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Estado de Minas VIOL�NCIA

Mil�cias no Rio: os fatores que acirram a disputa na zona oeste da cidade

Quase 30 �nibus foram queimados na regi�o em repres�lia de criminosos � morte de um miliciano; antes rivais, grupos do narcotr�fico e mil�cias agora se aliam pelo controle de comunidades


23/10/2023 18:30 - atualizado 23/10/2023 18:30
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Câmera de segurança da Polícia Militar do Rio mostra um dos ônibus incendiados na zona oeste da cidade nesta segunda (23/10)
C�mera de seguran�a da Pol�cia Militar do Rio mostra um dos �nibus incendiados na zona oeste da cidade nesta segunda (foto: PMRJ)
A zona oeste do Rio de Janeiro vive nesta segunda-feira (23/10) mais um epis�dio dos violentos confrontos de grupos criminosos com a pol�cia ou entre si pelo dom�nio da regi�o.

 

Quase 30 �nibus, em diferentes pontos da zona oeste, foram alvos de inc�ndios criminosos e levaram a capital fluminense ao "est�gio de mobiliza��o" — quando h� riscos de ocorr�ncias de alto impacto na cidade.

 

Os inc�ndios teriam sido provocados por criminosos em repres�lia � morte de Matheus da Silva Rezende durante troca de tiros com agentes, tamb�m nesta segunda. Conhecido como Faust�o ou Teteu, ele era sobrinho de Zinho, chefe de uma das principais mil�cias da regi�o.

 

Leia: Rio de Janeiro: ao menos 27 �nibus s�o incendiados ap�s morte de miliciano 

 

O governador do Rio, Cl�udio Castro (PL), parabenizou no X, antigo Twitter, policiais pela pris�o do sobrinho de Zinho, mas n�o citou sua morte.

Segundo o jornal O Globo, Faust�o era considerado o segundo homem na hierarquia da mil�cia e que seria o principal encarregado nas disputas entre bandos rivais na zona oeste.

Sem distin��o entre mil�cia e tr�fico

Segundo a pol�cia, j� n�o h� mais distin��o entre mil�cia e tr�fico, porque ambos imitam os "modelos de neg�cio" um do outro — o que pode ter sido um motor para a escalada de mortes e outros crimes violentos na �rea nos �ltimos meses.

 

O Comando Vermelho (CV), fac��o criminosa originalmente focada no tr�fico de drogas, agora se alia a milicianos da zona oeste pelo controle de comunidades na regi�o.

 

Ter o dom�nio da �rea significa poder explorar o com�rcio ilegal de drogas e de produtos e servi�os, como a venda de g�s de botij�o, acesso � internet, transporte por van e outros — agora feito por milicianos e traficantes, indistintamente.

 

Neste m�s, outros epis�dios relacionados � intensifica��o desses conflitos na zona oeste est�o o triplo assassinato de m�dicos na orla da Barra da Tijuca, no come�o do m�s, e o desvio de armamentos de um arsenal do Ex�rcito em S�o Paulo, na semana passada.

 

Segundo a Pol�cia Civil, as armas furtadas dos militares provavelmente seriam usado na disputa pelo controle territorial de favelas da regi�o que ocorre h� mais de um ano e meio.

 

Na disputa em que o armamento do Ex�rcito seria usado est� uma narcomil�cia da Gard�nia Azul agora aliada ao CV.

 

Foi no bairro que foram encontrados mortos quatro suspeitos da chacina de tr�s m�dicos de S�o Paulo no dia 5 de outubro.

 

A execu��o teria sido ordenada pela c�pula do CV, de acordo com a pol�cia, porque a a��o n�o atingiu o seu objetivo, a elimina��o de um rival, e chamou a aten��o para as atividades na regi�o.

 

A Pol�cia Civil afirma que sua principal linha de investiga��o � a de que um engano causou o ataque com as mortes dos ortopedistas Diego Ralf Bonfim, irm�o da deputada federal S�mia Bonfim (PSOL-SP), Marcos de Andrade Corsato e Perseu Ribeiro de Almeida, al�m de ferimentos graves no tamb�m m�dico Daniel Proen�a.

 

Perseu teria sido confundido com Taillon Barbosa, um miliciano rival dos autores da chacina, e que foi recentemente solto da pris�o.

 

Os quatro m�dicos bebiam em um quiosque na cal�ada oposta ao Hotel Windsor, onde estavam hospedados para um congresso de ortopedia.

Um salto nos crimes violentos na zona oeste

Esse conflito entre grupos criminosos gerou nos �ltimos meses uma escalada de mortes e outros casos violentos na �rea. Os efeitos j� aparecem nas estat�sticas de viol�ncia.

 

Um levantamento do Instituto Fogo Cruzado apontou que, de 1° de janeiro at� 12h de 20 de outubro de 2023 (quando a contagem foi encerrada), ocorreram na zona oeste carioca:


  • 241 mortos em homic�dios (129,5% sobre os 105 do mesmo per�odo de 2022)
  • 13 chacinas com 47 mortos (291,6% a mais que os 12 em 4 massacres no ano anterior)
  • 728 tiroteios (55,88% a mais que os 467 do ano passado)

Em compara��o, a zona sul, a mais rica do munic�pio, registrou, no mesmo per�odo:


  • 6 mortos em homic�dio (o dobro do ano anterior)
  • nenhuma chacina, como foi em 2022
  • 47 tiroteios (menos 4 casos, queda de 8,51% sobre os 51 de 2022)


Mapa mostra controle em diferentes áreas do Rio de Janeiro
Mapa mostra controle em diferentes �reas do Rio de Janeiro (foto: Geni uff e Fogo Cruzado)

 

"As disputas na regi�o explodiram ap�s a morte do Ecko (Wellington da Silva Braga), chefe da principal mil�cia, em junho de 2021", afirma o Instituto Fogo Cruzado em texto sobre o levantamento.

 

"O irm�o dele, Zinho [Luiz Carlos da Silva Braga], e um ex-aliado, Tandera [Danilo Dias Lima], passaram a disputar bairros. Com a mil�cia fragilizada, o Comando Vermelho passou a tentar tomar as �reas. A disputa em Jacarepagu� [zona oeste do Rio] � uma das mais cr�ticas.”

 

Segundo Carlos Nhanga, coordenador regional do Fogo Cruzado, a disputa entre esses grupos na zona oeste do Rio n�o come�ou agora, mas se intensificou pela entrada de novos atores na disputa pelos territ�rios.

 

“Antes, era dominado por uma mil�cia”, afirma ele.

 

“Hoje, tem fac��es do tr�fico entrando. A morte do Ecko gerou um novo cen�rio. N�o existe v�cuo de poder. Determinadas a��es [como a morte do antigo chefe da mil�cia] t�m consequ�ncias, pelos dados hist�ricos do Rio de Janeiro.”

 

O pesquisador Daniel Hirata, do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (Geni-UFF), diz que as mortes violentas na regi�o de Jacarepagu� e Barra da Tijuca afetaram os indicadores gerais de viol�ncia do Sudeste e do pa�s.

 

Segundo o Monitor da Viol�ncia do G1, os homic�dios ca�ram 3,4% no Brasil no primeiro semestre de 2023, em compara��o com o mesmo per�odo do ano passado.

 

A queda se deu em quase todas as regi�es. E o exce��o foi o Sudeste, onde os assassinatos cresceram. Na regi�o, o maior aumento ocorreu justamente no Rio de Janeiro: 17,3%.

 

“Os dados de 2022 e 2023 mostram que tivemos uma revers�o da tend�ncia nacional no Sudeste, que foi afetada pelo Rio”, diz ele.

 

“E quando olhamos, vemos que o aumento se deu mais na zona oeste da capital e em alguns munic�pios da Baixada Fluminense.”


reflexo de homem armado e homem em moto
Segundo a pol�cia, armamento furtado dos militares provavelmente seria usado na disputa pelo controle territorial (foto: Getty Images)

Liga da Justi�a

A maior mil�cia do Rio, ent�o chamada de Liga da Justi�a come�ou a atuar h� pelo menos 15 anos dizendo que tinha o objetivo de combater o avan�o do tr�fico de drogas.

 

A organiza��o criminosa foi criada por policiais que expulsaram traficantes e dominaram bairros da regi�o. Policiais civis e militares, bombeiros, guardas municipais e integrantes da For�as Armadas, al�m, de criminosos comuns, integravam o bando. Em alguns casos, tiveram apoio de moradores.

 

A quadrilha cobrava, por meio de intimida��o e viol�ncia, taxas ilegais de moradores e comerciantes, a pretexto de combater o crime.

 

Os milicianos tamb�m impunham a venda de produtos, como g�s em botij�o e �gua mineral, e servi�os, como acesso clandestino � internet, TV a cabo pirata e transporte por vans.

 

Com o tempo, transformaram o dom�nio em poder pol�tico e conquistaram mandatos parlamentares. O modelo foi replicado em outros bairros por outros criminosos.

 

Os chefes do grupo criminoso original, segundo a Pol�cia Civil, eram Natalino Guimar�es, que se elegeu deputado estadual, e seu irm�o, Jer�nimo Guimar�es, o Jerominho, que foi vereador na capital fluminense.

 

Com base eleitoral no bairro de Campo Grande, ambos sempre negavam ter liga��es com o crime ou qualquer atividade ilegal.

 

Natalino foi preso ainda no mandato, ao qual renunciou. Depois de cumprir dez anos de cadeia por v�rios crimes, entre eles o de forma��o de quadrilha, os dois desistiram das carreiras parlamentares, embora tentassem influir na pol�tica.

 

Cumpriram suas penas e foram soltos. Jerominho foi morto a tiros em agosto de 2022, em um ataque a tiros na rua durante o dia.

 

Na �poca em que os irm�os Guimar�es estavam na cadeia, a chefia da Liga da Justi�a foi assumida por Carlos Alexandre da Silva Braga, o Carlinhos Tr�s Pontes.

Policiais atribuem a ele a entrada da mil�cia da zona oeste do tr�fico de drogas.

 

Tr�s Pontes foi morto pela pol�cia em abril de 2017. Seu irm�o, Ecko, assumiu o comando da Liga. Ele expandiu os neg�cios e se tornou o criminoso mais procurado do Rio de Janeiro. O nome do grupo foi mudado para Bonde do Ecko.

 

Ecko foi morto durante uma opera��o policial em 2021. A quadrilha, ent�o, passou a ser comandada por um irm�o de Ecko e Tr�s Pontes: Luiz Carlos da Silva Braga, o Zinho.

 

Mas o bando rachou. A dissid�ncia � chefiada por Danilo Dias Lima, o Tandera, que era aliado de Ecko.

 

Os dois grupos come�aram a guerra pela zona oeste, h� mais de um ano, com assassinatos, tiroteios e destrui��o de vans controladas pelos rivais.

 

Com a entrada de traficantes de outros bairros, o confronto se agravou. A fac��o Comando Vermelho investiu no conflito. S�o dela os criminosos que se aliaram aos narcomilicianos da Gard�nia Azul, origem dos algozes dos m�dicos.


mural com a palavra Paz na Favela Morro do Chapadao, RJ
Crimes tiveram alta significativa na zona oeste do Rio, onde ocorre principalmente a disputa entre grupos criminosos (foto: Getty Images)

Fronteira urbana

Antiga zona rural do Rio de Janeiro, a zona oeste concentra a maior parte da popula��o da cidade.

 

� uma �rea de urbaniza��o relativamente recente, acelerada a partir dos anos 1980 — uma fronteira urbana.

 

Algumas caracter�sticas da regi�o ajudaram no desenvolvimento dos grupos criminosos. O modelo de neg�cios dessas quadrilhas, a partir do dom�nio territorial armado, focava loteamentos, compra e venda de im�veis e oferecimento de servi�os de infraestrutura.

 

"Tudo estava por ser feito na zona oeste", explica Hirata. "As mil�cias intermediavam."

Outro fator que impulsionou esses grupos criminosos foi que boa parte dos investimentos feitos para os grandes eventos nos anos 2010 — Copa do Mundo, Olimp�ada, Jornada Mundial da Juventude — se deu na zona oeste, observa o pesquisador.

 

Isso levou � valoriza��o acelerada dos im�veis situados naquela regi�o, o que favoreceu os milicianos.

 

No mesmo per�odo, a pol�tica de Unidades de Pol�cia Pacificadora (UPP), de atua��o comunit�ria para desarticular quadrilhas, n�o focou na �rea.

 

Quase todas foram instaladas em �reas de tr�fico — apenas uma, no Jardim Batam, foi montada na zona oeste.

 

"A zona oeste se tornou mais homogeneamente miliciana", diz Hirata. "Agora tem a disputa ali. Depois da morte do Ecko, houve uma disputa pela sucess�o, ainda em curso, pelo Zinho, Tandera e outros. Isso ajuda a entender o caso dos m�dicos."


Policiais civis em operação na favela do Jacarezinho; fotografia de 2011
Policiais civis em opera��o na favela do Jacarezinho em 2011 (foto: Getty Images)

Sem diferen�a

A Pol�cia Civil do Rio afirma que tem feito um trabalho intenso de combate aos milicianos da zona oeste, o que teria desestabilizado os grupos criminosos daquela regi�o.

 

Enfraquecidas, menores e mais capilarizadas, as mil�cias, segundo a corpora��o, teriam procurado alian�as com traficantes.

 

As a��es dos criminosos na regi�o, de acordo com a Secretaria de Pol�cia Civil, s�o monitoradas de v�rias formas.

 

Agentes da Subsecretaria de Intelig�ncia, da Delegacia Repress�o a Entorpecentes (DRE) , da Delegacia de Repress�o �s A��es Criminosas Organizadas e Inqu�ritos Especiais (Draco) e tamb�m de delegacias locais acompanham as a��es dos suspeitos.

 

Segundo a Pol�cia, isso resultou na “neutraliza��o” e pris�o de criminosos, al�m de a��es contra fontes de recursos dos criminosos. O preju�zo teria chegado a R$ 2,5 bilh�es em dois anos.

 

Por nota, a Secretaria de Pol�cia Militar informa que a corpora��o “vem empreendendo esfor�os no combate � criminalidade”, segundo o texto “com a��es de intelig�ncia, pautadas por crit�rios t�cnicos e pelo previsto na legisla��o vigente, tendo como preocupa��o central a preserva��o de vidas”.

 

“Os dados relativos � letalidade nos �ltimos meses est�o diretamente ligados �s disputas territoriais entre grupos criminosos rivais, principalmente na zona oeste da cidade do Rio”, diz a PM na nota.

 

“Nesse contexto, a corpora��o destaca as incessantes a��es conjuntas com a Secretaria de Estado de Pol�cia Civil para estabilizar as localidades, assim como para localizar e retirar de circula��o os marginais envolvidos em tais mobiliza��es.”

 

Segundo a nota, desde o in�cio de 2023 “a Pol�cia Militar prendeu quase 25 mil pessoas, apreendeu quase 3.200 adolescentes, mais de 4.600 armas de fogo e 389 fuzis foram retirados das ruas”.


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