e matar essas pessoas, que aqui j� estavam h� 30, 40, 50 anos".

O governo atual, diz Angela, "� a interface do governo militar da ditadura".

"Seja atrav�s de suas manifesta��es, seja atrav�s dos atos, ele (governo) estimula esse estado de viol�ncia. Ele usa um c�digo que as pessoas ouvem e come�am enlouquecidamente a fazer coisas", diz a ativista.

Ela lembra o epis�dio conhecido como o Dia do Fogo, em 2019, quando fazendeiros no Par� se organizaram para queimar �reas de floresta no mesmo dia para dificultar a fiscaliza��o.

Segundo ela, o grupo se sentiu encorajado por declara��es do presidente Jair Bolsonaro cr�ticas a �rg�os de fiscaliza��o. "Esse tipo de atitude incentiva e banaliza a viol�ncia", afirma.

A BBC enviou as cr�ticas de Angela � Presid�ncia da Rep�blica, mas n�o houve resposta at� a publica��o desta reportagem.

Prote��o a ativistas

Angela afirmou que a morte de Dom e Bruno refor�a a urg�ncia da entrada em vigor, no Brasil, do Acordo de Escaz�, um tratado internacional que cria prote��es para defensores ambientais.

Assinado por 24 pa�ses caribenhos e latino-americanos, dos quais 12 j� o ratificaram, o tratado busca garantir seguran�a a quem denuncie crimes ambientais e ampliar a participa��o social em �rg�os de fiscaliza��o, entre outros pontos.

O Brasil assinou o acordo em 2018, mas ainda n�o o ratificou.

A ratifica��o do acordo, diz Angela Mendes, pode inclusive ajudar a tornar mais transparentes as investiga��es do crime contra Dom e Bruno.

Apesar da como��o gerada pela morte da dupla, ela afirma que o caso tende a fortalecer o movimento pela prote��o da floresta.

"Enquanto eles v�o matando, a gente vai vivendo e levantando mais vozes", diz.

Angela lembra a frase de um amigo de seu pai. "Ele dizia que aqueles que atiraram no Chico erraram o tiro. Pensaram que tinham matado, mas n�o mataram, porque as ideias dele est�o a�, ele continua sendo falado. E, se ele continua sendo falado, � porque ainda est� vivo".

A morte de Bruno e de Dom — assim como a da freira americana Dorothy Stang, assassinada em 2005 por defender agricultores sem-terra em Anapu (PA) — ter� efeito similar, diz ela.

"Hoje a gente tem muito mais Chicos, e com certeza teremos mais Doms, Brunos e Dorothies", afirma.

'Este texto foi originalmente publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-61835908'

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