Isabella Savaget

Isabella Savaget

Arquivo pessoal

Devido � falta de oxig�nio durante o parto, a influenciadora digital e estudante Isabella Savaget, de 21 anos, teve parte do c�rebro lesionada e, por causa disso, seus movimentos ficaram limitados.

 

Na �poca, sua m�e teve uma gravidez considerada tardia pelos especialistas, aos 40 anos. Ela desejava fazer uma ces�rea, mas o m�dico recomendou um parto normal.

"N�o sa� na hora certa. Foram s� alguns segundos que fiquei sem oxig�nio, mas foram suficientes para lesionar a parte motora do c�rebro", diz Isabella, com lembran�as contadas por sua m�e.

 

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A beb� foi encaminhada para UTI neonatal, onde teve uma convuls�o e os m�dicos identificaram um problema, mas n�o deram um diagn�stico preciso.

 

"Na hora eles disseram que eu tive uma les�o e ponto", relata.

  

Ap�s consultas m�dicas, descobriram que a intercorr�ncia no parto gerou uma paralisia cerebral.

Desde ent�o, a jovem tem acompanhamento multidisciplinar com especialistas que auxiliam no seu desenvolvimento.


O lado esquerdo da estudante foi o mais prejudicado, fazendo com que ela tenha, at� hoje, dificuldade em certas a��es. Mas a parte cognitiva n�o foi afetada.


A influencer, que fala de inclus�o de pessoas com defici�ncia (PCDs) nas redes sociais, conta que � poss�vel realizar algumas atividades sem a ajuda de terceiros.


"Eu comecei a fazer tratamento muito nova e isso foi fundamental para desenvolver minha autonomia. Eu n�o consigo pegar uma x�cara, por exemplo. Mas fa�o tudo praticamente sozinha. [A paralisia] n�o afetou a parte cognitiva, s� a parte motora", conta.

Ela tamb�m apresenta dificuldade na fala e sofre com tetraplegia esp�stica, que faz com que a pessoa tenha dificuldade em mexer os membros superiores e inferiores, al�m de espasmos, que s�o movimentos involunt�rios.

Desenvolvimento escolar e ao longo da vida

Mesmo estudando em uma escola com apenas cinco alunos com defici�ncia, Isabella conta que nunca se intimidou ou se sentiu exclu�da pelos colegas. Ela permaneceu no mesmo col�gio por dez anos e sempre fez quest�o de dan�ar nos eventos de festa junina.

Inclusive foi por meio da dan�a que ela conseguiu melhorar sua coordena��o e movimentos.

"Eu aprendi a dan�ar funk antes de andar sozinha. Isso me motivou. A dan�a foi um tipo de terapia dentro da fisioterapia. Foi atrav�s da dan�a que vi que nada era imposs�vel", diz.

Ela se recorda que come�ou a andar aos quatro anos, mas j� improvisava passos de dan�a aos dois anos — tudo de maneira adaptada por sua fisioterapeuta.

Em rela��o � alfabetiza��o, o processo foi todo feito por meio de um computador. Por n�o ter coordena��o suficiente para escrever, ela contava com a ajuda da tecnologia para exerc�cios e tarefas escolares.

As mat�rias na �rea de exatas foram as mais dif�ceis. Segundo a jovem, montar equa��es e outras f�rmulas n�o eram t�o simples.

"Precisei de uma tutora que me acompanhasse dentro da sala de aula. Eu falava e ela escrevia em um caderno as f�rmulas. Sofri muito com f�sica, qu�mica e matem�tica."


Isabella Savaget quando criança

Isabella come�ou a andar aos quatro anos, mas j� improvisava passos de dan�a aos dois anos

Arquivo pessoal

Capaz de entender os ensinamentos da escola, ela conseguiu acompanhar toda a turma e mat�rias no col�gio. Mas a maior diferen�a entre Isabella e os colegas era o fato de que nem sempre era poss�vel fazer as mesmas atividades.

"Eu percebi que tinha defici�ncia quando via minhas amigas indo para a aula de bal�, de dan�a e eu ia para fisioterapia", lembra. Ela tamb�m fazia acompanhamento com neurologistas, terapeutas ocupacionais e fonoaudi�logos.

Anorexia foi forma de esconder defici�ncia

Dos 14 aos 17 anos, a jovem sofreu com anorexia nervosa e chegou a pesar 30 quilos. Como tinha dificuldade em aceitar a defici�ncia, ela conta que a doen�a foi uma forma de esconder o que sofria.

"Meu subconsciente achou que [a anorexia] era uma �tima forma de fazer isso e foi um dos per�odos mais ca�ticos da minha vida. Eu perdi toda aquela determina��o para seguir em frente", diz. Por causa do baixo peso, precisou interromper o tratamento que fazia.

Sua vida social tamb�m foi afetada. Ela deixou de ir a festas de anivers�rio porque era obrigada a comer. Acompanhada por especialistas de diversas �reas, a influencer lembra que os profissionais de sa�de chegaram a dizer que ela morreria e que precisaria ser internada.

"Naquele momento percebi que n�o era aquela vida que eu queria para mim", conta.

Ela passou a receber comida for�ada e chegou a ganhar um pouco mais de peso, mas seguia lutando contra o problema. Seus pais colocaram como "meta" o ganho de peso e, em troca, ela ganharia um cachorro, um dos seus maiores desejos.

Depois de muito tempo em tratamento, ela conseguiu controlar a anorexia. Mas a jovem conta que ainda sofre com resqu�cios da doen�a e precisa monitorar seu comportamento para evitar situa��es que a deixem mais vulner�vel.

"Eu digo que at� hoje sofro, mas n�o se compara ao que eu tinha na adolesc�ncia", diz.

Sucesso nas redes sociais e inspira��o


Isabella Savaget com o braço direito levantado

Em sua rede social, ela desmistifica o dia a dia de PCDs e esclarece d�vidas sobre a defici�ncia

Arquivo pessoal

Por causa de sua cachorra, ela j� administrava uma conta no Instagram e tentava buscar parcerias com empresas de produtos para a pet.

Um dia ela resolveu mudar o conte�do do perfil e postar um v�deo contando sobre sua hist�ria de supera��o.


Em algumas horas, a postagem viralizou e o perfil nas redes sociais come�ou a crescer.


Assim, ela passou a produzir conte�dos sobre capacitismo, o dia a dia de pessoas com defici�ncia e outros assuntos. Atualmente, ela j� soma pouco mais de 200 mil seguidores somente no Instagram.

O sucesso tamb�m ocorreu no Tik Tok. Isolada em casa, no auge da pandemia, ela publicou um v�deo em que aparece dan�ando e a postagem atingiu 22 milh�es de visualiza��es. Nessa rede social, Isabella j� tem quase um milh�o de seguidores.


Como sua paix�o desde pequena foi dan�ar, ela conta que n�o imaginava que o v�deo fosse fazer tanto sucesso, mas muitas pessoas a apoiaram e agradeceram pelo conte�do. Desde ent�o, ela segue com publica��es que desmistificam o cotidiano de PCDs e que ajudam na inclus�o.


Isabella Savaget de pé

Isabella sonha em criar uma loja de produtos adaptados para pessoas com defici�ncia

Arquivo pessoal

"Tem gente mandando coisas positivas, vivendo coisas boas e eu penso que n�o vou parar meu trabalho. Recebo muita gente dizendo que mudei a vida delas e que dei esperan�a. Recebo perguntas de m�es querendo saber qual �rtese [apoio para alinhamento de membro do corpo] eu uso porque o filho delas n�o conseguem andar", conta.


Um dos quadros que mais fazem sucesso em sua rede social � o "Bella Descomplica", no qual ela esclarece d�vidas sobre a defici�ncia.
Pautas como namoro com PCDs, filhos com defici�ncia, lei brasileira de inclus�o e outros temas s�o abordados por ela.

Falta inclus�o e visibilidade

Mesmo sendo bem aceita nas redes sociais, a jovem afirma que a realidade fora da internet � outra. Segundo ela, falta que a sociedade reconhe�a que pessoas com defici�ncia s�o capazes.


Uma outra quest�o apontada pela estudante � a necessidade de que marcas tamb�m enxerguem esse p�blico como consumidor.


"Eu preciso de um sapato adaptado. Eu consegui um sapato porque eu fui atr�s de uma marca e mandei fazer", diz.


A tecnologia tamb�m � um ponto que, ao mesmo tempo que evolui para um determinado p�blico, n�o progride da mesma maneira para quem tem defici�ncia.


"Quanto mais a tecnologia avan�a para voc�s, n�s somos deixados de lado. O microfone no telefone n�o entende minha voz, por exemplo", diz.


A mobilidade tamb�m � um ponto que ainda precisa ser melhorado em muitas cidades, segundo Isabella.


"Aqui no Rio de Janeiro andar nas cal�adas � um pouco complicado. Falta acessibilidade", destaca.


Isabella conta que seu maior sonho � criar uma loja de produtos adaptados.


"Eu penso em criar maquiagens, sapatos e at� m�veis para n�s."

Sofrimento no parto aumenta risco de paralisia cerebral

Algumas intercorr�ncias durante o parto podem fazer com que a oferta de oxig�nio para o feto — por meio da placenta e da circula��o sangu�nea — sejam prejudicadas.


A falta de oxigena��o e irriga��o de sangue para o c�rebro leva a hip�xia e isquemia cerebral, respectivamente. As les�es produzir�o sequelas neurol�gicas, como a paralisia cerebral.


E assim como ocorreu com a m�e de Isabella, uma das complica��es mais comuns e que geram o problema s�o partos normais e de longa dura��o. Mas at� em ces�reas pode haver danos.


"Tanto partos normais quanto cesarianas que ocorrem tardiamente podem provocar sofrimento fetal. Por exemplo, o beb� pode fazer coc� dentro da barriga da m�e e esse conte�do, chamado de mec�nio, vai circular pelo l�quido amni�tico e assim entrar� no pulm�o do beb�", explica M�rcio Moacyr de Vasconcelos, neuropediatra e secret�rio do Departamento Cient�fico de Neurologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).


"Quando o mec�nio entra em contato com o pulm�o gera uma inflama��o, e a consequ�ncia � a falta de oxig�nio no c�rebro."


Isabella Savaget segura cordas

No caso de Isabella, a parte cognitiva n�o foi afetada

Arquivo pessoal

"A gestante, durante o parto, pode ter uma press�o muito baixa e uma s�rie de problemas vari�veis podem causar a falta de oxigena��o cerebral. O c�rebro precisa de uma circula��o efetiva", destaca Carlos Alberto Mattozo, neurocirurgi�o do Hospital Marcelino Champagnat, em Curitiba (PR).

Sequelas da paralisia cerebral

No laudo emitido pelos m�dicos, Isabella recebeu o diagn�stico de paralisia cerebral com hemiplegia dupla, que provoca o comprometimento dos quatro membros. Ela ainda sofre com espasmos.


Uma das consequ�ncias principais da condi��o � o acometimento da parte motora e, em alguns casos, da �rea cognitiva do c�rebro.


"Muitos podem ter um grau de cogni��o dentro do normal, mas a fun��o motora � bem afetada. Eles t�m dificuldade em movimentar os bra�os e pernas, mas t�m cognitivo bom", diz Mattozo.


A dificuldade nos movimentos vai depender do n�vel de les�o e tamb�m do lado em que o beb� teve a falta de oxigena��o.


"Se tiver uma les�o numa regi�o do lado direito, pode ter um acometimento do lado esquerdo", diz Ana Paula Pe�a, neurologista e mestre em Gest�o de Sa�de Coletiva pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital S�rio Liban�s. Em cada �rea h� regi�es correspondentes, o que pode determinar se a les�o ser� leve ou n�o.


A especialista destaca ainda que as sequelas podem afetar a vis�o, fala e provocar defici�ncia intelectual.


� muito comum que esses pacientes sofram espasticidade, que � a resposta do nosso sistema nervoso a algum tipo de les�o.


Eles tamb�m podem apresentar distonia, que s�o movimentos involunt�rios. Essa classe de doen�as est� ligada a dist�rbios do movimento, que ocorrem quando a parte mais profunda do c�rebro � atingida.


"Se a pessoa perde esse grau de controle e os n�cleos da base ficam fora de sincronia, eles geram movimentos involunt�rios", destaca Mattozo.


Em rela��o � fala, pacientes podem apresentar dificuldade na dic��o ou articula��o de palavras. Isso ocorre porque as regi�es frontal e temporal esquerda s�o afetadas.

Como funciona o tratamento?

Quem sofre com paralisia cerebral precisa ter um acompanhamento multidisciplinar ao longo da vida, com neurologistas, neuropediatra, fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais.

"� uma equipe multidisciplinar para tentar melhorar as habilidades da crian�a. Por defini��o, haver� um atraso no desenvolvimento", diz Vasconcelos, da Sociedade Brasileira de Pediatria.


Em muitos casos, a espasticidade pode ser resolvida com fisioterapia, j� que a pr�tica ajuda para que o corpo n�o atrofie. Em alguns pacientes, � preciso o aux�lio de �rtese ou pr�teses, muletas e cadeira de rodas.


"O tratamento � vital�cio. No SUS obter a reabilita��o prolongada � um desafio. � penoso para os pais", ressalta o neuropediatra.


Para melhorar os espasmos, o paciente pode ainda recorrer a inje��es de botox, que s�o aplicadas nas articula��es. H� tamb�m medica��es que ajudam nos sintomas.


Por �ltimo, em casos mais raros e que n�o h� progresso com outros tratamentos, os m�dicos podem indicar neurocirurgias.


- Este texto foi publicado em
https://www.bbc.com/portuguese/geral-63198550

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