Itamar Vieira Jr lança ‘Coração sem medo’, conclusão da ‘trilogia da terra’
Novo livro do autor de ‘Torto arado’ e ‘Salvar o fogo’ chega às livrarias na próxima segunda (13/10) e tem foco na história de Rita Preta, bisneta de Donana
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Depois de retratar a luta de uma comunidade rural por terra em “Torto arado” e a perseguição religiosa contra afro-indígenas em “Salvar o fogo”, Itamar Vieira Junior conclui sua “trilogia da terra” com “Coração sem medo” (Todavia).
O romance, que chega às livrarias na próxima segunda-feira (13/10), já tem contrato assinado para sair em oito países – Portugal, Austrália, Índia, Reino Unido, EUA, África do Sul, Quênia e Canadá.
Neste terceiro volume, o escritor baiano avança algumas gerações na linhagem de Donana – avó das irmãs Bibiana e Belonisia, protagonistas de “Torto arado”. Acompanhamos a odisseia da bisneta dela, Rita Preta, que vive sozinha na periferia de Salvador, cuidando dos três filhos: Cid, Cainho e Juca.
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A vida dela é marcada por tragédias passadas, que remontam à infância na fazenda Outeiro Velho, quando quase se afogou no rio e ainda levou a culpa pela morte dos irmãos, carregados pela correnteza. Mas o maior golpe é o desaparecimento do filho Cid, após uma discussão violenta em casa.
Rita procura o rapaz, desesperando-se à medida que os dias passam sem notícias. Inicia, então, uma peregrinação por delegacias, hospitais e até o Instituto Médico Legal (IML). Só avança na investigação quando recebe informações de um preso conhecido como Brinquedo.
Ele revela que Cid foi levado por policiais que o teriam confundido com um traficante. As pistas de Brinquedo levam Rita a um local conhecido como “terra de desova”. Lá encontra a sandália de Cid com um casal de lavradores que faz uma revelação terrível: viram fogo e sentiram cheiro de carne queimada no local há pouco tempo.
Assim como nos outros dois romances da trilogia, Itamar muda o foco narrativo ao longo da história. Se a maior parte da trama é narrada em terceira pessoa, o desfecho de Cid – com todos os detalhes do desaparecimento – é revelado pelos “Cadernos de Cainho”, escritos em primeira pessoa pelo segundo filho de Rita.
“A sensação é a de que passei os últimos oito anos escrevendo essa história, que se desdobrou nesse tríptico”, diz Itamar, em entrevista ao Estado de Minas. “O que fica, agora, é a sensação de dever cumprido. São três livros com histórias atravessadas por personagens que dão conta de um tempo e de uma questão que são muito nossas: a luta pela terra e pelo território”, acrescenta.
Em “Coração sem medo”, essa luta é retratada de duas formas. Primeiro, por meio da memória que Rita tem da fazenda Outeiro Velho, onde a terra aparece como centro da vida e da opressão dos antepassados. Já no núcleo urbano o tema se manifesta na busca de Rita por um lugar digno para morar – uma constante em sua vida.
A protagonista foi forçada a deixar a Comunidade das Malvinas porque a prefeitura queria desocupar a área em favor da especulação imobiliária. Aceitou um lote em Fazenda Coutos, mas desejava mesmo uma comunidade com campo ou uma casa com laje coberta. A rotina errante faz dela uma pessoa “distante da terra, um pássaro sem local para pousar”.
“Acho que a observação continua sendo uma grande fonte de experiência para escrever histórias. Não vivi exatamente o contexto do livro, mas habitei a periferia da cidade por muito tempo. Pegava ônibus com homens e mulheres que iam trabalhar e ficava atento à vida deles. Então, Rita Preta não é diferente dessas mulheres que pegavam o ônibus comigo”, afirma o escritor.
“Inclusive, há uma passagem que é real. É a de uma mãe que conta a perda de quatro de seus cinco filhos. Essa mulher é a mãe do meu melhor amigo. Ou seja, é uma experiência do meu mundo que levo para a literatura”, revela.
O baiano conclui a trilogia avançando não só na linhagem de suas personagens, mas também no deslocamento geográfico. “Torto arado” se passa em uma fazenda fictícia na Chapada Diamantina, cercada pelos rios Santo Antônio e Tinga, afluentes do Paraguaçu, onde “Salvar o fogo” é ambientado. Por fim, a história deságua no litoral de Salvador, em “Coração sem medo”.
Nada disso é por acaso, garante Itamar. “Na Chapada Diamantina, ali no interior da Bahia, existe expressão muito forte do jarê, do legado da diáspora e da escravidão. A história foi seguindo um curso natural até chegar ao Paraguaçu, que é fundamental para o desfecho de 'Salvar o fogo'”, comenta.
“Depois ela continua seguindo até a Baía de Todos os Santos, que foi onde tudo começou. Afinal, não dá para pensar na história brasileira sem considerar aqueles que já estavam aqui, os povos originários”, conclui.
Lançamento em BH
Itamar Vieira Junior vai desembarcar na capital mineira no próximo dia 28 para participar do Sempre um Papo. A conversa será às 19h, no auditório do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (Av. Raja Gabaglia, 1.315, Luxemburgo). Entrada gratuita, sujeita à lotação do espaço.