Principal promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro (PL) na �rea da educa��o, o programa de escolas c�vico-militares pode estar com seus dias contados. Membros da equipe de transi��o do governo do presidente eleito Luiz In�cio Lula da Silva (PT) afirmam que a ideia � que o programa seja desativado na nova gest�o.
A sinaliza��o, por�m, dever� causar rea��es entre os que defendem o modelo federal j� implementado em dezenas de cidades em todo o Brasil. Entidades e gestores a favor das escolas c�vico-militares afirmam que parte delas dever� manter o modelo mesmo se o novo governo federal encerrar o programa.
O Programa Nacional das Escolas C�vico-Militar (Pecim) foi lan�ado em setembro de 2019, no primeiro ano do governo do presidente Bolsonaro. Ex-capit�o do Ex�rcito, Bolsonaro defendeu o ensino militar ao longo de toda sua trajet�ria pol�tica e, durante a campanha presidencial de 2018, prometeu implementar escolas c�vico-militares em todo o Brasil.
Seu principal argumento era de que um dos principais problemas da educa��o no pa�s seria a falta de disciplina e uma suposta doutrina��o ideol�gica de esquerda praticada em sala de aula.
- O avan�o das escolas c�vico-militares na rede particular de ensino
- Contin�ncia, 'inspe��o de cabelo' e tutoria de PMs: a rotina em uma escola com regras e disciplina militares
- 'Quem n�o gostaria de ver excel�ncia de escolas militares em todo o ensino?', diz M�rio S�rgio Cortella
Gest�o militar em escolas
De acordo com o programa lan�ado pelo governo federal, as escolas c�vico-militares s�o aquelas em que militares da reserva participam da gest�o e da organiza��o da escola, embora a dire��o e a maior parte das disciplinas continuem a cargo de civis. As escolas c�vico-militares n�o s�o iguais aos col�gios militares do Ex�rcito ou das pol�cias militares existentes em praticamente todo o pa�s. Nessas unidades, toda a gest�o � feita por militares.
Na maioria das escolas que adotam esse modelo h�brido, os militares atuam no recebimento dos alunos, nos intervalos entre os turnos e no encerramento do hor�rio de aula. Eles s�o pagos diretamente pelo Minist�rio da Defesa.
Al�m disso, as escolas adotam fardas que simulam uniformes militares e realizam rotinas como cantar o hino nacional periodicamente.
A ades�o ao modelo � volunt�ria e ocorre ap�s a realiza��o de uma consulta p�blica em que a comunidade que fica no entorno da unidade pode opinar sobre se ela deve ou n�o adotar o modelo.

De acordo com o Minist�rio da Educa��o (MEC), a meta era que 2016 escolas c�vico-militares fossem implementadas at� 2023. At� o momento, segundo a pasta, o n�mero chegou a 202, mas haveria uma "fila" de pelo menos 350 munic�pios � espera para entrar no programa.
Modelo em xeque
Apesar do suposto sucesso do programa, integrantes da equipe de transi��o ligados � pauta da educa��o afirmam que a tend�ncia � que o programa seja encerrado.
"Eu considero que a escola c�vico-militar � um equ�voco que tem que ser revisto. � preciso um processo de transi��o para rever pr�ticas pedag�gicas adotadas pelas escolas que aderiram ao programa", disse � BBC News Brasil o pesquisador e professor da Universidade de S�o Paulo (USP) Daniel Cara. Ele � integrante do grupo de trabalho da equipe de transi��o que avalia as pol�ticas que ser�o adotadas no pr�ximo governo.
"A tend�ncia � que o programa seja encerrado", disse � BBC News Brasil o l�der do PT na C�mara dos Deputados, Reginaldo Lopes (MG). Durante a campanha presidencial, ele ficou respons�vel por representar Lula nas discuss�es sobre educa��o.
A avalia��o de cr�ticos ao modelo c�vico-militar � de que ele parte de uma premissa equivocada: a de que a disciplina militar seria respons�vel por melhorar o desempenho dos alunos. Outro fator que faria com que as comunidades fossem favor�veis � ado��o do modelo � o temor em rela��o � viol�ncia dentro e nas proximidades das escolas, especialmente nas �reas perif�ricas das cidades.
"O problema � que as pessoas olham para o desempenho dos col�gios militares e acham que os bons resultados s�o resultado dos militares e n�o da quantidade de recursos que s�o empregados nessas unidades", disse a presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Educa��o do Estado de Goi�s (Sintego) e deputada estadual eleita, Bia de Lima (PT).
Na segunda-feira (28/11), uma reportagem do jornal O Globo apontou que esse grupo de trabalho sobre educa��o da equipe de transi��o havia chegado a um consenso de que o programa deveria ser extinto.
A cr�tica da petista em rela��o ao modelo contrasta, em parte, com a quantidade de escolas em estados historicamente governados pelo PT e que aderiram ao modelo c�vico-militar. � o caso da Bahia que, em 2019, tinha 83 escolas municipais de ensino fundamental adotando o formato militarizado. L�, a parceria � feita com a Pol�cia Militar e n�o com as For�as Armadas.
O programa baiano � anterior ao lan�ado pelo governo federal. O governo estadual n�o aderiu � iniciativa de Bolsonaro e das 202 escolas que aderiram ao programa federal, apenas duas s�o baianas.
Bia de Lima explica a procura dos munic�pios baianos pelo modelo militarizado.
"� a viol�ncia que faz com que haja essa procura. Os pais e os gestores municipais acham que o problema da viol�ncia vai ser resolvido colocando policial dentro das escolas. Mas o lugar do policial � fora das escolas e n�o dentro", disse a sindicalista e deputada.
Daniel Cara avalia que n�o � poss�vel o governo federal obrigar as escolas que j� aderiram ao programa federal a mudar seus modelos. Por isso, segundo ele, seria importante estabelecer medidas de transi��o entre a vers�o c�vico-militar e a 100% civil.
Na pr�tica, por�m, o fim do programa e a destina��o de suas verbas para outras �reas dever� comprometer um dos principais eixos do seu funcionamento: a presen�a de militares da reserva dentro das unidades.
Rea��o
Val�ria Ramirez, que dirige uma das escolas que aderiu ao programa federal, diz que a rea��o na comunidade atendida pela unidade � possibilidade de encerramento do programa foi negativa e que pais e m�es de estudantes demonstraram preocupa��o.
"Eu tenho recebido v�rias consultas nos �ltimos dias e os pais disseram que se o programa acabar e a escola deixar de ser c�vico-militar, eles v�o tirar os filhos daqui", disse.
A escola dirigida por Val�ria aderiu ao programa federal em 2020. Desde ent�o, ela conta, as mudan�as impostas pelo novo modelo tiveram impacto positivo na rotina dos alunos e dos professores.
"A quest�o disciplinar mudou muito. Agora, com a presen�a dos militares, os professores se preocupam menos com a bagun�a. Isso fez aumentar o tempo que os professores t�m para ministrar as aulas porque eles passam menos tempo sendo interrompidos", afirmou a diretora.
Val�ria tamb�m afirma que o desempenho escolar dos alunos melhorou. Os dados do �ndice de Desenvolvimento da Educa��o B�sica (Ideb) mostram que, no Ensino M�dio, a nota da escola saiu de 3,8 em 2019 para 4,8 em 2021. A nota da escola ficou acima da m�dia do Paran� no Ensino M�dio p�blico, que foi 4,6.
"Antes, a gente avan�ava muito devagar. Era quase um d�cimo de aumento por ano. Ap�s a mudan�a pro c�vico-militar, n�s subimos um ponto inteiro", comemorou a diretora.
"Eu n�o vou aceitar se eles mudarem", disse a aposentada Luzia C�lia Stein, 62. Ela � vizinha da escola Tancredo de Almeida Neves e tem dois de seus sobrinhos estudando na unidade.
"Eu moro aqui h� muitos anos. Meus filhos estudaram nessa escola e eu pude ver a mudan�a. N�o tem mais venda de drogas na esquina, n�o se ouve mais palavr�o na sa�da dos alunos. Eu acho que n�o tem que mudar nada", afirmou Luzia.
O presidente e fundador da Associa��o Brasileira de Educa��o C�vico-Militar (Abemil), Davi Lima, disse que o fim do programa federal vai frustrar pais e alunos.
"Vai ser uma frustra��o muito grande porque � um modelo que vem dando certo. Ainda n�o h� nenhuma posi��o oficial, mas a gente espera que isso n�o v� pra frente. Mas se for, acho que as escolas e as comunidades v�o procurar formas de manter o modelo", afirmou.
Val�ria Ramirez diz que j� est� avaliando possibilidades para manter o esquema c�vico-militar caso o programa do governo federal seja extinto. Uma das alternativas seria aderir ao programa Estado do Paran�, liderado pelo governador Ratinho J�nior (PSD), que durante as elei��es deste ano apoiou Jair Bolsonaro. Ratinho J�nior � um entusiasta do modelo.
"Se o governo federal acabar o programa, vou ter que recorrer ao governo estadual. Pra n�s, ser� ruim porque hoje temos 15 militares na nossa escola. No programa estadual, as escolas t�m entre dois ou tr�s. Vamos perder muito, mas vamos tentar manter o modelo", diz Val�ria.
Procurado pela BBC News Brasil, a atual gest�o do MEC defendeu o programa. Por e-mail, a pasta disse que as escolas c�vico-militares teriam obtido "expressivos resultados" em quesitos como a redu��o da evas�o e abandono escolar, diminui��o da viol�ncia, maior participa��o de pais e respons�veis na vida escolar e melhoria do Ideb.
A BBC News Brasil solicitou ao MEC relat�rios ou dados que comprovariam as informa��es repassadas por e-mail, mas nenhum documento ou estudo foi enviado.
- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-63825966