O leite materno � essencial para o bom desenvolvimento do beb�. Mas n�o raro � difundida a ideia de que, dependendo da cor ou da textura, ele � mais forte ou mais fraco. No entanto, isso n�o passa de um mito
Quando a m�e permite que outra mulher amamente o seu beb�, o chamado aleitamento cruzado, ela est� colocando em risco a sa�de da crian�a, pois algumas doen�as podem ser transmitidas atrav�s do leite materno.
No passado, os beb�s costumavam ser amamentados pelas "amas de leite", mas h� tempos foi comprovado, cientificamente, que isso � errado. Para se ter ideia, uma portaria do Minist�rio da Sa�de, publicada em 1993, j� abordava o assunto orientando que "as equipes de sa�de deviam proibir que as m�es amamentassem outros rec�m-nascidos que n�o os seus. O mesmo posicionamento adota a Rede de Bancos de Leite Humano.
- '� como se n�o ter filhos fosse uma trag�dia': o estigma contra mulheres que n�o s�o m�es
- Adolescente que salvou irm�o com v�deo que viralizou morre da mesma doen�a na �ndia
Valdenise Tuma Calil, pediatra neonatologista e coordenadora-m�dica do Banco de Leite Humano do Instituto da Crian�a e do Adolescente do Hospital das Cl�nicas da Faculdade de Medicina da Universidade de S�o Paulo (HCFMUSP), explica o aleitamento cruzado passou a ser contraindicado ap�s o advento do HIV, por volta da d�cada de 1980, porque a doen�a tamb�m � transmitida atrav�s do leite materno.
"Existe uma janela imunol�gica, ent�o, �s vezes, mesmo que a gestante tenha feito exames, eles podem ainda n�o estar detectando a infec��o, porque ela n�o tem a quantidade de anticorpos suficientes, por exemplo", explica Calil, refor�ando que essa pr�tica � muito arriscada, inclusive, para a mulher, visto que, embora seja menos comum, ela tamb�m pode ser infectada pelo beb�, j� que a amamenta��o � um contato extremamente �ntimo.
Leia tamb�m: Novo estudo: saiba quais s�o as principais sequelas da COVID-19
Eveline Campos Monteiro de Castro, pediatra e chefe da unidade de neonatologia da Maternidade-Escola Assis Chateaubriand da Universidade Federal do Cear� (MEAC-UFC), vinculada � Rede Ebserh acrescenta que, em algumas regi�es do pa�s, onde o acompanhamento do pr�-natal � mais escasso, os riscos s�o ainda maiores. "A realidade � mais dif�cil em alguns hospitais p�blicos onde as m�es n�o conseguem fazer o pr�-natal de forma correta", comenta a m�dica.
E al�m do risco iminente de infec��o pelo HIV, causador da Aids, outras doen�as tamb�m podem ser transmitidas para o beb� atrav�s do leite materno, como hepatites, HTLVs (v�rus da mesma fam�lia do HIV), mononucleose (ou doen�a do beijo), citomegalov�rus (da fam�lia do v�rus herpes).
Doa��o de leite � indicada e extremamente importante
Se a mulher precisa de leite materno ou quer doar, ela pode procurar um dos 220 postos de coleta dos Bancos de Leite Humano (BLHs) espalhados pelo pa�s. "Grande parte dos bancos tem o servi�o de coleta externa. Eles v�o buscar o leite na resid�ncia da doadora, e isso j� viabiliza, porque muitas vezes a mulher est� amamentando o seu beb� e n�o consegue se deslocar para doar", ressalta Ana Z�lia Pristo de Medeiros Oliveira, enfermeira e coordenadora do banco de leite da Maternidade Escola Janu�rio Cicco, vinculada � Rede Ebserh, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (MEJC-UFRN).
Nesse contexto � muito importante frisar que a doa��o para um banco de leite n�o � a mesma coisa que o aleitamento cruzado, porque o leite doado, antes de ser entregue a um beb�, � pasteurizado.
"A pasteuriza��o � um aquecimento do leite a 62,5°C por trinta minutos, e depois um resfriamento r�pido a mais ou menos 4°C para evitar que o leite perca muitas propriedades imunol�gicas", descreve Calil. "Com isso, existe uma inativa��o de 100% dos v�rus e bact�rias patog�nicas, por isso ele pode ser utilizado para outros beb�s que n�o s�o daquela m�e", esclarece a especialista, que tamb�m � professora colaboradora da disciplina de neonatologia da Universidade de S�o Paulo.
O leite materno � essencial para o bom desenvolvimento do beb�. Mas n�o raro � difundida a ideia de que, dependendo da cor ou da textura, ele � mais forte ou mais fraco. No entanto, isso n�o passa de um mito.
Segundo os especialistas, n�o existe leite fraco, independente da apar�ncia, ele tem sempre a quantidade de nutrientes adequada para cada fase do beb�, a n�o ser que a m�e tenha uma desnutri��o muito severa (exce��es), ent�o o leite pode ter uma quantidade de gordura um pouco menor.
O que acontece, na verdade, � que algumas mulheres produzem leite com um maior teor de gordura, dependendo da sua alimenta��o, o que n�o significa que o leite de outras seja fraco, tampouco que a nutri��o do beb� ser� prejudicada.
"As m�es que t�m restri��o alimentar por n�o ter condi��es de se alimentar adequadamente durante a gravidez, tamb�m tem um leite muito bom, porque o organismo tira tudo que ela tem de melhor para alimentar o beb�", refor�a Castro, pediatra e chefe da unidade de neonatologia da Maternidade-Escola Assis Chateaubriand.
A especialista ainda ressalta que a natureza � t�o perfeita que o leite da m�e de um beb� prematuro � diferente de outro que nasceu na �poca certa. "A quantidade de nutrientes � exatamente a ideal para aquele beb�, a gente nem entende essa perfei��o do corpo", comenta Castro.

Para doar leite materno, a mulher pode procurar um dos 220 postos de coleta dos Bancos de Leite Humano (BLHs) espalhados pelo pa�s
Getty ImagesBenef�cios do aleitamento materno
N�o � segredo para ningu�m que o leite materno � muito importante para o desenvolvimento do beb�. Mas voc� sabe exatamente por qu�? Veja a seguir alguns dos principais motivos:
- As prote�nas do leite materno t�m uma qualidade muito melhor se comparados com a f�rmula, como j� mostram diversos estudos;
- O leite materno tem as quantidades de nutrientes exatas para o rec�m-nascido e para cada fase posterior;
- Reduz o risco de mortalidade infantil;
- Tem uma digest�o mais r�pida e melhor, al�m de o beb� ter menos incid�ncia de refluxo e diarreia;
- Protege contra a desnutri��o e obesidade, j� que possui uma quantidade muito mais equilibrada de nutrientes;
- Diminui o risco de diabetes;
- O leite materno tem fatores de defesa imunol�gicos que protegem, em especial, contra infec��es digestivas e respirat�rias;
- Estudos apontam que o leite materno diminui o risco de transtornos mentais na inf�ncia e adolesc�ncia;
- Beb�s que mamam no peito correm menos risco de serem internados;
- Favorece o desenvolvimento motor-oral, que inclui a da arcada dent�ria, mand�bula, l�bios, l�ngua, mand�bula, maxila, bochechas, etc;
- Previne a m� oclus�o dental;
- Protege contra doen�as intestinais com origens imunol�gicas;
- Previne contra doen�as al�rgicas e cr�nicas, como colesterol, cardiopatias, alguns tipos de c�nceres e leucemia;
- O aleitamento materno � muito mais pr�tico, est� sempre pronto e na temperatura ideal;
- A amamenta��o fortalece muito os v�nculos afetivos entre m�e e filho.
E os benef�cios n�o param por a�. Diversas pesquisas, incluindo uma brasileira e publicada na prestigiada revista m�dica The Lancet, mostram que o aleitamento materno tamb�m melhora a cogni��o, ou seja, beb�s que mamam no peito tendem a ser mais inteligentes, com um QI mais elevado.
E as m�es tamb�m s�o beneficiadas, visto que o leite materno:
- Diminui o risco do c�ncer de mama, de ov�rio e protege contra a diabetes tipo 2, como j� demonstrado em estudos;
- Ajuda na recupera��o do p�s-parto com a libera��o de ocitocina, que contrai o �tero para que ele volte ao normal mais r�pido, independentemente do tipo de parto;
- Auxilia na perda do peso;
- Diminui o risco de depress�o p�s-parto.
Al�m disso, segundo os especialistas, a amamenta��o ainda tem um efeito anticoncepcional. A mulher que amamenta com intervalos regulares tende a demorar mais para engravidar novamente, pois a produ��o hormonal inibe uma nova gesta��o.

A Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS) aconselha a manuten��o do aleitamento materno por dois anos ou mais, e, de forma exclusiva, por 6 meses
Getty ImagesContudo, h� alguns casos que impedem que a mulher amamente o seu beb�, como o uso de alguns medicamentos para c�ncer ou doen�as imunol�gicas, quimioterapias, entre outros.
Algumas m�es podem sofrer com mastite — uma inflama��o que deixa o seio vermelho e bastante dolorido, e que requer medica��o. Outras t�m fissuras, que costumam surgir ainda no in�cio da amamenta��o. Isso ocorre, principalmente, porque a crian�a ainda est� aprendendo a sugar o leite. De qualquer forma � preciso ir ao m�dico para avalia��o, que pode, por exemplo, receitar pomadas para um tratamento eficaz, sem precisar cessar a amamenta��o.
Caso o seio esteja muito machucado, atualmente, existem profissionais que fazem aplica��o de laser para cicatriza��o, mas n�o � barato, por isso a t�cnica � invi�vel para a maioria da popula��o.
"A m�e pode deixar a mama machucada em repouso, passar a pomada receitada e retirar o leite para n�o empedrar. N�o pode deixar cheia de leite e dura, porque isso predisp�e a mastite", alerta Cali, professora da USP e membro do departamento de aleitamento materno da Sociedade de Pediatria de S�o Paulo.
A especialista comenta tamb�m que algumas m�es, ao terem o seio machucado gostam de passar o pr�prio leite na regi�o, o que faz bastante sentido. "Porque o leite materno tem propriedades cicatrizantes, ent�o, ela pode passar o leite e deix�-lo secar, que isso tamb�m vai ajudar na cicatriza��o", ensina Calil.
Segundo ela, a maior parte das m�es n�o precisa parar de amamentar por esses motivos, a n�o ser que haja, por exemplo, um abscesso mam�rio (infec��o com sa�da de pus). Nesse caso, ela deve cessar a amamenta��o e esperar melhorar. Depois, caso queira, pode voltar a amamentar o beb�.
Vale dizer que, �s vezes, s� um seio inflama e, nesse caso, a m�e pode seguir a amamenta��o apenas com o outro, provisoriamente.
Como forma preventiva, os especialistas refor�am que as m�es precisam ser acompanhadas e muito bem orientadas por um pediatra ou uma consultora de lacta��o. Nos pr�prios Bancos de Leite Humano, a mulher pode receber orienta��es sobre como amamentar o seu filho corretamente.
A amamenta��o � t�o importante que entre os dias 1 e 7 de agosto ocorre a 31ª semana mundial de aleitamento materno. No Brasil, esse m�s � conhecido como Agosto Dourado, porque simboliza a luta pelo incentivo � amamenta��o. A cor dourada est� relacionada ao padr�o ouro de qualidade do leite materno. A Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS) aconselha a manuten��o do aleitamento materno por dois anos ou mais, e, de forma exclusiva, por 6 meses.
- Este texto foi publicado originalmente em https://www.bbc.com/portuguese/geral-62434978
Sabia que a BBC est� tamb�m no Telegram? Inscreva-se no canal.
J� assistiu aos nossos novos v�deos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!
*Para comentar, fa�a seu login ou assine