
A contraposi��o entre o Pal�cio do Planalto e o Tribunal de Contas da Uni�o (TCU), uma das marcas de 2015 por conta das "pedaladas fiscais" do governo Dilma Rousseff, ocorreu tamb�m, em n�vel menos dram�tico, h� quase 20 anos, como revelam os di�rios do ent�o presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Em 14 de agosto de 1996, FHC registrou dificuldades colocadas pelo TCU para liberar as propostas de privatiza��es do governo tucano. No depoimento, revelado agora no livro "Di�rios da Presid�ncia - 1995-1996" (Companhia das Letras), FHC caracteriza os t�cnicos do TCU como "muito petistas" naquele momento.
"Voltei ao Pal�cio da Alvorada e recebi muita gente. Primeiro tive uma conversa com o S�rgio Mota (ent�o ministro das Comunica��es) e o presidente do TCU, o Marcos Vila�a. O TCU est� pondo dificuldades �bvias e corretas na aprova��o de concess�es na telefonia e na �rea de energia. O Vila�a disse com clareza que h� tr�s conselheiros (no TCU) muito antiquados, uns s�o estatistas, outros s�o exibicionistas, o que dificulta muito. Sugeriu que eu tivesse um jantar com todos na casa dele, explicar qual � o nosso prop�sito: evitar que o TCU, que est� muito influenciado por sua tecnocracia, muito petista, e tamb�m por uma mentalidade burocr�tica antiquada, atrapalhe o avan�o da privatiza��o e das concess�es", relata FHC.
Ao final, o modelo tucano de privatiza��es ganharia o sinal verde. Em 1997, o governo privatizaria a Vale e, no ano seguinte, a Telebr�s.
Agora, quase 20 anos depois, o conflito entre o governo e o TCU envolve o PT e ganhou contornos mais dram�ticos. Por conta de manobras fiscais, como as pedaladas, a Corte de Contas rejeitou, de forma un�nime, o Balan�o Geral da Uni�o de 2014. Foi a primeira vez em 78 anos que o TCU reprovou as contas federais. A oposi��o, que hoje � liderada pelo PSDB, aposta justamente nas "pedaladas fiscais" e no parecer pela rejei��o do TCU para embasar um pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff.
Postura infantil
O debate sobre o uso do dinheiro da privatiza��o da Vale para a meta fiscal do governo fez FHC chamar de "um pouco infantil" a postura de economistas de sua gest�o. O desabafo foi registrado em 8 de julho de 1996.
FHC narra que, em jantar com Cl�vis Carvalho e os irm�os Luiz Carlos Mendon�a de Barros e Jos� Roberto Mendon�a de Barros (ent�o secret�rio de Pol�tica Econ�mica) no Pal�cio do Alvorada, os quatro trataram da crise envolvendo o banco Bamerindus, que sofreria interven��o do Banco Central no ano seguinte no �mbito do Proer. Depois, FHC ouviu queixas sobre as cr�ticas feitas por Gustavo Franco, que era diretor do BC e principal fiador da pol�tica baseada no c�mbio fixo entre o real e o d�lar, base do Plano Real.
"Queixas tamb�m porque o Gustavo Franco voltou a atacar a quest�o do gasto, por causa da negocia��o da Vale do Rio Doce. Ele n�o sabe o que o Mendon�a est� fazendo. Mendon�a n�o pode abrir o jogo e deu a impress�o, porque n�o abriu o jogo, de que iremos utilizar os recursos da Vale para fazer obra, para os Estados pagarem as d�vidas. J� o Gustavo Franco estrilou, parece que o (Edmar) Bacha tamb�m. Quer dizer, um pouco essa disputa da PUC do Rio: para mostrar que � ortodoxa, quer segurar o c�mbio e o d�ficit, e diz que os outros s�o gastadores. A coisa � um pouco infantil", relata FHC.
D�ficit fiscal
Dias depois, FHC relata o debate sobre o d�ficit fiscal do governo, que aumentava em 1996. "Tive uma longa reuni�o com a �rea econ�mica sobre um artigo que o Andr� Lara Resende escreveu - eu n�o li -, parece que colocando em d�vida a possibilidade de controlarmos o d�ficit fiscal. Foi o grande tema de hoje. O debate na equipe econ�mica sempre toma uma conota��o muito dram�tica. Mas na verdade, quando se olham os dados, [a situa��o] n�o � t�o preocupante assim, embora tenhamos que cortar mais no f�sico, ou seja, dispensar gente, fechar �rg�os, diminuir gastos, porque parece que do ponto de vista de aumento de receita chegamos ao limite, pelo menos � o que dizem nossos t�cnicos. N�o d� para fazer o ajuste em cima s� do or�amento".
A crise fiscal, no entanto, pioraria ao longo de 96 e durante todo o ano de 1997. Em 1998, ano em que FHC buscou a in�dita reelei��o, o governo foi for�ado a buscar recursos junto ao Fundo Monet�rio Internacional (FMI) para fechar as contas, al�m de promover reformas na gest�o da pol�tica econ�mica.