
Combater a desigualdade � importante, mas n�o � suficiente para o Brasil fortalecer sua democracia sob o novo governo, acredita o economista Daron Acemoglu, coautor do best-seller Por que as na��es fracassam e que est� prestes a lan�ar no pa�s seu novo livro Poder e progresso.
"Ao menos que Lula encontre uma forma de atrair uma parcela significativa da popula��o que se desencantou com a democracia brasileira, n�o ser� um caminho f�cil", diz Acemoglu, em entrevista exclusiva � BBC News Brasil.
Para o professor do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts, na sigla em ingl�s), o presidente brasileiro precisa ir al�m dos programas sociais para vencer a polariza��o do pa�s.
"� preciso criar melhores oportunidades de emprego para a classe m�dia trabalhadora, para pessoas do setor agr�cola", sugere o economista turco-americano, de etnia arm�nia.
"O mesmo vale para os Estados Unidos – n�o acredito que voc� v� trazer de volta os eleitores de [Donald] Trump criando um programa de transfer�ncia de renda maior. Mas h� uma chance maior de traz�-los de volta mostrando que um governo democr�tico cria empregos para eles, lhes d� melhores escolhas e lhes permite viver suas vidas da forma que eles quiserem."
Em Por que as na��es fracassam (de 2012, relan�ado no Brasil pela editora Intr�nseca em 2022), Acemoglu e James A. Robinson analisaram os motivos que levam alguns pa�ses a enriquecer e outros a permanecer na pobreza. Em O Corredor Estreito (de 2019 e publicado pela Intr�nseca no ano passado), os mesmos autores avaliam por que alguns pa�ses conseguem conquistar a liberdade e a democracia, enquanto outros vivem em tiranias ou autocracias.J� no rec�m-lan�ado Poder e progresso (de 2023, com lan�amento no Brasil previsto pela Objetiva para o in�cio de 2024), Acemoglu e o tamb�m economista Simon Johnson analisam como, ao longo da hist�ria, diferentes escolhas levaram o avan�o tecnol�gico a servir ao interesse das elites ou a um crescimento inclusivo, garantindo tamb�m a melhora de vida dos trabalhadores.
Para os economistas, � poss�vel um futuro onde a intelig�ncia artificial (IA) e as novas tecnologias digitais sejam usadas para empoderar os trabalhadores, e n�o para a vigil�ncia e automa��o crescentes. Mas, para isso, � preciso fazer escolhas que levem as novas tecnologias nessa dire��o.
� BBC News Brasil, Acemoglu falou sobre a recente expans�o do Brics (bloco formado por Brasil, R�ssia, �ndia, China e �frica do Sul) e como ela representa, na vis�o dele, uma "oportunidade perdida" para os pa�ses emergentes assumirem uma voz independente nesse debate.
Para o economista, pa�ses como o Brasil t�m um duplo desafio: o de regulamentar as novas tecnologias para que elas n�o prejudiquem suas popula��es, sem prejudicar o avan�o delas – num contexto em que as na��es emergentes ainda est�o atrasadas na curva tecnol�gica.
Acemoglu diz ainda n�o acreditar na renda b�sica universal como uma solu��o para a amea�a que a intelig�ncia artificial representa ao futuro do trabalho.
"N�o acho que estamos condenados a substituir o trabalho humano", afirma o economista.
"H� um caminho alternativo e esse caminho � usar a intelig�ncia artificial de maneira mais em favor do ser humano, em favor do trabalhador. Ao colocar tanta �nfase na renda b�sica universal, assumimos uma postura derrotista", defende.
Confira abaixo os principais trechos da entrevista.
BBC News Brasil – Em anos recentes o senhor esteve pessimista em rela��o ao Brasil, tendo dito que est�vamos sob risco de destruir nossa democracia. O senhor acredita que esse risco passou?
Daron Acemoglu – � claro que eu estou muito feliz que [Jair] Bolsonaro n�o foi reeleito. E estou cautelosamente otimista que agora h� espa�o para reconstruir a democracia brasileira.
Mas sigo preocupado com o fato de que o Brasil ainda � um pa�s muito polarizado. E que essa polariza��o pode atrapalhar o fortalecimento da democracia.
Acho que eu nunca fui pessimista ao ponto de pensar que o Brasil estava "condenado" a destruir sua democracia. Mas talvez minhas falas refletissem o fato de que, dez anos atr�s, eu acreditava que a democracia brasileira estava muito segura, apesar de todos os esc�ndalos de corrup��o e todos os problemas que estavam acontecendo.
[Eu acreditava] que o Brasil nunca voltaria a uma ditadura militar. Mas, sob o governo Bolsonaro, houve momentos em que passei a temer. Quando o presidente de voc�s come�ou a pedir interven��o militar e a dizer que ele sentia saudade do tempo em que os militares mandavam no pa�s. E ele se manteve muito popular, quase 50% dos brasileiros o apoiavam.
Ent�o eu acredito que isso � a polariza��o.
Veja, Lula ter sido eleito � �timo. Mas, ao menos que ele encontre uma forma de atrair uma parcela significativa da popula��o que se desencantou com a democracia brasileira, n�o ser� um caminho f�cil.
O mesmo acontece nos EUA. Eu gosto de muitas das pol�ticas da gest�o [Joe] Biden, mas n�o acredito que elas sejam suficientes para ganhar de volta as pessoas que votaram em Trump e que se tornaram muito desiludidas com o sistema americano.

BBC News Brasil – Ent�o o que deve ser feito para assegurar que n�o voltemos �quele caminho de sentirmos que a democracia est� sob amea�a? O senhor acredita que endere�ar a quest�o da desigualdade no Brasil � uma das formas de garantir isso?
Acemoglu – [Combater a] desigualdade � uma forma de garantir isso. Mas n�o pode ser apenas atrav�s de programas sociais. Acredito que � preciso criar melhores oportunidades de emprego para a classe m�dia trabalhadora, para pessoas do setor agr�cola...
O mesmo vale para os EUA – n�o acredito que voc� v� trazer de volta os eleitores de Trump criando um programa de transfer�ncia de renda maior. Mas h� uma chance maior de traz�-los de volta mostrando que um governo democr�tico cria empregos para eles, lhes d� melhores escolhas e lhes permite viver suas vidas da forma que eles quiserem.
Acredito que os EUA e o Brasil t�m muito em comum: s�o muito heterog�neos, t�m sociedades muito diversas. � preciso respeitar essa diversidade e tentar criar mais e mais oportunidades para que as pessoas tenham boas condi��es de vida, e bons resultados econ�micos dentro dessa diversidade.
E eu acho que tanto a hist�ria do Brasil, como a dos EUA, mostra que, se voc� tenta eliminar essa diversidade de um jeito ou de outro, isso sai pela culatra.
BBC News Brasil – O senhor tamb�m disse recentemente que o Brasil provavelmente n�o vai conseguir um crescimento significativo baseado apenas na exporta��o de commodities para a China. E que o pa�s precisar� em algum momento encontrar um outro caminho. O que o senhor v� para o futuro do Brasil?
Acemoglu – O Brasil aspirou nos anos 1950 e 1960 a ser uma pot�ncia industrial. O pa�s tem uma grande parcela de sua m�o de obra educada. Tem uma quantidade de setores em que investiu muito no passado. Ent�o acredito que o pa�s precisa encontrar formar de estimular o setor privado.
E o governo n�o pode fazer isso. O governo pode dar incentivos e ser um facilitador. Mas, no fim das contas, o setor privado precisa liderar um crescimento que n�o seja baseado apenas na exporta��o de commodities. No momento, eu n�o vejo isso acontecendo o suficiente.

BBC News Brasil – O senhor acredita que o boom de industrializa��o que estamos vendo no M�xico e na �ndia pode ser exemplo para o Brasil?
Acemoglu – Exatamente, mas talvez atrav�s de outros setores. O M�xico tem vantagens comparativas em algumas coisas, facilitadas pela proximidade com os EUA. A �ndia est� apostando em outro conjunto de setores. Ent�o o Brasil precisa encontrar em quais setores tem capital humano, conhecimento especializado e que fa�am sentido diante da sua posi��o geopol�tica.
BBC News Brasil – E o momento pol�tico para isso � agora?
Acemoglu – Certamente, porque essa � a forma de criar empregos melhores para as pessoas, considerando que algumas delas se tornaram muito desiludidas com o modelo de crescimento brasileiro. Acredito que isso � parte da raz�o pela qual elas apoiaram Bolsonaro.

BBC News Brasil – Recentemente o senhor escreveu um artigo afirmando que a expans�o do Brics anunciada em agosto � "a expans�o errada do Brics". Por que o senhor pensa assim?
Acemoglu – Fiquei muito surpreso e entristecido pela forma como essa expans�o aconteceu, porque acredito que os pa�ses que foram adicionados est�o em grande medida sob influ�ncia de R�ssia e China.
Ent�o isso transforma o Brics em um eixo amplamente controlado pela China, quando eu penso que o que o mundo precisa � um agrupamento de economias emergentes que deveria ter um papel maior na diplomacia internacional, mas tamb�m ter voz em quest�es relacionadas ao com�rcio internacional, tecnologia, respostas globais na �rea de sa�de.
Ent�o pa�ses como Brasil, �ndia, Indon�sia, Mal�sia, Turquia v�o ter uma perspectiva que � muito diferente daquela da China – ou deveriam ter uma perspectiva muito diferente da China.
Pense em todas as grandes quest�es que devem surgir nos pr�ximos dez anos.
Por exemplo: democracia. A China � a maior amea�a � democracia em n�vel global. � nisso que os pa�ses do Brics dever�o trabalhar junto � China?
Com rela��o � globaliza��o, por exemplo, haver� grandes tens�es entre EUA e China. E precisamos de uma voz do mundo emergente que seja neutra em rela��o a esses dois poderes hegem�nicos.
Isso n�o vai acontecer enquanto o grupo estiver sob influ�ncia de China e R�ssia.
Na tecnologia, ser�o necess�rias grandes decis�es sobre como a intelig�ncia artificial dever� ser usada. E a China � a maior impulsionadora do uso da IA para vigil�ncia, mas n�o � disso que o mundo em desenvolvimento precisa.

BBC News Brasil – No seu artigo, o senhor refor�a que as economias emergentes deveriam buscar influenciar o futuro da intelig�ncia artificial e de outras tecnologias digitais. Por que isso � importante e por que o senhor avalia que isso n�o ser� poss�vel sob a nova forma��o do Brics?
Acemoglu – Porque a China tem interesses muito distintos em se tratando do uso da tecnologia.
Por exemplo, algumas das grandes decis�es sobre o futuro da intelig�ncia artificial ser�o o quanto dela ir� na dire��o de ferramentas autorit�rias, censura, monitoramento, vigil�ncia, reconhecimento facial versus ferramentas que v�o de fato ajudar as pessoas comuns a se comunicarem e talvez at� se engajarem em atividades dissidentes, incluindo organiza��es da sociedade civil, m�dia de oposi��o, m�dia cr�tica ao governo. A China est� em uma das pontas dessa escolha.
Outra grande escolha, que � muito relevante para �ndia, Indon�sia e Brasil, � como as tecnologias de IA ser�o usadas na produ��o. Elas ser�o mais pr�-trabalhador ou mais contr�rias ao trabalhador?
A� tamb�m a China tem claros incentivos, nesse caso, muito alinhados com o setor americano de tecnologia, de usar mais e mais [a intelig�ncia artificial] para automa��o.
Isso em parte porque a m�o de obra chinesa est� envelhecendo, mas tamb�m porque a China est� muito preocupada com o descontentamento trabalhista. Ent�o usar IA e outras tecnologias de automa��o � muito atrativo para as autoridades chinesas por esses motivos.
Mas isso n�o � do interesse do Brasil, que tem uma imensa for�a de trabalho, que deveria ser uma de suas vantagens competitivas. Mas n�o ser� se a intelig�ncia artificial e as tecnologias digitais forem direcionadas para mais automa��o.
Acredito que o Brasil poderia ter tido um papel de lideran�a nisso. Penso que um grupo independente nas rela��es internacionais seria de grande valor e que foi uma oportunidade perdida.

BBC News Brasil – Ainda no tema da China, como senhor v� a atual crise econ�mica por l� e isso pode, do seu ponto de vista, se tornar uma crise pol�tica maior e mudar de alguma forma a trajet�ria autorit�ria daquele pa�s?
Acemoglu – Acredito que estamos apenas no come�o desse processo.
N�o espero que isso se transforme numa crise pol�tica no futuro pr�ximo. Precisamente pela forma como a censura [chinesa] usa ferramentas de IA e como outras tecnologias repressivas t�m sido utilizadas ao longo da �ltima d�cada na China, acredito que o espa�o para protestos � limitado.
Ent�o, se voc� comparar a sociedade civil chinesa hoje com aquela que prevalecia nos anos 2010, h� uma grande diferen�a. H� muito menos liberdade, muito menos organiza��o.
[Naquele momento] havia pessoas defendendo os diretos dos trabalhadores rurais, de propriet�rios de terras, tratando de quest�es ambientais. Havia uma pequena quantidade de imprensa "semi livre", havia [protestos pela democracia em] Hong Kong. E tudo isso foi suprimido.
Ent�o eu n�o espero que a crise econ�mica leve imediatamente a uma crise pol�tica. Mas a China est� enredada em um imposs�vel paradoxo.
BBC News Brasil – O que o senhor quer dizer com isso?
Acemoglu – Eu explico. O imposs�vel paradoxo � que eles querem crescimento econ�mico, mas est�o muito preocupados que, � medida em que a economia cresce, a classe m�dia far� mais demandas, enfraquecendo o controle do Partido Comunista da China.
Assim, junto com o crescimento, h� mais e mais controle governamental. Mas isso, por sua vez, cria inefici�ncias tanto no curto, quanto no longo prazo. Reduz a independ�ncia das empresas, desencoraja o verdadeiro potencial de inova��o, leva a mais e mais m� aloca��o de capital.
Ent�o a solu��o criada pelo governo � mais interven��o governamental na economia e ainda mais repress�o, para que o descontentamento gerado por isso n�o resulte em oposi��o ao Partido Comunista. �, portanto, uma "bola de neve" e � essa a natureza do paradoxo.
Agora, eu n�o acredito que isso possa durar para sempre. Ent�o creio que, em cerca de dez anos, haver� uma crise pol�tica. Mas, no momento atual, eu n�o acredito que a sociedade civil, a imprensa ou qualquer tipo de organiza��o seja forte o suficiente para que isso aconte�a.

BBC News Brasil – Mudando de assunto para seu novo livro, Poder e progresso. Nele, o senhor diz que o mundo est� vivendo uma "ilus�o da intelig�ncia artificial". O que significa isso?
Acemoglu – Deixe-me primeiro fazer uma introdu��o, dizendo que eu acredito que as tecnologias de IA, incluindo a recente IA generativa [intelig�ncia artificial capaz de gerar textos, imagens ou outras m�dias em resposta a solicita��es em linguagem comum, como o ChatGPT da OpenAI e o Bard da Google] s�o promissoras. Ent�o n�o estou questionando que haja valor social e econ�mico a serem obtidos a partir dessas tecnologias.
Mas a ilus�o � acharmos que podemos substituir e escantear os seres humanos. Isso � sintetizado pela busca por uma intelig�ncia artificial geral [AI que teria a capacidade de aprender e desempenhar qualquer tarefa realizada por um ser humano] ou superintelig�ncia.
� sintetizado tamb�m pelo esfor�o incessante por automatizar o trabalho e resumir e capturar toda a sabedoria humana em tecnologias simples como o ChatGPT.
As raz�es por que isso � uma ilus�o s�o duas.
A primeira � que eu acredito que, no fim das contas, mesmo com mais avan�os, a criatividade humana ser� central e muito importante, tanto para a dignidade do trabalho humano e dos seres humano, como tamb�m para a efici�ncia produtiva.
Em segundo lugar, ainda mais no curto prazo, essas tecnologias t�m muitas limita��es, ent�o escantear os humanos leva a um caminho de inefici�ncia. E n�o estaremos obtendo os benef�cios que poder�amos a partir dessas tecnologias.

BBC News Brasil – O senhor tamb�m acredita que h� um certo otimismo, certo? Quer dizer, haveria uma cren�a de que tudo isso ser� para o bem. E voc� diz que n�o necessariamente, que � preciso intervir para que essas tecnologias tragam resultados positivos. O senhor pode explicar isso melhor?
Acemoglu – Toda essa busca por uma intelig�ncia artificial geral vem combinada com um profundo "tecno otimismo". E esse tecno otimismo tem alguns desdobramentos.
Primeiro, ele acredita que as m�quinas se tornar�o muito melhores do que os seres humanos rapidamente. Segundo, que isso vai gerar valor econ�mico. E terceiro, que isso tamb�m vai criar solu��es tecnol�gicas para muitos problemas.
Ent�o essa combina��o faz muitos l�deres do Vale do Sil�cio e outras figuras de lideran�a defenderem uma perspectiva de ades�o total: "N�o se preocupem com problemas, privacidade, coleta de dados, desemprego, porque � tudo para o bem. Vamos rapidamente chegar a bons lugares. Vamos criar mais produ��o, solu��es para os problemas clim�ticos, para as pandemias globais, para o c�ncer" e assim por diante.
Mas, quando combinamos isso com minha afirma��o anterior de que, na verdade, as capacidades da IA s�o exageradas no curto prazo e n�o v�o se realizar nem no m�dio prazo – a n�o ser que elas sejam usadas para ampliar as capacidades e o poder de ag�ncia humano – ent�o voc� percebe que isso n�o est� caminhando para nenhum bom lugar.
Estamos desempoderando as pessoas mais e mais e n�o chegaremos �s solu��es ou obteremos o valor econ�mico prometido.
Ent�o eu n�o sou um completo pessimista, mas digo que h� formas melhores de usar essas tecnologias e � por isso que precisamos de uma interven��o.
Porque a ind�stria americana e, por motivos distintos, a ind�stria chinesa, com a lideran�a do Partido Comunista, caminham para uma dire��o que n�o � boa. N�o � democr�tica, n�o vai trazer em nenhum momento pr�ximo os benef�cios econ�micos prometidos e h� caminhos muito melhores dispon�veis.
BBC News Brasil – No livro, o senhor aponta que impor limites ao poder das grandes empresas de tecnologia e regul�-las s�o passos cruciais para um futuro melhor para as tecnologias digitais. Mas, no Brasil, tivemos uma experi�ncia recente de o Congresso tentar passar uma lei contra a desinforma��o nas redes sociais e voltar atr�s, sob press�o de empresas como Google e Facebook, com o Google chegando a postar an�ncios contra a lei na p�gina principal do seu buscador. � realmente poss�vel os governos regularem as big techs no cen�rio atual?
Acemoglu – Google, Facebook, Amazon v�o fazer o que podem para barrar regula��es, mesmo quando dizem ser a favor de regula��es razo�veis, como disseram recentemente aos congressistas americanos.
E sim, em lugares onde os limites quanto ao uso de propaganda s�o mais frouxos, como no Brasil, eles v�o us�-la de forma mais abusiva.

Mas acredito elas serem t�o resistentes � uma prova de que � poss�vel regular essas empresas. Se de fato a regula��o n�o tivesse nenhum efeito, elas n�o estariam gastando milh�es de d�lares para lutar contra isso.
E h� um pa�s que mostra como efetivamente as big techs podem ser reguladas: a China.
Veja, eu n�o sou a favor do caminho chin�s, me oponho fortemente ao Partido Comunista Chin�s e n�o gosto dos seus m�todos ou seus objetivos. Mas a China provou nos �ltimos cinco anos que eles podem de forma muito bem-sucedida regular as big techs.
Ent�o eu espero que n�o precisemos copiar os chineses – certamente n�o dever�amos copiar seus m�todos antidemocr�ticos ou seus objetivos. Mas � uma prova de que regular � poss�vel.
Mas deixe-me dizer algo sobre Brasil, �ndia, Turquia e outros pa�ses como estes.
O problema a� � muito mais dif�cil porque, por um lado, voc� quer fazer o mesmo tipo de regula��o e garantir que as mazelas dessas novas tecnologias n�o afetem a popula��o. Mas, diferentemente dos EUA, por exemplo, esses pa�ses est�o atrasados na curva tecnol�gica.
Ent�o, ao mesmo tempo, � preciso garantir que empresas e indiv�duos tenham incentivos para adotar e aprender essas tecnologias rapidamente. Mas, ao fazer isso, � preciso n�o repetir os erros cometidos nos EUA. Ent�o � um problema bastante dif�cil.

BBC News Brasil – E por que o senhor acredita que a renda b�sica universal n�o � a solu��o para a amea�a que a intelig�ncia artificial representa ao futuro do trabalho?
Acemoglu – Se eu estivesse convencido de que n�o h� nada que possamos fazer e muitos empregos ir�o desaparecer; de que existe acordo pol�tico para uma renda b�sica universal; e de que, numa sociedade sem uma renda b�sica universal, pessoas que recebessem uma renda b�sica n�o seriam classificadas como cidad�os de segunda classe, eu seria mais favor�vel a uma renda b�sica universal.
Mas todas essas condi��es n�o se aplicam.
Primeiro, eu n�o acho que estamos condenados a substituir o trabalho humano. H� um caminho alternativo e esse caminho � usar a IA de maneira mais em favor do ser humano, em favor do trabalhador.
Ao colocar tanta �nfase na renda b�sica universal, assumimos uma postura derrotista, fechando as portas para esse caminho muito mais atraente.
Segundo, mesmo se decid�ssimos pelo caminho da renda b�sica, n�o acredito que o equil�brio pol�tico permitiria uma renda b�sica universal generosa. Elon Musk, Mark Zuckerberg e os executivos da Google, que s�o t�o resistentes a um pouquinho de regula��o, n�o v�o dizer: "Tudo bem, peguem metade da minha riqueza e destinem para uma renda b�sica universal."
E terceiro, mesmo que isso acontecesse, essa ainda seria uma sociedade de duas castas. Ter�amos 10%, 15% ou 20% da popula��o que seriam os grandes advogados, engenheiros, inovadores e designers, que ganhariam todo o dinheiro e ent�o dariam uma fra��o dele para o cuidado com as outras pessoas. E as pessoas que receberiam n�o fariam nada, s� ficariam com as migalhas dos super ricos. Essa seria uma sociedade muito desigual e acho que n�o queremos isso.
BBC News Brasil – Ent�o o senhor acredita que a forma de lidar com o impacto da IA sobre o trabalho � mudar sua dire��o?
Acemoglu – Exatamente. Redirecionar a mudan�a tecnol�gica, regular a forma como usamos a intelig�ncia artificial e garantir mais controle governamental sobre as dire��es em que estamos colocando nossos esfor�os.