
A biografia consumiu nove anos de investiga��o jornal�stica. E trouxe hist�rias saborosas que revelam o homem por tr�s do guerrilheiro e desvendam mitos criados em torno da sua figura. Uma das mais comoventes passagens relatadas por Magalh�es tem a ver com a m�e do guerrilheiro. Ainda pequeno, na Baixa do Sapateiro, bairro de Salvador (BA) onde nasceu e passou a inf�ncia e come�o da juventude, era amarrado no p� da mesa pela m�e, dona Maria Rita, uma negra alta e de olhos lindos, casada com o italiano Augusto Marighella. O temor materno era que “Carrinho”, apelido dado por uma das irm�s, fugisse para jogar futebol. Uma vizinha viu a cena e alertou dona Maria Rita. “N�o fa�a isso. Crian�a que � presa assim acaba presa de verdade.” Dito e feito. Marighella foi preso v�rias vezes e torturado barbaramente, em 1935, durante o governo de Get�lio Vargas. Dona Maria se remoeu de culpa a vida inteira e rezou mais ainda para que Deus tirasse da cabe�a do filho os “pensamentos” de justi�a social e revolu��o. De nada adiantou.
O livro tamb�m revela passagens da hist�ria do partid�o no Brasil, como era chamado o PCB, e de alguns de seus feitos, como o levante de 1935 que transformou Natal, capital do Rio Grande do Norte, em uma rep�blica comunista governada por uma junta denominada Comit� Popular Revolucion�rio. O sonho vermelho durou quatro dias. Tempo suficiente para que a junta baixasse pela metade o pre�o do p�o e da passagem do bonde, colocasse em dia o sal�rio dos servidores p�blicos, quitasse as d�vidas do estado com pequenos credores, abolisse o imposto pago pelos feirantes e assegurasse a liberdade irrestrita a culto e opini�o. Tudo ao som de “A internacional.”
Fusca A biografia de Marighella desmonta a vers�o oficial de que ele teria sido morto dentro de um fusca, depois de sacar um rev�lver e tentar resistir � pris�o. A �nica verdade � a cor azul do fusca, ironicamente pago com recursos da CIA. Marighella estava desarmado quando foi fuzilado em S�o Paulo, em novembro de 1969. Faz tamb�m justi�a aos dominicanos, acusados injustamente, at� mesmo pela esquerda, de trair Marighella, ao indicar para os policiais do Departamento de Ordem Pol�tica e Social (Dops) onde teriam um encontro com o guerrilheiro. Os fatos que culminaram com sua morte s�o descritos com riqueza de detalhes. Ali�s, os pormenores citados ao longo do livro podem levar o leitor a suspeitar se a obra n�o � romanceada. D�vida logo afastada pelo pr�prio autor, que explica como ficou sabendo, por exemplo, do coment�rio de Marighella sobre o gosto “adocicado de sangue” que tomou conta de sua boca ao ser alvejado dentro de um cinema, em 1964. Toda a reconstitui��o de detalhes e di�logos, segundo ele, foi feita ao menos “por um interlocutor, testemunha ou confidente da conversa”. � que tudo � t�o impressionante que poderia mesmo ser um romance ou um filme. Mas � real. (AM)
Ficha
Marighella, o guerrilheiro que incendiou o mundo
M�rio Magalh�es
Companhia das Letras
732 p�ginas