Daniel de Aguiar Ottoni

Daniel de Aguiar Ottoni assume que, ao acordar, a primeira coisa que faz � recorrer ao celular, j� que dorme cedo e precisa checar as mensagens

Arquivo pessoal


Quem n�o fica o dia todo com o celular por perto que atire a primeira pedra. Hoje, o acess�rio, mais do que um artigo de luxo ou lazer, faz parte da nossa vida, do nosso trabalho, rotina e at� do descanso. O uso constante desse aparelho, por�m, pode levar ao desenvolvimento de um quadro de depend�ncia com apresenta��es vari�veis.
 
De acordo com Felipe Mendes, neurocirurgi�o, membro da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia, esse circuito de forma��o da depend�ncia tem a ver, entre outros fatores, com uma subst�ncia chamada dopamina.
 
Felipe Mende

Felipe Mendes, neurocirurgi�o

Arquivo pessoal
 
 

"Pode haver queda no rendimento e at� mesmo prejudicar a qualidade do sono"

Felipe Mendes, neurocirurgi�o

 
 
“Todas as vezes em que surge uma notifica��o, uma curtida, um coment�rio ou uma rea��o positiva que traz uma percep��o agrad�vel, ocorre a libera��o da dopamina - um neurotransmissor que est� relacionado com a sensa��o de prazer e bem-estar.
 
 
Como � um sentimento agrad�vel, � natural que o organismo queira vivenciar cada vez mais essas sensa��es. Contudo, ocorre um processo de sensibiliza��o, isto �, para ter aquela experi�ncia inicial na mesma intensidade, s�o necess�rias quantidades maiores desse neurotransmissor por meio de est�mulos mais intensos ou mais repetitivos.”
 
 
A partir desse momento, o neurocirurgi�o relata que se come�a a estabelecer um circuito de depend�ncia. “Al�m disso, o c�rebro � condicionado a ficar na expectativa, de prontid�o, de que algo positivo ou prazeroso venha a acontecer. Nessa fase, h� libera��o de uma outra subst�ncia - o cortisol - relacionada � sensa��o de ansiedade e estresse. Cria-se ent�o um estado de alerta cont�nuo, o que leva ao h�bito de ficar constantemente checando se h� uma nova mensagem ou notifica��o na tela do celular.”
 
A suspeita de depend�ncia pode ter rela��o com alguns sinais e sintomas. Entre eles, est�o a necessidade de checar, de minuto em minuto aplicativos de rede social, desbloqueio de tela a todo o momento, mesmo sabendo que n�o h� nenhuma nova notifica��o; dificuldade de realizar uma outra atividade por um per�odo maior de forma ininterrupta, sem realizar pausas constantes para mexer no celular e, por fim, a dificuldade de se "desconectar" do aparelho, permanecer algumas horas distante dele ou mesmo n�o conseguir sair de casa sem o celular.
 
O neurocirurgi�o conta que tudo isso pode levar a quadros de desaten��o mais acentuados, dificuldade de foco e concentra��o para realizar atividades escolares ou do trabalho, principalmente nas atividades que exigem uma carga cognitiva ou intelectual maior. “Pode haver queda no rendimento e at� mesmo prejudicar a qualidade do sono, j� que h� uma exposi��o aumentada � luz azul, que pode alterar o ritmo circadiano - o rel�gio biol�gico interno do organismo.”
 
� o que acontece com Daniel de Aguiar Ottoni, de 39 anos. O jornalista se considera uma pessoa que n�o vive sem telefone celular porque o utiliza com frequ�ncia, principalmente para trabalho. “Existem alguns aplicativos de trabalho que est�o no celular, e eu preciso estar, mesmo nas minhas horas de folga, atento ao que est� acontecendo, uma vez que eu ocupo o cargo de editor. N�o posso deixar as coisas soltas, ou acontecendo sem que eu esteja ciente”, explica. “Eu prefiro estar atento a todo momento, do que dois dias depois, ap�s uma folga, pegar o celular e ver que perdi algo. Mas em meus momentos de descanso, � claro que a minha rela��o com o telefone n�o � a mesma.”

PREJU�ZOS Daniel tamb�m encara que esse uso excessivo pode ser prejudicial. “Tudo em excesso faz mal. Em alguns momentos, � poss�vel, talvez ter um controle melhor, n�o ficar, por exemplo, durante o lazer, t�o perto do celular, ou deix�-lo de lado por algumas horas. Mas � um pouco inevit�vel. Seria muito dif�cil para mim, j� que o celular est� sempre no bolso. Eu sempre acabo conferindo mensagens e se chegou alguma coisa. Quando eu acordo de manh�, por exemplo, a primeira coisa que eu fa�o � bater a m�o na escrivaninha para ver as mensagens que chegaram durante a noite. Como eu durmo cedo, acordo cedo tamb�m e j� tem algumas mensagens de trabalho e pessoais no meu celular.”
 
Por ser jornalista e precisar estar o tempo todo se informando, atualizando e acompanhando tudo o que acontece, isso faz com que o aparelho esteja em m�os durante mais tempo. Infelizmente, at� esse momento, n�o se sabe com precis�o quais seriam os efeitos a longo prazo do uso exagerado de celulares, j� que ainda � algo relativamente recente na hist�ria da humanidade. Felipe explica que, dessa forma, � ainda mais dif�cil saber se esses efeitos seriam definitivos ou n�o. S�o necess�rios estudos prospectivos - que realizam acompanhamento longitudinal ao longo do tempo para melhor elucida��o.
 
Para quem deseja tentar equilibrar o uso do celular, o especialista d� dicas como a cria��o de algumas regras e rotinas. “Por exemplo, separar um per�odo do dia para responder e-mails, outro per�odo para responder notifica��es em redes sociais, controlando-se para evitar ficar constantemente checando as redes sociais. Outra dica � desativar as notifica��es de aplicativos na tela inicial do celular. E, quando for realizar uma atividade que exija um n�vel de concentra��o maior, � prefer�vel deixar o celular desligado, em modo silencioso ou at� mesmo em outro c�modo. Al�m disso, tentar evitar fazer uso do aparelho pelo menos uma hora antes do hor�rio habitual de dormir para reduzir a exposi��o � luz azul e tamb�m modificar as fun��es de brilho de tela para modo noturno j� dispon�veis em v�rios celulares.”

DETOX Daniel conta que  nunca tentou fazer um detox desse tipo e n�o sabe se daria certo, porque, no dia a dia, ele realmente precisa acompanhar tudo o que acontece. Apenas em f�rias � que esse ritmo diminui.
 
Para quem, como o jornalista, trabalha com o aparelho, o neurocirurgi�o fala que o ideal � tentar dar algumas pausas. “Alguns minutos a cada hora, por exemplo. E durante o trabalho focar apenas nos aplicativos necess�rios para a fun��o laboral.”
 
Para quem n�o trabalha no celular e, ainda assim, sinta dificuldades de tentar estabelecer a cria��o dessas rotinas de forma espont�nea ou perceba que suas atividades di�rias est�o sendo prejudicadas pelo uso constante de celular, Felipe pondera que pode ser o momento de procurar a ajuda de um especialista para acompanhamento e aux�lio na redu��o dessa depend�ncia.