
Apesar do avan�o na incid�ncia, especialistas afirmam, � luz do conhecimento cient�fico que se tem sobre o v�rus MPXV, que o mundo est� longe de reviver o pesadelo da COVID-19. Com as formas de transmiss�o conhecidas, o importante – destacam – � tomar medidas de prote��o, como evitar o contato pr�ximo (pele a pele) com pessoas doentes ou com suspeita da enfermidade.
Embora o n�mero de casos da doen�a esteja aumentando, nada indica que, geneticamente, tenha havido altera��o significativa no v�rus de forma a se tornar mais transmiss�vel, esclarece o infectologista J�lio Croda, especialista da Funda��o Oswaldo Cruz (Fiocruz) e professor da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS) e da Escola de Sa�de P�blica de Yale, nos EUA. "Geneticamente, � um v�rus mais est�vel, de DNA. N�o parece ter sofrido muta��es importantes, principalmente na transmissibilidade", diz Croda, tamb�m presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT).
Um estudo recente, publicado na revista Nature Medicine por pesquisadores de Portugal, identificou uma acelera��o nas muta��es do MPXV maior que a esperada. Os autores, que compararam amostras do atual surto �s de infec��es de 2018-2019 na Nig�ria, constataram que o micro-organismo mudou 40 vezes no per�odo. De acordo com Richard Neher, f�sico e bi�logo da Universidade da Basileia, na Su��a, um v�rus da fam�lia pox (grupo formado por aqueles que causam ves�culas na pele) tende a variar uma vez ao ano.
Por�m, o cientista, que desenvolveu um modelo computacional de acompanhamento das muta��es do monkeypox, observa que essas varia��es s�o sem import�ncia cl�nica e epidemiol�gica. "A grande maioria delas s�o, provavelmente, inconsequentes ou delet�rias para o v�rus, e n�o temos evid�ncias de adapta��o viral." Muta��es delet�rias s�o aquelas que, em vez de dar uma vantagem ao micro-organismo, t�m a��es desfavor�veis a ele. Segundo Neher, a import�ncia mais evidente das altera��es gen�ticas � que elas ajudar�o a "distinguir diferentes grupos do surto e entender como o v�rus se espalha".
COMPORTAMENTO Marcelo Nascimento Burattini, professor de doen�as infecciosas e parasit�rias da Universidade Federal de S�o Paulo (Unifesp), lembra que todas as vezes em que h� um surto, existe a oportunidade de muta��es. Para o especialista em infectologia e medicina tropical, por�m, esse n�o parece ter sido o caso do MPXV. Burattini acredita que, possivelmente, n�o foi o v�rus que mudou, mas o comportamento das pessoas.
"Estamos no fim de uma pandemia de Sars-CoV-2, com as restri��es de viagem interrompidas, dois anos e meio depois das fronteiras mundiais fechadas. No fim do ano passado, houve um grande aumento no n�mero de viagens, com as pessoas se expondo muito mais", diz.
O MPXV n�o �, como o Sars-CoV-2 ou a influenza, um v�rus respirat�rio. Isso j� reduz significativamente o potencial de transmiss�o, afirma Burattini. Embora alguns especialistas tenham sugerido que o micro-organismo pode se espalhar por got�culas de secre��o nasal ou part�culas transportadas pelo ar, um estudo recente publicado na revista The Lancet por cientistas espanh�is mostrou que, provavelmente, esse � um caminho pouco vi�vel.
A equipe analisou amostras das les�es anais e orofar�ngeas de 200 pessoas infectadas, moradoras de Madri e Barcelona, at� meados de julho. Todos os participantes tinham manifesta��es na pele, sendo que, em 78% deles, as feridas estavam na regi�o anogenital e, em 43%, na zona oral e em volta da boca. A an�lise dos esfreg�es mostrou que o DNA do v�rus estava concentrado n�o na garganta, como se esperaria de um micro-organismo respirat�rio.
Em vez disso, a maior carga viral foi detectada no �nus e na genit�lia. "Esses dados s�o relevantes, pois corroboram a hip�tese de que a via de contato direto � a de transmiss�o mais importante e frequente no surto atual, sendo a a�rea provavelmente menos eficaz", avalia Pablo Fern�ndez, especialista em medicina tropical da Universidade Aut�noma de Madrid e porta-voz da Academia Espanhola de Dermatologia e Venereologia.
Isso, por�m, n�o significa que a doen�a seja sexualmente transmiss�vel. Nem o fato de que mais de 95% dos infectados no surto atual tenham sido caracterizados como homens que fazem sexo com homens. Independentemente de sexo biol�gico ou da orienta��o sexual, qualquer pessoa est� sujeita a ser infectada caso tenha contato pr�ximo – incluindo, mas n�o apenas, o sexual – com um paciente com MPXV.
"As erup��es podem ser encontradas nos genitais e na boca, provavelmente contribuindo para a transmiss�o durante o contato sexual ou contato boca a pele", ressalta a m�dica infectologista Helena Br�gido, professora da Universidade Federal do Par� (UFPA).
"� importante n�o estigmatizar pessoas de maior risco ou qualquer indiv�duo com quadro cl�nico de monkeypox, pois isso prejudica a busca de diagn�stico e tratamento da doen�a." O infectologista Marcelo Nascimento Burattini, da Unifesp, lembra que usar roupas e copos n�o higienizados e que foram utilizados por infectados, por exemplo, pode ser suficiente para transmitir o v�rus.
SEXO Muitas pessoas podem se perguntar por que, ent�o, a maioria dos casos est� concentrada, por enquanto, na popula��o de homens que fazem sexo com homens. De acordo com especialistas, n�o se trata de um grupo de risco, mas de um comportamento de risco. "A caracteriza��o dos pacientes, at� agora, mostra uma popula��o de homens, jovens adultos, com boa situa��o financeira, que viajam muito e fazem contato pr�ximo com uma quantidade grande de pessoas, frequentando ambientes prop�cios para a dissemina��o", destaca Burattini.
Alguns estudos sugerem que a doen�a pode ser transmitida tamb�m pelo s�men e por fluidos vaginais – mas n�o apenas por esse meio. Estudos realizados na Espanha, na Alemanha e na It�lia detectaram DNA do pat�geno em amostras seminais de alguns pacientes at� 19 dias ap�s a infec��o, mas isso n�o significa, necessariamente, cont�gio por essa via. O material gen�tico de outros v�rus, como o da zika, por exemplo, j� foi encontrado nesse mesmo tipo de secre��o e n�o h� evid�ncias de que seja sexualmente transmiss�vel.

Qualquer pessoa que se exponha ao contato �ntimo, incluindo gestantes e crian�as, est� em risco
J�lio Croda, infectologista
Comportamento de risco
O presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT), J�lio Croda, ressalta que, se a transmiss�o tamb�m ocorrer por s�men e fluido vaginal, isso n�o mudar� o impacto epidemiol�gico da doen�a, pois j� se sabe que a principal via de cont�gio � o contato pr�ximo, independentemente de haver penetra��o. "As pessoas precisam entender que n�o � por ser gay que algu�m ter� monkeypox. Qualquer pessoa que se exponha ao contato �ntimo, incluindo gestantes e crian�as, est� em risco", diz.
Para a preven��o, a melhor estrat�gia � evitar esse tipo de contato com pessoas que possam ter a doen�a, dizem os especialistas. Mesmo que, aparentemente, n�o existam les�es, um estudo recente, feito por pesquisadores do Hospital Bichat-Claude Bernard, em Paris, encontrou o v�rus em amostras anais de assintom�ticos. O n�mero de participantes foi pequeno – 200 pessoas, sendo que 13 delas testaram positivo mesmo sem sintomas.
Os autores destacaram que vacinar quem se encaixa em comportamentos de risco, e n�o apenas aqueles que se expuseram ao v�rus, pode frear a transmiss�o da doen�a. A Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS) n�o recomenda a vacina��o em massa, devido �s caracter�sticas de transmissibilidade. Por ora, a imuniza��o � indicada para grupos de risco, como profissionais de sa�de e trabalhadores de laborat�rios.
A vacina p�s-exposi��o recente tamb�m � eficaz para reduzir a probabilidade de se desenvolver a doen�a, assim como a gravidade dos sintomas. Por�m, os cientistas acreditam que n�o h� necessidade de estender a indica��o para a popula��o em geral. (PO)
Palavra de especialista - Felicia Nutter, professora-assistente da Faculdade de Medicina Veterin�ria Cummings (EUA), especialista em zoonoses e ecologia de doen�as infecciosas
Menor gravidade
“Qualquer pessoa pode ser infectada. � uma doen�a viral, que se espalha por meio do contato pr�ximo: isso significa estar em contato f�sico com algu�m que tenha a doen�a ou com qualquer coisa que ela tenha tocado por um per�odo prolongado, se houver uma les�o ativa. Por exemplo, se voc� est� lavando roupa para algu�m que tem a doen�a, pode estar exposto. Se voc� acha que foi exposto ao v�rus, � importante informar o seu m�dico, fazer o teste e possivelmente vacinar o mais r�pido poss�vel. A vacina, quando administrada dentro de quatro dias ap�s a exposi��o, tem a melhor chance de prevenir a doen�a, mas a vacina��o at� duas semanas depois tamb�m pode reduzir a gravidade dos sintomas.”