
Bras�lia – Vinte dias depois do golpe que derrubou o presidente Salvador Allende e instaurou uma ditadura militar no Chile, a embaixada do Brasil tinha em m�os uma lista de 57 brasileiros presos no Est�dio Nacional. Documento do Itamaraty, carimbado como "secreto e urgent�ssimo", pedia a cinco �rg�os de intelig�ncia instru��es sobre o que fazer com os homens e mulheres recolhidos pelos militares chilenos. Em vez de ajudar seus compatriotas, por�m, os diplomatas brasileiros estavam mais preocupados em passar ao regime informa��es sobre a movimenta��o dos exilados no pa�s vizinho. As rela��es entre a ditadura militar chilena e a brasileira ser�o alvo de mais uma investiga��o da Comiss�o Nacional da Verdade. Uma equipe comandada pelo cientista pol�tico Paulo S�rgio Pinheiro chega hoje a Santiago para conhecer o trabalho das duas comiss�es feitas pelo Chile e levantar documentos que comprovem a coopera��o iniciada logo depois do golpe que derrubou Allende, em 1973. O telegrama da embaixada transformado em uma nota da ent�o Divis�o de Seguran�a e Informa��es, hoje extinta, marca o embri�o de uma coopera��o entre as duas ditaduras. Foi fornecida pelos militares chilenos, que estavam interrogando um a um os presos brasileiros no est�dio, que, ao final, passaram de 80.
O que poderia parecer um levantamento comum de brasileiros em situa��o de risco no exterior se mostra, na verdade, um relat�rio de informa��es sobre a milit�ncia de cada um. "Da rela��o de brasileiros que se encontram presos no Chile, identificamos os abaixo relacionados como elementos da "Associa��o Brasileiro-Chilena de Solidariedade (ABCS)", informa o texto. A associa��o, chamada de "caixinha" pelos exilados, ajudava os rec�m-chegados com dinheiro para se manter. Para os militares, era um centro de atividade pol�tica de esquerda.
O documento lista a ficha corrida de 11 pessoas, com os antecedentes de alguns dos presos. Relata ainda quem seriam expulsos, interrogados mais uma vez ou julgados pela Justi�a militar chilena. "Essa � uma prova de que a embaixada do Brasil tinha conhecimento do que estava acontecendo com os brasileiros. Mas a a��o deles n�o foi de proteger o cidad�o brasileiro, foi de passar informa��es para o governo militar", afirma o advogado Vit�rio Sorotink, um dos prisioneiros no Est�dio Nacional. Ao cair o regime de Allende, em 11 de setembro de 1973, cerca de 5 mil brasileiros viviam no Chile, a maioria exilados do regime militar de 1964.
Ref�gio O antrop�logo Tom�s Tarqu�nio e o advogado Vit�rio Sorotink s�o dois dos brasileiros que aparecem na lista da embaixada do pa�s no Chile. Presos no Est�dio Nacional, foram agredidos e interrogados pelos militares chilenos alguns dias depois do golpe que instaurou uma ditadura militar no Chile. Ex-militantes estudantis, os dois foram parar em Santiago logo depois do Ato Institucional nº 5, que endureceu ainda mais a ditadura brasileira. "At� o golpe de 1973, o Chile era um local de ref�gio", conta Sorotink. Depois do golpe, no entanto, boa parte dos brasileiros foi parar no Est�dio Nacional e no Est�dio Chile, transformados em pris�o tempor�ria. Tarqu�nio foi preso em 13 de setembro, dois dias depois do golpe
Apanhou durante alguns dias para servir de "exemplo", por ser estrangeiro, antes de ser levado ao Est�dio Nacional. "Eram tantos presos que eles n�o sabiam mais onde colocar. Por isso levaram para o est�dio. Bastava ser estrangeiro para ser levado", conta. No est�dio, eles tiveram contato com os militares brasileiros enviados ao Chile para ajudar nas torturas. Ap�s negocia��es com embaixadores e organismos internacionais, alguns deles sem interesse imediato para a ditadura chilena foram despachados para campos de exilados das Na��es Unidas. Tarqu�nio foi para a Fran�a; Sorotink, para a Su��a.