Proibida no Brasil h� 53 anos, completados no �ltimo dia 3, a ca�a profissional e esportiva de animais silvestres pode ser liberada pelo Congresso Nacional. � o que prop�e projeto de lei do deputado ruralista Valdir Collato (PMDB-SC), que come�ou a tramitar na C�mara no fim do ano passado, mas, por enquanto, n�o foi analisado nem discutido em nenhuma comiss�o ou audi�ncia p�blica. O texto altera o C�digo de Ca�a, editado em 1967, que pro�be essa pr�tica em todo o territ�rio nacional, salvo em caso de autoriza��o expressa do governo federal por meio de seus �rg�os ambientais.
Prop�e ainda a cria��o de reserva particular pr�pria para ca�adas e de criat�rios de animais para serem mortos. E prev� tamb�m que animais que atacarem propriedades e rebanhos podem ser abatidos se houver um laudo t�cnico de algum �rg�o ambiental – o texto n�o espec�fica qual – autorizando a ca�a.
Na justificativa do projeto, o deputado alega que a proximidade com os animais silvestres no meio rural traz risco para as pessoas e tamb�m para as propriedades e rebanhos, o que torna a ca�ada uma pr�tica regular que, futuramente, pode vir a ser at� mesmo uma fonte de renda. “Nesses casos sem finalidade de entretenimento e de esporte, mas como pr�tica de rela��o com o ambiente, a qual, com o passar do tempo, pode se organizar como uma atividade de cunho cultural, como uma pr�tica social e mesmo como atividade geradora de ganho social e econ�mica para as popula��es do meio rural”, afirma o parlamentar.
Retrocesso
O projeto de lei, no entanto, j� � alvo de protestos de diversas entidades ligadas � prote��o dos animais e do meio ambiente expressamente contr�rias � ca�a esportiva. “Autorizar que o ser humano se divirta com uma mira eletr�nica matando por esporte um animal � um retrocesso tremendo, al�m de um risco enorme para a nossa fauna”, defende a presidente da Associa��o Mineira de Defesa do Meio ambiente (Amda), Maria Dalce Ricas.
Segundo ela, o pa�s j� quase n�o tem mais animais silvestres, nem mesmo nas �reas de conserva��o, pois n�o h� controle sobre o desmatamento dessas �reas nem sobre o tr�fico e matan�a de esp�cies. “Para al�m da crueldade, o Estado n�o tem condi��o de liberar a ca�a esportiva, pois n�o tem como fiscalizar essa pr�tica.”
Al�m disso, aponta Dalce, o projeto do deputado n�o traz nenhum dado ou informa��o t�cnica que embase essa decis�o e n�o foi feita nenhuma discuss�o com a sociedade sobre o assunto. Ela cita como exemplo dessa falta de controle a ca�a de javali europeu, liberada pelo Ibama em 2013. A esp�cie foi trazida para o Sul do Brasil para o com�rcio da carne e acabou se transformando em um problema ao ser introduzida na mata nativa. Como n�o h� predadores, os javalis se multiplicaram matando esp�cies nativas e rebanhos. Seu abate, ent�o, foi liberado, mas segundo Dalce, s�o muitos relatos de crueldade e de morte de outras esp�cies durante as ca�adas.
Armadilhas e falta de discuss�o t�cnica
O coordenador-geral da Rede Nacional de Controle do Tr�fico de Animais (Renctas), Dener Giovanini, tamb�m cobra uma discuss�o ampla e t�cnica sobre a regulamenta��o da ca�a. “Esse � um assunto que deve partir de uma permiss�o absolutamente t�cnica”, afirma Denner. Segundo ele, os t�cnicos da Renctas j� est�o debru�ados sobre o projeto. “Mas somos absolutamente contra a ca�a esportiva”, defende.
Segundo ele, o manejo de javalis, por exemplo, precisa ser rediscutido e melhor regulamentado, para evitar que outros animais sejam abatidos junto com essa esp�cie. Para ele, o Brasil n�o tem a menor condi��o de liberar a ca�a esportiva por absoluta falta de meios para fiscalizar a atividade. Ele tamb�m teme que haja a cria��o artificial de pragas animais para justificar sua ca�a.
Para ele, algo semelhante pode ter acontecido com os javalis citados por Dalce, que chegaram inicialmente no Sul do pa�s e hoje j� s�o problema at� em Roraima. “N�o credito que um javali andou 6 mil quil�metros, do Sul ao Norte. Acho que ele foi artificialmente introduzido para ser ca�ado.”
O ambientalista Paulo Pizzi, que integra o Conselho Nacional do Meio Ambiente e uma rede de organiza��es ambientais que se contrap�em a esse projeto, batizada de “Alian�a Pr�-Diversidade”, tamb�m classifica o projeto como um retrocesso. Segundo ele, o texto � cheio de armadilhas e tenta dar uma apar�ncia de cunho ambiental � proposta, mas seu �nico objetivo � liberar a ca�a.
Uma das armadilhas, segundo ele, � a permiss�o dada por qualquer �rg�o ambiental para matar animais silvestres. “O projeto n�o pede nem ao menos um estudo t�cnico, apenas um laudo de qualquer �rg�o ligado ao meio ambiente. � um risco muito grande.” Para ele, o projeto n�o tem nem como ser melhorado. “N�o deve tramitar”, defende. O autor do projeto n�o foi localizado pela reportagem para comentar as cr�ticas.
O que diz a lei
Lei 5.197, de 3 de janeiro 1967
Art. 1º. Os animais de quaisquer esp�cies, em qualquer fase do seu desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro, constituindo a fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais s�o propriedades do Estado, sendo proibida a sua utiliza��o, persegui��o, destrui��o, ca�a ou apanha.
§ 1º Se peculiaridades regionais comportarem o exerc�cio da ca�a, a permiss�o ser� estabelecida em ato regulamentador do Poder P�blico Federal.
§ 2º A utiliza��o, persegui��o, ca�a ou apanha de esp�cies da fauna silvestre em terras de dom�nio privado, mesmo quando permitidas na forma do par�grafo anterior, poder�o ser igualmente proibidas pelos respectivos propriet�rios, assumindo estes a responsabilidade de fiscaliza��o de seus dom�nios.
Art. 2º � proibido o exerc�cio da ca�a profissional.
Art. 3º. � proibido o com�rcio de esp�cimes da fauna silvestre e de produtos e objetos que impliquem a sua ca�a, persegui��o, destrui��o ou apanha.