Um vídeo recente do frei Gilson, frade católico conhecido por suas lives de oração e alertas espirituais, gerou debates acalorados ao criticar católicos que frequentam centros espíritas. No reel postado no Instagram este ano, ele alerta: "Cuidado! O diabo também cura para te enganar e te seduzir!", afirmando que católicos não devem pisar em centros espíritas ou de macumba, pois ali o demônio promoveria curas ilusórias com um preço espiritual posterior.

Essa declaração, replicada em plataformas como TikTok e Threads, reforça a visão católica tradicional de incompatibilidade entre o cristianismo e outras práticas espirituais, rotulando-as como influenciadas por forças malignas. O vídeo, que acumula milhares de visualizações, exemplifica o tom combativo de frei Gilson, que em outras ocasiões já associou o espiritismo ao diabo, gerando acusações de intolerância religiosa.

Essa controvérsia ilustra um contraste profundo entre visões religiosas. Enquanto no catolicismo e em outras denominações cristãs, como as igrejas pentecostais, termos como "diabo", "satanás" ou "demônio" são mencionados frequentemente em sermões, orações e rituais de exorcismo para denunciar o mal e reforçar a batalha espiritual – como visto nas pregações de frei Gilson –, a umbanda adota uma abordagem oposta. Nas giras, sessões rituais onde médiuns incorporam entidades como orixás, caboclos ou pretos-velhos, evita-se pronunciar esses nomes por razões cosmológicas e práticas.

"Exu não é diabo"

Primeiramente, a umbanda não adere ao conceito cristão de um antagonista eterno e absoluto como o diabo. Influenciada por tradições africanas, indígenas, católicas e espíritas, ela vê o mal como um desequilíbrio energético ou ações humanas negativas, não como uma entidade suprema maligna. Entidades como Exu, frequentemente demonizadas pelo cristianismo colonial como equivalentes ao diabo, são na verdade mensageiros neutros ou protetores nas encruzilhadas da vida, responsáveis por abrir caminhos e equilibrar forças.

"Exu não é diabo; nós não acreditamos em demônios ou nada do tipo", explica um vídeo educativo sobre a Umbanda, destacando que esses estereótipos surgiram da perseguição histórica durante a escravidão, quando práticas africanas eram forçadas a se sincretizar com o catolicismo para sobreviver.

Além disso, mencionar "diabo" ou "satanás" nas giras poderia atrair energias negativas indesejadas, segundo o princípio umbandista de que palavras e pensamentos criam realidade. Os rituais priorizam vibrações positivas, com pontos cantados (hinos) que invocam entidades benevolentes para cura, orientação e caridade.

Embora alguns pontos de demanda – cantos para proteção contra males – mencionem "inferno" ou "demônio" como resquícios culturais da colonização, eles não representam crença literal, mas sim uma forma de confrontar desequilíbrios sem atrair forças destrutivas. Muitos terreiros modernos evitam esses termos para combater preconceitos e enfatizar a essência da umbanda: o bem, o livre-arbítrio e a elevação espiritual.

Em contraste, religiões como o catolicismo e o protestantismo usam esses nomes abundantemente para educar fiéis sobre tentações e pecados, como em passagens bíblicas (ex.: Lucas 10:18 sobre a queda de Satanás) ou rituais de libertação. Essa diferença reflete visões de mundo distintas: o dualismo cristão versus o holismo umbandista, onde o mal é transitório e superável por meio de equilíbrio, não confronto eterno.



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