
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidad�o, ligada ao Minist�rio P�blico Federal, divulgou uma nota nesta ter�a-feira em que repudia a orienta��o dada pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) para que os quart�is celebrem a “data hist�rica” – quando um golpe militar derrubou o governo de Jo�o Goulart e iniciou o regime ditatorial que terminou em 1985. Para os procuradores que assinam o documento, o ato se reveste de “enorme gravidade constitucional”, representa um “desrespeito” ao estado democr�tico de direito e o uso de estrutura p�blica para defender o per�odo pode ser considerado ato de improbidade administrativa.
“Embora o verbo comemorar tenha como um significado poss�vel o fato de se trazer � mem�ria a lembran�a de um acontecimento, inclusive para critic�-lo, manifesta��es anteriores do atual presidente da Rep�blica indicam que o sentido da comemora��o pretendida refere-se � ideia de festejar a derrubada do governo de Jo�o Goulart em 1º de abril de 1964 e a instaura��o de uma ditadura militar”, afirmou o texto.
Os procuradores lembram na nota que, em 1964, o pa�s vivia um governo leg�timo constitucionalmente, e o golpe de 1964 foi um “rompimento violento e antidemocr�tico da ordem constitucional”. Eles argumentaram ainda que a disputa narrativa para as motiva��es do golpe s�o “irrelevantes” para justificar a derrubada de um governo democr�tico. Al�m disso, deu origem a um regime de restri��es a direitos fundamentais e repress�o violenta e sistem�tica � dissid�ncia pol�tica, movimentos sociais e diversos segmentos.
“Transcorridos 34 anos do fim da ditadura, diversas investiga��es e pesquisas sobre o per�odo foram realizadas. A mais importante de todas foi a conduzida pela Comiss�o Nacional da Verdade, CNV, que funcionou no per�odo de 2012 a 2014. A CNV foi institu�da por lei e seu relat�rio representa a vers�o oficial do Estado brasileiro sobre os acontecimentos. Juridicamente, nenhuma autoridade p�blica, sem fundamentos s�lidos e transparentes, pode investir contra as conclus�es da CNV, dado o seu car�ter oficial. A CNV confirmou que o Estado ditatorial brasileiro praticou graves viola��es aos direitos humanos que se qualificam como crimes contra a humanidade”.
No texto, os procuradores ressaltam que a Corte Interamericana de Direitos Humanos teve a mesma conclus�o ao julgar o caso do jornalista Vladimir Herzog, morto durante a ditadura. Em seguida transcrevem n�meros do per�odo: �rg�os de repress�o assassinaram ou desapareceram com 434 suspeitos de dissid�ncia pol�tica e mais de 8 mil ind�genas. Entre 30 e 50 mil pessoais foram presas ilicitamente ou torturadas.
“Esses crimes b�rbaros (execu��o sum�ria, desaparecimento for�ado de pessoas, exterm�nio de povos ind�genas, torturas e viola��es sexuais) foram perpetrados de modo sistem�tico e como meio de persegui��o social. N�o foram excessos ou abusos cometidos por alguns insubordinados, mas sim uma pol�tica de governo, decidida nos mais altos escal�es militares, inclusive com a participa��o dos presidentes da Rep�blica. A gravidade desses fatos � de clareza solar”, continua o texto.
No entendimento dos autores da nota, se os fatos ocorressem na atualidade, receberiam “grave reprimenda” judicial, o que inclui o Tribunal Penal Internacional, criado em 1998 e ratificado pelo Brasil em 2002. “Festejar a ditadura �, portanto, festejar um regime inconstitucional e respons�vel por graves crimes de viola��o aos direitos humanos. Essa iniciativa soa como apologia � pr�tica de atrocidades massivas e, portanto, merece rep�dio social e pol�tico, sem preju�zo das repercuss�es jur�dicas”.
A nota � assinada pelos procuradores federais Deborah Duprat, Domingos S�vio Dresch da Silveira, Marlon Weichert e Eug�nia Augusta Gonzaga.