Solteiros geralmente sofrem o preconceito, a discrimina��o ou o pr�-julgamento pelo fato de n�o terem se casado, que � o chamado singlismo
Ernesto Vel�zquez/Pixabay
Ainda � latente o preconceito com os solteiros na sociedade atual e “o solteir�o” e “a solteirona” acabam sendo vistos de forma amb�gua pelas pessoas. “Se por um lado s�o considerados independentes e livres para fazer o que quiser, por outro, de forma pejorativa, s�o apontados como os encalhados, aqueles que ningu�m quis, por algum tipo de problema de personalidade, de temperamento, de falta de beleza ou de qualidades para atrair um par”, comenta Cynthia Dias Pinto Coelho, psic�loga e sex�loga.
Para Cynthia Coelho, embora haja uma variedade de tipos de fam�lia nos dias atuais, cada vez mais aceitas em sua diversidade pela sociedade, os solteiros ainda sofrem com olhares de cr�tica ou de piedade, como se fossem pessoas para quem o casamento n�o aconteceu e que tal fato n�o dependeu de sua vontade. “� como se a solteirice n�o fosse considerada como escolha, op��o ou estilo de vida. Ela pode, sim, ser uma escolha. O que n�o pode haver � o preconceito, a discrimina��o ou o pr�-julgamento com as pessoas que n�o se casaram, que � o chamado singlismo.”
“Nos encontros de fam�lia, no ambiente de trabalho e nas rela��es interpessoais, o solteiro sofre. N�o faz diferen�a se aquela pessoa escolheu ser solteira, se ela n�o encontrou a sua famosa cara-metade, se ela se dedicou a cuidar da fam�lia de origem ou se investiu na profiss�o. O fato � que as pessoas sofrem com discrimina��es de ordens diversas. “Esse preconceito n�o ocorre apenas na esfera dos coment�rios, mas se traduz de forma concreta nas rela��es de trabalho, de contrata��o de servi�os, na compra de produtos, como seguros ou viagens, e at� nos convites para eventos sociais."
O singlismo atinge homens e mulheres, mas h� diferen�as de olhares e na intensidade de cr�ticas conforme o g�nero. “Talvez haja algum resqu�cio do pensamento passado, de que a mulher foi feita para o casamento, para a maternidade e para a submiss�o ao marido, que supostamente seria a cabe�a pensante do casal. Assim, a falta do casamento na vida de uma mulher fica associada � sua insufici�ncia de qualidades para atrair algu�m que a leve ao altar e se disponha a passar a vida com ela”, diz Cynthia.
O ass�dio sexual se torna mais abusivo com as mulheres solteiras do que com as casadas, como se a solteira fosse dispon�vel para o ass�dio e para o desejo masculino, inclusive da parte de homens casados, que costumam v�-las como fr�geis ou carentes, as que aceitam e toleram qualquer coisa em troca da companhia masculina
Cynthia Dias Pinto Coelho, psic�loga e sex�loga
“Os termos ‘encalhada’, ‘solteirona’ e ‘a que ficou pra titia’ s�o usados ainda nos tempos atuais. O curioso � que o preconceito come�a j� na pr�pria fam�lia da mulher solteira. � comum que os irm�os ou primos combinem juntos sa�das para restaurantes ou viagens de f�rias, mas a irm� e a prima solteira costumam ser exclu�das desses convites pelo simples fato de n�o terem um par. Ou seja, sua companhia e presen�a deixam de ter valor apenas porque elas n�o t�m um homem ao seu lado”, destaca.
A psic�loga enfatiza que ao contratar o pedreiro, o eletricista, o pintor ou o encanador para um reparo em sua casa, a solteira costuma pagar um pre�o muito mais alto do que o cobrado do homem solteiro e o prazo de entrega costuma ser dilatado ou atrasado sem nenhum respeito ou considera��o em fun��o de sua suposta fragilidade f�sica para cobrar ou brigar pelo seu direito. O mesmo acontece numa oficina mec�nica na hora dos reparos em seu autom�vel.
Singlismo velado
Cynthia Dias Pinto Coelho, psic�loga e sex�loga, diz que talvez ainda haja algum resqu�cio do pensamento passado, de que a mulher foi feita para o casamento
Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press
“O ass�dio sexual se torna mais abusivo com as mulheres solteiras do que com as casadas, como se a solteira fosse dispon�vel para o ass�dio e para o desejo masculino, inclusive da parte de homens casados, que costumam v�-las como fr�geis ou carentes, as que aceitam e toleram qualquer coisa em troca da companhia masculina. Ainda no que se refere � sexualidade, � comum que pessoas solteiras sejam alvo de questionamentos sobre sua orienta��o sexual, sugerindo indiretamente uma homossexualidade n�o assumida”, enfatiza Cynthia Coelho.
Ela acrescenta que talvez haja, por parte dos questionadores, uma exce��o no preconceito quando se trata de mulheres muito bem-sucedidas no trabalho, j� que elas obtiveram sucesso profissional e financeiro sem depender de apoio ou ajuda de um marido. “Mas at� nessas situa��es pode haver um singlismo velado, pois costumam dizer: “fulana se casou com o trabalho”, como se casar e ter sucesso profissional fossem coisas mutuamente excludentes”.
Como ficam os homens nessa hist�ria
O singlismo tamb�m atinge os homens, de forma mais branda. “Existem dois lados curiosos nessa quest�o. Num primeiro olhar, o homem considerado “solteir�o” pode ser visto como algu�m esperto, a ser admirado pelos amigos, principalmente na faixa et�ria mais madura. Por ser algu�m livre, pode sair com todas as mulheres que quiser, sem ter que se comprometer com ningu�m e arcar com os custos emocionais e exig�ncias relacionais, por exemplo, experimentando uma diversidade de parceiras sexuais”, explica Cynthia.
“Tal vis�o � alimentada apenas pelo prazer instant�neo que as rela��es fugazes oferecem, sem levar em conta os benef�cios da parceira e do cuidado que s� existem nas rela��es amorosas em que h� comprometimento e envolvimento amoroso, como em um relacionamento mais s�rio, no casamento ou em uni�es est�veis. Os amigos que est�o em relacionamentos infelizes acabam por se realizar, inconscientemente, nas aventuras do amigo “solteir�o”. Este, por sua vez, se sente o m�ximo, ainda que por alguns anos, como o pegador garanh�o”, diz a sex�loga.
J� num segundo olhar, a especialista lembra que esse comportamento pode sugerir uma imaturidade e uma incapacidade de criar la�os afetivos mais profundos, que requerem doa��o, compromisso, concess�es e engajamento. Assim, acrescenta a psic�loga, o singlismo aparece como uma forma de rotular os homens solteiros como problem�ticos emocionalmente, que n�o conseguem se envolver em relacionamentos s�rios, ou ainda, aqueles que n�o conseguiram amadurecer o suficiente para se casar e seguem vinculados � figura materna eternamente.
Compaix�o
Eles tamb�m podem ser vistos como ego�stas, que n�o conseguem construir uma vida a dois por pensarem apenas em suas vontades, ou como pessoas que n�o assumem responsabilidades. “De alguma forma, esse perfil de homem pode ser parcialmente exclu�do dos programas de outros casais amigos, por ser visto como um ‘mau exemplo’ para os homens casados, na opini�o das esposas. Mas em geral h� uma toler�ncia maior com o homem solteiro do que com a mulher solteira e ele desperta mais a compaix�o do que a cr�tica, pelo menos no ambiente familiar, podendo ser tratado como ‘o coitadinho que n�o deu sorte no amor’, o que lhe rende um cuidado maior por parte das irm�s e familiares.”
Para ler...
a capa do livro
Reprodu��o
“N�o sou feliz, mas tenho marido”, da jornalista argentina Viviana G�mez Thorpe. O livro, de 2021, � da Editora Letraviva e tem 176 p�ginas. � quase imposs�vel n�o rir durante a deliciosa leitura da obra Nele, a autora demonstra sua peculiar capacidade de descrever em min�cias as aventuras e desventuras de uma vida a dois. Dotada de um humor inteligente, consegue pontuar algumas quest�es nas rela��es humanas, sem a pretens�o de filosofar ou de avaliar cada uma delas. Baseada em experi�ncias reais de Viviana, a fic��o mostra uma jornalista que descobriu, ao longo do trabalho, que poderia ser uma esp�cie de bi�grafa de muitas outras mulheres em todo o mundo. Esta capacidade de "ironizar" o dia a dia pode ser uma das chaves do sucesso do t�tulo que ficou por nove meses entre os mais vendidos na Argentina.
capa de livro
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"Segregados: como os solteiros s�o estereotipados, estigmatizados e ignorados e vivem felizes", de Bella DePaulo, Editora Babelcube Inc., de 2018, 421 p�ginas, � baseado em d�cadas de pesquisas cient�ficas e em uma vasta cole��o de hist�rias sobre diversos tipos de solteiro. A autora desmistifica a vida de solteiro e mostra que praticamente tudo que j� ouviu sobre os benef�cios do casamento e sobre os perigos de ficar solteiro � grosseiramente exagerado ou simplesmente errado. Embora os solteiros sejam isolados com um tratamento injusto no trabalho, no mercado de consumo e na estrutura federal tribut�ria, eles n�o s�o simplesmente v�timas da “solteirofobia”. Os solteiros est�o vivendo mesmo felizes para sempre.
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