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Estado de Minas GERA��O DE ENERGIA

O drama dos agricultores que vivem embaixo de parque e�lico

Em Caet�s (PE), fam�lias relatam consequ�ncias da instala��o de parques e�licos perto de suas casas, como problemas de audi��o e aumento da medica��o para ins�nia e ansiedade. Empresas respons�veis pelos parques afirmam que est�o dentro das normas e que buscam reduzir os impactos para popula��o local


14/08/2023 07:49 - atualizado 14/08/2023 09:36
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torres eólicas em zona rural de Caetés
Dois parques e�licos t�m literalmente tirado o sono de agricultores de Caet�s (foto: Vitor Serrano/BBC)

A energia e�lica virou um grande problema em Caet�s, cidade de 28 mil habitantes a 245 km do Recife, conhecida principalmente como local de nascimento de um brasileiro ilustre: o presidente da Rep�blica, Luiz In�cio Lula da Silva (PT).

Em 2014, dois parques de gera��o de energia, que totalizam 220 torres na zona rural do munic�pio no agreste de Pernambuco, foram instalados nas comunidades rurais de Sobradinho e Pau Ferro.

Eles se transformaram em um teste de resist�ncia para um grupo de 120 fam�lias de pequenos agricultores que vivem bem perto delas — em alguns casos, a cerca de 150 metros — por conta do barulho alto e ininterrupto produzido pelos aerogeradores em uma �rea acostumada ao sil�ncio da ro�a e ao som dos animais da caatinga.

“Voc�s que v�m de fora e est�o filmando elas, � bonito. Mas venham morar debaixo delas para voc� ver o barulho por 24 horas, dia e noite. � esse zupo, zupo, zupo… Precisa a pessoa ser forte, forte de Deus, n�o � de carne e feij�o, n�o”, diz Ac�cio Noronha, que vive em um s�tio de apenas um hectare desde que nasceu, h� 64 anos.

A BBC News Brasil visitou a regi�o para entender melhor o que est� acontecendo ali.

Os moradores relatam que as torres, com 120 metros de altura e h�lices de 50, fomentam ansiedade, ins�nia e depress�o, o que fez com que muitos ali come�assem a tomar ansiol�ticos. Tamb�m falam dos sustos causados pelas sombra das h�lices, divis�o de fam�lias e a sa�da for�ada de suas fazendas.

As duas comunidades ficam a cerca de 10 km da r�plica da casa de Dona Lindu, m�e de Lula. A casinha original, de taipa, desmoronou com a chuva. Quando Lula nasceu, Caet�s ainda era um distrito de Garanhuns — por isso, o presidente costuma dizer que nasceu ali. S� em 1963, ela se emancipou.

Al�m das hist�rias antigas e orgulhosas, em Caet�s fala-se bastante do petista tamb�m em tom de preocupa��o.

Isso porque o governo Lula anunciou para os pr�ximos anos um investimento de R$ 50 bilh�es na chamada transi��o energ�tica, que pretende substituir gradualmente combust�veis f�sseis por recursos renov�veis e com menos impactos ambientais, como energia e�lica e solar.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), tamb�m anunciou um "plano verde", conjunto de investimentos em pol�ticas ambientais, que tamb�m tem como um dos focos a energia e�lica.

Hoje, existem 890 desses parques no Brasil, respons�veis por 13% de toda energia el�trica gerada. At� o fim do ano, a expectativa do setor � chegar a mil usinas.

O receio de ativistas e pesquisadores � que o modelo implantado em Caet�s se espalhe para outras cidades que hoje s�o alvo do interesse das empresas.


Réplica da casa de dona Lindu, mãe de Lula, na zona rural de Caetés
R�plica da casa de dona Lindu, m�e de Lula, na zona rural de Caet�s (foto: Vitor Serrano/BBC)

Moradores de Sobradinho e Pau Ferro est�o viajando a cidades do Nordeste para apresentar sua experi�ncia e convencer agricultores a n�o cederem suas terras.

No caminho inverso, moradores de outros munic�pios fazem excurs�es a Caet�s para ouvir os relatos.

Nos �ltimos meses, esse movimento de resist�ncia �s e�licas deu resultado em pelo menos um local: moradores de Borborema, na Para�ba, desistiram de ceder suas terras para a instala��o de parques na cidade.

A Associa��o Brasileira de Energia E�lica (Abee�lica), que representa as empresas do setor, reconhece os problemas de Caet�s, e diz que os dois parques n�o s�o um exemplo a ser replicado, porque foram constru�dos sob uma regula��o antiga.

As empresas respons�veis pelos parques afirmam que est�o dentro das normas e que est�o em contato com os moradores e tomando medidas para reduzir os impactos para a popula��o local (veja mais detalhes abaixo).

A BBC News Brasil procurou os minist�rios de Minas e Energia e Meio Ambiente para tratar do assunto, mas n�o obteve resposta.

'O barulho fica no meu ouvido'

Eleitor de Lula, com uma toalha do presidente pendurada na fachada de casa, Ac�cio Noronha mora em tr�s c�modos a 150 metros de quatro torres instaladas na fazenda de vizinhos, em Sobradinho.

O barulho, diz ele, aumenta ou diminui a depender da for�a do vento e do hor�rio.

“Voc� n�o dorme, n�o tem aquele prazer de deitar e descansar. Quando cochila, acorda assustado, achando que ela vai cair. Tem hora que parece um apito, cachorro latindo, um avi�o que nunca decola”, conta Ac�cio.

Ac�cio � um dos moradores que come�aram a tomar rem�dios para ins�nia e ansiedade. “Se estou nervoso, o barulho s� piora”, diz.


Acácio Noronha dentro de carro
O agricultor Ac�cio Noronha vive a 150 metros de quatro torres, em Sobradinho (foto: Vitor Serrano/BBC)

Alguns metros � frente, em uma casa tamb�m rodeada por aerogeradores, a dona de casa Edna Pereira, de 44 anos, diz tomar quatro rem�dios para dormir, al�m de outros para controlar a ansiedade e a dor de cabe�a.

“Os m�dicos est�o aumentando os miligramas. O rem�dio para dor de cabe�a era de 25 miligramas, agora � de 100. O para ansiedade era de 10, agora � de 150. O rem�dio para dormir era s� um, agora s�o quatro. E, mesmo assim, n�o consigo dormir”, diz Edna, segurando uma caixa onde guarda os medicamentos.

Edna costuma ir para a casa da filha, fora da comunidade, para tentar “um al�vio para minha cabe�a”, diz.

“S� que fica o barulho delas dentro do meu ouvido. Posso ir para onde eu for, que o barulho fica no meu ouvido. N�o sai, n�o sai.”


Edna Pereira em frente a sua casa
Edna Pereira conta ter aumentado a medica��o para ins�nia e ansiedade (foto: Vitor Serrano/BBC)

'N�o est�o conseguindo mais ouvir'

Os relatos sobre problemas de sa�de chamou a aten��o de m�dicos e cientistas do agreste. � o caso de Wanessa Gomes, professora de Sa�de Coletiva da Universidade de Pernambuco (UPE), que tem um campus em Garanhuns.

Nos �ltimos meses, ela e seus orientandos da p�s-gradua��o iniciaram uma pesquisa, al�m de uma resid�ncia m�dica, para tentar medir o impacto das torres na sa�de da comunidade.

O estudo, que vai durar tr�s anos, � financiado pela UPE e pela Fiocruz.

“H� relatos fortes de que as pessoas n�o est�o mais conseguindo ouvir como antes. Hoje mesmo, uma senhora contou que n�o dialoga mais com o filho dentro de casa, porque n�o consegue mais escut�-lo. E n�o � uma mulher com idade avan�ada, ela tem 52 anos”, conta a professora.

"Em Caet�s, as casas est�o a 150 metros de uma torre e�lica. � muito pouco.”

Como a tecnologia e�lica da forma como conhecemos hoje � relativamente recente — tem cerca de 25 anos —, n�o h� muitos estudos cient�ficos sobre seus impactos.

Alguns apontam para a rela��o entre ru�dos, ins�nia e perda auditiva, mas h� pesquisas que divergem desse diagn�stico.

Na Holanda, por exemplo, alguns pesquisadores afirmaram que os ru�dos n�o causam problemas de sa�de mental, mas, logo depois, outro grupo de cientistas contestou essa conclus�o, afirmando que h� muitos ind�cios de preju�zos � sa�de, al�m de apontar que a pesquisa inicial havia sido bancada por empresas de energia e�lica.

A quest�o da dist�ncia ideal entre os aerogeradores e as casas tamb�m vem sendo discutida em v�rios pa�ses em um momento em que a transi��o energ�tica foi apontada como uma das solu��es para frear a emiss�o de gases de efeito estufa.

A Pol�nia, por exemplo, estabeleceu um m�nimo de 400 metros, e a Fran�a, de 700.

No ano passado, ap�s uma s�rie de protestos, o Conselho de Estado da Holanda, mais alto conselho administrativo do pa�s, suspendeu a constru��o de um parque e�lico e solicitou mais estudos sobre poss�veis consequ�ncias ambientais e na sa�de mental das pessoas que vivem a cerca de 600 metros de onde as torres seriam instaladas.


Torres eólicas na comunidade de Sobradinho
Sobradinho � uma das comunidades onde foram instalados os parques e�licos (foto: Vitor Serrano/BBC)

No Brasil, a executiva Elbia Gannoum, presidente da Associa��o Brasileira de Energia E�lica (Abee�lica), reconhece os problemas de Caet�s. Ela classifica os parques da cidade como “antigos, constru�dos antes da regula��o que prev� um distanciamento de 400 metros entre torres e resid�ncias.”

“No Brasil, os grandes parques sa�ram a partir de 2011. E n�s temos alguns que chamamos de mais antigos, que foram constru�dos no modelo regulat�rio distinto do atual”, explica Gannoum.

“� importante saber que a energia e�lica �, sim, uma fonte limpa, renov�vel, que vai ser importante para a transi��o energ�tica. Mas tem algumas coisas que n�s chamamos de passado que precisam ser resolvidas.”

Os dois parques de Caet�s passaram pela m�o de v�rias empresas desde a instala��o, em 2014.

Essas mudan�as s�o comuns em um setor em franco crescimento e com fus�es entre companhias, incluindo empresas estrangeiras.


Elbia Gannoum em seu escritório decorado com imagens de torres eólicas
Elbia Gannoum, da Abee�lica, afirma que parques de Caet�s s�o 'antigos' (foto: Vitor Serrano/BBC)

Atualmente, os parques de Pau Ferro e Sobradinho pertencem �s empresas Echoenergia e AES Brasil.

A primeira, que assumiu Pau Ferro em 2017, afirma que, ap�s ouvir as queixas, realizou estudos na regi�o.

Diz que a “press�o sonora” das torres � de aproximadamente 40 decib�is (equivalente ao barulho de um freezer). Segundo a empresa, isso est� dentro das normas previstas para uma zona predominantemente residencial.

Alguns moradores disseram � reportagem, no entanto, que fizeram medi��es pr�prias que chegaram a mais de 100 decib�is e que a intensidade do ru�do varia ao longo do dia e de acordo com o vento.

A Echoenergia tamb�m diz ter investido R$ 25 milh�es em melhorias de estrutura e ac�stica das casas de 129 fam�lias, mas que um grupo de moradores n�o aceitou as reformas.

J� a AES Brasil, que assumiu Sobradinho em novembro de 2022, afirma que “vem mantendo di�logo permanente com os representantes da comunidade em busca de uma solu��o que priorize o bem-estar e a seguran�a de todos”.

Terra dividida

A zona rural de Caet�s � dividida em pequenas propriedades na caatinga.

Por volta de 2012, as empresas procuraram agricultores que aceitassem arrendar suas terras para a instala��o dos aerogeradores. Esse modelo � o mais comum no ramo.

Quem aceitou passou a receber 1,5% do valor da energia gerada em cada torre, cerca de R$ 2 mil mensais.

Essas pessoas, que melhoraram consideravelmente de renda com isso, sa�ram de suas terras e foram viver na zona urbana.

A reportagem tentou conversar com algumas delas, mas o termo assinado com as empresas exige “confidencialidade” sobre o assunto.

A BBC News Brasil teve acesso a dois contratos oferecidos a agricultores por duas empresas diferentes em cidades do Nordeste.

Al�m de autorizar a transfer�ncia do terreno para outra empresa sem a necessidade do aval do propriet�rio, um dos documentos afirma que o contrato tem dura��o de 49 anos e informa que s� pode ser rescindido pelo agricultor em “comum acordo” com a companhia.


agricultor trabalhando com torres ao fundo
A zona rural de Caet�s � dividida em pequenas propriedades de terra (foto: Vitor Serrano/BBC)

Por outro lado, as empresas t�m o direito de quebrar o contrato a qualquer momento, sem custos, se o im�vel tiver algum problema que atrapalhe a produ��o.

Outro documento afirma que, caso o propriet�rio descumpra obriga��es que tenham for�a para rescindir o contrato, como o pagamento de taxas e impostos, a empresa pode cobrar uma multa de 30 vezes o valor recebido por ano pela energia gerada.

Ou seja, essa multa pode chegar a milh�es de reais e ser superior ao valor do pr�prio im�vel.

Para Jo�o do Valle, ativista da Comiss�o Pastoral da Terra (CPT) e diretor do document�rio Vento Agreste, o modelo de Caet�s � um “latif�ndio e�lico, no qual as empresas n�o compram a terra, mas tomam posse dela por d�cadas.”

“A gente n�o � contra a energia e�lica. E, sim, contra esse padr�o trazido ao Nordeste, porque ele se baseia na expuls�o de agricultores, viol�ncia contra a natureza, adoecimento, divis�o de fam�lias e comunidades”, diz Jo�o, que junto � CPT e ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), tem organizado excurs�es de camponeses a Caet�s.

J� �lbia Gannoum, da Abee�lica, reconhece as reclama��es sobre os contratos, e diz que o modelo precisa ser revisto.

“Um parque tem uma estimativa de durar 25 anos, ent�o � normal que os contratos sejam longos. Mas, de fato, existem cl�usulas que n�o fazem sentido para um pequeno agricultor que tem uma ou duas torres, porque ele fica muito tempo preso ao contrato. Estamos discutindo um modelo que seja melhor para os dois lados”, diz.

O prefeito de Caet�s, Nivaldo Martins (Republicanos), afirma que, no geral, a chegada das e�licas levou mais benef�cios do que problemas � cidade.

“Tem fam�lias que t�m seis torres… Vamos dizer que ela receba R$ 2 mil por cada uma. S�o R$ 12 mil por m�s”, diz. “Os parques tiveram um impacto importante na renda da cidade. As pessoas pegaram esse dinheiro e fizeram constru��es aqui, ou compraram casas prontas e vieram viver na zona urbana.”

O prefeito, cujo gabinete � decorado com imagens de torres e�licas, afirma que as empresas “n�o explicaram direito” aos moradores quais seriam os impactos na sa�de e que a Secretaria da Sa�de do munic�pio tem prestado atendimento �s comunidades.

Tamb�m diz que a prefeitura n�o teve participa��o nas negocia��es com as empresas nem tem direito a royalties pela energia gerada — recebe apenas impostos indiretos.


Prefeito Nivaldo Martins
O prefeito de Caet�s, Nivaldo Martins, diz que e�licas s�o ben�ficas � cidade (foto: Vitor Serrano/BBC)

Identidade perdida

Um dos casos da sa�da da zona rural � o de Sim�o Salgado, de 74 anos, que deixou seu s�tio de 33 hectares em Pau Ferro, comprado em 2008, para viver no centro de Caet�s.

Mas o caminho dele � diferente dos vizinhos que cederam suas terras. Ele n�o deixou suas terras porque sua renda aumentou, mas porque n�o conseguiu mais viver perto das torres.

“A gente vivia com muita tranquilidade, minha propriedade era refer�ncia em agricultura familiar e na preserva��o da caatinga. Com a chegada dos parques, a gente deixou de receber visitas, de produzir, e ultimamente, tive que me afastar”, diz.

“Minha mulher teve um s�rio problema de sa�de, entrou em uma depress�o, em uma ansiedade…Da� um dia, ela me disse: ‘voc� vai esperar que eu morra para me tirar daqui?’ N�o tive escolha.”

Para Sim�o, o afastamento impactou sua no��o de identidade. “Eu me identificava como agricultor, trabalhador e produtor do semi�rido. Hoje, sinto uma tristeza muito grande.”


Simão Salgado
Sim�o Salgado deixou seu s�tio ap�s pedido da esposa: 'N�o tive escolha' (foto: Vitor Serrano/BBC)

Seu filho, Jos� Salgado, de 41 anos, resolveu ficar. Mas, cercado por 11 torres da fazenda vizinha, diz que est� mudando de ideia.

“Quando desligam os geradores, eu continuo com o barulho na mente. Tanto faz se eles est�o funcionando ou n�o, continuo escutando o zumbido. Comecei com rem�dios para dormir, mas desisti porque n�o queria ficar viciado”, explica.

Como muitos em Caet�s, Jos� diz n�o ser contra a e�lica. “Sou a favor, por�m, sou contra a forma como ela foi jogada dentro da casa das fam�lias. E, a depender das empresas, a gente vai ter que escolher entre viver no sofrimento ou correr. E onde vou tirar meu sustento? Eu tiro da ro�a, da terra, do gado, dos animais.”

Para o prefeito Nivaldo Martins, a solu��o para os moradores � a judicializa��o. Houve poucos processos at� agora, e eles ainda est�o em andamento.

“Acho que o ideal seria eles procurarem a Justi�a e tentar negociar uma �rea maior com as empresas… Receber alguma coisa e comprar terras numa �rea mais distante”, diz.

“Ou ent�o construir dentro do pr�prio terreno deles, tem gente que tem uma �rea grande de terra. Voc� tira sua casa ali de perto, constr�i distante. Acho que vai ajudar bastante.”


agricultor José Salgado em frente a torres
O agricultor Jos� Salgado convive diariamente com o barulho de 11 torres (foto: Vitor Serrano/BBC)

'Vai cair em cima de n�s'

Enquanto os agricultores que cederam seus s�tios melhoraram de renda, quem ficou embaixo das torres vive essencialmente do Bolsa Fam�lia e da produ��o agr�cola.

Em Sobradinho, h� casos de fam�lias que nunca mais se falaram depois da instala��o dos parques: uma parte saiu da ro�a com o dinheiro, enquanto a outra, que ocupa o terreno ao lado, sofre as consequ�ncias dessa escolha.

J� o medo das torres afeta essas fam�lias at� na hora de plantar.

“Funcion�rios da manuten��o nos disseram que h� cabos el�tricos no solo e que h� risco de descargas el�tricas. Ent�o, a gente n�o planta mais como antes”, diz Roselma Oliveira, de 35 anos, que se tornou a principal lideran�a dos agricultores de Sobradinho.

A empresa AES Brasil, respons�vel por Sobradinho, afirma que atualmente toda a transmiss�o de energia � feita por linhas a�reas.

Neste ano, Roselma viajou a outras cidades do Nordeste para falar dos impactos na comunidade, e diz ter se encontrado, em Bras�lia, com ministros do governo Lula, como Alexandre Silveira, de Minas e Energia, e Marina Silva, do Meio Ambiente.

As pastas n�o responderam aos questionamentos da BBC News Brasil.

No ano passado, a fam�lia de Roselma passou por um susto.

“A gente estava em casa �s 6h da manh�. De repente, uma explos�o. Meu marido disse ‘corre, tira as crian�as que a torre t� caindo no telhado, vai cair em cima de n�s”, conta ela, que gravou um v�deo do momento em que h�lice se soltou e caiu a poucos metros de sua casa.

Ningu�m ficou ferido, mas a fam�lia diz que ficou traumatizada.


Roselma com torre ao fundo
No ano passado, a h�lice de uma das torres pr�ximas � casa de Roselma Oliveira se desprendeu, assustando a fam�lia (foto: Vitor Serrano/BBC)

A alguns quil�metros dali, em sua casa em Pau Ferro, o antrop�logo Alexandre Gomes Vieira, de 30 anos, tamb�m registra acidentes, mas, no caso dele, envolvendo p�ssaros nativos da caatinga que se chocam contra as torres.

H� alguns anos, Alexandre, que herdou de seu bisav� um pequeno s�tio, resolveu pesquisar os impactos ambientais e sociais das e�licas em seu mestrado e doutorado na UFPE.

“Constatamos que muitas aves, como gavi�es, �guias e codornas s�o atra�das pelas h�lices e acabam colidindo com as torres, diminuindo a incid�ncia de esp�cies que j� s�o raras. Os agricultores relatam que n�o ouvem mais o canto de alguns p�ssaros, como o acau� e a m�e da Lua, que t�m uma simbologia religiosa”, explica.

Segundo o antrop�logo, que faz parte de um grupo de pesquisadores que estuda os impactos da energia e�lica, parte da vegeta��o da caatinga foi suprimida para a constru��o de estradas para a passagens de ve�culos durante a instala��o e, agora, para manuten��o dos parques.


Antropólogo Alexandre Gomes Vieira em sua casa
O o antrop�logo Alexandre Gomes Vieira passou a pesquisar os impactos das e�licas nas comunidades de Caet�s (foto: Vitor Serrano/BBC)

A 'resta'


Sombra das torres
A sombra das torres pode aparecer como miniatura ou com v�rios metros, como nessa imagem (foto: Vitor Serrano/BBC)

Um dos fen�menos vis�veis das e�licas em Caet�s � a "resta", como os agricultores chamam a sombra das torres.

A depender do hor�rio, a sombra das h�lices aparecem em v�rios lugares. �s vezes, ela � bem pequena, e forma o desenho de uma torre em miniatura, girando devagar na parede de alguma casa; em outros momentos, � bem maior e gira rapidamente, cobrindo v�rios metros de um pasto cheio de animais.

Os moradores de Caet�s dizem que a “resta” piora a ansiedade deles, provoca sustos e deixa os animais inquietos.

Esse fen�meno foi descrito por alguns pesquisadores como “efeito estrobosc�pico”. H� estudos cient�ficos divergentes sobre se ele pode ou n�o causar problemas de sa�de.

De toda forma, a “resta” aparece em v�rios momentos do dia na casa de Ac�cio Noronha. “Estou deitado de manh�, tentando dormir, a� vejo um vulto assim. Olha ela ali de novo...”, diz.

Ac�cio � um dos agricultores que pretendem entrar na Justi�a para receber alguma indeniza��o que o ajude a sair de Sobradinho depois de viver a vida inteira ali.

Com os geradores nos fundos, ele se orgulha de dizer que “Lula nasceu no s�tio Riacho Fundo de Caet�s, em uma casa de taipa, comendo beiju de massa”.

E conta o que falaria ao presidente caso ele aparecesse em Sobradinho: “Se eu tivesse a liberdade de estar em uma reuni�o com ele, e eu n�o estivesse muito emocionado e nervoso como estou agora, eu s� diria assim: ‘Homem, d� um jeito de tirar n�s. N�s, a popula��o da nossa comunidade, estamos debaixo dessas torres'”.


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