
A poss�vel aproxima��o do Brasil ao controverso e ambicioso plano de investimentos em infraestrutura da China conhecido como "Nova Rota da Seda" est� no centro das negocia��es entre diplomatas brasileiros e chineses �s v�speras da chegada do presidente Luiz In�cio Lula da Silva (PT) ao pa�s asi�tico.
Fontes ouvidas pela BBC News Brasil afirmam que autoridades chinesas querem algum aceno do pa�s � iniciativa.
Diplomatas ouvidos em car�ter reservado pela reportagem afirmam que o One Belt, One Road (Um Cintur�o, uma Rota, em tradu��o livre) � um dos principais pontos ainda em discuss�o do comunicado.
De acordo com negociadores brasileiros, embora os chineses sempre acenem com o assunto nas trocas diplom�ticas, dessa vez eles exerceram um pouco mais de press�o sobre o lado brasileiro por uma ades�o.
O Brasil, no entanto, ainda n�o teria decidido se far� alguma men��o ao projeto no comunicado conjunto que dever� ser divulgado ao final da visita, na sexta-feira (14/4).
Lula deve chegar � China na noite desta quarta-feira (12/4). Na quinta-feira (13/4), dever� participar da posse da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) como nova presidente do New Development Bank (NDB), tamb�m conhecido como "Banco dos Brics".
Na sexta-feira, est� previsto o encontro entre Lula e o presidente chin�s, Xi Jinping.A Nova Rota da Seda completa dez anos em 2023, e a ades�o do Brasil ao instrumento seria um ganho pol�tico consider�vel para Pequim.
Uma decis�o, segundo essas fontes, ainda aguarda a chegada a Xangai da comitiva brasileira. Uma ades�o formal ao projeto neste momento, por�m, estaria descartada.
As discuss�es em torno da iniciativa chinesa, no entanto, evidenciam uma divis�o p�blica entre uma ala liderada por diplomatas do Minist�rio das Rela��es Exteriores (MRE), incluindo o seu chefe, embaixador Mauro Vieira, e um grupo mais pr�ximo ao presidente Lula, que inclui seu assessor especial para assuntos internacionais, o ex-chanceler Celso Amorim.
O Itamaraty vem afirmando que o Brasil n�o precisaria aderir ao projeto porque o Brasil j� � alvo de parte significativa dos investimentos internacionais chineses.
Por sua vez, Celso Amorim e ministros como o da Agricultura, Carlos F�varo, defendem que o Brasil pode aderir ao projeto chin�s como forma de alavancar projetos de infraestrutura no pa�s.
O que � a Nova Rota da Seda?

O One Belt, One Road � um projeto trilion�rio lan�ado em 2013 pelo governo chin�s que inicialmente previa uma s�rie de projetos de infraestrutura como rodovias, ferrovias e portos, al�m de obras no setor energ�tico, como oleodutos e gasodutos ligando a �sia � Europa.
H� diferentes estimativas sobre quanto dinheiro j� foi investido desde seu lan�amento. Os valores v�o de US$ 890 bilh�es (R$ 4,46 bilh�es) a US$ 1 trilh�o (R$ 5 trilh�es).
O projeto ficou conhecido como Nova Rota da Seda em alus�o � antiga rota da seda, nome dado ao fluxo de com�rcio que funcionava no primeiro mil�nio e que conectava a �sia com a Europa Central.
Desde que foi lan�ado, o projeto chin�s foi expandido para outras regi�es do mundo, como �frica, Oceania e Am�rica Latina.
De acordo com o centro de estudos americano Council on Foreign Relations (CFR), especializado em rela��es internacionais, 147 pa�ses j� aderiram ou manifestaram interesse em aderir ao plano desde seu lan�amento. Eles representam dois ter�os da popula��o mundial e 40% do Produto Interno Bruto (PIB) global.
Na Am�rica Latina, pelo menos 20 pa�ses j� fazem parte da iniciativa, entre eles a Argentina, que, em abril de 2022, assinou um memorando de entendimento com o governo chin�s prevendo a ades�o.

Analistas internacionais avaliam que o projeto � um dos bra�os do projeto de expans�o do poder econ�mico e pol�tico da China.
Atualmente, a China � a segunda maior economia do mundo e, at� a pandemia de covid-19, havia estimativas que indicavam que poderia superar os Estados Unidos at� 2028.
Em uma aparente rea��o ao projeto chin�s, l�deres do G7 (grupo formado por Estados Unidos, Canad�, Fran�a, Reino Unido, Jap�o, It�lia e Alemanha) divulgaram, em 2022, um plano de financiamento a projetos de infraestrutura avaliado em US$ 600 bilh�es (R$ 3 trilh�es).
O projeto, no entanto, � alvo de outras controv�rsias. Especialistas alertam, por exemplo, para o risco de superendividamento de pa�ses que contraem esses financiamentos.
Em 2018, o governo do Sri Lanka transferiu o controle de um porto � China ap�s n�o conseguir honrar suas d�vidas com o pa�s.
A China, por outro lado, rebate as cr�ticas afirmando que elas seriam uma tentativa de manchar sua imagem no cen�rio internacional.
Outra cr�tica frequente � que os empr�stimos possibilitados pelo programa dependem da intermedia��o de empresas chinesas para serem liberados e que, com frequ�ncia, a China envia aos pa�ses a m�o de obra qualificada para as obras infraestrutura e contrata localmente apenas funcion�rios com sal�rios menores.
O que o Brasil tem a ganhar?
Especialistas nas rela��es sino-brasileiras afirmam que uma ades�o ao programa teria pouco efeito pr�tico e n�o resultaria em uma "enxurrada" de investimentos diretos no Brasil no curto prazo.Eles dizem que um aceno brasileiro � iniciativa teria, portanto, um resultado mais pol�tico do que econ�mico.
Karin Vazquez, especialista em coopera��o internacional e professora da Universidade Fudan, na China, avalia que uma ades�o formal do Brasil poderia dar acesso a um fundo de US$ 40 bilh�es (R$ 200 bilh�es) em investimentos chineses.
No entanto, segundo Vazquez, a desacelera��o da economia chinesa vem fazendo com que as condi��es para esses financiamentos sejam menos atrativas do que no passado.
"Tampouco vejo como uma ades�o favoreceria a participa��o do Brasil em projetos de integra��o regional financiados pela China. O Brasil j� � considerado em algumas dessas iniciativas, como a ferrovia bioce�nica, cujos entraves � execu��o costumam estar mais relacionados a quest�es internas dos pa�ses e menos ao financiamento desses projetos", diz a professora � BBC News Brasil.

Pablo Ibanez, professor de Geopol�tica da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e pesquisador visitante da Universidade Fudan, aponta que a entrada do Brasil no projeto teria um car�ter mais simb�lico. Mesmo assim, ele defende a ades�o.
"N�o vejo grandes desvantagens. A China n�o exige grandes contrapartidas quando financia os projetos. Acho que o Brasil deveria entrar, porque � grande parceiro da China", diz Ibanez.
Marcos Caramuru, ex-embaixador do Brasil na China, pondera que, apesar de simb�lica, a ades�o poderia beneficiar investimentos pleiteados por Estados brasileiros.
"A ades�o n�o faz muita diferen�a pr�tica, mas passa uma mensagem aos agentes econ�micos chineses que pode ajudar quando eles forem avaliar investimentos em entes subnacionais como os governos estaduais", explicou.
O que o Brasil pode perder?
Analistas ouvidos pela BBC News Brasil tamb�m avaliam que as desvantagens de uma eventual ades�o do Brasil seriam pequenas e n�o necessariamente relacionadas � parceria em si."Os problemas que vejo s�o relacionados �s dificuldades de se implantar projetos de infraestrutura, como o impacto ambiental e como isso afeta as popula��es ind�genas ou tradicionais”, diz Ibanez.
Os especialistas ouvidos tamb�m minimizam o risco de uma eventual retalia��o americana ao Brasil caso o pa�s se associe de alguma forma ao projeto chin�s.
Vazquez ressalta, no entanto, que a sinaliza��o do Brasil em rela��o ao assunto precisa ser bem calibrada.
“Alguns atores acreditam que aderir ao projeto daria maior espa�o para o Brasil barganhar com Estados Unidos e China e n�o ser encapsulado como membro de nenhum dos dois ‘bandos’”, afirma a professora.
Mas ela diz que o argumento � question�vel na medida em que dar um “sinal” de que o Brasil est� alinhado com a China sem sinalizar na mesma dire��o e intensidade para a Alian�a para a Prosperidade Econ�mica nas Am�ricas, projeto lan�ado pelo governo de Joe Biden em 2022, pode ser entendido como favorecer um dos dois lados.
“No m�nimo, teria que se ter clareza do que o Brasil quer e pode ganhar com cada uma dessas iniciativas, o que, a meu ver, n�o existe”, diz a professora.
Os Estados Unidos vivem um dos per�odos mais tensos em suas rela��es com a China e t�m sinalizado preocupa��o com o aprofundamento das rela��es entre China e Brasil.
Washington v� como um ativo o fato de Bras�lia n�o ter, at� agora, se comprometido a integrar o One Belt, One Road.
"Para os Estados Unidos, preocupa ver o Brasil crescentemente endividado com a China, se envolvendo em um n�mero crescente de neg�cios, especialmente em �reas sens�veis, como tecnologias, servi�os p�blicos, energia, �rea mineral, que tragam riscos para a coopera��o Estados Unidos-Brasil”, afirma Ryan Berg, diretor do programa de Am�ricas do Center for Strategic and International Studies, em Washington.
“Se Lula, como dizem os rumores, ceder ao projeto em sua viagem � China, isso tamb�m ser� algo grande para os Estados Unidos e visto com reservas, porque forneceria uma nova via para a influ�ncia e empr�stimos chineses no pa�s."
Quest�o exp�e racha no governo

Em meio a esse cen�rio, duas alas do governo Lula v�m divergindo publicamente sobre o Brasil ingressar ou n�o na iniciativa chinesa.
Em entrevista a correspondentes de ag�ncias internacionais no Brasil na semana passada, Mauro Vieira sinalizou que o Brasil n�o precisaria aderir ao plano chin�s neste momento.
“Temos uma parceria estrat�gica que vai muito al�m do One Belt, One Road. N�o � uma coisa que estejamos apressados nem de um lado e nem de outro. � uma coisa que faz parte de contatos e conversas, mas n�o � uma decis�o premente”, disse Vieira ao ser perguntado sobre o assunto pela BBC News Brasil.
Por outro lado, Celso Amorim disse em entrevista ao jornal Valor Econ�mico que o Brasil n�o teria motivos para ficar de fora da iniciativa.
“N�o tem raz�o para o Brasil n�o entrar. N�o tenho preconceito e n�o vejo nenhum dano pol�tico”, afirmou o assessor especial de Lula.
Outro que tamb�m defende a entrada do Brasil ao mecanismo � o ministro da Agricultura, Carlos F�varo.
Questionado pela BBC News Brasil, ele argumentou que a ades�o do pa�s ao projeto chin�s poderia trazer investimentos considerados importantes para a log�stica do agroneg�cio brasileiro e para a integra��o nacional.
“Eu defendo (a entrada do Brasil) porque um dos principais gargalos da competitividade do agro brasileiro � a infraestrutura log�stica. Frete caro � sin�nimo de perda de competitividade para produtos de exporta��o”, afirmou o ministro.
Para Pablo Ibanez, a diferen�a de vis�es entre o comando do Itamaraty e integrantes do entorno do presidente � resultado da vis�o de membros do PT como Lula e da ala liderada por Celso Amorim por uma prefer�ncia em fomentar rela��es com pa�ses fora do eixo Estados Unidos-Europa.
“De um lado voc� tem o PT, Lula e Celso Amorim que s�o conhecidos por valorizarem o crescimento das rela��es do chamado sul global. J� o Itamaraty tem uma ala mais pragm�tica que acredita que isso (a ades�o) pode trazer repres�lias dos Estados Unidos.”