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Estado de Minas MEIO AMBIENTE

COP 27: cerrado desmatado pode reduzir �guas nos rios em 1/3 e afetar gera��o de energia, indica estudo

Para ge�grafo brasileiro que fez o estudo, conservar o bioma � quest�o estrat�gica e de soberania nacional, pois gera��o de energia depende dos rios.


10/11/2022 05:18 - atualizado 10/11/2022 12:17


Cachoeira no Cerrado
Rios do Cerrado perderam 15,4% de sua vaz�o de �gua entre 1985 e 2018, aponta estudo (foto: Andre Dib/ISPN)

Os rios do Cerrado, respons�veis por boa parte do abastecimento h�drico e da gera��o de energia el�trica do Brasil, perderam 15,4% de sua vaz�o de �gua por causa do desmatamento e das mudan�as clim�ticas entre 1985 e 2022.

E a perspectiva de futuro n�o � nada animadora: um ter�o do volume de �guas (34%) tende a ser perdido at� 2050 caso a destrui��o do bioma continue no ritmo atual.

Essas s�o algumas das conclus�es de um estudo in�dito sobre a redu��o das vaz�es dos rios do Cerrado, realizado pelo ge�grafo Yuri Salmona, doutor em ci�ncias florestais pela Universidade de Bras�lia (UnB).

A pesquisa ser� apresentada nesta quinta-feira (10/11) na Confer�ncia das Na��es Unidas para o Clima, a COP 27, no Egito.

Oito das 12 principais bacias hidrogr�ficas brasileiras — como as dos rios S�o Francisco e Paran� — nascem no territ�rio do Cerrado, conhecido como "ber�o das �guas" e segundo maior bioma do pa�s, s� atr�s da Amaz�nia.

A pesquisa, que foi apoiada pelo Instituto Sociedade, Popula��o e Natureza (ISPN), analisou o comportamento de 81 bacias hidrogr�ficas. No total, 88% delas j� apresentam diminui��o da vaz�o de �gua causada por altera��es do uso do solo e, em menor escala, pelas mudan�as clim�ticas.

O ge�grafo mediu a recente perda e a tend�ncia para o futuro por meio de modelos matem�ticos, compilando dados hist�ricos sobre vaz�o de �gua, altera��es no uso do solo, chuvas e evapotranspira��o (ciclo de retorno da �gua � atmosfera).

Segundo ele, 56,7% da queda da vaz�o se deve a mudan�as do uso do solo no entorno dos rios, especialmente para expans�o do agroneg�cio — outros 43,3% foram causados pelas mudan�as clim�ticas no planeta.


Área de plantação de soja
Cerca de 45% da �rea desmatada do Cerrado deu lugar � agropecu�ria, como planta��o de soja (foto: Thomas Bauer/Divulga��o)

Em grande parte, a vegeta��o do Cerrado vem sendo destru�da para implanta��o de pastos ou de grandes �reas de cultivo de commodities, como a soja. Estima-se que 47% da �rea original do bioma j� foi totalmente desmatada.

"De 1985 para c�, n�s perdemos 19,7 mil metros c�bicos de �gua por segundo nas bacias analisadas, o equivalente � vaz�o do rio Paran�. � como se tiv�ssemos jogado fora o rio Paran� inteiro nesse per�odo", explica Salmona.

Para projetar a queda da vaz�o nos pr�ximos 28 anos, o pesquisador considerou os �ndices de desmatamento atuais e a tend�ncia para o futuro.

Ele levou em conta uma poss�vel queda dessa taxa — hoje entre 5 mil e 8 mil km² por ano — porque se o desmatamento continuar no ritmo atual, logo n�o haver� mais Cerrado para desmatar. "� como um homem calvo: ele j� perdeu todos os fios de cabelo com potencial para cair. Os restante n�o vai cair porque � o resto mesmo", explica.

Segundo Salmona, perder um ter�o dessas bacias significa diminuir a oferta de �gua que vai chegar nas torneiras da popula��o, pois os rios que nascem no Cerrado abastecem dezenas de milh�es de pessoas no pa�s.

Outra consequ�ncia � a gera��o de energia el�trica.

"Menos �gua significa que vamos gerar menos energia el�trica nas usinas. Conservar o Cerrado � uma quest�o estrat�gica e de soberania nacional", diz o ge�grafo, cujo estudo foi apresentado no programa de doutorado da UnB, na semana passada.

Das bacias analisadas, Salmona destaca tr�s rios cujo volume de �gua est� caindo com o avan�o do agroneg�cio em seu entorno: o rio da Corda, no Maranh�o, e os rios Arrojado e Ondas, ambos na Bahia.

No primeiro, o volume diminuiu 25% de 1985 a 2022 — ou seja 391,5 metros c�bicos por segundo.

De acordo com o ge�grafo, 74% desse valor teve como causa a substitui��o da vegeta��o original do entorno para dar lugar a pastagens, produ��o de commodities e �reas urbanas. Para os pr�ximos 28 anos, as proje��es indicam uma perda 56% do tamanho atual do rio da Corda.

No oeste baiano, a situa��o � parecida.

Os rios de Ondas e Arrojado registraram diminui��o do volume de �gua em 25% e 18,2%, respectivamente. E a tend�ncia � que o primeiro v� perder 56% da �gua at� 2050; e o segundo, 36,2%.

"As comunidades que vivem nessas �reas j� est�o sentindo os efeitos em seu modo de vida com a diminui��o da �gua, algumas s� conseguem ficar em per�odos de cheia. J� existe o que chamamos de 'guerra da �gua', com grupos econ�micos controlando o acesso � �gua enquanto a popula��o sofre com a escassez", explica Salmosa.

Em entrevista recente � BBC News Brasil, o bi�logo Reuber Brand�o, professor de manejo de fauna e de �reas silvestres da UnB, afirmou que nascentes de alguns rios no oeste da Bahia, como o Formoso e o Arrojado, recuaram v�rios quil�metros em virtude do avan�o do agroneg�cio.

"Conhe�o veredas cujas nascentes recuaram mais de 10 quil�metros em rela��o � original. Essas �reas, que tinham a presen�a de corpos aqu�ticos na paisagem, passaram a ser muito mais secas", disse.

"Isso tem um impacto muito grande sobre fauna e flora, porque as plantas que precisam ter contato com a �gua do solo sofrem um estresse h�drico e come�am a morrer. J� a fauna foge para procurar �gua", completou.

Irriga��o de soja

Al�m do desmatamento, boa parte da �gua do Cerrado � utilizada para irriga��o de produtos agr�colas, principalmente a soja. Essa �gua � retirada do solo com autoriza��o do Estado, por meio de outorgas previstas na lei.

Ela � utilizada nos chamados piv�s centrais, c�rculos de irriga��o com uma lan�a de 150 metros.

Uma reportagem da Ag�ncia P�blica de 2021 apontou que, apenas no oeste baiano, o agroneg�cio capta 1,8 bilh�o de litros de �gua por dia de maneira gratuita para irriga��o, com autoriza��o do governo do Estado.

Esse volume seria o suficiente para abastecer cerca de 11,8 milh�es de brasileiros. Parte dessa �gua � retirada por meio de barramentos em riachos e veredas, al�m da capta��o direta de rios e de po�os.

"O agroneg�cio est� inviabilizando seu pr�prio modelo ao desmatar e utilizar a �gua dessa maneira sem controle externo, porque ele depende da �gua para funcionar. N�o estamos apenas exportando soja, mas exportando �gua. E se a �gua acabar, o que vai acontecer? � a cobra comendo o pr�prio rabo", diz Salmona.


Áreas de plantação de soja ao lado do rio Formoso, na Bahia. Os círculos são pontos com pivô central de irrigação
�reas de planta��o de soja perto do rio Formoso, no oeste da Bahia. Os c�rculos s�o pontos com piv�s centrais de irriga��o (foto: Google)

Biodiversidade do Cerrado

O Cerrado � a savana com maior biodiversidade no planeta, com cerca de 14 mil esp�cies de plantas, al�m de uma rica fauna.

Segundo o Sistema de Detec��o de Desmatamento em Tempo Real (Deter), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o bioma perdeu 4.091,6 km² para o desmatamento entre janeiro e julho deste ano, alta de 28,2% em rela��o ao mesmo per�odo do ano passado.

Os dados mostram que os Estados que mais desmataram est�o na regi�o conhecida como Matopiba — principal fronteira de expans�o agr�cola no pa�s: Maranh�o, Tocantins, Piau� e Bahia.

De acordo com o MapBiomas, plataforma que monitora o uso do solo no Brasil, 45,4% do Cerrado j� foi destru�do para dar lugar � agropecu�ria.


Área de Cerrado recém-incendiada
Segundo o MapBiomas, mais de 45% do Cerrado j� foi destru�do para dar lugar � agropecu�ria (foto: Ag�ncia Brasil)

Alguns estudiosos do bioma, como Yuri Salmona e Reuber Brand�o, defendem que a economia brasileira teria mais benef�cios se investisse em ci�ncia e tecnologia desenvolvidas a partir da abundante biodiversidade do Cerrado do que com o atual modelo centrado em monoculturas e produ��o de commodities para exporta��o.

"Hoje o Brasil est� destruindo o potencial econ�mico de 14 mil esp�cies, que poderiam movimentar a ind�stria de cosm�ticos, por exemplo, para focar na produ��o de tr�s esp�cies: soja, capim e eucalipto", diz Salmona.

J� Brand�o acredita que produtos de v�rios setores poderiam ser desenvolvidos.

"O Cerrado tem um potencial de biodiversidade gigantesco. Seja para bioprodutos tecnol�gicos, como colas, ou para aliment�cios, cosm�ticos e medicamentos, como analg�sicos. H� prote�nas do veneno da jararaca, por exemplo, com valor econ�mico enorme. Ou a grande quantidade de palmeiras e castanhas que nunca foram estudadas", explicou.

- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-63562381


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