
A demiss�o de Regina Duarte � mais um cap�tulo do drama em que mergulhou a Cultura na gest�o Jair Bolsonaro. O desprezo do presidente pelo setor ficou evidente logo ap�s a elei��o dele. Uma das primeiras medidas que tomou foi extinguir o Minist�rio da Cultura e transform�-lo em secretaria, agora sob o guarda-chuva do Turismo.
A s�rie de nomea��es — muitas delas controversas — e exonera��es na pasta agravaram a situa��o do setor, j� �s voltas com a falta de investimento. Assim, a Cultura, que j� teve como ministros nomes do calibre do diplomata e acad�mico Sergio Paulo Rouanet, do economista e intelectual Celso Furtado e do cantor e compositor Gilberto Gil, segue � deriva, sem solu��o � vista.
Regina Duarte deixa a Secretaria de Cultura sem conseguir nenhuma medida de socorro ao setor duramente impactado pela pandemia do coronav�rus. Ap�s 78 dias no cargo, sucumbiu � press�o da ala ideol�gica do governo — que a enxerga como algu�m muito ligada � esquerda — e �s frituras do pr�prio presidente. Como pr�mio de consola��o, prometeu � atriz o comando da Cinemateca Brasileira, em S�o Paulo. O mais cotado para assumir a secretaria � o ator M�rio Frias.
O an�ncio da demiss�o de Regina foi feito nessa quarta-feira (20), por meio de um v�deo gravado nos jardins do Pal�cio da Alvorada. Na grava��o, Bolsonaro e a atriz minimizaram a exonera��o. O presidente justificou que a artista estava com saudades da fam�lia e que, com a mudan�a, ela conseguir� conciliar os dois lados.
“Vim perguntar aqui para o presidente se ele realmente est� me fritando, porque eu estou lendo isso em uma imprensa, que eu n�o acredito mais, mas, de qualquer forma, queria que me dissesse pessoalmente. Est� me fritando, presidente?”, questionou Regina, em tom teatral. Bolsonaro, por sua vez, disse que toda semana “tem um ou dois ministros que, segundo a m�dia, est�o sendo fritados”. “O objetivo � desestabilizar a gente e tentar jogar o governo no ch�o. N�o v�o conseguir. Jamais ia fritar voc�.”
Regina quis deixar transparecer que a mudan�a foi positiva e almejada por ela, dizendo que a ida para a Cinemateca foi um “presente”. Ela contou com a ajuda da deputada Carla Zambelli (PSL-SP), que a acompanhou mais cedo em reuni�o com o chefe do Executivo na resid�ncia oficial e filmou o comunicado. Segundo a atriz, o convite para a institui��o “� um sonho de qualquer pessoa de comunica��o, de audiovisual, cinema, teatro”. E completou: “� um presente duplo: � a Cinemateca e estar pr�xima da minha fam�lia, que � uma coisa que eu estou desejando muito”.
“Chateado”
No v�deo, Bolsonaro consolou Regina. “Eu acho que voc� quer ajudar o Brasil, e o que eu mais quero � o seu bem, pelo seu passado e tudo aquilo que voc� representa a todos n�s. (...) E para a Cinemateca, do lado do seu apartamento, ali em S�o Paulo, voc� vai ser feliz e produzir muito mais”, discursou. “Eu fico muito feliz com isso. Chateado, porque voc� se afasta um pouco do conv�vio nosso em Bras�lia.”
Apesar das declara��es j� era de conhecimento p�blico a insatisfa��o de Bolsonaro com a gest�o da atriz e que queria retir�-la da secretaria. Ela n�o s� falhou em acalmar a classe art�stica na rela��o com o governo — uma das suas miss�es quando assumiu a pasta — como foi bastante criticada pelo setor. O momento mais controverso da artista no governo foi quando, em entrevista � CNN, no in�cio deste m�s, cantou a marchinha da ditadura e minimizou as mortes ocorridas naquele regime.
Horas depois do an�ncio da demiss�o, Regina postou mensagem nas redes sociais em que atacou parte do setor cultural. “Continuo acreditando no sonho de achar o caminho do meio. Vou lutar sempre por escapar do ambiente raivoso que acomete parte do setor, um grupo que trabalha cotidianamente, n�o para construir nada, mas para separar os criadores de arte, impondo o atraso, impedindo a conex�o de todos”, escreveu. “Tudo isso � feito em nome de ideologias e ressentimentos partid�rios que nada t�m a ver com o fazer cultural.”
Baixas no governo
Veja os ocupantes do alto escal�o que deixaram a gest�o Bolsonaro em pouco mais de um m�s
Luiz Henrique Mandetta
Demitido do Minist�rio da Sa�de, em 16 de abril, ap�s longa fritura, porque se recusou a flexibilizar o isolamento social e a assinar protocolo de uso da cloroquina desde os primeiros sintomas da doen�a.
Sergio Moro
Pediu exonera��o do Minist�rio da Justi�a e Seguran�a P�blica ap�s Bolsonaro demitir o ent�o diretor-geral da Pol�cia Federal, Maur�cio Valeixo. O ex-magistrado acusou o presidente de tentar interferir politicamente na corpora��o.
Nelson Teich
M�dico assim com Mandetta, pediu exonera��o do Minist�rio da Sa�de pelos mesmos motivos do antecessor: n�o pregou a flexibiliza��o do isolamento social e, principalmente, recusou-se a ceder � press�o para liberar uso da cloroquina, inclusive, em pacientes com sintomas leves.
Regina Duarte
Ap�s um processo de fritura, a atriz foi dispensada da Secretaria de Cultura. A alega��o � de que ela sentia falta da fam�lia. Bolsonaro j� tinha demonstrado insatisfa��o com a atua��o da secret�ria. Ela, por sua vez, era pressionada a sair pela ala ideol�gica do governo.
Entenda o caso
Desventuras em s�rie
Regina Duarte estava sendo bombardeada pelo governo havia semanas. No �ltimo dia 5, o Executivo nomeou, sem consult�-la, o maestro Dante Mantovani para a Funda��o Nacional de Artes (Funarte) — cargo do qual ele tinha sido exonerado em 4 de mar�o, data da posse da atriz. No mesmo dia, no entanto, o governo voltou atr�s.
Na ocasi�o da nomea��o de Mantovani, um �udio de uma conversa entre Regina e uma assessora, obtido pela revista Cruso�, mostrou que a pr�pria atriz acreditava que estava sendo dispensada pelo presidente Bolsonaro. “Que loucura isso, que loucura. Eu acho que ele est� me dispensando”, disse. O maestro, que gerou grande pol�mica ao associar rock com sexo, satanismo e aborto, tinha sido indicado pelo antecessor de Regina na secretaria, Roberto Alvim.
Em 28 de abril, quando Regina ainda estava em home office em S�o Paulo, Bolsonaro lamentou o fato de a secret�ria estar fisicamente longe e n�o em Bras�lia e disse que “ela tem dificuldades”. Quatro dias depois, a atriz voltou a Bras�lia.
O abalo no “casamento” de Regina com Bolsonaro j� dava sinais no dia da posse da atriz. Na ocasi�o, ela fez quest�o de lembrar ao presidente sobre a promessa de “carta branca” na pasta. O chefe do Executivo respondeu: “Regina, todos os meus ministros tamb�m receberam seus minist�rios sob porteira fechada. Obviamente, em alguns momentos, eu exer�o poder de veto em alguns nomes”. Ela n�o conseguiu montar o time que desejava, pois v�rios dos nomes que indicou foram bloqueados pelo governo.