
O governo n�o se manifestou oficialmente. Mas, nos bastidores, h� quem diga que o texto indica o rompimento do PMDB com o Planalto. Diante dos holofotes, prevalece a turma do “deixa disso”. Entre eles, o l�der do PT no Senado, Humberto Costa (PE), que classificou a carta apenas como um “desabafo pessoal” do vice-presidente. “Michel Temer � algu�m que desempenha papel importante no nosso governo, na articula��o pol�tica. � um democrata de larga tradi��o e sabe, assim como todos n�s, que o momento � de baixarmos a temperatura. N�o � o governo, � o pa�s que est� em jogo", disse. A grande expectativa para esta quarta-feira � a conversa agendada para o in�cio da noite entre Dilma e Temer, no Pal�cio da Alvorada. Com o aval da presidente, o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, procurou nessa ter�a-feira um assessor de Temer para marcar o encontro, o primeiro ap�s a divulga��o da carta. Desde quinta-feira os dois n�o se falam.
O presidente do PMDB-RJ, Jorge Picciani, reagiu � carta. "Fico surpreso em ver como algu�m que se sentia figurativo por quatro anos brigou para manter a alian�a com o PT na elei��o de 2014 e continuar figurativo”, ironizou. Ele e seu filho Leonardo Picciani s�o citados na carta por terem negociado com Dilma espa�o do PMDB na reforma ministerial, sem ouvi-lo. Leonardo Picciani (RJ) considerou que o documento revela que o vice n�o tinha interesse no "fortalecimento da bancada".
O l�der do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), afirmou que a carta � uma declara��o a favor do impeachment de Dilma. "Houve uma posi��o, sem rodeios, onde exp�e, al�m da incapacidade administrativa, a falta de apoio pol�tico da presidente", disse. Para o presidente nacional do PSDB, senador A�cio Neves, a carta revela o afastamento “definitivo” entre o vice e a presidente. (Com ag�ncias)
Confira as queixas de Temer e o contexto de cada uma delas
“Passei os quatro primeiros anos de governo como vice decorativo. A Senhora sabe disso. Perdi todo protagonismo pol�tico que tivera no passado e que poderia ter sido usado pelo governo. S� era chamado para resolver as vota��es do PMDB e as crises pol�ticas”
Desde o primeiro mandato o PMDB vem se afastando do governo e adotando no Congresso uma postura independente nos �ltimos meses. Gra�as ao PMDB o Planalto amargou sucessivas derrotas no Legislativo, como a aprova��o do or�amento impositivo (obrigando o governo a pagar as emendas parlamentares) e a cria��o de uma CPI da Petrobras. Na tentativa de consolidar a base, Michel Temer tornou-se articulador pol�tico de Dilma com o Congresso Nacional.
“ Jamais eu ou o PMDB fomos chamados para discutir formula��es econ�micas ou pol�ticas do pa�s; �ramos meros acess�rios, secund�rios, subsidi�rios”
Sob o argumento que era alijado das discuss�es, o PMDB fez cr�ticas � pol�tica econ�mica do governo Dilma e apresentou um programa que defende, por exemplo, a retomada das privatiza��es para enxugar a m�quina do estado e o fim da corre��o de benef�cios sociais pelo aumento do sal�rio m�nimo. O documento afirma ainda que o governo cometeu “excessos” e que o Brasil se encontra em situa��o de grave risco, em “profunda recess�o” que deve continuar em 2016.
“A senhora, no segundo mandato, � �ltima hora, n�o renovou o Minist�rio da Avia��o Civil, onde o Moreira Franco fez bel�ssimo trabalho, elogiado durante a Copa do Mundo. Sabia que ele era uma indica��o minha. Quis, portanto, desvalorizar-me. Cheguei a registrar este fato no dia seguinte, ao telefone”
At� as v�speras da posse para o segundo mandato, Moreira Franco era tido como certo para continuar no comando da Avia��o Civil. Mas a presidente Dilma optou por tir�-lo do cargo porque ele disse que a Opera��o Lava-Jato traria “profundas consequ�ncias” na gest�o da Petrobras. As declara��es de Moreira ocorreram na semana em que foi revelado que a ex-gerente da Petrobras Venina Velosa da Fonseca havia alertado a ent�o presidente da companhia, Gra�a Foster, sobre irregularidades na estatal. Dilma havia ordenado que os integrantes do governo defendessem Gra�a e sua manuten��o no cargo. Temer tentou argumentar com Dilma para manter Moreira, mas ela n�o recuou.
“No epis�dio Eliseu Padilha, mais recente, ele deixou o Minist�rio em raz�o de muitas ‘desfeitas’, culminando com o que o governo fez a ele, ministro, retirando, sem nenhum aviso pr�vio, nome com perfil t�cnico que ele, ministro da �rea, indicara para a ANAC. Alardeou-se a) que fora retalia��o a mim; b) que ele saiu porque faz parte de uma suposta ‘conspira��o’”
Substituto de Moreira Franco, Eliseu Padilha deixou o cargo na sexta-feira passada. Ao n�o ser recebido pelo ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, para entregar a carta de demiss�o, Padilha optou por protocol�-la no Planalto. Nos bastidores, ele teria tomado a decis�o por convic��o pol�tica e lealdade ao vice, Michel Temer, de quem � forte aliado, e que estaria defendendo o impeachment de Dilma. Em rela��o � pasta que comandava, teria se irritado com o fato de a petista ter desautorizado a indica��o de Juliano Noman para uma diretoria da Ag�ncia Nacional de Avia��o Civil (Anac). O nome dele teria sido rejeitado no Senado a pedido da presidente.
“Quando a senhora fez um apelo para que eu assumisse a coordena��o pol�tica, no momento em que o governo estava muito desprestigiado, atendi e fizemos, eu e o Padilha, aprovar o ajuste fiscal. Tema dif�cil porque dizia respeito aos trabalhadores e aos empres�rios. N�o titubeamos. Estava em jogo o pa�s. Quando se aprovou o ajuste, nada mais do que faz�amos tinha sequ�ncia no governo. Os acordos assumidos no Parlamento n�o foram cumpridos. Realizamos mais de 60 reuni�es de l�deres e bancadas ao longo do tempo solicitando apoio com a nossa credibilidade. Fomos obrigados a deixar aquela coordena��o”
Michel Temer foi anunciado como coordenador pol�tico do governo no Congresso Nacional em 7 de abril deste ano. A meta do governo era aprovar as medidas de ajuste fiscal. Em 24 de agosto, depois de uma conversa com Dilma Rousseff (PT), o vice-presidente entregou as atribui��es de articular pol�tico. A gota d�gua teria sido o desgaste provocado por pronunciamento em que ele disse que “algu�m tinha que reunificar o pa�s”. Depois de ter sido criticado por petistas, a presidente Dilma disse que “nunca houve nenhuma desconfian�a” em rela��o ao seu vice.
“De qualquer forma, sou presidente do PMDB e a senhora resolveu ignorar-me chamando o l�der Picciani e seu pai para fazer um acordo sem nenhuma comunica��o ao seu vice e presidente do partido. Os dois ministros, sabe a senhora, foram nomeados por ele. E a senhora n�o teve a menor preocupa��o em eliminar do governo o deputado Edinho Ara�jo, deputado de S�o Paulo e a mim ligado”
Em 2 de outubro, a presidente Dilma anunciou uma reforma ministerial com o corte de oito dos 39 minist�rios e a redu��o de 10% nos sal�rios dos ministros. Na ocasi�o, aceitou a indica��o, feita por Leonardo Picciani, dos deputados federais Marcelo Castro (PI) e Celso Pansera (RJ) para as pastas de Sa�de e Ci�ncia e Tecnologia, respectivamente. Em raz�o da reforma, Edinho Ara�jo deixou o Minist�rio dos Portos. Em seu lugar assumiu Helder Barbalho, at� ent�o ministro da Pesca – pasta que foi incorporada ao Minist�rio da Agricultura.
“Democrata que sou, converso, sim, senhora presidente, com a oposi��o. Sempre o fiz, pelos 24 anos que passei no Parlamento. Ali�s, a primeira medida provis�ria do ajuste foi aprovada gra�as aos 8 (oito) votos do DEM, 6 (seis) do PSB e 3 do PV, recordando que foi aprovado por apenas 22 votos. Sou criticado por isso, numa vis�o equivocada do nosso sistema. E n�o foi sem raz�o que em duas oportunidades ressaltei que dever�amos reunificar o pa�s. O Pal�cio resolveu difundir e criticar”
A MP 665 foi aprovada pela C�mara dos Deputados em 6 de maio deste ano, por um placar de 252 a 227 votos. O texto era importante para o governo federal ao dificultar a obten��o do seguro-desemprego, do abono salarial e do seguro-defeso. Em 5 de agosto, depois de uma tensa reuni�o com aliados, o peemedebista disse que o Brasil precisava de algu�m com a capacidade de reunificar o pa�s e evitar uma “crise desagrad�vel”. A pol�mica fala foi usada no programa do PMDB de r�dio e televis�o, em setembro. A partir da�, ele passou a ser isolado das principais decis�es do governo, o que culminou na sa�da da articula��o pol�tica do governo no Congresso.
“Recordo, ainda, que a senhora, na posse, manteve reuni�o de duas horas com o vice-presidente Joe Biden – com quem constru� boa amizade – sem convidar-me, o que gerou em seus assessores a pergunta: o que � que houve que, numa reuni�o com o vice-presidente dos Estados Unidos, o do Brasil n�o se faz presente? Antes, no epis�dio da "espionagem" americana, quando as conversas come�aram a ser retomadas, a senhora mandava o Ministro da Justi�a para conversar com o Vice-presidente dos Estados Unidos. Tudo isso tem significado absoluta falta de confian�a”
Ao assumir o segundo mandato, a presidente teve um encontro com Joe Biden no Pal�cio do Itamaraty. Na sa�da da reuni�o, o americano comentou que a posse de Dilma era um novo in�cio. “� um novo ano, um novo come�o”, afirmou. Em discurso no Congresso, a presidente destacou a import�ncia de fortalecer as rela��es entre os dois pa�ses. “� de grande relev�ncia aprimorarmos nosso relacionamento com os Estados Unidos, por sua import�ncia econ�mica, pol�tica, cient�fica e tecnol�gica, sem falar no volume de nosso com�rcio bilateral”, afirmou na ocasi�o.
“Mais recentemente, conversa nossa (das duas maiores autoridades do pa�s) foi divulgada e de maneira inver�dica sem nenhuma conex�o com o teor da conversa”
Em entrevista coletiva na quinta-feira passada, o ministro da Casa Civil Jaques Wagner disse que Temer e Dilma haviam conversado sobre o impeachment e que o vice-presidente teria dito n�o ver “nenhum lastro” para o processo de impeachment. O ministro Edinho Silva (Comunica��es) havia dito que Temer daria assessoria jur�dica a Dilma. O vice-presidente desmentiu as duas entrevistas. “Eu n�o disse isso em momento algum da minha conversa com a presidente”, afirmou Temer a Wagner. Sobre as declara��s de Edinho, foi taxativo: “Essa n�o � fun��o do vice-presidente da Rep�blica”.
“At� o programa 'Uma ponte para o futuro', aplaudido pela sociedade, cujas propostas poderiam ser utilizadas para recuperar a economia e resgatar a confian�a, foi tido como manobra desleal”
O PMDB lan�ou o programa durante congresso realizado em 17 de novembro. Escrito pelo ex-ministro da Fazenda Delfim Netto, o ex-secret�rio de Pol�tica Econ�mica Marcos Lisboa e o presidente da Funda��o Ulysses Guimar�es, Wellington Moreira Franco, o documento traz teses opostas �s defendidas pelo PT. Entre elas, o fim do porcentual constitucional para despesas com sa�de e educa��o e o t�rmino das indexa��es de benef�cios sociais ao sal�rio m�nimo. O texto tamb�m atribuiu a crise atual aos gastos excessivos do governo nos �ltimos anos.