O idoso, de 60 anos, que estava em coma induzido por comer Nicotiana glauca, uma planta tóxica conhecida como “falsa couve”, em Patrocínio, no Alto Paranaíba, em Minas Gerais, foi extubado. O paciente está internado na Santa Casa da cidade e, apesar da melhora, segue em tratamento intensivo. A suspeita é que ele e a família consumiram a planta por engano. Uma mulher, identificada como Claviana Nunes da Silva, de 37 anos, morreu.

No dia que a família foi internada, no último dia 8, o Corpo de Bombeiros (CBMMG) informou que quatro pessoas consumiram a planta conhecida popularmente como “fumo-bravo” e apresentaram sintomas de intoxicação. O vegetal foi encontrado nas proximidades da cozinha da residência, reforçando a hipótese de erro na identificação da planta durante o preparo da refeição.

Segundo os bombeiros, todos haviam ingerido a planta confundida com couve no almoço. Uma criança de 2 anos também foi internada. Ela não ingeriu a planta, mas ficou em observação médica.

Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde de Patrocínio informou que o paciente de 60 anos foi extubado e segue respirando com auxílio de máscara de oxigênio. O idoso está consciente e orientado, porém segue sob cuidados intensivos e tem apresentado melhoras. Já o paciente de 64 anos recebeu alta da Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) e está estável.

Ainda segundo o Executivo municipal, a secretaria, por meio da Vigilância Sanitária e Epidemiológica, tem acompanhado o caso desde o início da ocorrência. Amostras de alimentos e materiais biológicos foram coletadas e encaminhadas para análise laboratorial, com objetivo de identificar o agente causador da intoxicação.

“O município reforça que todas as medidas preventivas e de investigação continuam em andamento, e novas informações serão divulgadas assim que confirmadas pelos órgãos competentes”, afirmou a Prefeitura de Patrocínio.

Óbito

Cinco dias depois que a família foi internada, a Secretaria de Saúde de Patrocínio informou que Claviana Nunes da Silva morreu na noite de segunda-feira (13/10). No dia que os familiares confundiram a planta com couve, a mulher teve uma piora súbita e entrou em parada cardiorrespiratória (PCR). De acordo com o Corpo de Bombeiros, foi necessário realizar manobras de reanimação, e a vítima foi levada ao Pronto-Socorro Municipal, onde teve o quadro revertido.

Claviana foi sepultada nessa terça-feira (14/10), no Cemitério Municipal de Guimarânia, a 28 quilômetros de Patrocínio. O velório aconteceu por volta das 9h, na Funerária do Baiano. Ela deixou dois filhos e o marido.

A Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) informou que está instaurado procedimento policial para apurar as circunstâncias do possível envenenamento. Segundo a corporação, os levantamentos preliminares indicam a possibilidade de envenenamento acidental, ocorrido durante o preparo do almoço, quando a planta foi confundida com couve.

Novos casos

Na manhã desta sexta-feira (17/10), a Prefeitura de Santa Vitória, no Triângulo Mineiro, emitiu um alerta após sete intoxicações por consumo da “falsa couve” serem confirmadas. Pelas redes sociais, o prefeito Sérgio Moreira (Solidariedade) informou que há suspeita de que outras pessoas cultivem a planta tóxica em casa.

“O José e a Rosane são nossos servidores aqui, tiveram uma intoxicação grave, mas graças ao empenho da nossa equipe aqui do pronto socorro, em especial ao doutor Artur, nossos socorristas e enfermeiros, eles foram atendidos a tempo e não evoluíram da pior forma como em Patrocínio”, contou o prefeito, que também é médico.

No alerta, Moreira fez um apelo à população para os moradores que tenham exemplares da planta em casa que “acabem com tudo”, para manter a segurança. Ele também explicou que a ingestão da planta pode causar náuseas, vômitos, confusão mental e até sintomas cardiovasculares, como parada cardiorrespiratória. “Evitem o consumo ou seu cultivo, não façam sua ingestão como alimento nem como chá, há risco de intoxicação grave e até mesmo risco de morte”, conclui.

O que é a Nicotiana glauca?

A Nicotiana glauca é uma planta da mesma família do tabaco, originária do Norte e Nordeste da Argentina e da Bolívia. Atualmente, está naturalizada em várias regiões do Sul da América Tropical, Estados Unidos, México, Austrália, Caribe e em áreas secas da Europa. No Brasil, ocorre de forma cultivada ou ruderal, em ambientes secos ou úmidos, principalmente em quintais, beiras de estrada e áreas rurais.

A planta é considerada invasora, por se dispersar rapidamente e alterar ecossistemas naturais, ameaçando a biodiversidade nativa. É conhecida por diferentes nomes populares: “falsa couve”, “charuteira”, “couve-do-mato” e “erva-de-charuto”. A confusão com a couve comum aumenta o risco de intoxicação.

Quais os sintomas de intoxicação?

  • Náuseas e vômitos logo após a ingestão
  • Tontura e sudorese intensa
  • Taquicardia seguida de queda brusca da frequência cardíaca
  • Fraqueza muscular e dificuldade para respirar
  • Perda de consciência e parada cardíaca

O que fazer em caso de intoxicação?

Ao perceber sintomas após a ingestão de plantas desconhecidas, é fundamental procurar atendimento médico imediato, levando, se possível, uma amostra da planta para facilitar a identificação. A reportagem procurou a Secretaria de Saúde de Patrocínio para mais informações sobre o estado de saúde das vítimas e aguarda posicionamento.

Por que a planta é tóxica?

A Nicotiana glauca contém alcaloides piridínicos, como anabasina, nicotina, anatabina e nornicotina, que agem sobre o sistema nervoso e afetam funções vitais como batimentos cardíacos, respiração e controle muscular. Alguns desses metabólitos podem levar à paralisia respiratória e até à morte.

Segundo o professor de química farmacêutica da PUC Minas Guilherme Rocha, a planta produz metabólitos primários, necessários para fotossíntese e sustentação, e metabólitos secundários, que atuam na defesa contra predadores ou atração de polinizadores. Esses metabólitos secundários, como os alcaloides, podem ser extremamente tóxicos e interferir diretamente no metabolismo do corpo humano.

Ele também ressalta que, dependendo da quantidade ingerida, da concentração do alcaloide e do peso da pessoa, mesmo pequenas doses podem ser letais. Ao contrário de alguns alimentos, o cozimento ou refogado não destrói os alcaloides, mantendo a planta perigosa mesmo depois do preparo. Além disso, a Nicotiana glauca é muito comum em áreas rurais no Brasil e já causou confusões graves com a couve, incluindo mortes documentadas.

A intoxicação pela Nicotiana glauca ocorre em duas fases: inicialmente, os alcaloides causam uma superestimulação dos músculos e órgãos, levando à taquicardia, hipertensão, náusea, tontura e sudorese intensa. Em seguida, os receptores nervosos entram em fadiga, provocando queda brusca da frequência cardíaca, paralisia muscular e respiratória e, em casos graves, parada cardíaca.

A falsa couve pode ser facilmente confundida com a couve comum, mas algumas características ajudam a diferenciá-la. Ao contrário da couve, que cresce de forma mais rasteira, a Nicotiana glauca desenvolve-se como um pequeno arbusto. Além disso, apresenta flores amarelas e partes com fluorescência, características ausentes na couve tradicional. Para garantir a identificação correta, é recomendado que a planta seja examinada por um biólogo ou especialista em farmacognosia.

 Siga nosso canal no WhatsApp e receba notícias relevantes para o seu dia

Casos de intoxicação por Nicotiana glauca já ocorreram no Brasil. Em 2012, em Santa Luzia, na Grande BH, um homem morreu, e quatro familiares ficaram internados após comerem a planta refogada, confundindo-a com couve. Em 2018, em Pio IX (PI), seis pessoas, incluindo duas crianças, foram hospitalizadas depois de ingerirem suco com folhas da planta; todas receberam alta.

compartilhe