Brasil gasta R$ 700 milh�es com aposentadoria de servidores aos 70 anos
Pa�s desperdi�a mais de meio bilh�o de reais todos os anos, al�m de conhecimento e de experi�ncia, com o afastamento compuls�rio dos servidores p�blicos aos 70 anos
postado em 26/01/2014 06:00 / atualizado em 26/01/2014 19:00
(foto: Arte EM)
O j� combalido cofre da Previd�ncia Social brasileira dispensa mais de meio bilh�o de reais anualmente para pagar as aposentadorias compuls�rias de servidores p�blicos, considerados inaptos para o trabalho a partir dos 70 anos. A previs�o � constitucional e joga numa vala comum as mais diversas categorias, atingindo desde os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) aos setores administrativos e desconsidera ainda o aumento da expectativa de vida dos brasileiros, hoje de 74,6 anos – tr�s anos a mais do que na �ltima d�cada. Uma contradi��o em rela��o � pol�tica do governo para os trabalhadores dos setores privados, que t�m sido obrigados a se aposentar cada vez mais tarde para ter direito ao teto da Previd�ncia Social, R$ 4.271,59 mensais.
Os dados do Minist�rio do Planejamento comprovam que os brasileiros est�o com mais disposi��o para o trabalho. O n�mero de aposentadorias compuls�rias – em alguns setores apelidada de “expuls�ria” – tem aumentado nos �ltimos tr�s anos. Em 2013, somente at� outubro, 582 servidores p�blicos deixaram o servi�o aos 70 anos, mais que o dobro daqueles 265 que foram obrigados a se aposentar em 2011. Em 2012, tamb�m o n�mero quase que dobrou em rela��o a 2011, atingindo 482 funcion�rios. Nos �ltimos 10 anos, 5.065 funcion�rios p�blicos tiveram que deixar os seus cargos ao atingir a idade m�xima prevista em lei. O n�mero pode parecer pequeno, mas a mudan�a na regra poderia significar, al�m de economia, o fim dos desperd�cio de conhecimento pela Uni�o.
Essa realidade preocupante j� obrigou o Legislativo a se mexer e apresentar a Proposta de Emenda � Constitui��o (PEC) 457, que concede um fol�go de mais cinco anos aos servidores. O texto, no entanto, se arrasta h� quase oito anos na C�mara dos Deputados diante das press�es de entidades de classe. No ano passado, o tema voltou � pauta, mas n�o chegou a ser votado. No Senado, a proposta foi aprovada em tempo recorde, em duas vota��es, e seguiu para a C�mara, onde enfrenta um impasse.
O deputado federal Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG) est� entre as dezenas de parlamentares que pediram, nos �ltimos anos e em v�o, a vota��o da mat�ria. Ele defende que a aposentadoria dos servidores p�blicos deve acompanhar a nova realidade brasileira e, por isso, estendida para 75 anos. “Al�m do desperd�cio de dinheiro, significa um desperd�cio de experi�ncia”, defende. Para o tucano, “a entrada maci�a de jovens no setor p�blico � o lado bom, mas a sa�da precoce dos mais velhos, que det�m conhecimento, est� na outra ponta, e � ruim”.
Para se ter ideia do conhecimento alijado do setor p�blico, � preciso considerar que, desde 2005, deixaram o Supremo os ministros Carlos M�rio Velloso, Sep�lveda Pertence, Eros Grau, Cezar Peluso e Ayres Britto, todos em raz�o da aposentadoria compuls�ria. Como Velloso, todos deixaram o tribunal, mas se mant�m ativos em escrit�rios de advocacia, atuando ainda como professores ou palestrantes. “Nunca deixei de trabalhar desde que me mandaram para casa”, diz o ex-ministro, defensor da extens�o do tempo de servi�o. “Sempre entendi que a compuls�ria aos 70 anos � um luxo de pa�s rico. Quando me aposentaram, eu tinha conhecimento de praticamente toda a jurisprud�ncia e doutrina da Corte. E o que disseram para mim? V� para casa e vai ganhar dinheiro com seu conhecimento. Um conhecimento que poderia estar a servi�o do Estado”, explica Velloso.
Em viagem ao EUA, o ex-ministro disse que a previs�o legal brasileira foi considerada pela Suprema Corte daquele pa�s, onde o cargo � vital�cio, como um “luxo”. “Eu at� brinquei: � coisa de pa�s com muitos po�os de petr�leo”, revela. O ministro, no entanto, diz que tem receio da vitaliciedade e diz que 75 anos � um limite “razo�vel” de perman�ncia. Veloso tamb�m reconhece que � o lobby das entidades de classe dos ju�zes que tem retardado a tramita��o da PEC no Congresso. “As entidades de classe afirmam ser contra a prorroga��o do prazo da compuls�ria, porque isso dificultaria a renova��o nos tribunais, quando, na verdade, significaria uma maior demora na promo��o da carreira.”
CAMPE� Submetida a uma lei especial ainda mais rigorosa que obriga a aposentadoria aos 65 anos, a delegada federal de Repress�o a Crimes Previdenci�rios do Rio de Janeiro, Maria Christina Dourado e Silva, de 69 anos, permanece na ativa por for�a de uma decis�o judicial que reconheceu seu direito de permanecer na corpora��o at� os 70 anos. E a decis�o foi mesmo acertada. Em 2012 – portanto, com tr�s anos a mais do limite estabelecido pela Pol�cia Federal –, Maria Christina atingiu o topo do p�dio em sua delegacia como campe� no n�mero de inqu�ritos relatados. “Eu acho isso (a compuls�ria) esquisito, porque parece que a gente ficou com a cabe�a ruim porque tem certa idade”, diz com simplicidade. Ela entrou na Pol�cia Federal em 1969 e, apesar dos 43 anos de servi�o, diz ter f�lego para enfrentar mais cinco caso lhe fosse concedido esse direito. “Eu trabalho das 8h �s 17h todos os dias e sinto que tenho hoje capacidade para enfrentar qualquer situa��o na pol�cia”, afirma.
O QUE DIZ A LEI
A Constitui��o Federal de 1988 prev�, na se��o que trata dos servidores p�blicos, tr�s tipos de aposentadorias: por invalidez, compuls�ria ou volunt�ria. Segundo o artigo 40, "os servidores abrangidos pelo regime de previd�ncia ser�o aposentados compulsoriamente aos 70 anos, com proventos proporcionais ao tempo de contribui��o".
KNOW-HOW DESPERDI�ADO
Maria Clara Prates
Dar-se ao luxo de abrir m�o de servidores em plenas condi��es de trabalho n�o � apenas “um luxo de pa�s rico”, como diz o ministro Carlos M�rio Velloso, mas tamb�m � uma atitude de soberba. Isso porque, al�m de sobrecarregar a quase falida Previd�ncia Social, abre-se m�o de um conhecimento que deveria ser revertido em bem da coletividade. Ao contr�rio disso, tudo o que esses servidores adquiriram de know-how passa a ser disponibilizado para o setor privado, como se se investisse em talentos para a exporta��o.