Gr�vida do primeiro filho, presa por militares e trancada em uma sala escura com uma jiboia. Em relato concedido ao jornalista Luiz Cl�udio Cunha e publicado nesta ter�a-feira, no site do Observat�rio da Imprensa (www.observatoriodaimprensa.com.br), a jornalista M�riam Leit�o, de 61 anos, contou sobre as torturas sofridas durante o per�odo em que esteve presa no 38º Batalh�o de Infantaria do Ex�rcito, no Esp�rito Santo, entre dezembro de 1972 e fevereiro de 1973.
Trechos do depoimento formal, arquivado pela Justi�a Militar, foram publicados no livro "Brasil: Nunca Mais", de 1995, que re�ne relatos de presos pol�ticos. A diferen�a � que, agora, M�riam decidiu contar com as pr�prias palavras as torturas sofridas na institui��o militar.
� reportagem do Estado, ela disse que n�o foi movida por um "sentimento pessoal de raiva, mas pela no��o de que as institui��es democr�ticas precisam que as For�as Armadas reconhe�am que pessoas morreram dentro das institui��es militares".
Em 3 de dezembro de 1972, M�riam e o ent�o marido, Marcelo Netto, iam � praia quando foram capturados. O grupo de homens os levou para o Forte de Piratininga, em Vila Velha, cidade vizinha a Vit�ria, capital do Esp�rito Santo. Ao chegar � unidade militar, Miriam e Marcelo foram separados. Os militares a levaram para uma sala escura onde hoje funciona o anfiteatro do forte. Marcelo permaneceu preso por 13 meses.
No anfiteatro, a jornalista, ent�o com 19 anos, conta ter sido obrigada a tirar a roupa e amea�ada de estupro coletivo enquanto era interrogada. Um militar identificado por ela apenas como Dr. Pablo - que depois descobriram ser o coronel Paulo Malh�es, morto em abril deste ano - chegou ao local com uma cobra jiboia, ironicamente chamada por ele de Miriam.
A jovem filiada ao PCdoB disse ter permanecido horas sozinha, nua, gr�vida de um m�s (informa��o que disse ter passado aos torturadores), sem poder se mexer, em ambiente completamente escuro, com medo de que a cobra percebesse o movimento e a atacasse.
"Dr. Pablo voltou, depois, com os outros dois (militares), e me encheu de perguntas. As de sempre: o que eu fazia, quem conhecia. Me davam tapas, chutes, puxavam pelo cabelo, bateram com minha cabe�a na parede. Eu sangrava na nuca, o sangue molhou meu cabelo. Ningu�m tratou de minha ferida, n�o me deram nenhum alimento naquele dia", contou M�riam a Cunha.
Depois de tr�s meses, ela deixou o 38º Batalh�o. Emagrecera 11 quilos. Estava "deprimida, mal alimentada, tensa, assustada, an�mica, com car�ncia aguda de vitamina D por falta de sol". Precisava se recuperar rapidamente para proteger o beb�, que poderia ter sequelas. Vladimir nasceu saud�vel, em agosto.
No s�timo m�s de gesta��o, M�riam prestou depoimento na 2ª Auditoria da Aeron�utica, no Sum�rio de Culpa, no jarg�o militar, "o �nico momento em que o r�u fala". Diante dos ju�zes militares, ela relatou as torturas sofridas nos tr�s meses de pris�o, mesmo depois de ter recebido recomenda��es de amigos para n�o falar nada, pois poderia voltar a ser presa.
"Era arriscado denunciar. Tive que decidir sozinha e denunciei que fui torturada", relembrou.
Em 2011, a jornalista voltou ao anfiteatro do Forte e instintivamente se posicionou no mesmo local onde foi colocada pelos militares h� 42 anos.
"Quando entrei tive a sensa��o que estava vendo uma tela dividida: metade era o que tinha vivido no passado; na outra metade, o que vivia naquele momento. Foi uma viagem interna". De f�rias, a jornalista escreve um novo livro "sobre o futuro do Brasil, enquanto nosso passado ainda est� em aberto".G