
"Quando fui diagnosticada com TPL, pensei que nunca teria relacionamentos saud�veis." Foi assim que Mae, de 21 anos, se sentiu quando soube no in�cio deste ano que tinha Transtorno de Personalidade Lim�trofe (TPL) - e este � um sentimento compartilhado nas redes sociais por muitas outras pessoas com o mesmo diagn�stico.
O TPL est� se tornando cada vez mais vis�vel nas redes sociais, e Liana Romaniuk, psiquiatra infantil e professora da Universidade de Edimburgo, na Esc�cia, acha que isso se deve em parte ao fato de os jovens encararem o diagn�stico de forma diferente das gera��es anteriores.
"Alguns jovens com quem trabalho me perguntam: 'Posso ter TPL?' Acho que h� uma conscientiza��o crescente", diz Romaniuk.
O Transtorno de Personalidade Lim�trofe (TPL) � um problema de sa�de mental que causa instabilidade emocional e pode afetar a forma como as pessoas gerenciam seu humor e interagem com outras pessoas. Acredita-se que afete cerca de uma em cada 100 pessoas.

Muitas pessoas com TPL sofreram traumas ou neglig�ncia na inf�ncia, o que pode dificultar os relacionamentos quando adultos. Romaniuk ressalta que "trauma" n�o precisa significar algo horr�vel ou abusivo - pode ser resultado, por exemplo, de pais que se separam, s�o emocionalmente distantes ou a morte de um deles em uma idade jovem.
Infelizmente, pode haver um estigma associado ao diagn�stico de TPL.
Romaniuk explica: "Muitos m�dicos acreditavam no passado que o TPL era intrat�vel ou que as pessoas estavam sendo manipuladoras. Felizmente, essa n�o � a opini�o de ningu�m com quem trabalho no momento".
Leia tamb�m: Polui��o � associada a maior risco de desenvolver dem�ncia
H� tamb�m um "debate cont�nuo" nos c�rculos profissionais, diz Romaniuk, sobre se o TPL � de fato um dist�rbio de personalidade ou uma rea��o a um trauma passado.
"N�o gosto da express�o 'dist�rbio de personalidade'", diz ela. "Parece que voc� est� dizendo que h� algo fundamentalmente errado com [a pessoa], e esse n�o � o caso. Penso nisso mais em termos de sobreviventes, eles s�o adaptadores."
Obsess�o nos relacionamentos
Mae come�ou a pesquisar o TPL porque percebeu que estava ficando "obsessiva" e ansiosa nos relacionamentos.
"Percebi que meus sintomas eram muito mais fortes e disfuncionais quando estava em um relacionamento", diz ela, diagnosticada em mar�o de 2021.
"Fico obsessiva rapidamente. Vou constantemente querer ligar ou enviar mensagens de texto, e vou me isolar de outros amigos - abandono hobbies e dedico todo o meu tempo a essa pessoa."
Coisas simples para quem n�o tem TPL podem tomar grandes propor��es para quem vive com o transtorno.
"Uma vez, eu estava no apartamento de um amigo quando recebi uma mensagem do namorado e o tom dele realmente me assustou - eu literalmente peguei todas as minhas coisas e disse: 'Tenho que ir' e corri para o apartamento dele 15 minutos de dist�ncia.
"Estava tendo um ataque de p�nico total. Acontece que estava tudo bem, ent�o voltei para a casa da minha amiga. Deve ter sido muito bizarro para ela, mas n�o seria capaz de sentar e conversar porque o p�nico continuaria a aumentar."
O medo do abandono tamb�m pode se manifestar como hostilidade.
"Nas �ltimas semanas do meu �ltimo relacionamento, terminava com meu ex, dizendo que iria embora algumas vezes e sendo muito rancorosa", diz Mae.

"Ent�o, quando ele finalmente terminou comigo, fiquei absolutamente arrasada, liguei para ele chorando, implorando para voltar. O fim do relacionamento estava diretamente relacionado ao meu TPL."
Desde seu diagn�stico, Mae iniciou um tratamento chamado Terapia Comportamental Dial�tica (TCD), que � um tipo de terapia de fala para pessoas que t�m dificuldade para regular suas emo��es. Tamb�m come�ou a tomar antidepressivos.
"Estou me sentindo muito mais positiva", diz ela. "Quando fui diagnosticada pela primeira vez, parecia uma senten�a de morte, e seria assim pelo resto da minha vida, mas o TCD est� me mostrando uma sa�da."
� importante observar que nem todos os diagnosticados com TPL se comportar�o da mesma maneira, diz Romaniuk: "Voc� n�o pode fazer uma avalia��o de um grupo inteiro de pessoas com base em tr�s letras".
Sintomas de TPL ou comportamento abusivo?
Os parceiros de pessoas com TPL �s vezes tamb�m podem achar dif�cil - embora muitos com a condi��o possam construir relacionamentos saud�veis.
Este n�o foi o caso de Ellen*.
A mulher de 32 anos namorou um homem diagnosticado com TPL no ano passado. "N�o sei como as coisas poderiam ter
sido diferentes se ele n�o tivesse TPL", diz. "Acho que desculpei muito comportamento abusivo, porque pensei que talvez fosse parte da condi��o."
Ellen explica que o ex-companheiro "me fazia sentir culpada" por deix�-lo sozinho, a ponto de ela come�ar a voltar mais cedo do trabalho.
"Se tiv�ssemos algum tipo de desacordo, ele deixava de falar comigo", acrescenta. "Fiz muitas concess�es pensando que era o TPL. Ele come�ou a me deixar a cada tr�s dias - ele sa�a no meio da noite, depois voltava e me dizia que eu era o amor de sua vida."
Ela diz que parte do comportamento dele era abusivo. Mas este � um r�tulo justo para pessoas com a doen�a? "Essa � uma quest�o realmente importante que toca no cerne de quem somos como seres humanos", diz a psiquiatra infantil Romaniuk.
"Tendo TPL, voc� ainda � voc� mesmo. Isso pode predispor voc� a responder de certas maneiras, mas acho que ainda h� um n�vel de responsabilidade pelo que voc� faz em um determinado momento. Na maioria das vezes, o comportamento n�o � manipulador, mas �s vezes, pode ser."

Na maioria das vezes, por�m, o comportamento vem do medo do abandono.
"Pelo que outras pessoas com TPL me disseram, h� uma tend�ncia de empurrar antes de ser empurrado", diz Romaniuk.
"Voc� pode criar motivos para terminar um relacionamento ou criar testes para garantir que seu parceiro esteja realmente com voc�. Isso � subconsciente - n�o � manipula��o aberta. Do ponto de vista da sobreviv�ncia do seu c�rebro, � sempre melhor estar em guarda e esperar o pior."
Ela incentiva a "conversa honesta" entre os parceiros se uma pessoa tiver TPL, mas tamb�m recomenda a pessoas sem a condi��o de "n�o descuidar de seu bem-estar tamb�m".
Romaniuk tamb�m destaca que cada pessoa com TPL � diferente, e o r�tulo n�o predisp�e ningu�m a um conjunto espec�fico de comportamentos.
"Algumas das pessoas mais ador�veis, din�micas e interessantes que conhe�o t�m TPL", conclui.
*Alguns nomes foram alterados
Este artigo foi originalmente produzido em ingl�s para a BBC Three.
- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/geral-64107883