Redu��o da viol�ncia comemorada por Moro � vista com cautela por especialistas
Para eles, a queda nos �ndices de homic�dio, comemorada pelo ministro da Justi�a, n�o tem rela��o com o discurso do governo na �rea de seguran�a, mas com a soma de medidas adotadas dois anos atr�s
postado em 13/10/2019 04:00 / atualizado em 13/10/2019 08:29
Sergio Moro, ministro da Justi�a: "Trabalho duro, intelig�ncia e a��o integrada das for�as federais, estaduais e distritais t�m levado a esse resultado. Se aprovado o pacote anticrime no Congresso, o n�mero cairia mais" (foto: MARCELO FERREIRA/CB/D.A PRESS %u2013 6/7/19)
Celebrada pelo ministro da Justi�a Sergio Moro, por governadores e secret�rios de Seguran�a como resultado do bom trabalho nos primeiros meses de governo, a queda nos �ndices de viol�ncia no ano passado e no primeiro semestre de 2019 � tratada com cautela por especialistas. De acordo com levantamento do F�rum Brasileiro de Seguran�a P�blica (FBSP), o Brasil registrou redu��o de 22% nos homic�dios entre janeiro e julho, sendo que em 2018 j� havia registrado queda de 11%. Os n�meros mostram ainda que o fen�meno n�o foi particular ou regional, uma vez que houve melhora em 22 estados.
Entre hip�teses mais consideradas para a redu��o na criminalidade est�o medidas tomadas por autoridades desde 2016 e 2017, quando as estat�sticas chegaram ao �pice e houve press�o da opini�o p�blica por melhorias na seguran�a. Tamb�m aparecem (principalmente entre pol�ticos e militares) teorias como uma autorregula��o das fac��es criminosas, quantidade de armas em circula��o e pol�ticas de aprisionamento.
Ontem, Moro comemorou em sua conta no Twitter a redu��o de assassinatos, de roubos a bancos (40%) e a ve�culos (27%). Disse que os n�meros s�o resultado de “trabalho duro, intelig�ncia e a��o integrada das for�as federais, estaduais e distritais.” E ainda acrescentou: “Se aprovado o pacote anticrime no Congresso, o n�mero cairia mais.”
A pedido do Estado de Minas, profissionais de diferentes �reas ligadas � seguran�a p�blica analisaram os motivos para a redu��o nos �ndices de criminalidade. Eles ressaltam que o fen�meno n�o est� diretamente ligado ao discurso mais radical do atual governo em rela��o ao combate � criminalidade, mas pode ser explicado como um somat�rio de a��es locais e mudan�as sociais. Para os especialistas, a flexibiliza��o da posse de armas, uma das propostas implementadas pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), pode ir na contram�o do cen�rio atual e levar ao aumento dos crimes violentos.
“Ainda � prematuro entender integralmente os fatores sociais e institucionais que levaram � queda nos �ndices de homic�dios e crimes violentos. N�o existem explica��es cient�ficas embasadas, mas temos hip�teses e suspeitas. A principal � que nos �ltimos dois anos a maioria dos estados adotou medidas mais rigorosas na preven��o, via Pol�cia Militar, e investiu mais na investiga��o, via Pol�cia Civil. � importante lembrar que em 2107 tivemos os n�veis mais altos de viol�ncia j� vistos no pa�s. Ent�o, houve uma grande press�o sobre os governadores, que buscaram as medidas no �mbito policial”, analisou Luiz Fl�vio Sapori, coordenador do Centro de Pesquisas em Seguran�a P�blica da PUC Minas e membro do F�rum Brasileiro.
Segundo dados oficiais do Sistema de Informa��es sobre Mortalidade, divulgado pelo Minist�rio da Sa�de, em 2017, houve 65 mil homic�dios no Brasil, o que equivale a uma taxa de 31,6 mortes para cada 100 mil habitantes. As estat�sticas gerais do pa�s apontam seguido crescimento na viol�ncia entre 2007 at� 2017. A partir de 2018, houve redu��o de 11% no n�mero de assassinatos e de janeiro a julho de 2019 a queda foi de 22%, sendo registrados entre janeiro e junho 21 mil homic�dios no pa�s.
O soci�logo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e especialista em seguran�a p�blica Cl�udio Beato Filho avalia que os resultados positivos s�o resultado de um somat�rio de fatores, que v�o de a��es policiais at� mudan�as demogr�ficas no pa�s na �ltima d�cada. “Registramos essa queda nos �ltimos dois anos, sendo que em alguns lugares a redu��o nos �ndices come�ou antes. Temos a��es no �mbito estadual, como a moderniza��o nas estruturas de seguran�a, mais qualifica��o das pol�cias e mais uso de tecnologias. Temos tamb�m uma mudan�a na estrutura demogr�fica do Brasil, com o envelhecimento da popula��o. A redu��o na faixa dos jovens, que s�o as maiores v�timas dos homic�dios, por exemplo, pode refletir essa mudan�a”, diz Beato.
Para os especialistas, fica claro que o momento de crise econ�mica, com milh�es de desempregados e aumento da popula��o na faixa da extrema pobreza, n�o tem rela��o direta com o aumento da viol�ncia. “Estamos vendo a economia sem se estabilizar ao mesmo tempo em que os �ndices est�o caindo. N�o h� rela��o concreta entre as duas situa��es. Ningu�m sai assaltando e matando porque est� desempregado. N�o � algo simples uma pessoa se tornar criminosa. � uma quest�o que envolve muitas coisas e muitos valores”, analisa Fl�vio Sapori.
Cl�udio Beato tamb�m entende que n�o existe uma correla��o entre o aumento da viol�ncia com momentos de crise econ�mica, mas ressalta que os �ndices de crimes contra o patrim�nio – furtos e roubos – n�o acompanharam a redu��o registrada nos homic�dios e outros crimes violentos. “Os crimes contra o patrim�nio n�o est�o caindo na mesma velocidade, ent�o podemos ter alguma rela��o com a crise econ�mica. Mas s�o n�meros que envolvem outras situa��es, como caracter�sticas locais, por exemplo”, explica Beato.
Alerta O criminalista Edson Luz Knippel, da Faculdade de Direito Mackenzie, de S�o Paulo, aponta que, na contram�o dos crimes violentos, alguns �ndices registraram aumento e servem de alerta para os governantes. “N�o tivemos s� a diminui��o nos levantamentos mais recentes. Percebemos o crescimento da viol�ncia dom�stica e de crimes ligados ao grupo LGBT. Ent�o, � preciso analisar todo o cen�rio. No caso dos homic�dios, a queda n�o se deve a fatos isolados. S�o dados que est�o muito ligados a quest�es locais e medidas pontuais. N�o vejo essa redu��o como resultado de pol�ticas recentes. As mudan�as nos n�meros da viol�ncia s�o de impacto em m�dio e longo prazos”, analisa Knippel.
Em setembro, ap�s a divulga��o do balan�o com a redu��o nos �ndices de 2018 e do primeiro semestre de 2019, o ministro Sergio Moro afirmou que o m�rito era tamb�m do governo federal e em suas redes sociais criticou os que citaram a��es estaduais como reflexo dos dados. “Claro, para alguns autodenominados especialistas em seguran�a p�blica, o governo n�o estaria fazendo nada para contribuir com a queda de crimes. Cegueira ideol�gica ou pol�tico-partid�ria? N�o sei, o que importa � que vamos trabalhar para reduzir ainda mais a criminalidade”, escreveu. A reportagem procurou o ministro Moro para ouvir sua an�lise sobre a redu��o dos crimes violentos, mas o Minist�rio da Justi�a e Seguran�a P�blica n�o quis se manifestar.
Minas acompanha queda nos �ndices de homic�dio
Secret�rio de Justi�a e Seguran�a P�blica, general Mario Ara�jo: mesmo com a crise financeira, governo manteve programas de preven��o (foto: Ed�sio Ferreira/EM/D.A PRESS
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A viol�ncia em Minas Gerais acompanhou a tend�ncia do Brasil e dos outros estados, com queda significativa em 2018 e no primeiro semestre de 2019. De acordo com o levantamento do F�rum Brasileiro de Seguran�a P�blica, entre 2017 e 2018 os homic�dios dolosos ca�ram quase 30%, passando de 3.966 para 3.055. Os latroc�nios (roubos seguidos de morte) tamb�m tiveram queda – de 104, em 2017, para 82, em 2018. No primeiro semestre deste ano, continuaram as quedas nas mortes violentas, com redu��o de 18%, incluindo homic�dios e latroc�nios.
O secret�rio de Estado de Justi�a e Seguran�a P�blica, general Mario Ara�jo, ressaltou “a��es bem-sucedidas” de governos anteriores e que os �ndices positivos dos �ltimos anos representam fen�meno de v�rias frentes, mas destacou que a atual gest�o priorizou a seguran�a p�blica diante de um cen�rio de crise econ�mica do estado para manter programas na �rea de preven��o. Ara�jo admite, no entanto, que a falta de recursos impediu o lan�amento de novos programas e investimentos na estrutura do sistema.
“Al�m da continuidade de medidas bem-sucedidas de gest�es anteriores, como a implanta��o das bases m�veis nas cidades-polo mineiras e pol�tica de prioriza��o da atividade-fim policial, hoje h� uma melhor integra��o dos �rg�os de seguran�a p�blica no estado e programas de preven��o � criminalidade. O governo Romeu Zema colocou tr�s pilares como prioridade: sa�de, seguran�a e educa��o. Por isso as pastas foram as que menos sofreram cortes financeiros. Tivemos que reduzir o custeio em algumas atividades, mas conseguimos manter os programas na �rea de preven��o”, analisa o secret�rio de Seguran�a.
Ex-secret�rio de Seguran�a de Belo Horizonte, Cl�udio Beato, considera que a atua��o mais efetiva das for�as policiais em alguns estados come�aram antes de outros, como S�o Paulo e Cear�, o que levou a resultados diferentes em cada lugar. Ele explica tamb�m que desde os altos �ndices de crimes violentos entre 2015 e 2017, muitas prefeituras se mobilizaram para atuar na �rea da seguran�a ao lado dos governos estaduais. “Em Minas Gerais, por exemplo, as administra��es municipais tamb�m passaram a focar muito na preven��o e evitando crimes”, diz Beato.
Futuro Os especialistas ouvidos pelo Estado de Minas avaliam que a tend�ncia de redu��o nos �ndices de criminalidade deve se manter nos pr�ximos anos, mas se mostram preocupados com a implementa��o de algumas medidas pelo atual governo federal que podem levar ao aumento de mortes violentas. “Certamente, a libera��o do uso de armas ter� impacto negativo para certos tipos de crimes, como viol�ncia dom�stica e brigas de gangues”, aposta o ex-secret�rio da capital mineira.
“Talvez tenhamos mais dois anos de queda, caso os governadores mantenham as pol�ticas de preven��o e a estrat�gia de buscar uma melhor atua��o policial. Mas uma preocupa��o importante deve ser com o sistema prisional, que deve se tornar um gargalo cada vez mais s�rio, com superlota��es. Tamb�m existe uma preocupa��o com a libera��o de armas, que pode atuar como elemento de recrudescimento da viol�ncia e das mortes violentas”, analisa Luiz Fl�vio Sapori, do Centro de Pesquisas em Seguran�a P�blica da PUC Minas.
Para o advogado criminalista Edson Luz Knippel, as propostas de aumento de penas e de libera��o de posse de armas de fogo podem influenciar negativamente no cen�rio brasileiro. “N�o � poss�vel imaginar que o aumento de penas reduza a criminalidade. Historicamente, n�o � o que se v�. A redu��o da viol�ncia depende de pol�ticas p�blicas bem-sucedidas. Tamb�m n�o vejo como positivo a flexibiliza��o das armas. Armas servem para matar pessoas, e o cidad�o n�o tem condi��o t�cnica nem psicol�gica para usar armas. Infelizmente, � mais prov�vel que mais armas acabem caindo em m�os erradas”, analisa Knippel.
Diverg�ncias com ministro Moro
Sergio Moro: “O m�rito � tamb�m do governo federal porque assistimos basicamente a uma redu��o da criminalidade em todo o pa�s, o que nos leva a crer que existe uma causa nacional para a redu��o da criminalidade. Entre elas, recorde de apreens�o de drogas.” (Entrevista � Globo News)
(foto: Marta Carneiro / PUC Minas )
Luiz Fl�vio Sapori: “N�o sabemos ainda os motivos da queda da viol�ncia. � prematuro para entender os fatores sociais e institucionais deste fen�meno e n�o tem explica��es embasadas cientificamente. Temos hip�teses para explicar. A principal � que nos �ltimos dois anos a maioria dos estados adotou medidas de preven��o. Uma resposta aos altos n�veis de criminalidade que chegaram ao auge em 2017.”
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Sergio Moro: “A pol�tica de seguran�a de Jair Bolsonaro tem por base o isolamento das lideran�as criminosas em pres�dios federais e o controle das comunica��es. Isso tem levado � redu��o dos crimes e protegido a popula��o contra ataques e ordens de assassinatos.” (Twitter)
(foto: Lia de Paula/Agencia Senado )
Cl�udio Beato: “A quest�o das fac��es e do crime organizado tem um alcance limitado a alguns estados. O impacto � local e limitado. A redu��o nos �ndices � nacional, portanto, envolve diversos fatores.”
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S�rgio Moro:“N�o tem a ver com a seguran�a p�blica (libera��o de armas). Foi uma decis�o tomada pelo presidente em atendimento ao resultado das elei��es e existe toda uma pretens�o de v�rias pessoas que
(foto: Arquivo Pessoal )
entendem que t�m um direito e isso est� sendo preservado. Mas isso n�o significa a delega��o (da seguran�a p�blica) ao cidad�o privado, tanto que estamos trabalhando firmes para debelar esses problemas.” (Audi�ncia no Congresso Nacional)
Edson Luz Knippel: “N�o vejo como positivo a flexibiliza��o das armas. Armas servem para matar pessoas, e o cidad�o n�o tem condi��o t�cnica nem psicol�gica para usar amas. Infelizmente, � mais prov�vel que mais armas acabem caindo em m�os erradas.”