Sandro Sanfelice diz que os criadores desta forma de piada s�o como a orquestra do Titanic: diante da enxurrada de esc�ndalos que atinge o pa�s h� mais de dois anos, continuam tocando. E suas altas notas parecem ir longe. Com 1,3 milh�o de seguidores em sua p�gina do Facebook, "Capinaremos", este funcion�rio de uma companhia telef�nica em Curitiba afirma que alguns de seus memes alcan�aram os cinco milh�es de usu�rios.
Para acompanhar o ritmo deste Brasil fren�tico, Sanfelice criou no ano passado a "Capina Meme Factory", uma central de produtores de anedotas que se re�nem em um grupo fechado do Facebook. L�, qualquer integrante pode propor o seu meme e, se for bem avaliado, cumprindo as regras �ticas, ser� publicado por algum dos 10 moderadores. Uma vez na Internet, pode ter uma vida curta, mas com a chance de ser explosivo no segundo pa�s mais ativo do mundo no Facebook, segundo os dados da empresa.
"Todos os assuntos que tomam certa relev�ncia acabam se tornando memes quase instantaneamente, desde algo banal at� uma decis�o do tribunal eleitoral", conta este jovem de 28 anos que, como o resto dos integrantes da Capinaremos, colabora voluntariamente. Uma de suas grandes noites foi a de 17 de maio, quando o jornal O Globo revelou a grava��o em que Michel Temer parece dar o aval ao pagamento de propina ao ex-deputado Eduardo Cunha. Enquanto a crise dava outra volta inesperada, deixando o futuro do presidente por um fio, muitos brasileiros mostraram sua indigna��o com criatividade.
Por centenas de milhares de celulares come�aram a correr montagens do presidente ou imagens antigas de seus antecessores e inimigos pol�ticos, Luiz In�cio Lula da Silva e Dilma Rousseff, gargalhando.
- Aviso -
As piadas, entretanto, n�o foram engra�adas para todo mundo e poucos dias depois Sanfelice e outros criados de memes foram contactados pela Presid�ncia. "Recebemos um e-mail comunicando que as fotos oficiais de Temer n�o podiam ser usadas para nenhum fim que n�o fosse jornal�stico", conta o respons�vel da Capinaremos.
Embora reconhe�a que o "pux�o de orelha" os deixou apreensivos, decidiram continuar publicando memes sobre o presidente. Depois, a Presid�ncia esclareceu que o e-mail se limitava a recordar que � necess�rio pedir autoriza��o para usar imagens oficiais com fins comerciais.
Mas para o professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), Viktor Chagas, o aviso era muito claro. "O pol�tico est� pouco acostumado a ver sua imagem sair de sua esfera de controle. Com a Internet � cada vez mais f�cil que ocorra e isso lhes preocupa", afirma o pesquisador de m�dia.
Junto com um grupo de alunos e professores, Chagas criou em 2015 o "Museu de memes", um projeto dedicado ao estudo e arquivo desta nova forma de express�o que vai muito al�m da piada f�cil. "N�o podemos olhar para este fen�meno apenas do ponto de vista das not�cias falsas ou da p�s-verdade, como se todo o conte�do merecesse ser descartado. Devemos levar em conta que as pessoas est�o tendo acesso a um debate que antes n�o tinham e isso tamb�m transforma a realidade social", assegura.
- Realidade que supera a fic��o -
Menos subversivo do que na China e com um grau menor de incorre��o pol�tica do que nos Estados Unidos, para Chagas o humor brasileiro est� mais centrado em desconstruir os poderosos, com um toque de autopar�dia. Um bom exemplo dessa tomada de dist�ncia � a p�gina "O Brasil que deu certo", onde mais de 1,2 milh�o de usu�rios seguem no Facebook a sele��o de not�cias e de imagens feita por seu criador, Ciro Hamen, e por sua equipe.
Desde as selfies feitas por algumas pessoas enquanto esperam que um tiroteio acabe at� a apari��o na m�dia de uma mulher que gritava "Temer, eu te amo" em frente ao Pal�cio do Planalto em plena crise institucional, pode-se encontrar um cat�logo de a��es incomuns que tamb�m s�o uma cr�nica do pa�s. "A realidade aqui pode ser muito mais louca do que a fic��o. Muitas vezes recebemos um conte�do que dizemos: 'n�o � poss�vel, deve ser inventado'. Mas n�o, � verdade", confessa Hamen.