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Estado de Minas ELEI��ES 2022

Por que � t�o dif�cil medir efeito da reforma trabalhista, na mira de candidatos?

Dois novos estudos buscam mensurar impactos da reforma. Mas incerteza continua acerca de mudan�a que afeta o dia a dia dos trabalhadores e virou tema nas elei��es de 2022.


17/05/2022 06:12 - atualizado 17/05/2022 10:03


Carteira de Trabalho
Dois novos estudos buscam mensurar impactos da reforma. Mas incerteza continua acerca de mudan�a que virou tema nas elei��es de 2022 (foto: Ag�ncia Brasil )

A reforma trabalhista est� na agenda das elei��es de 2022. Ao menos dois candidatos � Presid�ncia — Lula e Ciro Gomes — falam na possibilidade de revogar ou revisar a mudan�a da CLT (Consolida��o das Leis do Trabalho), sancionada em 2017, durante o governo de Michel Temer.

Com 11,9 milh�es de desempregados ao fim do primeiro trimestre, 40% da popula��o ocupada na informalidade e queda de quase 9% da renda no ano, os brasileiros t�m uma d�vida: qual foi o efeito da reforma trabalhista sobre o emprego?

Antes da implementa��o, as promessas da equipe econ�mica de Temer eram de que a reforma — que, entre outras mudan�as, instituiu novas modalidades de contrata��o — criaria entre 2 e 6 milh�es de empregos nos anos seguintes � sua aprova��o.

Mesmo considerando a pandemia e crises institucionais desde ent�o, h� frustra��o da popula��o com uma taxa de desemprego que se mant�m em dois d�gitos h� seis anos — ainda que a reforma esteja em vigor h� mais de quatro deles.

No entanto, avaliar os impactos da reforma n�o � tarefa simples. Isso porque n�o basta olhar para dados como a taxa de desemprego e a renda, antes e depois da reforma, para chegar a alguma conclus�o, pois diversos fatores influenciam essas vari�veis e n�o � poss�vel saber como a economia teria se comportado caso a reforma n�o estivesse em vigor.

Dois estudos recentes tentam contornar essas dificuldades.

Mas ainda restam muito mais d�vidas do que certezas sobre como a reforma mudou a economia brasileira e como ela poderia ser alterada para beneficiar trabalhadores e empresas.


Homem com cartaz que diz 'procuro trabalho'
Com 11,9 milh�es de desempregados, 40% da popula��o ocupada na informalidade e queda de quase 9% da renda no ano, brasileiros se perguntam qual foi o efeito da reforma trabalhista sobre o emprego (foto: Marcelo Camargo/Ag�ncia Brasil)

Novo estudo da USP

Gustavo Pereira Serra, pesquisador do Made-USP (Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades da Universidade de S�o Paulo), destaca a dificuldade de se avaliar os efeitos da reforma trabalhista sobre o mercado de trabalho brasileiro.

"Desde que a reforma foi aprovada, ao final de 2017, muita coisa aconteceu na economia brasileira. A gente teve quest�es pol�ticas, uma troca de governo, tamb�m a crise econ�mica causada pela pandemia de covid-19. Ent�o � importante tentar isolar quais foram os impactos especificamente dessa reforma", diz Serra.

Por ser dif�cil, olhando somente para o Brasil, separar o que � efeito direto da reforma, o grupo de pesquisadores formado por Serra, Ana Bottega e Marina da Silva Sanches selecionou uma amostra de 12 pa�ses da Am�rica Latina e Caribe que n�o passaram por mudan�as em suas leis trabalhistas no per�odo analisado — que vai de 2003 a 2020.

Por esse crit�rio, Paraguai, Uruguai, Argentina e Costa Rica ficaram fora da amostra, por terem passado por algum tipo de mudan�a nas rela��es de trabalho no per�odo. Restaram Bahamas, Bol�via, Chile, Col�mbia, Rep�blica Dominicana, Guiana, M�xico, Nicar�gua, Santa L�cia, S�o Vicente e Granadinas e Trinidade e Tobago.

A partir do comportamento da taxa de desemprego nesses pa�ses, os economistas constroem um "Brasil sint�tico". Isto �, uma proje��o de como teria se comportado a taxa de desemprego brasileira, caso n�o tivesse sido aprovada por aqui a reforma trabalhista.

Esse modelo � controlado para uma s�rie de outras vari�veis, como crescimento do PIB, infla��o, c�mbio e taxa de juros, j� que todos esses indicadores influenciam a taxa de desemprego.

Usando essa t�tica, os economistas encontram que a reforma trabalhista teria reduzido a taxa de desemprego no pa�s entre 2018 e 2020 em 1 ponto percentual, na m�dia dos tr�s anos.

Em seguida, os economistas realizam um teste, para saber se essa varia��o encontrada � significativa do ponto de vista estat�stico.

E a� vem o banho de �gua fria.

Aplicando a mesma metodologia para pa�ses onde n�o houve reforma, como Chile, Guiana e Trinidade e Tobago, os economistas encontram diferen�as ainda maiores entre o modelo sint�tico e a taxa de desemprego efetiva desses pa�ses, o que indica que n�o se pode concluir que a diferen�a observada nos dados brasileiros seja resultado da reforma trabalhista.

"A gente n�o consegue afirmar que a cria��o de empregos foi maior com a reforma do que teria sido sem a reforma", diz Serra.

Ele destaca que uma dificuldade para a an�lise do caso brasileiro � o curto tempo da reforma em vigor.

Isso porque estudos utilizando metodologia semelhante, analisando reformas trabalhistas realizadas na Argentina, Austr�lia e Alemanha, encontraram redu��es na taxa de desemprego desses pa�ses entre 1,19 e 3,44 pontos percentuais em 12 anos.

"Por um lado, as grandes expectativas que o governo Temer tinha para a reforma definitivamente n�o foram correspondidas", observam Serra, Bottega e Sanches no estudo.

"Por outro lado, nossos resultados tamb�m sugerem cautela para concluirmos algo sobre a reforma t�o cedo, j� que n�o podemos dizer que ela foi a causa dos aumentos na taxa de desemprego nos �ltimos anos e nem podemos prever os efeitos que ter� a longo prazo."


Protesto contra a reforma trabalhista em São Paulo (abril de 2017)
'As grandes expectativas que o governo Temer tinha para a reforma definitivamente n�o foram correspondidas', observam Serra, Bottega e Sanches no estudo no Made-USP (foto: Getty Images)

Estudo sobre ponto espec�fico da reforma

Uma outra an�lise sobre a reforma trabalhista repercutiu bastante nas �ltimas semanas, embora o estudo ainda n�o esteja publicado e n�o seja poss�vel, por ora, avaliar a metodologia utilizada pelos pesquisadores.

O estudo analisa apenas um ponto da reforma: a regra que transfere ao trabalhador os custos com o advogado da empresa, caso ele perca uma a��o trabalhista na Justi�a.

"Criamos um modelo matem�tico para replicar o que era o Brasil exatamente antes da reforma, no ano de 2017", diz Danilo Paula de Souza, pesquisador de p�s-doutorado no Insper e um dos autores do estudo ao lado dos professores Raphael Corbi, Rafael Xavier Ferreira e Renata Narita, da FEA-USP (Faculdade de Economia, Administra��o, Contabilidade e Atu�ria da Universidade de S�o Paulo).

"Ent�o fazemos um exerc�cio contrafactual, que � analisar como seria esse Brasil p�s-reforma, sem olhar para os dados [da economia real], por que o emprego pode ter subido ou ca�do [na economia real] por motivos diversos, como quest�es de pol�tica externa, etc.", acrescenta Souza.

Os pesquisadores ent�o alteram esse modelo matem�tico para incluir a possibilidade de que o trabalhador tenha de arcar com parte do custo do processo judicial, caso venha a perd�-lo.

"Ent�o refazemos todos os c�lculos e vemos como as firmas e trabalhadores se comportariam nesse mundo 'contrafactual', em que simulamos a implementa��o desse ponto da reforma dentro do modelo", diz Corbi, tamb�m autor do estudo.

"Dentro do modelo, essa mudan�a resulta numa queda no n�mero de processos trabalhistas de 30%, ou de 800 mil processos — muito parecida com o que foi observado de fato na Justi�a do Trabalho. E uma redu��o de 1,7 ponto percentual no desemprego, que representa 1,7 milh�o de empregos a mais", acrescenta o pesquisador.

Segundo ele, isso significa que as firmas, antes da reforma, antecipavam o potencial custo de demiss�o elevado e contratavam menos gente. Com a reforma, as empresas teriam maior seguran�a na contrata��o e quanto aos custos de demiss�o e, por isso, contratariam mais, na vis�o dos pesquisadores.


Manifestantes seguram uma carteira de trabalho gigante em protesto contra a possível extinção da Justiça do Trabalho (São Paulo, janeiro de 2019)
Estudo analisou impacto de regra que transfere ao trabalhador os custos com o advogado da empresa, caso ele perca uma a��o trabalhista na Justi�a (foto: Anamatra)

Adriana Marcolino, soci�loga e t�cnica do Dieese (Departamento Intersindical de Estat�stica e Estudos Socioecon�micos), v� os resultados desse estudo com cautela.

"N�o conhe�o a metodologia do estudo, j� que ele n�o est� publicado, mas acredito ser pouco efetivo pegar uma medida que reduziu o n�mero de processos trabalhistas e avaliar que houve mais contrata��es no mercado de trabalho por conta disso", diz Marcolino.

A soci�loga avalia que � negativo ter havido uma redu��o no n�mero de processos trabalhistas, n�o porque as rela��es de trabalho tenham se tornado mais eficientes, mas porque, na sua vis�o, foi criado um obst�culo para que os trabalhadores possam reivindicar seus direitos na Justi�a.

"Sabemos que no Brasil h� um descumprimento muito grande das quest�es b�sicas relacionadas ao trabalho — pagamento de sal�rio, realiza��o de jornada, condi��es de sa�de. Ao inv�s de criar uma regula��o que resolvesse esses problemas de forma mais efetiva, criamos mecanismos para inibir o trabalhador de reclamar esses direitos", afirma.

"Com isso, o empregador pode ter tido uma redu��o de custos com a��es judiciais, mas n�o vejo como isso diretamente gerou empregos, a n�o ser num exerc�cio matem�tico."

Em outubro do ano passado, o STF (Supremo Tribunal Federal) julgou inconstitucional que trabalhadores com direito � justi�a gratuita paguem os honor�rios de sucumb�ncia, como s�o chamados os valores pagos aos advogados da parte vencedora de um processo judicial.

Ganhadores e perdedores

Para o economista Claudio Ferraz, professor da Universidade de British Columbia, no Canad�, e diretor cient�fico do JPAL (Poverty Action Lab) para a Am�rica Latina, s�o v�rios os fatores que explicam por que ainda h� t�o poucos estudos consistentes quanto aos efeitos da reforma trabalhista sobre a economia brasileira.

O primeiro problema, na avalia��o de Ferraz, � a falta de dados. Isso porque a principal fonte de estudos sobre o mercado de trabalho formal no Brasil � a Rais (Rela��o Anual de Informa��es Sociais), cujos microdados eram liberados com atraso de cerca de dois anos em rela��o ao ano de refer�ncia pelo Minist�rio da Economia, prazo que recentemente se tornou ainda mais longo.

Al�m disso, como a reforma entrou em vigor de uma vez para todos os trabalhadores brasileiros, n�o � poss�vel comparar grupos afetados e n�o afetados pela mudan�a da lei, que � uma maneira bastante usada para avaliar o impacto de pol�ticas p�blicas, observa o pesquisador.

O fato de a reforma ser bastante complexa, tendo mexido ao mesmo temo em diversos pontos das rela��es de emprego, tamb�m dificulta a an�lise dos impactos, avalia Ferraz.


Fila de pessoas em mutirão de emprego em São Paulo
Fato de a reforma ser complexa, tendo mexido em diversos pontos das rela��es de emprego dificulta an�lise dos impactos, avalia Ferraz (foto: Ag�ncia sindical)

Al�m da mudan�a da regra com rela��o aos honor�rios advocat�cios, a reforma trouxe diversas outras altera��es na lei, como a introdu��o do trabalho intermitente, a preval�ncia do combinado entre trabalhador e empregado sobre a legisla��o e a n�o obrigatoriedade da contribui��o sindical.

"� poss�vel olhar para peda�os da reforma, como faz o estudo recente do Raphael Corbi, Renata Narita e coautores, que olha para a redu��o no n�mero de processos na Justi�a trabalhista e como isso pode ter afetado empresas e o custo judici�rio das firmas com processos", diz Ferraz.

"Mas esse � um peda�o muito pequeno da reforma, cuja grande mudan�a eu avalio ser a flexibiliza��o do mercado em termos de contrata��o", afirma.

Para o economista, defensor de longa data das pol�ticas p�blicas baseadas em evid�ncias e do uso de dados para avalia��o de pol�ticas, eventuais mudan�as na reforma trabalhista devem levar em conta que diferentes grupos podem ter sido afetados de formas distintas pela mudan�a de regras.

"Normalmente, quando avaliamos pol�ticas p�blicas, olhamos para o efeito m�dio, mas a reforma trabalhista � um exemplo de como podemos ter 'ganhadores' e 'perdedores'", diz Ferraz.

Ele cita o exemplo das mulheres com filhos pequenos, que podem ter sido beneficiadas pela maior flexibilidade de contratos possibilitada pela reforma. Por outro lado, o economista avalia que pode haver muitos "perdedores", com o avan�o da subcontrata��o, da terceiriza��o de empregos e da perda de qualidade dos postos de trabalho.

"Dizer que, por defini��o, essa � uma reforma que piora a vida de todo mundo, acho que n�o � verdade. Por isso fico um pouco assustado quando as pessoas falam que � preciso reverter tudo, porque na verdade, a gente nem avaliou o que aconteceu e os efeitos s�o heterog�neos."

Para o pesquisador, a iniciativa do PT de olhar para o que foi feito na Espanha, com a revis�o da reforma trabalhista por l�, � um primeiro passo em um processo que demanda um diagn�stico preciso antes de se falar em mudan�as.

"O pontap� inicial � olhar para as similaridades entre a reforma brasileira e outras. Em segundo lugar, � preciso entender que essa � uma reforma microecon�mica, portanto precisamos olhar para os diferentes lados da reforma, o que aconteceu com empresas e trabalhadores. No momento em que soubermos o que aconteceu, ent�o podemos pensar que pol�ticas podemos implementar."

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