“Acidente”. Foi assim que Renê da Silva Nogueira Júnior, investigado pela morte do gari Laudemir de Souza Fernandes, descreveu o crime em uma carta enviada a seu antigo defensor, Dracon Luiz Cavalcante Lima.
O documento foi entregue ao advogado na tarde dessa segunda-feira (26/8), depois que o suspeito nomeou um novo representante legal, o criminalista Bruno Silva Rodrigues, do Rio de Janeiro. Renê, marido de uma delegada da Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG), confessou ter feito o disparo de arma de fogo que atingiu e matou a vítima.
Na carta, o autor confesso relata que houve um mal entendido com a mudança dos advogados e que gostaria que tanto o mineiro, que entrou no caso na última sexta-feira (22/8), quanto o carioca, constituído no dia seguinte, o representem.
Entre os pedidos, a forma com que o empresário cita o homicídio chama a atenção. “O que aconteceu foi um acidente com a vítima”, retrata.
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Primeiro ele negou
Em um primeiro momento, Renê negou que teria cometido o crime e passado pela Rua Modestina de Souza, no Bairro Vista Alegre, Região Oeste de BH, na manhã de 11 de agosto. Ele chegou a dizer que saiu de casa, no Bairro Vila da Serra, em Nova Lima, na região metropolitana, direto para o trabalho em Betim, também na Grande BH.
No entanto, o álibi foi derrubado pelos investigadores, que obtiveram imagens nítidas do carro do suspeito e dele guardando a arma de sua esposa, delegada da PCMG, em uma mochila.
Após a divulgação das gravações, na última segunda-feira (18/8), o investigado, em novo depoimento, confessou que estava no local e disparou a arma da esposa.
Arma "para proteção"
Conforme registrado no termo de declaração da oitiva, pela PCMG, Renê afirmou que essa foi a primeira vez que pegou a pistola .380, de uso particular da mulher. Ainda segundo a nova versão, ele teria feito isso para se proteger, por “estar indo para um local perigoso” e por não conhecer o caminho. A arma, então, seria “para proteção”.
Durante o caminho para o trabalho, Renê teria encontrado um congestionamento causado pelo caminhão de coleta de lixo. Segundo ele, a motorista deixou que os carros à sua frente passassem, mas, ao chegar na sua vez, fechou o trânsito. Ele, então, teria gritado “Meu carro é largo, não vai passar” e a funcionária, do ângulo em que estava, viu a arma dentro do carro e alertou os coletores: “Ele está armado!”.
Em resposta a isso, Renê contou que um gari veio em sua direção, dizendo que ameaçar uma mulher era fácil, “quero ver fazer isso com um homem”. Ele confessou que, após a suposta ameaça, saiu do carro, com a arma em mãos, e apontou para o chão, momento em que o gari recuou.
Conforme o relato, o suspeito levantou a arma de fogo e, ao perguntar se o gari queria “resolver na mão”, a arma disparou. Ele afirmou que não tinha intenção de matar ninguém, e sim “atirar para o alto”.
Renê também alegou que não imaginava que o disparo tinha atingido Laudemir e que pensou que poderia responder judicialmente “no máximo” por porte ilegal de arma de fogo. Ele disse que só soube do assassinato ao ser abordado pela Polícia Militar de Minas Gerais, na tarde do crime.
Confronto de versões
A versão apresentada pelos garis sobre os fatos que precederam o crime diferem do que disse o empresário no interrogatório. Segundo os garis, a motorista do caminhão, Eledias Aparecida Rodrigues, de 42 anos, percebeu que uma fila de carros se formava atrás do veículo.
Para liberar a passagem, ela decidiu manobrar, permitindo que os motoristas seguissem adiante, entre eles o empresário Renê da Silva, que conduzia um carro da marca BYD.
De acordo com depoimentos, a motorista e os garis acenaram para Renê, dizendo “vem, vem, pode vir”, em sinal de que havia espaço para ele passar. Nesse momento, o suspeito teria abaixado a janela e gritado para a condutora que, se alguém encostasse em seu veículo, ele iria matar a pessoa. Ele, então, pegou uma arma, apontou para Eledias e ameaçou “dar um tiro na cara” dela.
O gari Tiago Rodrigues contou que se colocou entre os dois, tentando intervir: “Você vai dar um tiro na mulher trabalhando? Vai matar ela dentro do caminhão?”, questionou.
Renê seguiu com o carro sem encostar no caminhão e parou alguns metros à frente. De acordo com as testemunhas, ele saiu do veículo armado, mas deixou o carregador cair. Após recolhê-lo, engatilhando novamente a pistola, e efetuou um disparo, que atingiu Laudemir.
A bala acertou o tronco de Laudemir, no lado direito das costelas e saiu pelo esquerdo. Laudemir foi levado ao Hospital Santa Rita, em Contagem, na Grande BH, mas morreu momentos depois por hemorragia interna. No local do crime, foi recolhido um projétil intacto de munição calibre .380.
Naquele dia, a vítima substituía um colega afastado por lesão. Ele normalmente trabalhava na rota que atende o Bairro Serra, na Região Centro-Sul da capital.
Quem é o suspeito?
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Renê da Silva Nogueira Júnior, de 47 anos;
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Ex-vice-presidente de empresa de alimentos, desligado após repercussão;
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Casado com a delegada Ana Paula Balbino Nogueira (PCMG);
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Descrevia-se como “cristão, esposo, pai e patriota”;
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Tem outros registros policiais em São Paulo (lesão corporal grave contra uma mulher) e Rio de Janeiro (lesão corporal contra ex-companheira, ameaça contra ex-sogra e envolvimento em homicídio culposo);
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Nega ter antecedentes criminais, diz que só responde a processo por luxação no pé da ex-esposa.
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A esposa do suspeito é investigada?
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Ana Paula Balbino Nogueira, identificada como a esposa do suspeito de homicídio, continua trabalhando normalmente;
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A delegada foi ouvida pela Corregedoria da Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG), onde trabalha;
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As armas de serviço e pessoal foram apreendidas e estão sendo analisadas nos inquéritos administrativos e criminal;
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A PCMG afirma que, até o momento, não há informações que liguem a delegada ao homicídio do gari.