Senhor Eduardo fazendo diálise

Eduardo Moura acorda �s 4h da manh� para pegar transporte e ir fazer di�lise em outro munic�pio, ele mora em Maric�, no interior do Rio de Janeiro

ABCDT/Divulga��o

Cerca de 155 mil pacientes renais cr�nicos, que fazem tratamento de di�lise nas mais de 867 unidades pelo Brasil, est�o hoje, dia 31 de agosto, o Dia D da Di�lise, em luta pela garantia do tratamento que lhes garante a vida. A mobiliza��o � uma iniciativa da Associa��o Brasileira dos Centros de Di�lise e Transplante (ABCDT), que, desde 2018, chama a aten��o para as dificuldades enfrentadas para melhorar a assist�ncia aos pacientes renais cr�nicos. A maior preocupa��o hoje � com a sustentabilidade do sistema, trazendo desafios de gest�o �s cl�nicas que permanecem em funcionamento.
 
A o longo desses cinco anos, a crise se intensificou devido � defasagem da tabela Sistema �nico de Sa�de (SUS) e algumas unidades come�aram a fechar as portas. Outras deixaram de atender pacientes encaminhados pelo SUS. Somente nos �ltimos seis anos, 42 cl�nicas n�o conseguiram se manter e foram � fal�ncia, sendo seis apenas em 2023. De acordo com os administradores, os repasses feitos pelo Governo Federal tornaram-se insuficientes diante dos aumentos de custos. Cl�nicas contratadas pelo SUS n�o conseguem ampliar o n�mero de vagas no Brasil e algumas j� fecharam diante do recebimento de um repasse defasado. D�vidas se acumulam.


Conforme a ABCDT, sem recursos, muitas cl�nicas deixaram de fazer investimentos. E, na atual conjuntura, podem vir a fechar. Estamos agora apelando para o Governo Federal, para Estados e Munic�pios em busca de aux�lio financeiro. Os cofinanciamentos s�o necess�rios. Hoje, apenas os estados do Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Distrito Federal e Bahia complementam os custos da di�lise. E os pacientes renais cr�nicos dependem da di�lise para sobreviver. Quando os rins param de funcionar e filtrar o sangue, somente uma m�quina � capaz de realizar essa tarefa. E todo paciente dial�tico precisa da terapia ao menos por quatro horas, tr�s vezes por semana, at� que possa conseguir um transplante renal, se estiver apto. 

Reajuste do Minist�rio da Sa�de

A ABCDT destaca que, depois de imensa luta, conseguiu um reajuste de 10,3% do Minist�rio da Sa�de. A tabela SUS estabelece os valores a serem pagos �s cl�nicas. Mas, segundo a institui��o, ainda � abaixo dos custos e n�o resolve as dificuldades.

"Usamos m�quinas e insumos importados, cujos pre�os aumentaram muito nos �ltimos anos. O SUS pagar� R$ 240 por di�lise, contra um custo m�dio de R$ 302 por sess�o. � um d�ficit de R$ 62. Com a grande defasagem no valor do reembolso, a maioria das prestadoras de servi�o ao SUS precisou recorrer a empr�stimos. Muitas cl�nicas est�o endividadas e h� um risco real de desassist�ncia no setor”, explica o nefrologista e presidente da Associa��o Brasileira de Centros de Di�lise e Transplante (ABCDT), Yussif Ali Mere J�nior. 

Outros  desafios se imp�em na nefrologia brasileira

  1. Dificuldade de acesso ao diagn�stico da doen�a e ao tratamento em tempo oportuno
  2. Acompanhamento ambulatorial pr�-dial�tico � insuficiente
  3. O acesso para cirurgia vascular � limitado
  4. Existe um vazio assistencial em regi�es afastadas dos grandes centros
  5. H� dificuldades para oferecer o tratamento a pacientes pedi�tricos
  6. H� dificuldade de acesso ao transplante renal
  7.  O acesso � di�lise peritoneal � reduzido (apenas 5% da popula��o t�m acesso) e a remunera��o � insuficiente para a manuten��o e acompanhamento da equipe assistencial
  8.  Por falta de vagas em cl�nicas, h� pacientes internados em hospitais para realizar o tratamento. Mais de 2 mil pessoas hoje est�o � espera de vaga em cl�nica de dialise para sair de um hospital. 
Um estudo recente feito pela ABCDT chama a aten��o para a diferen�a do crescimento de pacientes e procedimentos feitos no �mbito do SUS e na rede privada. H� 11 anos, o SUS atendia a cerca de 78 mil pacientes - que realizavam 12 milh�es de procedimentos anuais e a rede privada tinha 7,3 mil pacientes, com 1,3 milh�o de sess�es de di�lise por ano. De l� pra c�, houve crescimento de 33% no SUS, chegando a 17.5 milh�es de procedimentos para quase 104 mil pacientes.

J� na rede privada o incremento foi de 108%, passando para cerca de 2 milh�es de procedimentos em quase 15 mil pacientes at� o ano de 2021. No ano de 2022 ainda n�o h� o n�mero de procedimentos realizados na rede particular e o percentual pode ser um pouco maior. 

Di�lise pedi�trica sem reajustes desestimula crescimento de vagas

A hemodi�lise pedi�trica ambulatorial come�ou no SUS em 2014 em 54 cidades, com 133 pacientes e hoje apenas 44 continuam com o servi�o. O n�mero de pacientes cresceu em 40% e chegou a 187 em 2021, mas a modalidade seguiu sem reajuste desde 2014 – esse ano ter� apenas 2,7% de reajuste. H� um desest�mulo para o seu crescimento. Entre 2012 e 2021, 10 munic�pios deixaram de ofertar a modalidade pedi�trica, sobrecarregando os munic�pios que permaneceram realizando o tratamento.
 
“O que nos resta pensar � que o futuro � incerto para os pacientes renais cr�nicos. � importante que a sociedade saiba que essa terapia substitui a fun��o que o rim doente n�o consegue mais executar e, sem esse tratamento, o paciente renal vai a �bito. Podemos dizer que o Brasil vinha, at� aqui, sendo um bom exemplo de presta��o de servi�o nefrol�gico. H� pacientes renais com mais de 30 anos em di�lise desde que os rins pararam. E esses cidad�os, em sua maioria, s�o pessoas carentes que adquirem diabetes e hipertens�o e depois perdem a fun��o renal porque se alimentaram mal por muitos anos; muitas mal t�m tempo e dinheiro para comprar e produzir alimento saud�vel em casa, muito menos para fazer atividade f�sica. A sa�de das pessoas mais pobres � cada dia mais cr�tica. E, quando adoecem, n�o tomam os rem�dios necess�rios. V�o piorando cada vez mais”, alerta Yussif.

Doen�a renal cr�nica (DCR)

A doen�a renal cr�nica (DRC) � uma das principais causas de morte no Brasil, com 40 mil novos casos ao ano, de pessoas com alguma disfun��o renal. Muitas nem sequer chegam a descobrir a doen�a a tempo de tratar e acabam falecendo. 

Augusto Saboia Neto

Augusto Saboia Neto n�o sabe at� quando conseguir� manter a cl�nica em funcionamento porque os custos aumentaram mais do que os repasses feitos pelo governo para manter a presta��o do servi�o aos pacientes do SUS

ABCDT/Divulga��o


“Para se ter uma ideia, pa�ses com bom padr�o de atendimento t�m cerca de mil pacientes em tratamento para cada milh�o de habitantes. O Brasil tem aproximadamente 550 pacientes para cada milh�o de habitantes. N�o � que o Brasil tem menor preval�ncia da doen�a. Temos aus�ncia de diagn�sticos e muitos v�o a �bito antes de descobrirem o problema renal, que muitas vezes � silencioso”, finaliza.
 
Cl�nicas de di�lise em dificuldades n�o conseguem abrir novas vagas e fazer novos investimentos e fila de pacientes sem atendimento continua. Augusto Saboia Neto � m�dico nefrologista e administra duas cl�nicas nos munic�pios de Quixad� e Iguatu, no Cear�. Para gerir o servi�o faz planejamentos de longo prazo, ciente que seu cliente � um paciente portador de doen�a cr�nica e precisa do tratamento pelo menos tr�s vezes na semana para viver. O volume de d�vidas, no entanto, est� se acumulando e para tentar reduzir os custos, com �gua e luz por exemplo, investiu num po�o artesiano e na implanta��o de pain�is fotovoltaicos nas cl�nicas.

Augusto Saboia Neto n�o sabe at� quando conseguir� manter a cl�nica em funcionamento porque os custos aumentaram muito mais do que os repasses feitos pelo governo para manter a presta��o do servi�o aos pacientes do SUS: " “� o que d� pra fazer em termos de gest�o, mas os recursos do SUS para custeio do tratamento n�o s�o suficientes”, destaca o m�dico.
 
Augusto Saboia Neto n�o est� sozinho nesta preocupa��o. Cerca de 42 cl�nicas de di�lise em todo pa�s j� fecharam as portas por insolv�ncia financeira, sendo 6 em 2023. “Os gestores destas cl�nicas, que ficam na maioria no Sul do pa�s, transferiram equipamentos e instala��es para institui��es filantr�picas e hospitais p�blicos em troca da quita��o das enormes d�vidas adquiridas nos �ltimos anos para manter a opera��o at� ent�o. A situa��o � t�o cr�tica, que os gestores temem que isso seja um efeito cascata irrevers�vel. Novos investimentos j� deixaram de ser feitos nas cl�nicas h� tempos. O pa�s precisa de mais vagas para pacientes renais, abrir mais cl�nicas em mais cidades, os servi�os precisam ser mais bem pagos, e precisamos evoluir na qualidade da di�lise feita no pa�s. S�o muitos desafios no cen�rio da nefrologia", destaca o m�dico nefrologista Leonardo Barberes, vice-presidente da ABCDT.

Eduardo Daher tem uma cl�nica em Bel�m do Par� e a realidade da presta��o de servi�o n�o � diferente do Cear�. Outro estado, mais de 1.600km de dist�ncia, mas com as mesmas solu��es que auxiliam na redu��o de gastos. O administrador tamb�m investiu no po�o artesiano para dissolver os custos da gest�o, mas sabe que o maior peso est� nas contas fixas e que n�o podem ser substitu�das, como insumos para a realiza��o da di�lise, mas tem resolvido alguns problemas, com a produ��o b�sica de solu��o e ampliando tamb�m, al�m do SUS, o atendimento para o conv�nio. O malabarismo � parte integrante desta rotina, que tenta com o apoio da tecnologia driblar os problemas, a burocracia e ganhar f�lego e mais tempo para sobreviver. 

Hist�rias de vidas, experi�ncias diferentes e uma palavra que os une: sensa��o de desamparo

Ana Paula

Ana Paula Carvalho � paciente renal, cadeirante, dependente da hemodi�lise e tr�s vezes por semana e precisa viajar para outra cidade para dialisar

ABCDT/Divulga��o
Ana Paula Carvalho � paciente renal, cadeirante, dependente da hemodi�lise e tr�s vezes por semana encara o transporte p�blico para se deslocar � cl�nica onde faz o tratamento. Ela mora em Belford Roxo, na regi�o metropolitana do Rio de Janeiro. Para evitar qualquer atraso, sai de casa com duas horas de anteced�ncia. �s vezes, precisa contar com a sorte, j� que nem sempre a acessibilidade do �nibus est� em funcionamento. De carro o trajeto duraria apenas 10 minutos. Paulinha, como � conhecida, recebe um benef�cio assistencial do Governo Federal e retira pelo SUS a medica��o que necessita, mas os suplementos vitam�nicos recomendados ao tratamento n�o entram na gratuidade.
 
J� Eduardo Moura, mora em Maric�, no interior do Rio de Janeiro, mas para fazer di�lise precisa se descolar para outro munic�pio: Itabora�, distante quase 30km. Diferentemente de Paulinha, o trajeto � compartilhado, al�m do motorista, com mais quatro pessoas que est�o no primeiro turno da cl�nica de di�lise da cidade vizinha, e em muitos casos esse deslocamento e o tratamento consomem entre 06 e 10 horas do dia. Ele n�o sabe mensurar que fatores pesam mais na vida de quem depende do procedimento para viver, mas sabe que a maior dificuldade � n�o ter a presta��o de servi�o dispon�vel na cidade em que mora. Ele acorda �s quatro todo dia.

O benef�cio assistencial auxilia quem n�o pode trabalhar, mas os custos da suplementa��o alimentar pesam no or�amento. Sem contar o desgaste e o cansa�o de quem viaja tr�s vezes na semana em busca de um tratamento para ter, no m�nimo, mais qualidade de vida.

Karyl  na máquina de diálise

Karyl da Silva n�o consegue trabalhar o dia todo por conta da rotina de di�lise

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E tem at� paciente que preferiu renunciar ao servi�o de transporte, em benef�cio da sa�de mental. “Quem faz di�lise quer sobreviver e quando voc� compartilha esse espa�o no transporte, compartilha dramas, ang�stias e viv�ncias, mas quando o trajeto termina voc� est� destru�do emocionalmente de ver como as pessoas enfrentam tantas dificuldades na vida, sobretudo quando adoece”, revela Karyl da Silva, tamb�m paciente renal.

Karyl conseguiu um trabalho e sua jornada come�a cedo, mas precisa encerrar �s 13h para dar tempo de pegar o terceiro e �ltimo turno na cl�nica de di�lise. Ele usa o vale social para pegar o transporte p�blico. Uma jornada que inicia �s 15h e encerra �s 23h30, quando retorna para casa.
 
Cada um dos personagens tem uma dificuldade que para um olhar menos atento parece individual, mas n�o �: o desafio de cada um deles � sobreviver. Cada uma dessas hist�rias mostra a dificuldade que os pacientes renais enfrentam para ter acesso ao tratamento que salva suas vidas, mas eles precisam de mais apoio para viver com maior qualidade de vida. Porque as vidas importam.

Dia D da Di�lise

Com a reivindica��o de um tratamento de qualidade e acesso para todos os renais cr�nicos, a Associa��o convoca cl�nicas, profissionais da �rea, pacientes e familiares para aderirem � campanha "Vidas Importam - A di�lise n�o pdoe parar", #adialisenaopodeparar.

Pe�as de divulga��o com apoio � causa, curiosidades e depoimentos de pacientes est�o sendo divulgados no site. O ‘Dia D’ da Di�lise � feito pela Associa��o Brasileira dos Centros de Di�lise e Transplante (ABCDT) com o apoio da Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), a Associa��o Brasileira de Enfermagem em Nefrologia (SOBEN), a Federa��o Nacional de Associa��es de Pacientes Renais e Transplantados do Brasil (FENAPAR) e a Alian�a Brasileira de Apoio � Sa�de Renal (Abrasrenal).


Grandes n�meros

  • Atualmente, o pa�s soma quase 155 mil pacientes em tratamento renal cr�nico, sendo 87% com a terapia financiada atrav�s do Sistema �nico de Sa�de (SUS), ou seja, 135 mil pacientes.
  • No Brasil, 867 estabelecimentos prestam o servi�o de di�lise, sendo 710 unidades cl�nicas privadas.
  • Cerca de duas mil pessoas aguardam por uma fila em cl�nica de di�lise em todo o pa�s, muitas internadas apenas para dialisar.
  • Apenas 5% dos 155 mil pacientes renais fazem di�lise peritoneal
  • Apenas 7% dos munic�pios brasileiros possuem cl�nicas de di�lise
  • A Regi�o Sudeste concentra o maior n�mero de nefrologistas (50,3%); 20,3% est�o na Regi�o Nordeste; 14,9% no Sul; 8,9% no Centro-oeste e 4,3% na Regi�o Norte. 59,6% dos nefrologistas est�o nas capitais e 34,4 % no interior.
  • �ltimo reajuste concedido pelo MS: 10,3% ( junho de 2023), e o valor da sess�o passa de R%uFF04 218,47 para R%uFF04 240,97, a partir de setembro.
  •  Para cobrir os custos e evitar o colapso do setor, o valor da sess�o de hemodi�lise deveria custar, pelo menos, R%uFF04 302,00.