Paulo de Tarso Lyra
Bras�lia – “Presidente, estou aqui descumprindo uma ordem m�dica, mas precisava vir para apresentar as demandas do setor.” Foram estas as palavras ditas pela senadora K�tia Abreu (TO), rec�m-operada e, � �poca, ainda filiada ao PSD, na primeira audi�ncia das duas no Pal�cio do Planalto. Para Dilma, que descobriu, em plena corrida eleitoral, um c�ncer no sistema linf�tico, deparar-se com uma mulher que, como ela, n�o deixa de trabalhar, apesar dos problemas de sa�de, era a senha que faltava para transformar a futura ministra da Agricultura em uma das pessoas mais pr�ximas a ela no restrito c�rculo do poder de Bras�lia.
At� ent�o, o contato entre ambas era zero. Aliados at� afirmam que a carta n�o tinha interesses pol�ticos, apenas uma demonstra��o de solidariedade humana. K�tia fez campanha para Jos� Serra em 2010 e n�o poderia, abertamente, apoiar a candidata do PT. Mas, ao t�rmino do segundo turno das elei��es presidenciais de quatro anos atr�s, ela debru�ou-se sobre o mapa eleitoral feito pelos analistas pol�ticos da Confedera��o Nacional da Agricultura (CNA) e afirmou: “A presidente ter� de nos procurar para buscar o apoio nos locais onde ela n�o tem”.
Na verdade, K�tia, de longe, observava os passos da presidente desde a metade do primeiro mandato de Lula. Ainda que de forma obl�qua. A ruralista percebia os embates da chefe da Casa Civil com a ent�o ministra do Meio Ambiente, Marina Silva – essa sim, considerada advers�ria ferrenha. “K�tia sabia que precisava de uma aliada forte. Marina, al�m de empedernida, era protegida de Antonio Palocci”, recorda uma aliada da presidente da CNA.
Apesar de o apoio do agroneg�cio ser tradicionalmente ao PSDB, K�tia desabafou a pessoas pr�ximas que, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, o setor jamais foi recebido em audi�ncia no Pal�cio do Planalto. Lula sinalizou um distensionamento com os produtores rurais e o di�logo ficou melhor com os ministros Roberto Rodrigues e Reinhold Stephanes. Mas ainda era pouco. A vit�ria de Dilma de 2010, por exemplo, poderia ser uma porta aberta para os ruralistas no governo.
A presidente, contudo, escolheu Antonio Palocci para a Casa Civil. O caminho estava bloqueado novamente. K�tia, ent�o, buscou estradas alternativas para chegar � presidente. E optou pelo vice-presidente Michel Temer, com quem tem rela��o estreita – ele � o respons�vel pela filia��o dela ao PMDB. Temer foi tamb�m o respons�vel por aproximar as duas que, nas palavras de um amigo do PSD, descobririam pouco depois que se completavam no estilo de trabalhar e pensar o pa�s.
Do trabalho de aproxima��o at� a primeira audi�ncia, em 2012, o caminho foi natural. Hoje, K�tia � uma das poucas pessoas com canal direto com a presidente. Se h� ministros – a maior parte deles, na verdade – que reclamam n�o ter qualquer intimidade com a principal mandat�ria do pa�s, K�tia pode orgulhar-se de conversar com a presidente por SMS. E n�o apenas de pol�tica , mas dicas de beleza, roupas, brincos, conversas femininas. Para desespero dos movimentos sociais e da esquerda petista, ser� preciso bem mais do que vaias e gritos de protestos para fazer a presidente ficar em d�vida sobre a indica��o.
Beleza Segundo interlocutores em comum, K�tia adora dar dicas de beleza � presidente. Vaidosa, ela “se monta”, nas palavras de uma aliada, n�o para aparecer em fotos nos jornais ou para audi�ncias pol�ticas. Ela se produz toda porque � uma figura pop entre seu eleitorado. Durante a campanha, ela desembarcou em Tocantins para um evento e foi cercada por produtores rurais. “A senhora sabe qual o nome da �ltima vaca que vai para o matadouro? Esperan�a. Senadora, a senhora � nossa esperan�a em Bras�lia”, afirmou o fazendeiro.
Ela olhou bem nos olhos do interlocutor, deu um tapa nas costas dele, e disse: “N�o sei se agrade�o, se xingo voc� ou se dou um mugido”, gargalhou. De outra feita, um produtor rural, querendo ser simp�tico, disse que tinha se encharcado de perfume e colocado a melhor camisa s� para v�-la. K�tia n�o pensou duas vezes: puxou pelo bra�o a esposa do fazendeiro. “Vem c�, que vou falar com voc� e n�o com ele. E fala para seu marido que � para voc� que ele precisa passar perfume e vestir a melhor camisa, n�o para mim”, aconselhou.
Se K�tia � pop, algo que Dilma jamais ser�, as duas combinam na obsess�o pelo trabalho. “Ela � um trator e a maioria das pessoas diverge completamente do que ela pensa e fala. Mas, a exemplo da presidente, K�tia n�o tem medo de comprar brigas ou ser antip�tica ao defender seus pontos de vista”, afirmou uma pessoa que j� viveu o desespero de ter que contrapor-se �s argumenta��es da senadora peemedebista.
Ela tamb�m �, assim como a presidente, estudiosa. Nos encontros com Dilma, leva mapas e dados para mostrar os problemas do setor e apresentar alternativas e solu��es. “K�tia sabe e gosta de fazer pol�tica, mas foge ao perfil tradicional da pol�tica. Ela n�o conversa com a presidente sobre cargos, mas sobre o Brasil real que precisa de infraestrutura”, disse uma pessoa pr�xima. Por isso, j� houve conversas entre ambas, a s�s, fora da agenda, por mais de uma hora. Uma coisa rara na escassa paci�ncia de Dilma em trocar ideias com algum interlocutor.