
O teto de gastos � a regra que limita o crescimento das despesas � varia��o da infla��o. Embora haja um consenso entre economistas sobre a necessidade de alter�-lo, ele ainda est� em vigor e precisa ser cumprido na execu��o do Or�amento. Por isso, o bloqueio de recursos � obrigat�rio para o governo.
A trava deixar� um saldo de apenas R$ 3,6 bilh�es para todo o governo federal atravessar o m�s de dezembro. O valor n�o inclui despesas como sal�rios e benef�cios sociais, uma vez que elas s�o obrigat�rias.
"Vai ser muito dif�cil, muito apertado. O governo nunca passou t�o apertado assim, o normal � vir flexibilizando [os bloqueios no Or�amento]", disse o secret�rio especial de Tesouro e Or�amento, Esteves Colnago. Apesar a situa��o cr�tica, ele avaliou que o governo conseguir� chegar ao fim do ano com as necessidades mais imediatas em dia. "Vamos atender a todas as pol�ticas que s�o importantes", afirmou, sem citar quais.
Segundo Colnago, o novo bloqueio de despesas vai incidir quase todo sobre os gastos discricion�rios de minist�rios, que bancam custos com o funcionamento, compra de materiais ou investimentos. As emendas parlamentares que ainda estavam dispon�veis j� est�o todas bloqueadas —h� na verdade uma press�o crescente pela libera��o desses recursos.
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Como mostrou a Folha de S.Paulo, parlamentares do centr�o articulam a aprova��o de um projeto de lei para alterar a LDO (Lei de Diretrizes Or�ament�rias) e incluir uma s�rie de dispositivos que flexibilizam a forma com que o teto de gastos � mensurado.
O efeito pr�tico das mudan�as seria evitar o novo bloqueio e ainda liberar recursos que j� estavam travados desde antes. O governo tamb�m tem interesse na medida para evitar um colapso de suas atividades.
N�o se descarta ainda incluir algum dispositivo na PEC (proposta de emenda � Constitui��o) da Transi��o, patrocinada pela equipe do presidente eleito, Luiz In�cio Lula da Silva (PT), para permitir a amplia��o de gastos no fim deste ano para resgatar os minist�rios mais comprometidos. A articula��o foi revelada pela Folha de S.Paulo. A avalia��o � que s� o projeto de lei pode n�o ser suficiente para aliviar a press�o sobre o Or�amento.
Em setembro, o valor total bloqueado no Or�amento havia alcan�ado R$ 10,5 bilh�es, sendo R$ 7,9 bilh�es em emendas de relator (instrumento usado como moeda de troca nas negocia��es pol�ticas com o Congresso) e R$ 2,6 bilh�es em despesas de minist�rios. Uma parte pequena chegou a ser liberada, mas a situa��o de aperto se imp�s novamente.
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Caso a nova trava de R$ 5,7 bilh�es precise ser implementada pela equipe econ�mica, o bloqueio total chegar� a R$ 15,4 bilh�es, deixando poucos recursos para a m�quina p�blica seguir rodando no �ltimo m�s de 2022. A situa��o � avaliada como cr�tica, e outros servi�os podem sofrer paralisa��es.
Hoje o teto de gastos precisa ser respeitado em dois momentos: na inclus�o das despesas no Or�amento e no efetivo desembolso financeiro para pagar as a��es. O projeto de lei em tramita��o no Congresso busca flexibilizar a primeira exig�ncia, permitindo a previs�o de despesas que ser�o quitadas s� no pr�ximo exerc�cio sem a necessidade de cancelar gastos de outros �rg�os.
Na pr�tica, o valor que ser� efetivamente pago em 2023 n�o precisaria ser contabilizado no teto deste ano, e o espa�o deixado por isso pode ser aproveitado para outra despesa.
'INTERPRETA��ES CRIATIVAS'
T�cnicos experientes ouvidos sob reserva avaliam que a proposta busca "inaugurar interpreta��es criativas" sobre o funcionamento do teto de gastos, ou simplesmente driblar o limite. Na �rea t�cnica do TCU (Tribunal de Contas da Uni�o), a avalia��o preliminar � de que a iniciativa � inconstitucional, pois altera o funcionamento do limite de despesas —que � previsto na pr�pria Constitui��o.
O projeto de lei originalmente s� alterava a data-limite para abertura de novos cr�ditos no Or�amento. O relat�rio com as mudan�as � do deputado AJ Albuquerque (PP-CE), correligion�rio do presidente da C�mara, Arthur Lira (PP-AL), e do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira. A reportagem n�o conseguiu contato com o parlamentar.
Um dos trechos do parecer desconta do teto de gastos os ajustes referentes a despesas prim�rias que s�o empenhadas no fim de um ano, mas s� t�m impacto financeiro no in�cio do exerc�cio seguinte —como ocorre com a folha de pagamento de servidores e da Previd�ncia Social.
O empenho � a primeira fase do gasto, quando o governo assume o compromisso de efetuar aquele pagamento. No caso dos sal�rios e benef�cios, o empenho � feito em dezembro, mas parte do desembolso s� ocorre em janeiro, conforme o cronograma das folhas.
O parecer ainda permite contabilizar no Or�amento apenas a previs�o de repasse efetivo referente � lei Paulo Gustavo de incentivo � cultura. Bolsonaro chegou a editar uma MP (medida provis�ria) para adiar o gasto de R$ 3,8 bilh�es, mas o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu que a medida � inconstitucional —for�ando o governo a incluir a despesa na previs�o or�ament�ria do ano.
"A despesa da 'Lei Paulo Gustavo', ap�s abertura do cr�dito, n�o ter� execu��o completa at� o encerramento do exerc�cio. Dada a natureza financeira de verifica��o do teto de gastos, se faz necess�rio incorporar a efetiva proje��o de pagamento at� o encerramento de exerc�cio, de modo que o espa�o do teto n�o seja comprometido com essas despesas", diz o parecer do projeto.
Segundo Colnago, o projeto liberaria um espa�o de R$ 3,8 bilh�es se aprovado, referente � Lei Paulo Gustavo. Mas ele disse que ainda n�o h� posi��o consensual dentro do governo sobre apoiar ou n�o a medida, uma vez que ela promove outras mudan�as mais amplas.
Os t�cnicos do Minist�rio da Economia tamb�m avaliam que a flexibiliza��o do teto proporcionada pela proposta � limitada, uma vez que a regra fiscal � prevista na Constitui��o. "Tem uma reda��o mal escrita na Constitui��o, que mistura or�ament�rio e financeiro. O projeto busca fazer melhor separa��o, mas n�s temos uma trava que � constitucional, ele fala o que deve computar no teto
Em rela��o � reavalia��o do Or�amento, al�m da inclus�o da despesa com a Lei Paulo Gustavo, o governo precisou incorporar uma previs�o adicional de R$ 2,3 bilh�es em gastos com a Previd�ncia Social.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, a redu��o mais acelerada da fila do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) pressiona o Or�amento, uma vez que aumenta o volume de benef�cios a serem pagos pelo governo federal. A possibilidade de novo aumento na reta final do ano j� vinha sendo alertada por t�cnicos.
Apesar do quadro de aperto do lado das despesas, o Minist�rio da Economia projeta um cen�rio ainda mais favor�vel na arrecada��o. A estimativa de super�vit prim�rio subiu de R$ 13,5 bilh�es em setembro para R$ 23,4 bilh�es na avalia��o feita agora.
At� o fim do ano, o �rg�o prev� uma melhora ainda mais sens�vel. A perspectiva � que as contas do governo central —que re�nem Tesouro Nacional, Previd�ncia e Banco Central— tenham um resultado positivo de R$ 38,7 bilh�es. Se confirmado, ser� o primeiro super�vit desde 2013.
O governo tamb�m reviu sua estimativa de arrecada��o para 2023, primeiro ano do novo mandato de Lula. O projeto de Or�amento foi enviado em agosto com uma previs�o de d�ficit de R$ 63,5 bilh�es. Agora, o rombo foi reduzido a R$ 40,4 bilh�es, embora ainda permane�a no terreno negativo.
Segundo a Economia, a revis�o decorre de uma amplia��o de R$ 23,1 bilh�es nas receitas previstas com tributos e dividendos de empresas estatais.
Em uma inusual participa��o na divulga��o da reavalia��o do Or�amento, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que a melhora das contas � fruto das pol�ticas adotadas em sua gest�o. "Como d� pra algu�m s�rio e preparado falar em heran�a maldita?", questionou.
Segundo ele, o quadro fiscal para 2023 tem hoje um "pequeno d�ficit" que, se o novo governo Lula "quiser transformar em super�vit", poderia ser revertido com o corte de desonera��es. "A situa��o � relativamente simples para quem � preparado ou para quem quer falar a verdade", disse Guedes.
O Or�amento de 2023 prev� R$ 80 bilh�es em desonera��es, incluindo a al�quota zero de tributos federais sobre gasolina e diesel. A medida foi adotada por Bolsonaro neste ano e n�o foi revertida pelo atual governo, que incluiu a medida na previs�o do ano que vem.