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Estado de Minas HEMOFILIA

O esc�ndalo que levou � infec��o de 175 crian�as pelo HIV

As fam�lias de alguns dos afetados est�o prestando depoimentos em um inqu�rito sobre o desastre do tratamento da hemofilia no servi�o de sa�de p�blica brit�nico nas d�cadas de 1970 e 80.


06/10/2022 10:49 - atualizado 06/10/2022 12:58

Pelo menos 175 crian�as com hemofilia, uma doen�a que acomete o sangue, foram infectadas com o v�rus HIV na d�cada de 1970 e 80, de acordo com documentos dos arquivos nacionais do Reino Unido analisados pela BBC News.

Algumas das fam�lias afetadas est�o prestando depoimento em um inqu�rito sobre o que foi chamado de "pior desastre de tratamento na hist�ria do NHS" (o servi�o p�blico de sa�de brit�nico).

O epis�dio aconteceu h� quase 36 anos — no final de outubro de 1986 — mas Linda* nunca se esquecer� do dia em que soube que o filho havia sido infectado pelo HIV.

Ela foi chamada para um consult�rio no Hospital Infantil de Birmingham, com Michael, de 16 anos.

Quando crian�a, ele foi diagnosticado com hemofilia, um dist�rbio gen�tico que impede a coagula��o adequada do sangue.

Linda assumiu que a reuni�o era para discutir a transfer�ncia do tratamento para um novo local, o Hospital Queen Elizabeth.

"Isso era algo t�o rotineiro que meu marido ficou no carro, do lado de fora", lembra.

"Ent�o, de repente, o m�dico disse: 'Claro, Michael � HIV positivo'."

"Ele comunicou o fato como se estivesse falando sobre o clima l� fora. Meu est�mago simplesmente revirou."

"Entramos no carro, contei ao meu marido e ficamos em sil�ncio durante todo o caminho para casa. Foi um choque."

Teste positivo

O epis�dio se desenrolou ainda no in�cio da crise da aids, mas o estigma da doen�a j� era muito real.

Em 1985, dezenas de pais tiraram seus filhos de uma escola prim�ria em Hampshire, tamb�m no Reino Unido, depois que um aluno de nove anos — tamb�m hemof�lico — testou positivo para o HIV.

Michael n�o queria que os amigos ou os familiares fossem informados do diagn�stico.

"Foi assim que ele lidou com isso: guardar para si mesmo", destaca Linda.

"Ele nunca contou aos amigos ou qualquer outra pessoa, porque s� queria sentir-se normal."


Linda sentada
Linda conta que o filho 'nunca contou aos amigos ou qualquer outra pessoa, porque s� queria sentir-se normal' (foto: BBC)

Entre 1970 e 1991, 1,2 mil pessoas com hemofilia foram infectadas com HIV no Reino Unido depois de tomar o Fator 8 — � �poca, um novo tratamento que substitu�a a prote�na de coagula��o que faltava no sangue das pessoas com essa doen�a.

Agora, documentos do Arquivo Nacional do Reino Unido revelam que, entre esses pacientes, havia pelo menos 175 crian�as que receberam a medica��o em hospitais e cl�nicas de hemofilia do NHS, o servi�o de sa�de p�blica brit�nico.

Acredita-se que dezenas de milhares de outras pessoas tenham sido expostas � hepatite C, enfermidade viral que pode causar insufici�ncia hep�tica e c�ncer, seja pelo mesmo tratamento ou pela transfus�o de sangue.

Cerca de metade desses indiv�duos que foram infectados pelo HIV morreu antes que os medicamentos antirretrovirais ficassem dispon�veis ao p�blico.

Usu�rios de drogas

H� quatro d�cadas, o Reino Unido n�o era autossuficiente em produtos farmac�uticos de origem sangu�nea, ent�o o Fator 8 era importado dos Estados Unidos.

Cada lote do tratamento era feito a partir do plasma sangu�neo agrupado ou misturado de milhares de doadores.

Se apenas um desses doadores fosse HIV positivo, o v�rus poderia estar na formula��o da terapia.

As empresas farmac�uticas nos EUA pagavam indiv�duos para doar sangue — incluindo aqueles que integravam alguns em grupos considerados de alto risco para a infec��o pelo HIV � �poca, como prisioneiros e usu�rios de drogas.

Linda lembra-se de ter ouvido falar de aids pela primeira vez durante uma apresenta��o no Hospital Infantil de Birmingham em 1984. Ela se recorda de ter ficado em alerta e atenta a certos sintomas que foram descritos.

Mas ela diz que a fam�lia nunca foi totalmente conscientizada sobre os perigos envolvidos — certa vez, uma enfermeira afirmou que Linda n�o precisava se preocupar, porque "Michael estava bem".

Durante todo esse tempo, o filho continuou sendo tratado com a mesma medica��o de origem americana.


Hospital Rainha Elizabeth, Birmingham
O antigo Hospital Queen Elizabeth em Birmingham foi fechado em 2010 e os servi�os de sa�de foram transferidos para um novo local (foto: BBC)

No final da adolesc�ncia, Michael come�ou a ter problemas de sa�de — de suores noturnos e febre a incha�o nos g�nglios e crises de gripe bem fortes.

Mas ele continuou a viver a vida ao m�ximo: viajava, ouvia m�sica e torcia pelo clube de futebol West Bromwich Albion.

"Houve uma grande partida no est�dio de Wembley e ele estava muito, muito mal", relata Linda.

"Ent�o n�s decoramos todo o carro e ele encontrou os amigos. N�o importava como ele se sentisse. Se pudesse chegar at� o est�dio, ele iria."

Anos depois, quando o sistema imunol�gico de Michael come�ou a apresentar problemas mais graves, ele emagreceu bastante, tinha muita fadiga e perdeu parte da mem�ria.

Ele foi transferido para o Hospital Heartlands, em Birmingham, onde Linda, que se demitiu do trabalho como cozinheira em uma casa de repouso, ajudou a cuidar dele nos �ltimos meses de vida.

"Ele me disse: 'M�e, voc� nunca vai ser bab�'."

"Eu apenas respondi: 'N�o se preocupe'."

"Isso foi tudo o que eu conseguia pensar em dizer", diz Linda.

Michael desenvolveu meningite e pneumonia — ambas relacionadas ao v�rus HIV com o qual ele foi infectado quando crian�a.

Ele morreu em 26 de maio de 1995, exatamente uma semana antes de completar 26 anos.

Sess�o especial

Quase tr�s d�cadas depois, Linda est� fornecendo provas e depoimentos para um longo inqu�rito p�blico sobre o desastre do tratamento de hemofilia no sistema de sa�de p�blico ingl�s.

Ela aparecer� ao lado de outros pais em uma sess�o especial sobre as experi�ncias de fam�lias cujos filhos foram infectados pelo HIV nas d�cadas de 1970 e 1980.

"Senti que precisava fazer isso porque quero ajudar a desvendar a fundo essa hist�ria", acredita.

"Todos n�s queremos saber por que permitiram que isso acontecesse e continuasse a afetar tantas pessoas."

* Linda pediu que seu sobrenome fosse omitido.

- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/internacional-63156989

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