Afinal, de quem � a compet�ncia para julgar as contas dos prefeitos: da C�mara Municipal ou do Tribunal de Contas? A pergunta parece simples, mas a resposta n�o. Sem uma defini��o clara na legisla��o brasileira, cabe a cada juiz ou tribunal adotar a sua tese. E com ela, o poder de vedar ou n�o a candidatura de um administrador p�blico em raz�o de uma an�lise negativa das contas da gest�o, prestadas ao TCE.
Em Minas Gerais, por exemplo, as candidaturas de ex-prefeitos n�o s�o impugnadas com base apenas em parecer do TCE, mas na reprova��o das contas pelos vereadores. No Cear� � diferente, basta uma rejei��o pelo Tribunal de Contas para que um ex-prefeito seja impedido de disputar uma elei��o.
E � por causa dessa interpreta��o que o assunto chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF), �rg�o que ter� a palavra final sobre a pol�mica. Impedido pelo Tribunal Regional Eleitoral cearense de disputar uma cadeira de deputado estadual, o ex-prefeito de Horizonte Jos� Rocha Neto (PTB) recorreu ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e novamente teve a candidatura impugnada. Indignado, em janeiro deste ano ele entrou com a��o no STF, e na semana passada os ministros decidiram aplicar a chamada “repercuss�o geral” ao caso, ou seja, o que for decidido sobre o assunto ser� aplicado a qualquer a��o envolvendo o mesmo tema.
Relator do processo, o ministro Lu�s Roberto Barroso ressaltou em seu despacho que a defini��o do �rg�o competente para julgar as contas “assume particular import�ncia quando se constata que sua rejei��o, por irregularidade insan�vel, gera inelegibilidade do agente p�blico”. Dentro do pr�prio STF h� correntes divergentes. H� decis�es no sentido de que a compet�ncia para julgar as contas do prefeito – ainda que se tratem de contas de gest�o – � do Legislativo. Mas tamb�m h� precedentes em contr�rio. “� preciso que a Corte d� � quest�o um tratamento uniforme”, argumentou Barroso.
A pol�mica gira em torno da atua��o do prefeito. Em primeiro lugar, � preciso distinguir se o ato considerado irregular foi adotado pelo chefe do Executivo ou um funcion�rio. “Se um prefeito por exemplo assina notas, cheques, uma licita��o, ele est� assumindo a fun��o de administrador. Nesse caso, uma rejei��o do TCE � suficiente para torn�-lo ineleg�vel”, explica o promotor Edson Resende, coordenador das promotorias eleitorais. Por outro lado, se o prefeito apenas estabelece diretrizes e delega um ato a um secret�rio, ele estar� atuando como gestor. Neste caso, as suas contas precisariam ser reprovadas pela C�mara Municipal para que ele se tornasse ineleg�vel.
Esse, pelo menos, tem sido o entendimento aplicado em Minas Gerais. Mas n�o � seguido em todo o pa�s. “Num primeiro momento, � importante definir isso para n�o gerar mais inseguran�a jur�dica, e para que n�s possamos arguir as inelegibilidades de maneira uniforme”, ressalta Edson Resende. A cada elei��o, a Justi�a Eleitoral recebe dos tribunais de Contas estaduais e da Uni�o a listagem de gestores que tiveram as contas rejeitadas – e a partir dela o Minist�rio P�blico pode pedir a impugna��o da candidatura e os ju�zes acatarem ou n�o o pedido. Em Minas, nas elei��es de 2012 a lista trouxe 500 nomes, referentes a 702 ocorr�ncias. No ano passado, foram 481 gestores com 628 ocorr�ncias.
INELEGIBILIDADE E FICHA LIMPA
A quest�o envolvendo as contas de ex-prefeitos e ocupantes de cargos p�blicos est� prevista na Lei Complementar 64/90, a Lei das Inelegibilidades, e na Lei da Ficha Limpa. De acordo com as legisla��es, ser� ineleg�vel aquele que tiver as contas “relativas ao exerc�cio de cargos ou fun��es p�blicas rejeitadas por irregularidade insan�vel que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decis�o irrecorr�vel do �rg�o competente”. J� a Constitui��o Federal delega ao Legislativo o julgamento dos ordenadores de despesa, sejam eles o prefeito ou seus auxiliares.
Baseado no que diz a Constitui��o, e que foi reproduzido na Lei das Inelegibilidades, o TSE alega que basta o parecer do TCE pela rejei��o das contas para que um administrador, que tenha atuado como ordenador de despesas, seja impedido de disputar uma elei��o. Caber� ao Supremo dizer se essa tese � constitucional ou se a tarefa de rejeitar contas de prefeitos � exclusiva do Legislativo. O promotor Edson Resende torce pela primeira tese. “S� assim vamos evitar que um prefeito que atuou como ordenador de despesa tenha as contas reprovadas no Tribunal de Contas e aprovadas na C�mara porque tem a maioria dos vereadores”, explica.