No próximo dia 13, estreia na HBO Max “Ângela Diniz: Assassinada e Condenada”. A série é baseada no aclamado podcast “Praia dos Ossos” e mergulha nos acontecimentos que levaram à morte da mineira, em 1976, e, principalmente, no julgamento que chocou o país ao colocar a vítima no banco dos réus.

Nascida em uma família da alta sociedade mineira, Ângela era conhecida por sua beleza e por viver de forma independente, desafiando os padrões conservadores da época. Após um divórcio conturbado, ela se mudou para a praia de Búzios, no Rio de Janeiro, onde iniciou um relacionamento com Raul Fernando do Amaral Street, o Doca Street.

O romance, que durou apenas alguns meses, terminou de forma trágica. Em 30 de dezembro de 1976, durante uma discussão acalorada na casa de praia, Doca Street deu quatro tiros à queima-roupa contra Ângela, que morreu no local.

Durante o primeiro julgamento, em 1979, o advogado de defesa de Doca Street, Evandro Lins e Silva, construiu uma tese que culpabilizava a vítima. Ele retratou Ângela Diniz como uma mulher de moral duvidosa e comportamento promíscuo, argumentando que Doca agiu em “legítima defesa da honra”. A estratégia funcionou, e o assassino foi condenado a apenas dois anos de prisão, com direito a suspensão da pena, saindo do tribunal em liberdade.

Logo após o resultado, movimentos feministas da época ganharam força. E Ângela virou um símbolo da luta contra a violência contra a mulher. Com o lema “Quem ama não mata”, ativistas foram às ruas para protestar contra a decisão e a cultura que permitia que a vida de uma mulher fosse julgada como justificativa para seu próprio assassinato. Em meio à polêmica, um novo julgamento foi marcado. Dessa vez, com o advogado Humberto Telles na defesa de Doca.

No novo júri, a tese de “legítima defesa da honra” foi rebatida, e Doca Street finalmente recebeu uma condenação mais severa: 15 anos de prisão em regime fechado.

A nova série da HBO Max, assim como o podcast que a inspirou, não se limita a recontar o crime. A produção busca analisar como a sociedade da época reagiu ao assassinato e como a narrativa de culpabilização da vítima foi construída e aceita, um fenômeno que, infelizmente, ainda reverbera nos dias de hoje.

Como identificar e combater a culpa da vítima no dia a dia

O caso Ângela Diniz expôs uma prática cruel e ainda comum: a culpabilização da vítima. Reconhecer e combater essa atitude é um passo fundamental na luta contra a violência de gênero. Veja como você pode fazer a diferença em conversas cotidianas e nas redes sociais.

  1. Questione perguntas que invertem a lógica: frases como “Mas o que ela vestia?”, “Por que ela estava naquele lugar sozinha?” ou “Ela não deveria ter provocado?” transferem a responsabilidade do agressor para a vítima. A única pergunta relevante é: por que o agressor cometeu o crime?

  2. Foque a responsabilidade no agressor: em qualquer discussão sobre um caso de violência, reforce que a culpa é exclusivamente de quem comete o ato violento. As escolhas, o comportamento ou o histórico da vítima nunca justificam uma agressão.

  3. Evite especulações sobre a vida pessoal da vítima: julgar a vida amorosa, as amizades ou as decisões de quem sofreu a violência é uma forma de desumanizá-la e validar a agressão. A vida pessoal de alguém não é um atenuante para um crime.

  4. Use a linguagem correta: prefira termos como “vítima” e “sobrevivente” em vez de palavras que minimizam a situação. Chame o crime pelo nome: feminicídio, estupro, assédio. A precisão na linguagem ajuda a moldar a percepção pública.

  5. Amplifique dados e informações confiáveis: compartilhe estatísticas sobre violência contra a mulher e informações de fontes seguras. Educar seu círculo social sobre a dimensão do problema ajuda a desconstruir mitos e preconceitos.

  6. Ofereça apoio em vez de julgamento: se uma pessoa próxima compartilhar uma experiência de violência, ouça com empatia e sem julgamentos. Ofereça ajuda prática e valide seus sentimentos. O acolhimento é essencial para que a vítima se sinta segura para denunciar e buscar ajuda.

Também tem gerado produções culturais: séries, filmes, livros e podcasts que revisit­am o episódio sob diferentes olhares - muitos deles destacando como o tratamento midiático e jurídico da época culpabilizou a vítima e naturalizou justificativas machistas. imagem gerada por i.a
O assassinato de Ângela Diniz permanece como um símbolo importante na história do feminismo no Brasil. O caso é frequentemente citado em discussões sobre violência de gênero, cultura do machismo e impunidade para agressores. Reprodução do Youtube Canal Rádio e TV Justiça
A pressão social, especialmente de movimentos feministas, levou a um novo julgamento em 1981, no qual Doca Street foi condenado a 15 anos de prisão. Esse segundo julgamento tornou-se um marco contra a justificativa de violência sob alegações emocionais ou de honra. Reprodução do Youtube Canal Rádio e TV Justiça
Assim, ele foi condenado a dois anos de prisão, com direito a sursis, a suspensão condicional da pena. Ou seja, não cumpriu pena de fato, por ser réu primário. Esse resultado provocou protestos públicos, com o slogan “Quem ama não mata”. Reprodução do Youtube Canal Rádio e TV Justiça
No primeiro julgamento, em 1979, a defesa de Doca Street usou a tese da “legítima defesa da honra”, alegando que Ângela teria provocado o namorado. Reprodução do Youtube Canal Rádio e TV Justiça
O caso teve grande repercussão nacional. O assassinato acendeu debates sobre direitos e violência contra as mulheres feminina e impunidade. Domínio Público/Wikimédia Commons
Depois do crime, Doca fugiu, mas ele acabou se entregando às autoridades em 18 de janeiro de 1977. Domínio Público/Wikimédia Commons
Após uma briga, Doca saiu da casa, mas voltou pouco tempo depois. A discussão recomeçou, e ele acabou atirando à queima-roupa em �ngela: foram quatro tiros disparados com uma pistola Beretta - três no rosto e um na nuca. Reprodução do Youtube Canal Rádio e TV Justiça
O assassinato de Ângela Diniz aconteceu na noite de 30 de dezembro de 1976, quando ela estava na casa de veraneio na Praia dos Ossos, em Búzios, com Doca Street. - Domínio Público/Wikimédia commons
Em meados de 1976, ela se envolveu com o empresário Raul Fernando do Amaral Street, conhecido como Doca Street, com quem manteve relacionamento conturbado marcado por manifestações de ciúme e violência verbal por parte dele. Reprodução do Youtube Canal Rádio e TV Justiça
Quando terminou o relacionamento, ela firmou o desquite, já que o divórcio não era permitido legalmente à época. Após o fim do casamento, ela manteve uma pensão e uma mansão em Belo Horizonte, mas perdeu a guarda dos filhos. Angela Diniz - Assassinato de Ângela Diniz, história da morte da socialite através de um crime opcorrido em dezembro de 1976 - Reprodução do Youtube Canal Rádio e TV Justiça
Ela se casou aos 17 anos com o engenheiro Milton Villas Boas, com quem teve três filhos. A união durou nove anos. Reprodução do Youtube Canal Rádio e TV Justiça
Socialite de destaque nos anos 1970, ela ganhou fama e notoriedade por seu estilo de vida livre, com comportamentos que contrariavam visões conservadoras da época, e por ser uma presença constante na alta sociedade brasileira. - Reprodução do Youtube Canal Rádio e TV Justiça
Ângela Maria Fernandes Diniz nasceu na cidade mineira de Curvelo, em 1944. - Domínio Público/Wikimédia Commons
Em 2023, o caso foi tema do filme “Ângela”, estrelado por Isis Valverde e Gabriel Braga Nunes e com direção de Hugo Prata. Divulgação
Outros nomes do elenco incluem Antônio Fagundes como o advogado e ex-ministro do STF Evandro Lins Silva; Thiago Lacerda como Ibrahim Sued; Camila Márdila interpretando Lulu Prado; e Yara de Novaes no papel de Maria Diniz. Divulgação
O roteiro da minissérie tem base no podcast “Praia dos Ossos”, da Rádio Novelo, que conta a história da socialite com detalhes. Divulgação
A protagonista é interpretada por Marjorie Estiano, enquanto Emilio Dantas assume o papel de Doca Street. Divulgação
A produção revisita o caso da socialite Ângela Diniz, assassinada em 1976 pelo então companheiro Doca Street, em um crime que chocou o Brasil. Reprodução do Canal HBO Max Brasil
A HBO Max liberou o primeiro teaser da minissérie dramática “Ângela Diniz: Assassinada e Condenada”, com estreia prevista para novembro de 2025. Divulgação

A tese de "legítima defesa da honra" ainda é válida?

Não. Em 2023, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu por unanimidade que a tese é inconstitucional.

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Com isso, ficou proibido que advogados de defesa usem esse argumento para justificar feminicídios em tribunais do júri no Brasil.

Uma ferramenta de IA foi usada para auxiliar na produção desta reportagem, sob supervisão editorial humana.

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