
No dia em que a C�mara votar� a proposta de emenda � Constitui��o (PEC) do voto impresso - amplamente defendido pelo governo -, um comboio de blindados militares passar� pelo Congresso a caminho do Pal�cio do Planalto. As tropas integram a Opera��o Formosa, realizada todos os anos pela Marinha, mas que nunca incluiu a Pra�a dos Tr�s Poderes no trajeto at� a cidade goiana.
Outro fato in�dito � a participa��o do Ex�rcito e da Aeron�utica, al�m de a coordena��o ficar sob a responsabilidade do Minist�rio da Defesa. A decis�o � vista como uma tentativa de intimida��o do Parlamento e provocou cr�ticas de congressistas e a��es na Justi�a.
Marinha justificou que a inten��o � entregar convite ao presidente Jair Bolsonaro e ao ministro da Defesa, Braga Netto, para participarem da cerim�nia de abertura do evento no Entorno do DF, marcada para o pr�ximo dia 16.
No an�ncio sobre a passagem pela Esplanada dos Minist�rios, a No Judici�rio e no Congresso, a a��o � vista como uma tentativa de pressionar os deputados, tendo em vista o cen�rio de forte rejei��o � PEC. Prevendo derrota na C�mara, o governo estaria fazendo uma demonstra��o de suposta lealdade pol�tica das For�as Armadas � escalada autorit�ria de Bolsonaro.
Com 2.500 militares envolvidos na Opera��o Formosa, os blindados partiram do Rio de Janeiro, e a expectativa � de que o comboio chegue ao centro de Bras�lia por volta das 8h. A a��o causou surpresa at� mesmo a integrantes do alto escal�o do Ex�rcito, que dizem n�o terem sido informados com anteced�ncia do evento. Fontes militares consultadas pelo Correio Braziliense, sob a condi��o de anonimato, afirmam que a ordem para seguir at� o Planalto, passando em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Congresso, partiu do Minist�rio da Defesa.
Amea�a
A presen�a de blindados no centro do poder � mais um cap�tulo em torno de pol�micas provocadas pelo alinhamento de militares com o governo. As imagens da Esplanada com tanques devem ter forte representa��o pol�tica e hist�rica. A cena � incomum e preocupa o Legislativo.
A senadora Simone Tebet (MDB-MS) chamou o desfile de intimida��o e disse que se trata de a��o inconstitucional. "Tanques na rua, exatamente no dia da vota��o da PEC do voto impresso, passou do simbolismo � intimida��o real, clara, indevida, inconstitucional. Se acontecer, s� cabe � C�mara dos Deputados rejeitar a PEC, em resposta clara e objetiva de que vivemos numa democracia e que assim permaneceremos", declarou.
J� o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) v� ensaio de golpe. "Colocar tanques na rua n�o � demonstra��o de for�a e, sim, de covardia. Os tanques n�o s�o seus, pertencem � na��o. Quer tentar golpe, senhor Jair Bolsonaro? � o crime que falta para lhe colocarmos na cadeia", frisou.
Por sua vez, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) questionou os gastos de verba p�blica envolvidos no desfile, que foi avisado com um dia de anteced�ncia. "Pedi � Justi�a que impe�a o gasto de recursos p�blicos em uma exibi��o vazia de poderio militar. As For�as Armadas, institui��es de Estado, n�o precisam disso. Os brasileiros, sofrendo com as consequ�ncias da pandemia, tamb�m n�o. O Brasil n�o � um brinquedo na m�o de lun�ticos", destacou pelas redes sociais.
Vieira protocolou a a��o popular na Justi�a Federal da 1ª Regi�o. A deputada Tabata Amaral (sem partido-SP) tamb�m � signat�ria do processo. "Est� claro que Bolsonaro quer intimidar o Congresso na sess�o que vai decidir sobre o voto impresso. � inadmiss�vel esse comportamento do presidente", escreveu a parlamentar nas redes sociais.
Opini�o semelhante foi expressada pela deputada Perp�tua Almeida (PCdoB-AC). "H� homens fracos e frouxos que usam da for�a para mostrar poder. Bolsonaro � desses. Em baixa nas pesquisas, traz ve�culos de artilharia e combate, usados em treinamentos militares, para a Esplanada.
Mais uma vez, usa as institui��es militares para impulsionar seu projeto anarquista de poder", escreveu nas redes sociais. "� um necess�rio exerc�cio da Marinha, mas que Bolsonaro transforma num espet�culo pol�tico, quando o traz pra Esplanada, com a clara inten��o de aumentar especula��es. Bolsonaro vive de especula��es e sobrevive de tens�es pol�ticas."
Ap�s a repercuss�o, a Marinha emitiu nota negando press�o pelo voto impresso. "Cabe destacar que essa entrega simb�lica foi planejada antes da agenda para a vota��o da PEC 135/2019 no plen�rio da C�mara dos Deputados, n�o possuindo rela��o com a mesma, ou qualquer outro ato em curso nos Poderes da Rep�blica", diz um trecho do comunicado.
Atritos com o Congresso
Ap�s o in�cio da CPI da COVID - quando militares da ativa que estiveram no comando do Minist�rio da Sa�de entraram para o grupo de investigados sob a suspeita de corrup��o em contratos de compra de vacinas -, cresceram os atritos entre o Minist�rio da Defesa e o Congresso. H� um m�s, o ministro da pasta, Braga Netto, e os comandantes militares assinaram uma nota dizendo que a comiss�o desrespeitava os militares em raz�o de seu presidente, Omar Aziz (PSD-AM), ter se referido � exist�ncia de uma suposta "banda podre" nas For�as Armadas. Um dia depois, segundo o Estad�o, Braga Netto fez chegar ao presidente da C�mara, Arthur Lira (PP-AL), que sem a ado��o do voto impresso n�o haveria elei��es em 2022.
Desfile dos militares provoca preocupa��o
Ministro da Defesa entre 2011 e 2015, no governo da ent�o presidente Dilma Rousseff (PT), Celso Amorim classificou como muito preocupante a ida de militares em ve�culos blindados a Bras�lia, diante da crise institucional entre o Pal�cio do Planalto e os outros Poderes.
"S� posso interpretar isso como uma amea�a. Se n�o est� no consciente, est� no subconsciente. O Congresso vai votar no mesmo dia a PEC (do voto impresso) que diz respeito a um assunto crucial que j� est� provocando uma crise entre os Poderes. � uma situa��o tensa, dif�cil", afirmou.
Al�m de a exibi��o ocorrer no dia da vota��o da PEC, h� o cen�rio de reiterados ataques do presidente Jair Bolsonaro ao sistema eleitoral e ao Tribunal Superior Eleitoral. O chefe do Planalto disse, por diversas vezes, que, sem voto impresso, n�o haveria elei��es em 2022. "� uma demonstra��o de for�a meio absurda, sobretudo neste momento. Em pol�tica, n�o h� coincid�ncias. Mesmo que fosse uma coincid�ncia, que j� tivesse programado, em uma hora como esta, voc� modifica, desprograma", frisou.
Celso Amorim se disse preocupado com a situa��o. "Para fazer uma analogia com o direito internacional, a demonstra��o de for�a j� pode ser considerada um ato de guerra, dependendo da circunst�ncia. � muito preocupante. Acho que a gente n�o pode ficar tranquilo. Tanque na rua � uma coisa muito preocupante", destacou.
O ex-ministro afirmou que enxerga a situa��o como uma manifesta��o de apoio militar �s posi��es pol�ticas de Bolsonaro. "Se n�o for essa a inten��o, tem de provar que n�o �", enfatizou, dizendo que os militares precisam deixar claro que n�o apoiariam a��es golpistas. Na opini�o dele, a situa��o toda � ruim para as For�as Armadas, que sempre foram institui��es admiradas pela popula��o. Amorim destacou, ainda, que n�o cabe aos militares ficarem se manifestando sobre voto impresso.
Tamb�m ex-ministro da Defesa, Aldo Rebelo se disse confiante de que as For�as Armadas n�o embarcariam em uma "aventura" proposta pelo presidente que viole a Constitui��o. "Bolsonaro sabe que contar� com as For�as Armadas para tudo, para qualquer tarefa, qualquer servi�o de interesse p�blico. S� n�o contar� com as For�as Armadas para qualquer tipo de aventura que viole a Constitui��o", afirmou. "Ele sabe disso. Qualquer esfor�o de envolver as For�as Armadas em um plano de viola��o da Constitui��o vai terminar em fracasso." (ST e RS)
Arthur Lira: "Tr�gica coincid�ncia"
O presidente da C�mara, Arthur Lira (PP-AL), classificou como uma "tr�gica coincid�ncia" a realiza��o de desfile militar, hoje, da Marinha nos arredores do Congresso Nacional, quando est� prevista a vota��o da proposta de emenda � Constitui��o (PEC) do voto impresso. Para alguns parlamentares, o exerc�cio foi visto como uma tentativa de intimida��o do Congresso e de influenciar o resultado da vota��o.
"N�o � usual", disse Lira. "E n�o sendo usual, em um pa�s polarizado do jeito que o Brasil est�, isso d� cabimento para que se especule de algum tipo de press�o."
Ele afirmou, ainda, que entrou em contato com o Pal�cio do Planalto. "Falei com o presidente, e ele garantiu n�o haver esse intuito", destacou. Em entrevista ao O Antagonista, o presidente da C�mara ressaltou que o desfile n�o deve causar problemas � vota��o, mas, caso parlamentares achem conveniente, seria poss�vel adiar a vota��o da PEC.
"Essa Opera��o Formosa acontece desde 1988, aqui em Goi�s, com movimenta��es da Marinha. Este ano, ser�o acrescidos o Ex�rcito e a Aeron�utica. Ent�o, n�o � uma coisa que foi inventada, mas tamb�m nunca houve desfile na Esplanada dos Minist�rios para ir a Formosa (GO) e parar na frente do Pal�cio do Planalto", enfatizou.
Governo n�o apresenta provas de fraudes
Cobrado a se explicar sobre os ataques do presidente Jair Bolsonaro ao sistema eletr�nico de vota��o, o governo n�o apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF) provas de fraudes nas elei��es de 2014 e 2018.
Os documentos enviados � Corte foram elaborados pela Advocacia-Geral da Uni�o (AGU), que defende judicialmente os interesses do Planalto, e pela Secretaria-Geral da Presid�ncia da Rep�blica, a pedido do ministro Gilmar Mendes. Ele tinha dado 10 dias para que o Executivo se manifestasse em um mandado de seguran�a movido pela Rede Sustentabilidade para multar Bolsonaro em R$ 100 mil, caso ele n�o apresente provas das suspeitas levantadas sobre o sistema eletr�nico de vota��o. O partido acusa o chefe do Planalto de tentar descredibilizar as urnas antevendo uma poss�vel derrota nas elei��es do ano que vem.
Em 19 p�ginas, o governo se limita a argumentos de ordem t�cnica: diz que a Rede n�o tem legitimidade para propor a a��o e que o partido n�o apontou concretamente as normas jur�dicas que teriam sido violadas pelo presidente. "A 'prova' do impetrante se d� por ret�rica de cunho pol�tico e a partir de ila��es obtidas junto � m�dia, sem, portanto, qualquer suporte documental efetivo", escreve a Secretaria-Geral da Presid�ncia.
A AGU diz, ainda, que o mandado de seguran�a tem alcance restrito justamente para evitar, entre outros, a sua instrumentaliza��o por partidos pol�ticos. "Transformando-se em indesej�vel ve�culo de judicializa��o excessiva de quest�es governamentais e parlamentares", frisa a manifesta��o.
Em outro trecho, a Secretaria-Geral da Presid�ncia ressalta que n�o h� irregularidade na "mera possibilidade de levantar discuss�es sobre os aspectos que permeiam o sufr�gio eleitoral". "N�o resta qualquer d�vida de que o tema de fundo � bastante atual e est� longe de ser pac�fico, tendo at� mesmo a Justi�a Eleitoral acenado para a import�ncia e a necessidade de voto impresso e audit�vel, em clara e evidente busca pelo aperfei�oamento do pleito eleitoral, de modo a diminuir, o tanto quanto poss�vel, eventuais fraudes que o sistema eletr�nico de vota��o possa conter e, bem assim, poder transmitir maior fiabilidade aos eleitores", segue a pasta.
A pouco mais de um ano das elei��es, informa��es falsas sobre as urnas, ataques ao sistema eletr�nico de vota��o, defesa do comprovante impresso do voto e amea�as ao pleito de 2022 ganharam for�a nas redes bolsonaristas capitaneadas por Bolsonaro. O debate acabou abrindo uma crise entre Executivo e Judici�rio, depois que o Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal abriram investiga��es sobre as declara��es do presidente.